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Endoscopia no Futuro: Inteligência Artificial até que ponto?

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O desenvolvimento de carros e transportes inteligentes sem condutor, assistentes virtuais da Alexa e Google Nest gerenciando a rotina domiciliar são uma realidade que permeia a atualidade e respalda um estudo de Oxford o qual estima que 47% das profissões atuais estão em risco de automação.

Na era pós-pandemia do Covid, vimos a aceleração digital alcançar a educação com vídeo-aulas, reuniões virtuais e congressos por conferência remota. Neste sentido, uma das pautas atuais é a inteligência artificial (IA) como tecnologia na Medicina nesta última década. Ela já atua em vários campos da radiologia, oftalmologia, dermatologia e neurologia, desde diagnóstico de imagens em mamografias, lesões malignas cutâneas e na retinopatia diabética. 

Para compreender a IA, é essencial saber as terminologias básicas:

  • Inteligência Artificial (IA): ciência multidisciplinar que envolve aprendizado automatizado;
  • Machine Learning (ML): meio da IA de aprendizado automatizado por computação através de diversos métodos algorítimicos;
  • Deep Learning (DL): um dos meios de ML mais atual por envolver diversas camadas de correlações algorítimicas, podendo ter pesos diferentes em cada conexão, simulando a arquitetura de rede neural.

Na gastroenterologia, a IA entremeia a Endoscopia em dois meios que podem ser vistos no Vídeo:

  • Computer-Aided Detection (CADe): envolve o uso de ML e DL para detecção e localização de lesão. Por exemplo, a indicação de pólipos na colonoscopia, como na Figura 1, denotado por sinal azul claro em forma de retrato envolvendo o pólipo

  • Computer-Aided Diagnosis (CADx): envolve o uso de ML e DL para auxiliar no diagnóstico de lesões. É possível que a IA consiga diferenciar lesões neoplásicas de hiperplásicas na colonoscopia, como visto na Figura 2, com um círculo amarelo envolvendo a na visão endoscópica e demarcação da lesão no campo inferior direito.

Atualmente, o uso de IA encontra-se em diversos estudos e em fases distintas, desde validação, eficácia até a vigilância pós-comercialização com aprovação do FDA (agência reguladora de saúde e serviços nos EUA). Seu uso na endoscopia digestiva alta, cápsula endoscópica e colonoscopia podem ser separados por segmentos:

Esôfago

  • Esôfago de Barrett (EB): Groof et al. obteve uma sensibilidade e especificidade maiores com IA na detecção de EB, respectivamente de 90% e 88%, quando comparado aos especialistas sem CADe de 88% e 72%, respectivamente. Ebigbo et al. desenvolveu um CADx capaz de diagnosticar cancer em EB, bem como diferenciar invasão de submucosa, de T1a de T1b, com 77% de sensibilidade e 64% de especificidade.
  • Carcinoma Espinocelular (CEC): O CADe de Guo et al. conseguiu uma sensibilidade de 98% e especificidade de 95% com o auxílio de cromoscopia NBI.

Estômago

  • Helicobacter pylori: Nakashima e colegas desenvolveram um CADx com sensibilidade à luz branca de 66.7%, à cromoscopia BLI de 96.7% e à cromoscopia com LCI de 96.7%.
  • Câncer precoce: Kanesaka et al. conseguiram delinear por CADx as lesões suspeitas com sensibilidade e especificidade de 65.5% e 80.8%, respectivamente. Zhu e colegas desenvolveram um modelo capaz de diferenciar a profundidade da lesão, de SM1 versus SM2, com sensibilidade de 76.5% e especificidade de 95.6%, auxiliando na avaliação de ressecção endoscópica.

Intestino Delgado

  • Sangramento de intestino delgado: o diagnóstico por cápsula endoscópica de Jia e colegas chegou a 99% de sensibilidade e especificidade. Aoki et al. desenvolveu um CADe para detecção de erosões  e ulcerações com acurácia de 90.8%.

Intestino Grosso

  • Taxa de detecção de pólipo (ADR): Um estudo randomizado de Wang et al. reportou um aumento de ADR no grupo com CADe comparado ao convencional (34% versus 28%).
  • Cancer colorretal: Ito e colegas aplicaram um CADx capaz de diagnosticar a profundidade de invasão de cancer T1b, chegando a acurácia de 81,2%.
  • Doença inflamatória intestinal: Campo ainda com estudos prospectivos em andamento. Maeda et al. desenvolveram um CADx predizendo inflamação histológica em retocolite ulcerativa com acurácia de 91%.

A tecnologia avança exponencialmente e o estudo de Oxford mostra que o profissional do futuro deve estar aberto a inovar e aprender. Isso não difere na Medicina, tanto que em universidades renomadas, como a Harvard Medical School nos EUA, já possuem grades curriculares que antecipam a participação dos alunos no hands-on e contato com paciente e especialidades, bem como a desenvolver soft skills de pensamento crítico, coordenação e tomada de decisão, habilidades ainda além do escopo da IA.

De tantas aplicabilidades que estão em andamento e outras a virem, a IA deverá se apresentar multimodal no campo da endoscopia. Ela envolverá não apenas a detecção e diagnóstico, mas também na decisão clínica através de previsão histológica e de risco metastático em lesões neoplásicas, auxiliando nas condutas e decisões a curto e longo prazo, podendo delinear o prazo ideal de seguimento.

Referências Bibliográficas

  1. Boyle, Kathleen. “TECHNOLOGY AT WORK v6. 0: The Coming of the Post-Production Society.” (2021).
  2. Brown, Jeremy R. Glissen, and Tyler M. Berzin. “Adoption of New Technologies: Artificial Intelligence.” Gastrointestinal Endoscopy Clinics 31.4 (2021): 743-758.
  3. Okagawa, Yutaka, et al. “Artificial intelligence in endoscopy.” Digestive Diseases and Sciences 67.5 (2022): 1553-1572.

Como citar este artigo

Kum, AST e Miyajima, NT. Endoscopia no Futuro: Inteligência Artificial até que ponto? Endoscopia Terapeutica 2023, vol 1. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/assuntosgerais/endoscopia-no-futuro-inteligencia-artificial-ate-que-ponto/

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Médico formado pela Faculdade de Medicina da USP (FMUSP);
Fellow researcher na Harvard Medical School New Research Building, EUA;
Residência em Cirurgia Geral e Endoscopia pelo HC-FMUSP;
Preceptoria e Fellow de Endoscopia Avançada do HC-FMUSP;
Título de especialista pela SOBED.

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Médico do Serviço de Endoscopia Gastrointestinal do Hospital das Clínicas - FMUSP, Grupo Fleury, Hospital SBC e Nipo-Brasileiro.


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