1. Introdução
O câncer colorretal (CCR) é um grande problema de saúde pública, associado a uma alta taxa de morbidade e mortalidade no ocidente. O CCR representa o ponto final de uma ampla gama de alterações genéticas e epigenéticas que ocorrem em células colorretais normais.
Estima-se que aproximadamente 85% dos CCRs se desenvolvem a partir de pólipos colorretais. Os pólipos adenomatosos e as lesões serrilhadas sésseis (LSS ou SSL em inglês) são os precursores mais importantes do CCR. Estima-se que adenomas e LSS estejam presentes em 20% a 50% dos indivíduos com mais de 50 anos de idade [1].
2. Classificação da OMS para Lesões Serrilhadas Colorretais
Até 2010, lesões serrilhadas colorretais eram geralmente consideradas como lesões inofensivas e relatadas como pólipos hiperplásicos (PHs) por patologistas e gastroenterologistas.
Posteriormente, uma variedade de termos foi usada para descrever essas lesões, contribuindo para mal-entendidos sobre a terminologia e classificação das lesões serrilhadas.
Em 2010, a Organização Mundial da Saúde (OMS) propôs a seguinte classificação para lesões serrilhadas colorretais (4ª edição = penúltima versão até a publicação deste artigo):
Tipo Histológico | Tipo Histológico |
---|---|
Pólipo Hiperplásico (PH) | • Tipo Microvesicular |
• Tipo rico em células caliciformes | |
• Tipo pobre em mucina | |
Adenoma/Pólipo Serrilhado Séssil (SSA/P) | • SSA/P com displasia |
• SSA/P sem displasia | |
Adenoma Serrilhado Tradicional (TSA) |
Em 2019 a OMS atualizou a classificação Lesões serrilhadas colorretais (5ª. Edição) [2]. Esta nova classificação diferencia lesões serrilhadas em quatro categorias:
Tipo Histológico | Subtipo Histológico |
---|---|
Pólipo Hiperplásico (PH) | • Tipo Microvesicular |
• Tipo rico em células caliciformes | |
Lesão Serrilhada Séssil (LSS) | • LSS |
• LSS com displasia (LSSD) | |
Adenoma Serrilhado Tradicional (TSA) | |
Adenoma Serrilhado, Não Classificado |
A principal mudança na terminologia é a aprovação do novo termo “lesão serrilhada séssil ” (LSS), que visa adequar as terminologias anteriores confusas “adenoma séssil serrilhado e pólipo séssil serrilhado “. De fato, o termo “adenoma” inclui o conceito de displasia, que não é observada em um número significativo de LSSs. Agora, quando o patologista observa um padrão displásico nas LSSs, deve utilizar a terminologia “LSS com displasia”. Além disso, grande parte das LSSs não apresentam aparência polipoide, tornando o termo “pólipo” inadequado.
3. Lesões Serrilhadas Colorretais: Características Histológicas e Endoscópicas
Microscopicamente, as lesões serrilhadas colorretais são caracterizadas pela presença de dobras semelhantes a dentes de serra nas criptas epiteliais [1]. As diferenças entre os principais subtipos de lesões serrilhadas estão nas características arquiteturais e na localização/extensão da zona proliferativa.
3.1 – Pólipos Hiperplásicos (PH)
- Os PHs são as lesões serrilhadas mais comuns, representando cerca de 75% de todos os pólipos serrilhados.
- Prevalência estimada em pacientes submetidos a colonoscopias de rastreio é de 20–30%.
- Nos PH, as criptas são retas e alongadas, com uma arquitetura serrilhada confinada aos dois terços superiores das criptas e as células mostram mínima atipia citológica.
- Na parte basal da cripta, a arquitetura é regular e não serrilhada, e as células não apresentam sinais de atipia.
- PH são comumente encontrados no cólon esquerdo, principalmente no cólon retossigmoide, e normalmente têm menos de 5 mm.
- Na endoscopia com luz branca, aparecem como lesões elevadas ou sésseis, às vezes cobertas com mucosa normal.
- Na cromoendoscopia, são observadas padrão de criptas tipo II do tipo estrelado na superfície da lesão.
Duas variantes de Pólipos Hiperplásicos:
- pólipos hiperplásicos de tipo microvesicular:
- caracterizados pela presença de pequenas gotículas de muco nas células
- são considerados precursores de LSS.
- pólipos hiperplásicos ricos em células caliciformes:
3.2 – Lesões Sésseis Serrilhadas (LSS)
- LSS são o segundo tipo mais comum de lesão serrilhada e são consideradas lesões precursoras de CRC. (Mais detalhes etiopatogênicos)
- Prevalência de LSS na população geral é de 5–10%.
