Demografia Médica no Brasil 2023 – Uma leitura sobre a Endoscopia Digestiva

Publicado em fevereiro de 2023, a pesquisa Demografia Médica no Brasil (DMB), é uma referência sobre a profissão e suas especialidades no país. Iniciada em 2011 no Departamento de Medicina Preventiva da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), o estudo encontra-se na sua sexta edição, e é fruto do acordo de cooperação técnica celebrado entre a Associação Médica Brasileira (AMB) e a FMUSP.

No relatório, é apresentada uma análise demográfica detalhada e atualizada, discriminando também aspectos relevantes das especialidades e residências médicas.

Com isso, é possível extrair informações relevantes sobre quantos e quais médicos estão disponíveis no Brasil para atuar no sistema de saúde, quais as regiões mais ou menos assistidas, o que mudou na formação e no trabalho médico no país, entre outras informações.

Aqui estão alguns dos principais pontos:

  • Em pouco mais de duas décadas, desde 2000, quando o Brasil contava com 219.896 médicos, o número de profissionais mais do que dobrou. No mesmo período, a população geral do país cresceu cerca de 27%

  • A estimativa é que o Brasil chegue em 2025 com taxa de 2,91 médicos por 1.000 habitantes, quase três vezes maior que a taxa de 1980 (0,94 médico por 1.000 habitantes), e acima da taxa de 2015, que era de 2 médicos por 1.000 habitantes.
  • A distribuição de médicos é desigual em todo o país, com a região Sudeste tendo a maior concentração de médicos (3,39 por 1.000 habitantes), enquanto a região Norte tem a menor (1,45 por 1.000 habitantes).

  • Mulheres serão a maioria dos médicos em 2024 (50,2%)

Em relação à Endoscopia Digestiva:

  • A especialidade de Endoscopia conta com 1.253 médicos do sexo feminino (31,7%) e 2.703 do sexo masculino (68,3%), resultando em uma razão de 2,2 homens para cada mulher na especialidade.
  • Houve um aumento de 2374 especialista em 2012 para 4365 em 2023 (aumento de 83,86%).
  • A média de idade do especialista é 50,5 +/- 12 anos

    • < 35 anos: 400 (10,1%)
    • >55 anos: 1477 (37,3%)

  • Existem 142 residentes em Endoscopia (67 são R1), representando 0,3% do total de residentes do país.

  • Os estados com maior número de especialistas em Endoscopia são:
Unidade da Federação Número de Especialistas Percentual do Total (%)
Brasil 4365 100%
São Paulo 1181 27.05%
Minas Gerais 452 10.36%
Rio de Janeiro 383 8.77%
Paraná 333 7.63%
Rio Grande do Sul 319 7.31%
Bahia 230 5.27%
Santa Catarina 202 4.63%
Ceará 170 3.89%
Goiás 138 3.16%
Distrito Federal 128 2.93%
Pernambuco 124 2.84%
Espírito Santo 107 2.45%
Paraíba 86 1.97%
Pará 72 1.65%
Mato Grosso 65 1.49%
Mato Grosso do Sul 57 1.31%
Maranhão 49 1.12%
Alagoas 47 1.08%
Rio Grande do Norte 44 1.01%
Amazonas 40 0.92%
Piauí 37 0.85%
Sergipe 37 0.85%
Tocantins 26 0.60%
Rondônia 24 0.55%
Amapá 7 0.16%
Roraima 4 0.09%
Acre 3 0.07%

  • Entre os especialistas em Gastroenterologia (5997), 2.128 (35,48%) também são especialistas em Endoscopia.
  • Outras áreas com mais de uma especialização, incluindo Endoscopia:

Quais foram os dados que mais te surpreenderam?

Referências

  1. SCHEFFER, M. et al. Demografia Médica no Brasil 2023. São Paulo, SP: FMUSP, AMB, 2023. 344 p. ISBN: 978-65-00-60986-8.
  2. Documento completo: https://amb.org.br/wp-content/uploads/2023/02/DemografiaMedica2023_8fev-1.pdf

Como citar este artigo

Medrado B. Demografia Médica no Brasil 2023 – Uma leitura sobre a Endoscopia Digestiva. Endoscopia Terapeutica 2023 vol 2. Disponível em: http://endoscopiaterapeutica.net/pt/assuntosgerais/demografia-medica-no-brasil-2023-uma-leitura-sobre-a-endoscopia-digestiva




Onde coletar as biópsias gástricas para o estadiamento OLGA?

O protocolo OLGA para estadiamento da atrofia gástrica ficou muito popular no nosso meio. Cada vez mais os endoscopistas estão recebendo pedidos dos gastroenterologistas solicitando coleta de biópsias conforme o protocolo OLGA.

Mas existe uma dúvida persistente: de que locais devemos coletar essas biópsias?

O Sistema Sidney

Primeiramente, devemos revisitar um artigo importantíssimo acerca do assunto: O update do sistema Sydney, escrito pelo Dr. Michael Dixon, pelo famoso Dr. Pelayo Correa além de outros autores (Dixon M, 1996). Destaco esse trecho:

Recommendations: For optimal assessment, five biopsy specimens are taken, two from the antrum within 2 to 3 cm from the pylorus, one from the distal lesser curvature, and the other from the distal greater curvature, two from the corpus about 8 cm from the cardia (one from the lesser and the other from the greater curvature), and one from the incisura angularis (Fig. 2). Samples from antrum, corpus, and incisura angularis should be separately identifiable.”

Sistema OLGA

Em abril de 2005, um grupo internacional de gastroenterologistas e patologistas (Operative Link for Gastritis Assessment [OLGA]) reuniu-se em Parma, Itália, com o objetivo de reavaliar criticamente as diretrizes atualizadas do Sistema de Sydney e determinar se seria possível adicionar alguma espécie de estadiamento da gastrite crônica.

Como o risco do CaG esta relacionado a extensão da atrofia gástrica, um sistema que envolvesse o status da atrofia poderia fornecer informações importantes para o prognostico e seguimento desses pacientes. Nasce então o sistema OLGA.

Nesse artigo, os autores escrevem o seguinte paragrafo:

“…the Sydney Systems took into account the topographical distribution of the elementary lesions in the different gastric compartments and recommended that multiple endoscopic biopsy samples be taken from predefined sites of the stomach [8]. Five main sites were considered necessary: (1) greater and lesser curvature of the distal antrum (mucus-secreting mucosa), (2) greater and lesser curvature of the proximal corpus (oxyntic mucosa), and (3) lesser curvature at the incisura angularis, where the earliest atrophic-metaplastic changes tend to occur.” [Rugge M. Hum Pathol. 2005]

Ou seja, eles se baseiam nas recomendações do sistema Sidney e recomendam biópsias da pequena e grande curvatura tanto de corpo quanto de antro, além da incisura.

Em 2007 surge uma nova publicação do protocolo OLGA

“According to the Sydney system, the biopsy sampling protocol required that no less than five biopsy samples were obtained: two from the antral mucosa; one from the mucosa of the angularis incisura; two from the oxyntic area. Biopsy samples were submitted to the pathology department in different vials labelled according to the site of the sample.” [Rugge M. Gut. 2007]

Notem que aqui ele já não fala nada a respeito da parede gástrica, se pequena curvatura, grande, anterior ou posterior.

