Home » Nova Classificação de Eventos Adversos em Endoscopia Digestiva: AGREE
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Com a expansão das técnicas endoscópicas diagnosticas e terapêuticas faz-se necessário métodos uniformes e mundialmente reconhecidos para avaliação dos eventos adversos relacionados aos procedimentos endoscópicos. Essa padronização permite avaliação da qualidade de serviço, de procedimento, bem como, para estudos científicos (coorte, ensaios clínicos randomizados e metanálises).

Na literatura atual há uma escassez de ferramentas de definição para tais eventos. Para intervenções cirúrgicas existe a classificação de Clavien-Dindo (CD)1, que, por vezes, sua utilização foi extrapolada para procedimentos endoscópicos. A classificação de CD é inadequada quando aplicada para procedimentos endoscópicos, pois existem diferenças quanto a origem dos pacientes: a maioria são ambulatoriais nos procedimentos endoscópicos comparado ao perfil internado para as intervenções cirúrgicas.

Com o objetivo de padronizar o registro de eventos adversos em endoscopia digestiva, foi proposta a nova classificação chamada AGREE (Classification for Adverse events in GastRointEstinal Endoscopy)2.

Esta classificação estratifica os pacientes desde os que não apresentam eventos adversos em 30 dias até os que evoluem para óbito por complicações relacionadas ao procedimento endoscópico (vide tabela 1). A definição de evento adverso nesta nova classificação foi similar à classificação de CD, que define evento adverso como um desfecho negativo para o paciente que impede a conclusão de um procedimento planejado ou causa qualquer desvio do curso pós-procedimento padrão, independente da correlação direta. Por exemplo, paciente vítima de acidente de bicicleta que foi submetido a colonoscopia 3 dias antes sob sedação consciente pode parecer não relacionado ao procedimento, mas ainda deve ser registrado como evento adverso. Vale ressaltar que, assim como é realizado na classificação de CD, caso o paciente apresente múltiplos eventos adversos relacionados, apenas o mais grave deve ser considerado.

GraduaçãoDefinição

Ausência de Evento Adverso

Contato telefônico com profissional, ambulatório ou serviço de endoscopia ou observação estendida após procedimento < 3h, sem qualquer necessidade de intervenção.

Grau I


Evento adverso sem necessidade de intervenção endoscópica, radiológica ou cirúrgica.
– Comparecimento a emergência,
– Admissão hospitalar <24h,
– Uso de drogas sintomáticas ou eletrólitos,
– Testes diagnósticos laboratoriais ou radiológicos.

Grau II

Evento adverso com necessidade de uso de outras medicações (antibióticos, antitrombóticos), necessidade de transfusão sanguínea ou admissão hospitalar por mais de 24h.

Grau III

III a – necessidade de intervenção endoscópica ou radiológica
III b – necessidade de intervenção cirúrgica

Grau IV

Necessidade de cuidados intensivos
IV a- disfunção orgânica simples (incluindo dialise)
IV b – disfunção múltipla de órgãos

Grau V

Óbito

Tabela 1: Classificação de AGREE

Para a validação desta nova ferramenta de registro de eventos adversos endoscópicos, foram cumpridas três etapas. Na primeira etapa, foram analisadas as diferentes percepções dos eventos adversos sob a ótica de endoscopistas experientes, enfermeiras e pacientes, sendo selecionados casos fictícios e analisados para graduação dos eventos na nova classificação AGREE. Como esperado, houve algumas subjetividades principalmente na análise do nexo causal do evento adverso e o procedimento endoscópico. Além disso, endoscopistas experientes tinham uma percepção menos grave sobre a necessidade de uma nova intervenção para tratamento de um evento adverso do que enfermeiras e pacientes. Na segunda etapa da validação, foram coletados dados retrospectivos de eventos adversos registrados num serviço acadêmico de Amsterdam no período de janeiro de 2016 a novembro de 2020. Foram aplicadas a classificação AGREE em todos os 436 eventos adversos. Na terceira e última etapa de validação da classificação AGREE, foram aplicados questionários para especialistas de 30 países e 5 continentes diferentes. Um dado importante é que cerca de metade dos endoscopistas experientes dos diferentes centros do mundo não utilizavam nenhum banco de dados para reportar os seus eventos adversos.

É importante ressaltar algumas limitações dessa nova classificação as quais podemos citar a ausência de definição de leve, moderada ou grave como é padronizada na classificação da ASGE3, além de não haver uma graduação de gravidade relacionada a longa permanência hospitalar na nova classificação AGREE. Comparando as duas classificações, os efeitos adversos severos correspondem graus II a IVb da classificação de AGREE. Outra ressalva deve-se a variedade de políticas aplicadas no manejo dos eventos adversos nos diversos serviços dos diversos países, dando abertura para subjetividade na avaliação de desvio do tratamento pós-procedimento padrão.

Entretanto, esta nova classificação AGREE foi considerada simples, reprodutível, aplicável e lógica pela maioria dos endoscopistas especialistas, tornando-se uma importante ferramenta no registro padronizado dos eventos adversos, gerando estudos através do banco de dados e contribuindo com a melhoria das práticas endoscópicas em todo mundo.

Em suma, o AGREE permite uma padronização exequível em todo o mundo para avaliar qualidade de serviço de endoscopia, criticidade de um novo procedimento e fomento de estudos científicos observacionais, ensaios clínicos e metanálises.

Referências

  1. Dindo D, Demartines N, Clavien PA. Classification of surgical complications: a new proposal with evaluation in a cohort of 6336 patients and results of a survey. Ann Surg. 2004 Aug;240(2):205–13.
  2. Nass KJ, Zwager LW, van der Vlugt M, Dekker E, Bossuyt PMM, Ravindran S, et al. Novel classification for adverse events in GI endoscopy: the AGREE classification. Gastrointest Endosc. 2022 Jun;95(6):1078-1085.e8.
  3. Ben-Menachem T, Decker GA, Early DS, Evans J, Fanelli RD, Fisher DA, et al. Adverse events of upper GI endoscopy. Gastrointest Endosc. 2012 Oct;76(4):707–18.

Como citar este artigo

Kum AST Nova Classificação de Eventos Adversos em Endoscopia Digestiva: AGREE Endoscopia Terapeutica 2023, vol 2. Disponível em: endoscopiaterapeutica.net/pt/nova-classificacao-de-eventos-adversos-em-endoscopia-digestiva-agree/

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Médico formado pela Faculdade de Medicina da USP (FMUSP);
Fellow researcher na Harvard Medical School New Research Building, EUA;
Residência em Cirurgia Geral e Endoscopia pelo HC-FMUSP;
Preceptoria e Fellow de Endoscopia Avançada do HC-FMUSP;
Membro Titular da SOBED.

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Médica formada em 2017 pela Escola Bahiana de Medicina e Saúde pública (BA)
Especialista em cirurgia geral - Hospital Ana Nery (BA)
Residente de Endoscopia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo

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Médico Endoscopista no Hospital Vila Nova Star, Hospital Nove de julho e Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP
Fellow em Ecoendoscopia e Colangiopancreatografia Retrógrada Endoscópica (CPRE) no Hospital das clínicas da Faculdade de Medicina da USP
Mestre em Ciências em Gastroenterologia pela Faculdade de Medicina da USP


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