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Eficácia do Amplatzer (cardiac septal occluder) no tratamento de fístula e deiscência após cirurgia bariátrica

por Flávio Ferreira
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A endoscopia digestiva possui um papel fundamental no suporte e tratamento do paciente com fístula após cirurgia bariátrica através de diferentes técnicas, incluindo uso de endopróteses, terapia a vácuo e técnicas de drenagem interna através de septotomia ou pigtail. Analisamos o excelente trabalho publicado na edição deste mês da Gastrointestinal Endoscopy que contou com Dr. Diogo Moura e Dr. Eduardo Moura como autores.

Artigo: Efficacy of the cardiac septal occlude in the treatment of post-bariatric surgery leaks and fistulas.  Publicado na Gastrointestinal endoscopy em março de 2019 (Volume 89)

 Os autores realizaram um estudo avaliando o tratamento endoscópico de fístula após cirurgia bariátrica com o uso off-label de uma prótese utilizada habitualmente para tratamento de defeitos cardíacos (persistência de ducto atrial/ventricular), com elevada taxa de sucesso.

Métodos:

 

Estudo multicêntrico retrospectivo envolvendo 9 hospitais terciários (Brasil, Colombia, Estados Unidos e Venezuela), no período de 2012 a 2018. Foram incluídos pacientes com diagnóstico de fístula após gastrectomia vertical (GV) ou bypass gátrico em Y de Roux (BGYR) para tratamento com Amplatzer tanto para casos de falha terapêutica de outros métodos endoscópicos tanto como terapia primária.

Prótese: O Amplatzer é uma prótese metálica autoexpansível de nitinol e polyester, em formato de ampulheta/carretel, de diversos tamanhos. O diâmetro da “cintura” da prótese (localizada dentro do orifício fistuloso) varia entre 18mm e 38mm, com extensão de 3-7mm. As extremidades proximal e distal (“bordas” intragástrica / intracavitária) variam entre 9 e 54mm. O sistema introdutor possui calibre entre 5-12Fr e comprimento de até 80cm o que não permite seu uso através do endoscópio. Para permitir o uso da prótese por endoscopia foi realizada uma adaptação através do uso de um empurrador de prótese biliar (7-10Fr) como sistema de liberação – a prótese era liberada do introdutor original e depois tracionada (encapada) dentro do empurrador com auxílio de pinça. As próteses eram selecionadas de acordo com o diâmetro do orifício fistuloso, devendo ter ao menos mais de 50% do calibre da fístula.

Imagem do dispositivo com sistema introdutor

Procedimento: Realizado por endoscopia com controle radiológico, sob sedação ou anestesia geral, sem necessidade de internamento hospitalar permitindo manejo ambulatorial dependendo das condições clínicas do paciente.  Exame contrastado era realizado logo após o procedimento para confirmar adequada oclusão da fístula. A progressão da dieta seguia os seguintes parâmetros: dieta zero (24h) seguida de 3 dias de líquida total, 3 dias de pastosa/soft solids e posteriormente dieta livre. Era prescrito uso de omprazol por 30 dias; controle com esofagograma e endoscopia após 4-6 semanas.

Sequencia de imagens evidenciando (A): fístula associada a bloqueio inflamatório (B): introdução do dispositivo (C):prótese liberada (D): exame de controle

 

Resultados:
43 pacientes foram submetidos ao tratamento dos quais 65,1% do sexo feminino, 34,9% sexo masculino, com fístulas gastrocutaneas (n=38), gastropleural (n=3) e gastrobronquica (n=2). A maior parte dos pacientes com fístulas tardias e crônicas (81,4%), seguido de precoces (entre 1-6 semanas; 5 pacientes) e agudas (n=3, 6,9%). Houve sucesso técnico em todos os casos,  com sucesso no fechamento da fístula em exame de controle em 39 dos 43 casos (90,7%).

Todos os cinco pacientes com fístulas precoces tiveram recidiva da fístula nos primeiros 30 dias e foram submetidos a troca das próteses por modelos mais calibrosos com adequado sucesso terapêutico nos exames de controle, sem outras intervenções.