Um ano depois, em 2008, sai a seguinte publicação

“The OLGA proposal (basically consistent with the Houston-updated biopsy protocol) consists in recommending (at least) five biopsy samples from: (1) the greater and lesser curvatures of the distal antrum (A1–A2 = mucussecreting mucosa); (2) the lesser curvature at the incisura angularis (A3), where the earliest atrophic–metaplastic changes mostly occur; and (3) the anterior and posterior walls of the proximal corpus (C1–C2 = oxyntic mucosa) (Fig. 2)”. Rugge M. Dig Liver Dis. 2008.

Aqui ele já muda para parede anterior e posterior de corpo, porém cita a mesma referência de Dixon M et al, do updated Sydney System de 1994, que recomendava PC e GC 🧐. Esse novo artigo do Dr. Massimo Rugge tem ilustrações bonitinhas e que foram bastante reproduzidas nas aulas de congressos, publicações, etc. Talvez um dos motivos da maioria das pessoas entenderem que o local correto é a parede anterior e posterior de corpo.

Teria sido um erro da publicação?

A princípio parece que não, pois em publicações posteriores, Massimo Rugge e colaboradores reiteram a coleta na parede anterior e posterior de corpo, mas em outras publicações voltam para pequena e grande curvatura e em algumas citam apenas corpo, antro e incisura, sem especificar a parede. Explicado então porque existe tanta confusão a esse respeito.

MAPS II

Mais recentemente, a ESGE, em conjunto com outras sociedades europeias (European Helicobacter and Microbiota Study Group (EHMSG), European Society of Pathology (ESP), and Sociedade Portuguesa de Endoscopia Digestiva (SPED) publicaram o consenso MAPS (Management of epithelial precancerous conditions and lesions in the stomach). Nesse consenso a preferência é pela pequena e grande curvatura.

“Biopsies of at least two topographic sites (from both the antrum and the corpus, at the lesser and greater curvature of each) should be taken and clearly labelled in two separate vials.”

Nesse consenso a preferência é pela pequena e grande curvatura, mas sumiu a incisura angularis! 😫

Incisura angularis: to biopsy or not biopsy?

Mais biópsias permitirão um melhor estadiamento. No entanto, na prática clínica, mais biópsias significam mais tempo e mais custos.

O racional para a biópsia da incisura vem das recomendações do sistema Sydney atualizado. O sistema Sydney original recomendava duas biópsias de antro e duas de corpo. Já o sistema Sydney atualizado recomenda incluir a incisura, visto ser o local onde mais precocemente ocorre as alterações atróficas e metaplásicas “….lesser curvature at the incisura angularis, where the earliest atrophic-metaplastic changes tend to occur”. No entanto, essa recomendação foi baseada em conceitos, e não havia evidências cientificas sugerindo um benefício clínico.

Estudos sobre o benefício da amostragem de biópsia da incisura:

  • Um grande estudo com mais de 400 mil biópsias mostrou que a aderência ao sistema original de Sydney proporcionou a mais alta eficácia diagnóstica para infecção por H. pylori e IM. A inclusão de uma biópsia da incisura resultou em ganhos diagnósticos marginais a um custo adicional. [Lash JG, 2013]
  • Dois estudos europeu mostraram que sem a biópsia da incisura, 14/1048 pacientes mudariam a categoria de alto risco (III/IV) para baixo risco (I/II) do estadiamento OLGA. [Isajevs S, 2014 e Varbanova M, 2016]
  • Isso se traduziu em um número necessário para tratar de 75 – 80, o que significa que um em cada 75 – 80 pacientes não seria corretamente incluído em um grupo de alto risco se a biópsia da incisura não fosse realizada.
  • Outro estudo europeu, incluindo população de alto risco (parentes de primeiro grau de pacientes com câncer gástrico de início precoce) avaliou o sistema OLGA sem a biópsia da incisura e demonstrou um downgrade geral de 15% e 30% em comparação com o sistema OLGA original. No entanto, para pacientes em estágios de alto risco (OLGA III/IV), o rebaixamento foi menor (apenas 5% dos pacientes). [Marcos-Pinto R, 2012]
  • Um estudo coreano (Kim YI, 2017) incluindo 247 pcts de alto risco testou vários protocolos de biópsias e mostrou que incluir a incisura angularis e obter biópsias da pequena e grande curvaturas de corpo (PC + GC) ao invés da parede anterior e posterior (AP) identificavam mais pacientes no grupo de alto risco de OLGA e OLGIM

    • Corpo (PC + GC), incisura, antro (PC + GC) = 64,4%
    • Corpo (PC + GC) + antro (PC + GC) = 59,5% (p= .031)
    • Corpo (AP), incisura, antro (PC + GC) = 55,5% (P< .001)
    • Corpo (AP) + antro (PC + GC) = 47,8% (P< .001)

Em resumo, existe um pequeno rendimento adicional de uma biópsia da incisura o qual precisa ser equilibrado em relação aos custos e tempo, tempo e trabalho. O consenso MAPS II recomenda um mínimo de duas biópsias do antro e duas biópsias do corpo, observando que pode ser considerado adicionar uma biópsia da incisura para maximizar a detecção de pacientes com condições pré-neoplásicas, especialmente quando a cromoendoscopia não está disponível.

Onde colher então?

Minha preferência é pela pequena e grande curvatura. Além dos motivos já expostos, devemos lembrar da linha F, que é a linha de progressão da atrofia no estômago. Segundo a classificação de Kimura, a linha F se estende pela pequena curvatura do corpo em direção à cárdia. Ou seja: maior chance de pegar uma amostra com sinais de atrofia se incluirmos a PC nas amostras.

Saiba mais

Classificação de Kimura-Takemoto

Explicação sobre estadiamento OLGA

OLGA, OLGIM e Kimura

Laudando gastrite atrófica

Referências

  1. Dixon MF, Genta RM, Yardley JH, Correa P. Classification and grading of gastritis. The updated Sydney System. International Workshop on the Histopathology of Gastritis, Houston 1994. Am J Surg Pathol. 1996 Oct;20(10):1161-81. doi: 10.1097/00000478-199610000-00001. PMID: 8827022.
  2. Rugge M, Genta RM. Staging and grading of chronic gastritis. Hum Pathol. 2005 Mar;36(3):228-33. doi: 10.1016/j.humpath.2004.12.008. PMID: 15791566.
  3. Rugge M, Meggio A, Pennelli G, Piscioli F, Giacomelli L, De Pretis G, Graham DY. Gastritis staging in clinical practice: the OLGA staging system. Gut. 2007 May;56(5):631-6. doi: 10.1136/gut.2006.106666. Epub 2006 Dec 1. PMID: 17142647; PMCID: PMC1942143.
  4. Rugge M, Correa P, Di Mario F, El-Omar E, Fiocca R, Geboes K, Genta RM, Graham DY, Hattori T, Malfertheiner P, Nakajima S, Sipponen P, Sung J, Weinstein W, Vieth M. OLGA staging for gastritis: a tutorial. Dig Liver Dis. 2008 Aug;40(8):650-8. doi: 10.1016/j.dld.2008.02.030. PMID: 18424244.
  5. Pimentel-Nunes P, Libânio D, Marcos-Pinto R, Areia M, Leja M, Esposito G, Garrido M, Kikuste I, Megraud F, Matysiak-Budnik T, Annibale B, Dumonceau JM, Barros R, Fléjou JF, Carneiro F, van Hooft JE, Kuipers EJ, Dinis-Ribeiro M. Management of epithelial precancerous conditions and lesions in the stomach (MAPS II): guideline update 2019. Endoscopy. 2019 Apr;51(4):365-388. doi: 10.1055/a-0859-1883. Epub 2019 Mar 6. PMID: 30841008.
  6. Misiewicz JJ. The Sydney System: a new classification of gastritis. Introduction. J Gastroenterol Hepatol 1991; 6: 207 – 208
  7. Isajevs S, Liepniece-Karele I, Janciauskas D et al. The effect of incisura angularis biopsy sampling on the assessment of gastritis stage. Eur J Gastroenterol Hepatol 2014; 26: 510 – 513
  8. Lash JG, Genta RM. Adherence to the Sydney System guidelines increases the detection of Helicobacter gastritis and intestinal metaplasia in 400738 sets of gastric biopsies. Aliment Pharmacol Ther 2013; 38: 424 – 431
  9. Varbanova M, Wex T, Jechorek D et al. Impact of the angulus biopsy for the detection of gastric preneoplastic conditions and gastric cancer risk assessment. J Clin Pathol 2016; 69: 19 – 25
  10. Marcos-Pinto R, Carneiro F, Dinis-Ribeiro M et al. First-degree relatives of patients with early-onset gastric carcinoma show even at young ages a high prevalence of advanced OLGA/OLGIM stages and dysplasia. Aliment Pharmacol Ther 2012; 35: 1451 – 1459
  11. Kim YI, Kook MC, Cho SJ, Lee JY, Kim CG, Joo J, Choi IJ. Effect of biopsy site on detection of gastric cancer high-risk groups by OLGA and OLGIM stages. Helicobacter. 2017 Dec;22(6). doi: 10.1111/hel.12442. Epub 2017 Sep 22. PMID: 28940945.

