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Para saber um pouco mais sobre ambientes com pressão negativa

por Rodrigo Rodrigues
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A pandemia do coronavírus impôs maciças restrições à prática da endoscopia, especialmente à sua maior parcela, a dos procedimentos eletivos, assim como fez em todos os setores, de maneira jamais vista.

Ao redor do mundo, múltiplas sociedades produziram e divulgaram uma série de recomendações para adequação da prática médica, visando a continuidade dos atendimentos necessários com a máxima segurança possível, ainda que, com restrições.

Essas restrições são ainda mais rígidas nos procedimentos considerados geradores de aerossóis, como é o caso da endoscopia digestiva. Em casos confirmados ou suspeitos de COVID-19, recomenda-se a realização do procedimento em sala com pressão negativa, medida de difícil cumprimento, dada a escassez desse recurso em nosso meio (1,2).

Mas o que é de fato uma sala com pressão negativa?

Seu princípio de funcionamento é relativamente simples. Trata-se de um ambiente selado, no qual uma pressão negativa é gerada a partir da exaustão de ar em volume maior do que aquele que é permitido entrar nesse ambiente. Mas na verdade, o manejo da pressão é apenas um dos seus fundamentos. O controle do ar ambiente para se evitar transmissão por partículas suspensas está baseado em três pilares:

  • controle pressórico, para condução do fluxo de ar;
  • ventilação por diluição, para troca do ar ambiente;
  • filtragem, para remoção de partículas.

 

Nestas salas, o sistema controla a troca gasosa com o exterior, retirando do ambiente entre 30 e 40% a mais em volume de ar do que permite entrar, gerando assim, uma espécie de vácuo permanente com fluxo unidirecional. A diferença entre a exaustão e o suprimento de ar deve ser de cerca de 2.5 Pascal, induzindo o fluxo do ar de espaços adjacentes para a sala isolada.

O fluxo da massa de ar é promovido por ventilação mecânica e a capacidade do sistema de eliminar diferentes quantidades de material infectante depende do número de trocas de ar por hora (air changes per hour – ACH – Figura 1) oferecido pelo sistema, bem como do posicionamento das entradas e saídas de ar, além da configuração física da sala.

Figura 1 – Tempo requerido para remoção de 90%, 99% e 99,9% de contaminantes transmitidos pelo ar. Excerto de Airborne Infectious Disease Management: Methods for Temporary Negative Pressure Isolation (ref. 3)

 

Embora o princípio das salas de pressão negativa seja simples, a sua disponibilidade é pequena, mesmo em grandes centros em países desenvolvidos. Atualmente, nos EUA, apenas 2 a 4 % das salas hospitalares contam com pressão negativa. Nada de errado nisso até recentemente, por serem pouco demandadas proporcionalmente e representarem custo adicional.

 

É possível transformar um ambiente comum em uma sala de pressão negativa?

A medida tem sido adotada tanto em ambiente hospitalar (3), aumentando a capacidade de acomodação em condições de isolamento, quanto fora do hospital, em pontos alternativos de cuidados (4 e 5).  Para isso o recurso é a adaptação por Isolamento Temporário por Pressão Negativa (TNPI). TNPIs devem ser considerados quando há necessidade de salas de isolamento para infecção com transmissibilidade pelo ar (Airborne Infeccion Isolation Rooms – AIIRs) e esses ambientes encontram-se ausentes ou são insuficientes. Existem várias configurações de TNPIs. Em todas elas um equipamento de filtragem tipo HEPA (high performance particulate arrestance) e de ventilação mecânica é colocado no ambiente. Esse sistema estará ligado uma saída de ar, que pode ser uma janela, com eliminação do ar filtrado para o exterior do prédio, ou ainda para o próprio sistema de ventilação (Figuras 2 e 3). Uma terceira versão, menos eficiente, pode utilizar cortinas plásticas para delimitar o espaço de isolamento. O sistema de filtragem e ventilação cria uma pressão negativa relativa, no entorno do paciente, e drena o ar para fora dos limites do isolamento (Figura 4).

Figura 2 – Isolamento temporário por pressão negativa com saída em janela. Excerto da ref (3)

Figura 3 – Isolamento temporário por pressão negativa com saída para sistema de ventilação. Excerto da ref (3).

Figura 4 – Isolamento temporário por pressão negativa com delimitação por cortinas plásticas. Excerto da ref (3).

 

Ainda não sabemos quais das novas recomendações de segurança perdurarão na prática endoscópica após a fase crítica da pandemia, mas é possível que haja necessidade de ampliação da oferta de ambientes que contem com essa tecnologia.

 

Referências:
  1. Gralnek Ian M et al. ESGE and ESGENA. Position Statement on gastrointestinal endoscopy and the COVID-19 pandemic .Endoscopy 2020; 52
  2. Repici A et. al. Coronavirus (COVID-19) outbreak: what the department of endoscopy should know. DOI 10.1016/j.gie.2020.03.019
  3. https://www.health.state.mn.us/communities/ep/surge/infectious/airbornenegative.pdf
  4. https://www.fastcompany.com/90491094/negative-pressure-rooms-save-lives-why-arent-there-more-of-them
  5. https://news.stlpublicradio.org/post/florissant-hotel-being-converted-house-coronavirus-patients-if-need-arises#stream/0
Rodrigo Rodrigues
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Doutorado em Ciências da Saúde pela UNIFESP (2011).
Mestrado em Ciências da Saúde pela UNIFESP (2005)
Visiting fellow University of Pittsburgh Medical Center – UPMC e Universidade de Kobe, Japão
Coordenador médico do setor de endoscopia e motilidade digestiva - Fleury Medicina e Saúde.
HEAD de Especialidades Médicas - Fleury Medicina e Saúde.
Residência Gastroenterologia HC-UFPE 2001


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