Ausência de vazamento em exame contrastado (esquerda) ; re-epitelização sobre borda interna do dispositivo (direita)

Dos 4 casos de falha terapêutica (9,7%), três eram casos agudos e uma fístula tardia gastropleural onde havia uma cavidade não drenada.  Nos casos agudos, foi observada melhora inicial porém houve retorno da drenagem cutânea após 72h. Nestes, foi observado alargamento do orifício fistuloso – em todos foi realizada remoção da prótese com pinça de corpo estranho/alça polipectomia e posicionada prótese metálica autoexpansível por 6 semanas, com resolução da fístula. O paciente da fístula gastrocutânea teve piora clinico-laboratorial e foi submetido a gastrectomia total por decisão do cirurgião assistente.

 Comentários:

 

Trata-se de um trabalho muito interessante, envolvendo (mais) um método endoscópico minimamente invasivo para o tratamento de fístula pós bariátrica com grande potencial para se sedimentar como uma excelente opção, caso esses resultados sejam reproduzidos posteriormente. Os autores buscaram 20 estudos publicados como relato de caso, entre 2006 e 2018 envolvendo 23 pacientes tratados com este modelo de dispositivo, para fístulas benignas (não apenas bariátrica) com resolução da fístula em 18 casos (78,26%) o que nos sugere que estes resultados podem ser reproduzidos.

Todas as complicações e casos de falha terapêutica foram em casos agudos e precoces salvo por um caso mais complexo de paciente com fistula gastropleural em paciente sem a cavidade drenada. É possível que a oclusão aguda com estes dispositivos, em uma cavidade abdominal não drenada mantenha o processo infecioso em atividade e não permita a cicatrização da fístula.

É importante ressaltar que todos os casos de fístula aguda (até 7 dias), embora com pequena casuística (n=3), apresentaram falha terapêutica e houve alargamento do diâmetro da fístula com o dispositivo. Todos foram tratados com sucesso no estudo utilizando próteses metálicas tradicionais porém é importante considerar a possibilidade de agravamento da fístula nestes casos.

As próteses metálicas autoexpansíveis tem resultados expressivos no tratamento de fistulas agudas e precoces embora haja grande debate sobre o modelo a ser utilizado (totalmente ou parcialmente recobertas, esofágicas off-label ou bariátricas). Técnicas de drenagem interna com pigtails, septotomia + dilatação e terapia a vácuo possuem melhor eficácia em fistulas crônicas no entanto em todos casos há necessidade de re-intervenção.

Neste estudo, o amplatzer teve desempenho excelente nos casos tardios/crônicos onde não houve complicação, re-intervenção e obteve sucesso de 100%, justamente no grupo onde os outros métodos encontram mais dificuldades seja por menor eficácia (próteses) seja pela necessidade de re-intervenções (outros métodos).

A prótese em questão já está disponível no Brasil, sendo utilizada em cardiologia, o que facilita seu emprego e realização do novos estudos para comprovar sua eficácia.

Flávio Ferreira
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Membro Titular da Sociedade Brasileira de Endoscopia Digestiva (SOBED);
Especialização em Endoscopia Digestiva na Universidade de São Paulo (USP);
Mestrado em Cirurgia na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE);
Médico endoscopista da NeoGastro (PE);
Coordenador do Serviço de Endoscopia Digestiva do Hospital Otávio de Freitas (PE)


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1 Comentário

Diogo Turiani Hourneaux De Moura 09/04/2019 - 3:44 pm

Excelente resumo do artigo Flávio!Parabéns!
Aproveito o espaço para resumir nossa opinião sobre o estudo.
Em poucas palavras acredito que para fístulas agudas (acute/early) as terapias convencionais devem ser utilizadas. Já para fistulas crônicas (late/chronic) refrátarias as terapias tradicionais, o cardiac septal occluder parece ser uma excelente opção. Obviamente são necessários mais estudos para comprovarmos a eficácia e a segurança do mesmo.
Grande abraço,
Diogo Moura

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