Como citar este artigo

Martins BC. Onde coletar as biópsias gástricas para o estadiamento OLGA? Endoscopia Terapeutica 2023, vol 2. Disponível em: http://endoscopiaterapeutica.net/pt/assuntosgerais/onde-coletar-as-biopsias-gastricas-para-o-estadiamento-olga




Nova Classificação de Eventos Adversos em Endoscopia Digestiva: AGREE

Com a expansão das técnicas endoscópicas diagnosticas e terapêuticas faz-se necessário métodos uniformes e mundialmente reconhecidos para avaliação dos eventos adversos relacionados aos procedimentos endoscópicos. Essa padronização permite avaliação da qualidade de serviço, de procedimento, bem como, para estudos científicos (coorte, ensaios clínicos randomizados e metanálises).

Na literatura atual há uma escassez de ferramentas de definição para tais eventos. Para intervenções cirúrgicas existe a classificação de Clavien-Dindo (CD)1, que, por vezes, sua utilização foi extrapolada para procedimentos endoscópicos. A classificação de CD é inadequada quando aplicada para procedimentos endoscópicos, pois existem diferenças quanto a origem dos pacientes: a maioria são ambulatoriais nos procedimentos endoscópicos comparado ao perfil internado para as intervenções cirúrgicas.

Com o objetivo de padronizar o registro de eventos adversos em endoscopia digestiva, foi proposta a nova classificação chamada AGREE (Classification for Adverse events in GastRointEstinal Endoscopy)2.

Esta classificação estratifica os pacientes desde os que não apresentam eventos adversos em 30 dias até os que evoluem para óbito por complicações relacionadas ao procedimento endoscópico (vide tabela 1). A definição de evento adverso nesta nova classificação foi similar à classificação de CD, que define evento adverso como um desfecho negativo para o paciente que impede a conclusão de um procedimento planejado ou causa qualquer desvio do curso pós-procedimento padrão, independente da correlação direta. Por exemplo, paciente vítima de acidente de bicicleta que foi submetido a colonoscopia 3 dias antes sob sedação consciente pode parecer não relacionado ao procedimento, mas ainda deve ser registrado como evento adverso. Vale ressaltar que, assim como é realizado na classificação de CD, caso o paciente apresente múltiplos eventos adversos relacionados, apenas o mais grave deve ser considerado.

Graduação Definição
Ausência de Evento Adverso Contato telefônico com profissional, ambulatório ou serviço de endoscopia ou observação estendida após procedimento < 3h, sem qualquer necessidade de intervenção.
Grau I

Evento adverso sem necessidade de intervenção endoscópica, radiológica ou cirúrgica.
– Comparecimento a emergência,
– Admissão hospitalar <24h,
– Uso de drogas sintomáticas ou eletrólitos,
– Testes diagnósticos laboratoriais ou radiológicos.

Grau II Evento adverso com necessidade de uso de outras medicações (antibióticos, antitrombóticos), necessidade de transfusão sanguínea ou admissão hospitalar por mais de 24h.
Grau III III a – necessidade de intervenção endoscópica ou radiológica
III b – necessidade de intervenção cirúrgica
Grau IV Necessidade de cuidados intensivos
IV a- disfunção orgânica simples (incluindo dialise)
IV b – disfunção múltipla de órgãos
Grau V Óbito
Tabela 1: Classificação de AGREE

Para a validação desta nova ferramenta de registro de eventos adversos endoscópicos, foram cumpridas três etapas. Na primeira etapa, foram analisadas as diferentes percepções dos eventos adversos sob a ótica de endoscopistas experientes, enfermeiras e pacientes, sendo selecionados casos fictícios e analisados para graduação dos eventos na nova classificação AGREE. Como esperado, houve algumas subjetividades principalmente na análise do nexo causal do evento adverso e o procedimento endoscópico. Além disso, endoscopistas experientes tinham uma percepção menos grave sobre a necessidade de uma nova intervenção para tratamento de um evento adverso do que enfermeiras e pacientes. Na segunda etapa da validação, foram coletados dados retrospectivos de eventos adversos registrados num serviço acadêmico de Amsterdam no período de janeiro de 2016 a novembro de 2020. Foram aplicadas a classificação AGREE em todos os 436 eventos adversos. Na terceira e última etapa de validação da classificação AGREE, foram aplicados questionários para especialistas de 30 países e 5 continentes diferentes. Um dado importante é que cerca de metade dos endoscopistas experientes dos diferentes centros do mundo não utilizavam nenhum banco de dados para reportar os seus eventos adversos.

É importante ressaltar algumas limitações dessa nova classificação as quais podemos citar a ausência de definição de leve, moderada ou grave como é padronizada na classificação da ASGE3, além de não haver uma graduação de gravidade relacionada a longa permanência hospitalar na nova classificação AGREE. Comparando as duas classificações, os efeitos adversos severos correspondem graus II a IVb da classificação de AGREE. Outra ressalva deve-se a variedade de políticas aplicadas no manejo dos eventos adversos nos diversos serviços dos diversos países, dando abertura para subjetividade na avaliação de desvio do tratamento pós-procedimento padrão.

Entretanto, esta nova classificação AGREE foi considerada simples, reprodutível, aplicável e lógica pela maioria dos endoscopistas especialistas, tornando-se uma importante ferramenta no registro padronizado dos eventos adversos, gerando estudos através do banco de dados e contribuindo com a melhoria das práticas endoscópicas em todo mundo.

Em suma, o AGREE permite uma padronização exequível em todo o mundo para avaliar qualidade de serviço de endoscopia, criticidade de um novo procedimento e fomento de estudos científicos observacionais, ensaios clínicos e metanálises.

Referências

  1. Dindo D, Demartines N, Clavien PA. Classification of surgical complications: a new proposal with evaluation in a cohort of 6336 patients and results of a survey. Ann Surg. 2004 Aug;240(2):205–13.
  2. Nass KJ, Zwager LW, van der Vlugt M, Dekker E, Bossuyt PMM, Ravindran S, et al. Novel classification for adverse events in GI endoscopy: the AGREE classification. Gastrointest Endosc. 2022 Jun;95(6):1078-1085.e8.
  3. Ben-Menachem T, Decker GA, Early DS, Evans J, Fanelli RD, Fisher DA, et al. Adverse events of upper GI endoscopy. Gastrointest Endosc. 2012 Oct;76(4):707–18.

