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Rastreio de neoplasia pancreática em indivíduos com predisposição genética

por Fernanda Prado Logiudice
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A neoplasia pancreática apresenta habitualmente manejo desafiador, em virtude de seu comportamento biologicamente agressivo, resposta limitada às terapias oncológicas e estágio avançado da doença ao diagnóstico. A taxa reportada de sobrevida média em 5 anos é de cerca de 10% e aproximadamente 80% dos pacientes não são elegíveis à tratamento cirúrgico ao diagnóstico.  No entanto, a detecção em estágios iniciais da doença está associada a melhor sobrevida, podendo atingir 93% em 10 anos em diagnósticos no estadio 0 e até 39% em 5 anos em neoplasias estadio I.

Devido à natureza muitas vezes assintomática do câncer pancreático em estágios iniciais, a detecção precoce pode ser desafiadora e geralmente requer métodos de triagem em populações de alto risco.

Em 2022 a ASGE publicou guideline acerca das recomendações de triagem para adenocarcinoma ductal pancreático em indivíduos com susceptibilidade genética.

O guideline sugere a realização de rastreio de neoplasia pancreática em indivíduos com risco aumentado de câncer pancreático devido à suscetibilidade genética. Um total de 25 estudos foram analisados, envolvendo pacientes com síndrome de pancreatite hereditária familiar, síndrome de Peutz-Jeghers, síndrome familiar de melanoma múltiplo atípico e síndrome de Lynch, bem como aqueles com variantes patogênicas nos genes BRCA1, BRCA2, ATM e PALB2. As principais medidas avaliadas incluíram mortalidade por todas as causas, rendimento da triagem para lesões de alto risco, rendimento da triagem para lesões ressecáveis e limítrofes e danos causados pela triagem.

Um dado de destaque na análise dos estudos é que cerca de 60% das neoplasias detectadas pela triagem eram ressecáveis ou limítrofes, enquanto que na prática cotidiana, 20% dos casos sintomáticos são diagnosticados quando ressecáveis ou limítrofes, 30% em estágio localmente avançado e 50% são metastáticos.

Cabe-se ressaltar também possíveis malefícios decorrentes da realização de rastreio, notando-se que, embora no total de pacientes submetidos a rastreio a taxa de cirurgias que não evidenciaram tumores foi de 2,8%, dentre os 181 pacientes operados, 46,6% não apresentaram evidência de neoplasia na peça cirúrgica e a taxa de eventos adversos foi de 19,9%.

Quanto ao método de rastreio, o guideline sugere que tanto a realização de ecoendoscopia quanto de ressonância magnética ou a alternância entre estes métodos são estratégias viáveis.

A ecoendoscopia pode ser preferida em casos de pacientes com risco bastante aumentado para tumor de pâncreas, como na síndrome de Peutz-Jeghers e síndrome familiar de melanoma múltiplo atípico, em situações que pode ser combinada com exames de endoscopia e colonoscopia de rastreio, como nas síndromes de Lynch e Peutz-Jeghers, e em situações de contraindicação à realização de ressonância magnética. Sugere-se que sejam utilizados ecoendoscópios com probes setoriais pelo melhor rendimento diagnóstico.

Já a ressonância magnética pode ser o método de escolha em situações de risco aumentado para a sedação relacionada a procedimentos endoscópicos, em pacientes que priorizem métodos menos invasivos e na possibilidade de realização concomitante de outros exames de imagem.

A periodicidade sugerida do rastreio é anual para todos os grupos de pacientes com risco aumentado de câncer pancreático devido à suscetibilidade genética e as recomendações de idade para início do rastreio estão sumarizadas na tabela:

Variante patogênica / SíndromeInício do rastreio
BRCA2 / BRCA1 / PALB2
Heterozigotos ATM + fam. 1º/2º grau c/ neo de pâncreas
FPC (rastreio recomendado em fam. 1º grau dos afetados)
Lynch + fam. 1º/2º grau c/ neo de pâncreas
50 anos / 10 anos antes do fam. + jovem com neo de pâncreas
FAMMM40 anos / 10 anos antes do fam. + jovem com neo de pâncreas
Peutz-Jeghers35 anos / 10 anos antes do fam. + jovem com neo de pâncreas
Pancreatite hereditária autossômica dominante40 anos

Referência

  1. Sawhney MS, Calderwood AH, Thosani NC, Rebbeck TR, Wani S, Canto MI, Fishman DS, Golan T, Hidalgo M, Kwon RS, Riegert-Johnson DL, Sahani DV, Stoffel EM, Vollmer CM Jr, Qumseya BJ; ASGE guideline on screening for pancreatic cancer in individuals with genetic susceptibility: summary and recommendations. Gastrointest Endosc. 2022 May;95(5):817-826. PMID: 35183358

Como citar este artigo

Logiudice FP. Rastreio de neoplasia pancreática em indivíduos com predisposição genética. Endoscopia Teraupetica 2024, vol 1. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/assuntosgerais/rastreio-de-neoplasia-pancreatica-em-individuos-com-predisposicao-genetica/

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Residência médica em Cirurgia Geral e Endoscopia Digestiva pelo Hospital das Clínicas da FMUSP.

Especialização em Endoscopia Digestiva Avançada pelo Hospital das Clínicas da FMUSP.

Médica assistente do serviço de Endoscopia Hospital das Clínicas da FMUSP, Hospital Paulistano, Centro Paulista de Endoscopia e São Luiz Rede D’Or Jabaquara.


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