Como citar este artigo

Kum AST Nova Classificação de Eventos Adversos em Endoscopia Digestiva: AGREE Endoscopia Terapeutica 2023, vol 2. Disponível em: endoscopiaterapeutica.net/pt/nova-classificacao-de-eventos-adversos-em-endoscopia-digestiva-agree/




Processo de aprendizado – Parte 2: como aprender melhor e mais rápido?

Não seria bacana aprender qualquer coisa de maneira mais eficaz e mais rápida? Sem dúvida nossa vida seria muito mais fácil! Existem vários livros e técnicas sobre esse assunto.

Na primeira parte dessa série, explicamos sobre o processo de aprendizado e a curva de esquecimento. Se você não leu a primeira parte, clique aqui nesse post.

Nesse segundo artigo, estou compartilhando algumas técnicas bacanas sobre como melhorar a memória e o aprendizado.  

O acrônimo para decorar a fim de aprender mais rápido é F.A.S.T.

F= FORGET

Para aprender melhor você precisa esquecer 2 coisas:

  1. Esqueça qualquer coisa não urgente que possa desviar sua atenção. Apesar de tentarmos fazer várias coisas ao mesmo tempo, nosso cérebro não foi desenhado para cumprir múltiplas tarefas simultâneas. Desligue o celular e concentre-se no que está estudando.
  2. Esqueça suas limitações. Se começar o aprendizado repetindo ideias como: “isso é muito difícil”, “nunca vou aprender isso”, “sou ruim com números/pessoas/pólipos/drogas/etc” muito dificilmente você aprenderá alguma coisa sobre o assunto em questão. Essa é uma dica muito poderosa.

A sigla mnemônica em inglês para esse conceito é ANT (authomatic negative thoghts). Portanto, para um melhor aprendizado você precisa acabar com esses pensamento negativos, ou seja: KILL THE ANTs! Significa eliminar os pensamentos negativos que tiram sua concentração e travam seu aprendizado. Isso vale não apenas para memória de conceitos mas também para o aprendizado técnico de endoscopia, colonoscopia, ultrassom endoscópico, etc.

Kill the ANTs!!!

A= ACTIVE

Seja ativo! Tome atitude! O aprendizado eficaz não pode ser uma atividade passiva. Isso não funciona e sabemos disso há décadas!

Lembre-se do esquema de aula na escola: os alunos entediados na sua carteira enquanto o professor falava de algum assunto que não desperta interesse. Resultado: aprendizado zero!

Assim ninguém aprende

O cérebro também aprende através da criação. Fazer perguntas, imaginar situações, se envolver no assunto, tomar notas, fazer desenhos, etc. Quanto mais ativo –> maior o aprendizado.

Por último: pratique atividade física! Existem diversos estudo científicos relacionando atividade física com melhora da capacidade de aprendizado. O que é bom para o coração, também é bom para o seu cérebro.

“Um grande estudo da Universidade de Munique, por exemplo, acompanhou 4.000 idosos durante dois anos. Aqueles que raramente faziam atividades físicas tiveram mais do que o dobro de chance de sofrer algum comprometimento cognitivo se comparados aos que faziam jardinagem, natação ou ciclismo algumas vezes por semana.” – (extrato de artigo da revista galileu – Link – original da revista new scientist por Christie Aschwanden)

Fonte: revista galileu. Renato Faccini. https://revistagalileu.globo.com/Revista/noticia/2014/02/quer-ser-mais-inteligente-corra.html

S= STATE

Seu estado emocional pode ajudar ou atrapalhar o seu aprendizado. São as emoções que você está sentindo naquele momento.

Muito mais propício para o aprendizado se você estiver empolgado, curioso ou fascinado pelo assunto. Se cansado, estressado ou se estiver pensando na praia, é melhor você não perder seu tempo e passar seu protetor solar.

INFORMAÇÃO + EMOÇÕES = MEMÓRIA DE LONGO PRAZO

T= TEACH

Todos já ouviram a máxima: “see one, do one, teach one” Durante seu estudo, aprenda como se fosse ensinar alguém. Você irá prestar mais atenção. Irá tomar notas. Querer entender o porquê. Vai repetir o conteúdo até ter certeza que a informação que você irá passar é a mais correta possível. Resultado –> melhor aprendizado pessoal!  

Duas outras dicas que eu gosto bastante!!!

1. DURMA BEM

Com uma mente tubulenta não conseguimos nos concentrar, nem tomar decisões acertadas e nem aprender nada. Uma boa noite de sono ajudará você a se concentrar, pensar com mais clareza e tomar melhores decisões. Também é essencial para a sua memória, porque durante o sono é quando você consolida a memória de curto a longo prazo.

Técnicas de meditação também funcionam para o mesmo propósito.

 

2. FAÇA PARTE DE UM GRUPO POSITIVO DE PESSOAS

As pessoas com quem você convive é quem você acabe se tornando. Em um grupo positivo de pessoas, uma pessoa acaba estimulando a outra com novidades, curiosidades, dúvidas, etc. Portanto, verifique se as pessoas com quem você está convivendo são boas para sua mente e sua vida. De alguma forma, isso é exatamente o que fazemos aqui no Endoscopia Terapêutica!

Quer saber mais?




Processo de aprendizado – Parte 1: curva de esquecimento

Nosso cérebro está constantemente registrando informações temporárias: trechos de conversas ouvidas na calçada, o que a pessoa na sua frente está falando, vestindo, fazendo, etc.

Como a maioria das informações não são necessárias e não ficam se repetindo, nosso cérebro vai se desfazendo delas. A notícia ruim, é que as informações que você realmente deseja guardar (na palestra que acabou de ouvir ou no texto que acabou de ler) também vão sendo apagadas junto com as informações banais do dia a dia.

Ebbinghaus Forgetting Curve

A curva de esquecimento de Ebbinghaus representa a diminuição da capacidade do cérebro de reter uma informação ao longo do tempo. Esse conceito foi elaborado por Hermann Ebbinghaus em 1885.

  • A capacidade de memória é máxima ao final da lição.
  • No segundo dia, se você não recapitular nada do que foi aprendido, você terá perdido 50-80% do que aprendeu (triste né?).
  • No dia 7, lembramos ainda menos, e no dia 30, retemos cerca de 5% do aprendizado original

Taxa de Esquecimento

Existem vários fatores que podem afetar a taxa de esquecimento. Alguns dos quais são

  • Significado da informação: a importância que a nova informação tem para você
  • A maneira como é apresentada: técnicas de ensino, etc.
  • Fatores fisiológicos e estado emocional (curiosidade, motivação, estresse, sono, etc.)

A taxa de esquecimento (inclinação da curva) não é a mesma entre todos.

Existem desempenhos diferentes na memória dos indivíduos que podem ser explicados pelas habilidades individuais de representação mnemônica. Em outras palavras: algumas pessoas têm naturalmente uma capacidade mnemônica extraordinária, outras são bem treinadas para melhorar sua memória, e outras não estão nem aí para esse assunto (e não há problema algum com isso).

Nem todos temos capacidade de armazenamento ilimitada….
…e não há problema algum com isso

De acordo com Ebbinghaus, os indivíduos podem ser treinados para aumentar sua capacidade mnemônica. Duas técnicas que ele destaca são:

  1. Melhor representatividade mnemônica (técnicas mnemônicas como associação, visual, etc)
  2. Repetição através da recordação ativa (repetição espaçada periódica)

Desta forma, você pode alterar a forma da curva de Ebbinghaus, estudando com mais eficiência e revisando periodicamente o material estudado.

Ao reprocessar a informação, você envia um sinal poderoso ao seu cérebro para manter esses dados. Quando a mesma coisa é repetida, seu cérebro diz: “Oh – aí está de novo, é melhor eu manter isso”. E quando você é exposto às mesmas informações repetidamente, leva cada vez menos tempo para “ativar” as informações em sua memória de longo prazo e fica mais fácil recuperar as informações quando necessário.

Após revisitar o material algumas vezes a retenção do conteúdo é muito maior, e a queda da curva é mais lenta

Um exemplo prático de como revisar o material estudado pode ser benéfico:

  • dentro de 24 horas após o estudo – gaste 10 minutos revisando e você aumentará a curva para quase 100% novamente.
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  • No dia 30, seu cérebro precisará apenas de 2 a 4 minutos para fornecer o feedback “sim, eu sei disso …”

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Injeção Endoscópica de Toxina Botulínica

 Introdução 

Esta revisão visa ilustrar a técnica de injeção endoscópica de toxina botulínica, assim como mostrar seus benefícios e limitações. Iniciaremos com o conceito de acalásia, para depois ilustrar a forma correta de aplicação da técnica citada. Serão também mostrados efeitos da intervenção e preditores de sucesso em longo prazo, além de eventuais complicações.

O principal artigo para elaboração dessa revisão foi: Chan Sup Shim, Endoscopic botulinum toxin injection: Benefit and limitation, Gastrointestinal Intervention, Volume 3, Issue 1,2014, Pages 19-23. https://doi.org/10.1016/j.gii.2014.03.001. 

Acalásia 

Conceito 

É uma desordem motora esofágica que tem como principal sintoma a disfagia, ocorrendo de forma insidiosa. Caracteriza-se pela destruição ou ausência dos plexos nervosos intramurais do esôfago. Essa condição determina ausência de peristaltismo (aperistalse) no corpo do órgão, bem como o relaxamento incompleto do esfíncter inferior do esôfago (EIE) em resposta à deglutição. Consequentemente, há estase esofágica e incoordenação motora. De modo progressivo, ocorre dilatação do órgão e diminuição de sua capacidade de contração. 

Histologia 

  • Histologicamente observa-se destruição do plexo nervoso mioentérico (Auerbach). 
  • A degeneração inflamatória envolve preferencialmente os neurônios inibitórios, que liberam óxido nítrico e peptídeo vasoativo intestinal, afetando o relaxamento da musculatura lisa. 
  • Os neurônios excitatórios estão relativamente poupados. Eles liberam acetilcolina e causam contração da musculatura lisa, contribuindo para o tônus do EIE. 
  • A perda da inervação inibitória do esfíncter inferior do esôfago faz a pressão basal do EIE aumentar, de modo a impedir o relaxamento do mesmo. 
  • No corpo esofágico, a destruição do plexo nervoso resulta em aperistalse.       
Localização dos plexos nervosos na parede do trato gastrointestinal.

O tratamento usual consiste na dilatação com balão ou na miotomia do EIE. A injeção intraesfincteriana de toxina botulínica (botox) emergiu como uma alternativa à dilatação com balão, agindo através do bloqueio da liberação de acetilcolina nos terminais nervosos. 

A toxina botulínica bloqueia a liberação de acetilcolina na junção neuromuscular, diminuindo a contração muscular.

Injeção Endoscópica de Toxina Botulínica 

Técnica endoscópica de injeção de botox: 

  • Consiste na injeção de 100 UI nos quatro quadrantes do EIE (25 UI em cada quadrante), utilizando agulha de escleroterapia.
  • A injeção deve ser feita 1 cm proximal à junção escamocolunar, de forma perpendicular à parede esofágica, na camada muscular.
  • Uma nova injeção de 100 UI após 1 mês pode aumentar a eficácia2

Para aplicação de botox, é necessário diluir o mesmo com SF 0,9% e misturar suavemente, sem agitar a solução.  

Efeitos da intervenção 

Estudos demonstraram que a injeção de toxina botulínica (ITB) nos pacientes com acalásia proporciona uma melhora sintomática significativa comparativamente ao placebo.  

A aplicação de 100 UI, seguida da repetição da dose em um mês demonstrou ser mais eficiente do que aplicações únicas de 50 ou 200 UI2. Contudo, uma redução na eficácia da toxina botulínica tem sido observada no seguimento destes pacientes, provavelmente relacionada à produção de anticorpos contra a sua molécula. 

Estudos mostram que as taxas de resposta 1 mês após a administração são em média de 82% (69–90%). Aos 6 meses, a taxa de resposta clínica cai para 57% (33–77%) e, em 12 meses, para 48% (15–76%). 

Preditores de sucesso em longo prazo 

A ITB, apesar de menos invasiva que a dilatação pneumática e miotomia, ainda apresenta piores resultados a longo prazo em relação a estes métodos. Fatores preditores de melhor resposta à toxina botulínica incluem: 

  • Acalásia vigorosa (tipo III); 
  • Pacientes com pressão do esfíncter esofágico inferior não excedendo mais de 50% do limite superior da normalidade, em pacientes sem acalasia vigorosa 
  • Idade maior que 50/55 anos, sendo a taxa de resposta nesse grupo etário próximo ao dobro da observada na população mais jovem e ainda mais evidente na acalásia clássica; 
  • Forma do tratamento, com reaplicação em 4 semanas. 

Outros fatores como sexo, duração da doença, características radiográficas basais e gravidade dos sintomas iniciais não demonstraram ser preditores de resposta ao tratamento. 

Complicações 

As complicações da administração da toxina botulínica incluem principalmente a dor torácica transitória e azia, sendo reportados casos isolados de bloqueio cardíaco, retenção urinária e pneumotórax. 

Benefícios e limitações 

A ITB, apesar de apresentar menor eficácia terapêutica que os demais métodos, é comumente utilizada como terapia inicial pela sua facilidade técnica e baixa taxa de complicações, sendo preferencialmente reservada para pacientes com comorbidades importantes, em espera para tratamento cirúrgico ou que se recusam outros métodos de tratamento. Destaca-se, porém, o aumento da taxa de perfuração esofágica quando o paciente é submetido, posteriormente, à dilatação pneumática. 

Após a aplicação da toxina botulínica, os pacientes com acalásia devem ser monitorados regularmente, pesquisando possíveis complicações, como dilatação esofágica maciça e carcinoma esofágico.  

Referências

  1. Chan Sup Shim, Endoscopic botulinum toxin injection: Benefit and limitation, Gastrointestinal Intervention, Volume 3, Issue 1,2014, Pages 19-23. https://doi.org/10.1016/j.gii.2014.03.001
  2. V. Annese, G. Bassotti, G. Coccia, M. Dinelli, V. D’Onofrio, G. Gatto, et al. A multicentre randomised study of intrasphincteric botulinum toxin in patients with oesophageal achalasia. GISMAD Achalasia Study Group, Gut, 46 (2000), pp. 597-600.

Como citar este artigo

Passos HL, Bernardes FV, Martins BC. Injeção Endoscópica de Toxina Botulínica. Endoscopia Terapeutica 2023, vol 1. Disponivel em: http://endoscopiaterapeutica.net/pt/injecao-endoscopica-de-toxina-botulinica/




Cold EMR – Mucosectomia à frio

As técnicas de ressecção endoscópica com uso de corrente elétrica estão associadas com eventos adversos como por exemplo a síndrome pós-polipectomia (por queimadura profunda da parede do cólon), e também com perfuração e sangramento tardio pela possibilidade de injúria mais profunda dos vasos da submucosa.

Diante do exposto, tem crescido no uso respaldado por diversos estudos na literatura das técnicas de ressecção sem uso do cautério, ou seja as técnicas à frio, sendo referenciado nos últimos anos como a “cold revolution”.

A principal indicação da polipectomia à frio é para as lesões < 10 mm, sem suspeita de invasão profunda, por possibilitar menores taxas de recidiva quando comparada com a ressecção com pinça, e bem como também associada com menores taxas de sangramento tardio, e síndrome pós-polipectomia quando comparado com a ressecção com alça diatérmica.

Posteriormente, diversos estudos recentes vem demostrando a eficácia e segurança da mucosectomia à frio (Cold EMR) para lesões > 20 mm, sem suspeita de invasão submucosa, sendo portanto uma opção para as LSTs granulares homogêneas e para as lesões sésseis serrilhadas sem displasia, como bem demonstrado por Breno Bandeira de Mello e cols em metanálise recente.1

A mucosectomia à frio pressupõe a injeção submucosa associada à ressecção fatiada com alça preferencialmente dedicada, que são as alças com fio de corte mais fino (£ 0,3 cm, mais rígidas, com abertura de 9 a 10 mm, e com cobertura rígida do cateter. Hoje em dia já existem diversas no mercado disponíveis. A alça utilizada nesse vídeo foi a Exacto (Steris)

Outras vantagens inerentes à mucosectomia à frio são:

  • Mais fácil ver os limites da lesão
  • Expansão da submucosa fazendo o corte ser mais fácil
  • Prevenção de sangramento por efeito de tamponando

Abaixo vídeo demonstrando a técnica de caso de lesão séssil serrilhada sem displasia em cólon ascendente:

Referências

  1. Mello BB, Popoutchi P, Zago R, Averbach M. Análise comparativa dos resultados de ressecções de lesões sésseis serrilhadas do cólon ≥ 20 mm com e sem o emprego de energia elétrica. Revisão sistemática e metanálise. 2022

Como citar este artigo

Franco M. Cold EMR – Mucosectomia à frio. Endoscopia Terapeutica 2023, vol. 1. Disponível em: http://endoscopiaterapeutica.net/pt/assuntosgerais/cold-emr-mucosectomia-a-frio/




Litotripsia Intraductal na Colangiopancreatografia Retrógrada Endoscópica

Com o advento da colangioscopia digital de operador único em 2015 (SpyGlass™), superando a dificuldade técnica dos antigos aparelhos “mother-baby” que dependiam de dois operadores, diversas foram as utilidades desta nova tecnologia na colangiopancreatografia retrógrada endoscópica (CPRE): avaliação intraductal de estenoses indeterminadas das vias biliares, direcionar a drenagem de segmentos acometidos por estenose, litotripsia intraductal de coledocolitíase e hepatolitíase.

Os cálculos complexos possuem preditores para falha de remoção das vias biliares pelo método convencional, sendo: 

  • cálculos maiores que 1,5 cm;
  • cálculos múltiplos (mais de 10); 
  • cálculos com formatos em barril e longo;
  • cálculos intrahepáticos; 
  • anormalidades de colédoco distal (oblíquos, estreitos, angulados);
  • papila duodenal peridiverticular;
  • desproporção de tamanho do cálculo vs colédoco; 
  • associados a estenoses benignas e malignas;
  • alteração pós-cirúrgica do trato gastrointestinal alto

Seguindo os guidelines europeu e americano da ESGE e ASGE, após a falha de remoção convencional na CPRE, opta-se por dilatação balonada de grandes proporções (DBGP) da papila, que é definida de 12 a 20 mm, limitando-se até o diâmetro do colédoco distal, precedida de papilotomia prévia ou tática (saiba mais nesse post). Havendo a falha de extração após DBGP, os guidelines sugerem a litotripsia, que podem ser:

  • mecânica através do basket reforçado “through the scope” (convencional) ou “out the scope” (também conhecido como litotriptor de emergência);
  • intraductal com pulso eletro-hidráulico ou a laser através do uso de colangioscópio.

Caso Clínico

No vídeo a seguir, temos o caso de uma mulher jovem com coledocolitíase de 10 mm, com duas tentativas prévias de CPRE sem sucesso na remoção de cálculo devido a desproporção cálculo vs colédoco distal. Mesmo com papilotomia ampla prévia e dilatação balonada CRE até 18 mm, sem perda de cintura radiológica por fibrose de esfíncter, houve falha na apreensão do cálculo com basket trapezoid devido a impactação do cálculo em via biliar.

Neste caso, a abordagem cirúrgica seria difícil especificamente devido ao colédoco pouco dilatado, sendo optado por intervenção com colangioscopia (Spyglass) + litotripsia endoscópica a laser intraductal. Como resultado, a paciente evoluiu com alta no primeiro pós-operatório com resolução da retirada do cálculo, assintomática, podendo ser submetida a colecistectomia em seguida.

Discussão

Um estudo multicêntrico randomizado publicado na Endoscopy de Angsuwatcharakon et al. em 2019 comparou esses dois métodos, que permitia o crossover entre a litotripsia mecânica com basket de 30 mm (LithoCrush V, Olympus) e a litotripsia a laser (SpyGlass DS, Boston Scientific, com Dornier Medilas H Solvo, Wessling), chegando aos seguintes resultados:

  • 476 pacientes pós-CPRE, com 32 falhas pós-DBGP, sendo randomizados 16 em cada grupo;
  • Média do tamanho dos cálculos: 19.5 mm (5.63) no grupo laser vs 17.6 mm (3.37) no grupo litotripsia mecânica;
  • Remoção completa na primeira tentativa foi maior na litotripsia laser vs mecânica (100% vs 63%, p < 0,01);
  • Tempo de procedimento total foi menor no laser vs mecânica (83 vs. 66 min; P = 0.23);
  • Tempo de remoção foi menor no laser vs mecânica (53 vs. 39 min; P = 0.26);
  • Tempo de fluoroscopia e radiação menor no laser vs mecânica (21 vs. 11 minutes; P < 0.01 e (40 745 vs. 20989 mGycm2; P = 0.04);
  • Efeitos adversos e tempo de internação foram semelhantes entre os grupos.

As limitações do estudo estão na amostra relativamente baixa, que tange às indicações restritas da litotripsia após falha da CPRE e DBGP, bem como na avaliação de apenas a metodologia a laser, sem comparar a eletro-hidráulica, apesar da equivalência de efetividade dos dois métodos.

Embora os limites impostos pelo alto custo do dispositivo, com necessidade de expertise do uso de colangioscopia, e baixa disponibilidade desta tecnologia nos centros de endoscopia, Deprez et al. avaliou maior economia e menor custo no grupo da litotripsia intraductal devido a maior taxa de sucesso e menor número de CPREs no tratamento da coledocolitíase complexa. Salvo limitações do custo de saúde, país e moeda diferente do estudo, as justificativas de menor custo-efetividade são válidos.

Ademais, com o desenvolvimento de outras marcas de colangioscópios e a maior abrangência desta tecnologia, espera-se que esse método diagnóstico e terapêutico se popularize e se torne um novo arsenal ao endoscopista.

Referências

  1. Angsuwatcharakon P, Kulpatcharapong S, Ridtitid W, et al. Digital cholangioscopy-guided laser versus mechanical lithotripsy for large bile duct stone removal after failed papillary large-balloon dilation: a randomized study. Endoscopy. 2019 Nov;51(11):1066-1073. doi: 10.1055/a-0848-8373. Epub 2019 Feb 20. PMID: 30786315.
  2. ASGE Standards of Practice Committee; Buxbaum JL, Abbas Fehmi SM, Sultan S, et al. ASGE guideline on the role of endoscopy in the evaluation and management of choledocholithiasis. Gastrointest Endosc. 2019 Jun;89(6):1075-1105.e15. doi: 10.1016/j.gie.2018.10.001. Epub 2019 Apr 9. PMID: 30979521; PMCID: PMC8594622.
  3. Manes G, Paspatis G, Aabakken L, et al. Endoscopic management of common bile duct stones: European Society of Gastrointestinal Endoscopy (ESGE) guideline. Endoscopy. 2019 May;51(5):472-491. doi: 10.1055/a-0862-0346. Epub 2019 Apr 3. PMID: 30943551.
  4. Deprez PH, Garces Duran R, Moreels T, et al. The economic impact of using single-operator cholangioscopy for the treatment of difficult bile duct stones and diagnosis of indeterminate bile duct strictures. Endoscopy 2018;50:109-18.

Como citar este artigo

Kum AST, Ide E, Nunes BCM. Litotripsia Intraductal na Colangiopancreatografia Retrógrada Endoscópica. Disponível em Endoscopia Terapeutica 2023, vol. 1. http://endoscopiaterapeutica.net/pt/litotripsia-intraductal-na-colangiopancreatografia-retrograda-endoscopica/




Laringoespasmo

O laringoespasmo é até certo ponto uma ocorrência comum para os anestesiologistas, mas, muitas vezes, desconhecida do médico endoscopista.

Apesar de não ter uma frequência tão elevada, um episódio com tratamento tardio ou inadequado pode ser catastrófico.

De forma resumida, seria o fechamento glótico causado por um reflexo exacerbado de constrição da musculatura intrínseca da laringe. É essencialmente um mecanismo de proteção para prevenir entrada de material estranho na árvore brônquica. Como resultado, haverá impedimento da ventilação, levando à hipoxia e à hipercapnia.

O problema é autolimitado na maior parte dos casos, pois por tempo prolongado, a hipoxia e a hipercapnia cessam o reflexo de espasmo. Contudo, em certos episódios, o espasmo pode se prolongar e trazer riscos ao paciente.

Etiologia

Apesar de ter etiologia multifatorial, a manipulação da via aérea é o principal fator implicado. A incidência é maior em crianças, pacientes com infecções do trato respiratório, ou asma, tabagistas, portadores de apneia obstrutiva do sono, refluxo gastresofágico importante e obesos. Além disso, o risco é maior em casos de manipulação de via aérea e em procedimentos na cavidade oral e faringe.

A endoscopia digestiva alta e a broncoscopia estão diretamente relacionadas ao laringoespasmo pelo estímulo direto da região. Outras associações seriam anestesia superficial no início e final desses procedimentos e regurgitação.

Muitas drogas têm sido estudadas na prevenção do laringoespasmo. Pré-medicaçao com benzodiazepínicos reduz os reflexos de via aérea. Lidocaína tópica (4mg/kg) ou venosa (1,5-2mg/kg) parece também trazer benefício. Cuidados não medicamentosos: manter o paciente em decúbito lateral esquerdo no periprocedimento.

O laringoespasmo pode ser parcial, havendo passagem de certa quantidade de ar, levando a estridor inspiratório; ou completo, não havendo passagem de ar e ausência de sons respiratórios. Em ambos os casos, sinais de obstrução podem ser notados, como: retração intercostal e movimentos paradoxais do tórax e do abdome. Sinais tardios: dessaturação, bradicardia e cianose.

Tratamento

O tratamento consiste primeiramente em identificar e cessar o fator desencadeante.Após, aplicar pressão positiva com oxigênio a 100%, anteriorização da mandíbula e manobra de Larson (figura1). Essa técnica abre as vias aéreas e causa dor periosteal, ajudando a relaxar as cordas vocais pelo sistema nervoso autônomo.

  • Cessar o fator desencadeante
  • Pressão positiva com oxigênio a 100%,
  • Anteriorização da mandíbula
  • Manobra de Larson
Figura 1. Ponto do laringoespasmo (seta). Local onde se realiza a manobra de Larson: compressão simultânea em ambos os lados da cabeça, na depressão localizada atrás do lóbulo das orelhas e limitada anteriormente pelo ramo ascendente da mandíbula adjacente ao côndilo, posteriormente pelo processo mastoóide do osso temporal e superiormente pela base do crânio. Concomitantemente, deve ser feito o deslocamento anterior da mandíbula. Erro comum é aplicar pressão no ângulo da mandíbula, devendo ser mais cefálico.

Após, aplicar pressão positiva com oxigênio a 100%, anteriorização da mandíbula e manobra de Larson (figura 1). Essa técnica abre as vias aéreas e causa dor periosteal, ajudando a relaxar as cordas vocais pelo sistema nervoso autônomo. Obtendo-se melhora do quadro, o diagnóstico seria de espasmo parcial. Persistindo o quadro, seria um caso de laringoespasmo completo, sendo importante a ajuda de outro profissional e aprofundamento da anestesia com Propofol (0,25-0,8mg/kg). Provavelmente será necessário ventilar o paciente em consequência de apneia transitória.

A chance de reversão do quadro com Propofol é bastante alta. Todavia, se não houver melhora, utiliza-se Succinilcolina (0,1mg/kg-1,2mgkg EV ou 3-4mg/kg IM). Ter em mente que o Propofol é preferível frente à Succinilcolina, já que nessa dose não acarreta muita repercussão hemodinâmica e não traz risco de paralisia muscular.

Algoritmo de tratamento escalonado enquanto não há melhora do quadro:

Conclusão

É de suma importância identificar os fatores de risco para o desenvolvimento do laringoespasmo e reconhecê-lo rapidamente, antes que a condição do paciente se deteriore. Uma sedação profunda para realização da endoscopia é essencial.

Além disso, o conhecimento das doses das principais medicações utilizadas para reverter o espasmo: propofol e succinilcolina.

Finalmente, importante avaliar se o paciente não cursou com broncoaspiração ou edema agudo de pulmão por pressão negativa pelo esforço respiratório contra obstrução.

Referências:   

  1. Landsman IS. Mechanisms and treatment of Laryngospasm. Int Anesthesiol Clin. 1997 Summer;35(3):67-73. PMID: 9361977
  2. Alalami AA, Ayoub CM, Baraka AS. Laryngospasm: review of different prevention and treatment modalities. Paediatr Anaesth. 2008 Apr;18(4):281-8. doi: 10.1111/j.1460-9592.2008.02448.x. PMID: 18315632
  3. Soares RR, Heyden EG. Tratamento do Laringoespasmo em anestesia pediátrica por digitopressão retroauricular: relato de casos. Rev. Bras. Anestesiol. Dez 2008;  58:6:631-636
  4. Chen Y, Zhang X. Acute postobsctrutive pulmonry edema following laryngospasm in elderly patients: a case report. J Perianesth Nurs. 2019 Apr;34(2):250-258. PMID: 30100095
  5. Moura TSM, Silva FCP, Taves LOAF. Laringoespasmo em anestesia pediátrica. Rev Med Minas Gerais 2018;28 (Supl 8): S20-S27

Como citar este arquivo

Elder P. Laringoespasmo. Endoscopia Terapeutica 2023, Vol 1. Disponível em: http://endoscopiaterapeutica.net/pt/laringoespasmo/

                         




Lesão Esofágica Pós-Ablação Cardíaca

A fibrilação atrial é a arritmia cardíaca mais comum sendo o tratamento através da ablação indicado nos casos de doença refratária à medicação. Entretanto devido à proximidade da parede posterior do átrio esquerdo com o esôfago (< 5mm em 40% dos casos), associado a quantidade de energia desprendida no local (potência, tempo e força de contato), tornam o esôfago um potencial sítio de eventos adversos.

Abaixo as possíveis complicações gastrointestinais pós-ablação cardíaca

Dismotilidade do trato gastrointestinal superior

O mecanismo exato dessas lesões não é conhecido, porém a lesão do nervo vago devido à sua proximidade com o esôfago e a parede do átrio esquerdo, é a teoria mais aceita. Curiosamente, a maior parte da dismotilidade parece ser subclínica e muitas vezes diagnosticada incidentalmente. 

Os sintomas geralmente se iniciam 3 dias após a ablação, sendo os mais comuns: refluxo, disfagia, dor torácica por hipomotilidade esofágica, distensão abdominal, saciedade precoce, perda de peso, náuseas e vômitos.

No único estudo prospectivo observacional realizado, 74% dos pacientes submetidos a ablação desenvolveram alguma dismotilidade, porém normalizada em até 6 meses em todos os participantes1.

O tratamento deve ser realizado nos casos sintomáticos, com refeições em menores porções e baixo teor de gordura, além do uso de pró-cinéticos. Nos raros casos refratários pode ser realizada toxina botulínica para espasmo pilórico ou mesmo cirurgia.

Lesões esofágicas

Estudos demonstram uma incidência variável de lesão esofágica após ablação por cateter, variando de 2% a 47%, sendo a grande maioria assintomáticos.

Durante a ablação, altas temperaturas são alcançadas podendo causar danos ao esôfago, variando de eritema leve (mais comum e com ótimo prognóstico) à ulcerações e, em casos raros, pode levar a perfuração esofágica e formação de fístula atrioesofágica2

Como as lesões esofágicas assintomáticas são comuns, a triagem endoscópica precoce pós ablação pode ajudar a identificar os pacientes com maior risco de perfuração esofágica, permitindo vigilância adequada. Abaixo a classificação utilizada para esse estadiamento:

Kansas City Classification (KCC)3

  • Tipo 1: eritema
  • Tipo 2A: úlcera mucosa superficial
  • Tipo 2B: úlcera profunda 
  • Tipo 3A: perfuração esofágica sem fístula atrioesofágica
  • Tipo 3B: perfuração esofágica com fístula atrioesofágica

Em uma revisão que incluiu 570 lesões esofágicas avaliadas endoscopicamente em pacientes assintomáticos, 36% eram tipo 1, 39% tipo 2A e 25% tipo 2B3. No entanto, a avaliação luminal do esôfago é limitada à superfície e pode subestimar a extensão do dano transmural, visto que as lesões são “de fora para dentro”. 3; 4

Deve-se sempre lembrar que nos casos com suspeita de fístula (febre, dor torácica, odinofagia) a endoscopia é contraindicada pelo risco de embolismo gasoso, devendo-se optar pela tomografia com contraste oral e endovenoso para avaliação.

Figura 1: lesão KCC tipo 1
Figura 2: lesão KCC tipo 2A
Figura 3: lesão KCC tipo 2B

Fístula atrioesofágica

A lesão térmica que leva à isquemia e inflamação parece resultar em dano gradual e progressivo da parede esofágica, o que pode explicar por que a perfuração esofágica e posterior fístula podem levar de 2 a 4 semanas para se desenvolverem.

É uma rara, porém gravíssima complicação, com uma incidência de 0,015 a 0,2%, apesar de provavelmente subnotificada. Sua complexidade decorre do diagnóstico tardio e falta de correção cirúrgica a tempo2

Apresenta sinais clínicos variados como febre, hematêmese, alteração do nível de consciência, dor torácica, disfagia, sepse, mediastinite, derrame pleural ou pericárdico. Acidente vascular cerebral (embolia gasosa), septicemia e sangramento gastrointestinal (GI) são os principais fatores que contribuem para taxas de mortalidade que variam de 40% a 100%4.

Conduta

  • Lesões tipo 1 e tipo 2A: inibidor de bomba de prótons (IBP), resposta completa em 2 a 4 semanas
  • Lesões 2B: apresentam 4% de risco de progressão para tipo 3. Internação, jejum / líquidos claros e TC seriadas por 4 a 6 semanas.
  • Lesões tipo 3: uma revisão de literatura demonstrou que o tratamento conservador ou stent esofágico isolado parece ter um desfecho clínico ruim, sendo o reparo cirúrgico precoce associado ou não a stent esofágico a opção de escolha. Os resultados clínicos da terapia combinada (cirurgia + stent) ainda são pouco claros devido ao número reduzido de estudos5.

Nota: apesar de nenhum estudo randomizado ter comprovado o seu benefício, a maioria dos serviços indica periprocedimento e por um período de até 6 semanas o uso rotineiro de IBP e sucralfato.

Abaixo um fluxograma da conduta nos casos suspeitos:

KEY POINTS

  • IBP e sucralfato por 4 a 6 semanas
  • EDA pós ablação para estratificação de risco
  • TC na suspeita de perfuração
  • Classificação de Kansas 
  • Maioria assintomáticos ou sintomas de dismotilidade autolimitados tratados com sintomáticos
  • Perfuração = tratamento cirúrgico precoce, associado ou não a stent esofágico

Referências

  1. LAKKIREDDY, D.  et al. Effect of atrial fibrillation ablation on gastric motility: the atrial fibrillation gut study. Circ Arrhythm Electrophysiol, v. 8, n. 3, p. 531-6, Jun 2015. ISSN 1941-3084. Disponível em: < https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/25772541 >. 
  2. GARG, L.  et al. Gastrointestinal complications associated with catheter ablation for atrial fibrillation. Int J Cardiol, v. 224, p. 424-430, Dec 01 2016. ISSN 1874-1754. Disponível em: < https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/27690340 >. 
  3. YARLAGADDA, B.  et al. Temporal relationships between esophageal injury type and progression in patients undergoing atrial fibrillation catheter ablation. Heart Rhythm, v. 16, n. 2, p. 204-212, Feb 2019. ISSN 1556-3871. Disponível em: < https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/30273767 >. 
  4. ASSIS, F. R.  et al. Esophageal injury associated with catheter ablation for atrial fibrillation: Determinants of risk and protective strategies. J Cardiovasc Electrophysiol, v. 31, n. 6, p. 1364-1376, Jun 2020. ISSN 1540-8167. Disponível em: < https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/32323383 >. 
  5. ZHOU, B.  et al. Treatment strategy for treating atrial-esophageal fistula: esophageal stenting or surgical repair?: A case report and literature review. Medicine (Baltimore), v. 95, n. 43, p. e5134, Oct 2016. ISSN 1536-5964. Disponível em: < https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/27787367 >. 

Como citar este artigo

Oliveira JFD. Lesão Esofágica Pós-Ablação Cardíaca. Endoscopia Terapeutica 2023 Vol 1. Disponível em: http://endoscopiaterapeutica.net/pt/lesao-esofagica-pos-ablacao-cardiaca/