- Geralmente, LSS são maiores que PH, com diâmetro médio entre 5-7 mm, e sua forma é plana ou séssil.
- Ao contrário dos PH, LSS são mais frequentes no cólon direito.
- Característica histológica que distingue LSS de PH é a presença de criptas serrilhadas distorcidas.
- Para diagnóstico histológico de LSS, a cripta deve mostrar pelo menos uma das seguintes características:
- Crescimento horizontal ao longo da camada muscular da mucosa.
- Dilatação da base da cripta.
- Serrilhamento se estendendo até a base da cripta.
- Proliferação assimétrica.
- Características endoscópicas:
- presença de uma capa de muco
- Coloração pálida/esbranquiçada.
- Padrão de criptas tipo II-O (abertas) na cromoscopia com magnificação.
3.3 – Lesões Sésseis Serrilhadas com Displasia (LSS-D)
- De acordo com seu potencial carcinogênico conhecido, LSSs podem originar focos displásicos.
- Esta entidade histológica, chamada LSSD, representa um subgrupo dos LSSs.
- Estima-se que cerca de 4–8% dos LSSs contêm displasia.
- Pelo menos três tipos morfológicos diferentes de displasia foram descritos em LSSD:
- Displasia intestinal (semelhante a adenoma): rara.
- Displasia serrilhada: mais comum.
- Displasia de mínima divergência: poucas alterações em comparação com LSS e perda característica de MLH1.
- Endoscopicamente, essas lesões geralmente apresentam nódulos na superfície.
- Sinais como morfologia (sub)pediculada, elevação dupla, depressão central e tonalidade avermelhada são sinais suspeitos de displasia. [3]
- Na cromoendoscopia com magnificação, exibem um padrão de pit adenomatoso (Kudo tipo III, IV). [4]
3.4 – Adenoma Serrilhado Tradicional (AST ou TSA em inglês)
- Mais frequentes no cólon esquerdo.
- São as lesões serrilhadas mais raras do colorretal com prevalência de menos de 1%.
- Geralmente, AST são maiores que LSS e têm aparência polipoide ou pediculada.
- Histologicamente, apresentam arquitetura vilosa distorcida e, em muitos casos, vilosidades com pontas bulbosas.
- Tanto a displasia tipo adenoma quanto a displasia serrilhada podem ser observadas nos AST.
- O risco e a rapidez de progressão para carcinoma são desconhecidos.
- Na endoscopia, parecem lesões avermelhadas, protuberantes ou pediculadas e, macroscopicamente, apresentam aspecto de “pinha” ou “coral”.
Resumo das Alterações:
- Lesão serrilhada sésseis (LSS) é o novo termo para lesões anteriormente chamadas de adenoma serrilhado séssil (SSA). As diretrizes clínicas para o gerenciamento de SSA se aplicam à LSS.
- LSS com displasia é o termo usado para as lesões anteriormente chamadas de SSA com displasia citológica.
- Adenoma serrilhado não classificado foi introduzido para pólipos raros difíceis de classificar como LSS ou TSA.
Resumo dos Critérios Histológicos para Lesões Sésseis e Pólipos:
- Uma única cripta distorcida incontestável é o suficiente para diagnosticar uma lesão serrilhada sésseis (LSS). A distorção da arquitetura da cripta pode incluir crescimento horizontal ao longo da muscular da mucosa, dilatação da base da cripta e proliferação assimétrica.
- Lesões/pólipos serrilhados planos sem cripta típica do tipo LSS são diagnosticados como pólipo hiperplásico (PH) por exclusão. Dilatação simétrica leve da cripta e células caliciformes na base das criptas não são suficientes para diagnóstico de LSS.
- Estratificação em displasia de baixo e alto grau não é recomendada.
- O diagnóstico de adenoma serrilhado tradicional (TSA) requer duas das seguintes características:
- (1) serrilhamento em forma de fenda;
- (2) células eosinofílicas altas com núcleos de lápis;
- (3) formações de criptas ectópicas.
Referências:
- Mezzapesa M, Losurdo G, Celiberto F, Rizzi S, d’Amati A, Piscitelli D, Ierardi E, Di Leo A. Serrated Colorectal Lesions: An Up-to-Date Review from Histological Pattern to Molecular Pathogenesis. Int J Mol Sci. 2022 Apr 18;23(8):4461. doi: 10.3390/ijms23084461. PMID: 35457279; PMCID: PMC9032676.
- WHO Classification of Tumours Editorial Board . WHO Classification of Tumors: DIGESTIVE System Tumours. 5th ed. International Agency for Research on Cancer; Lyon, France: 2019
- Murakami T, Sakamoto N, Ritsuno H, Shibuya T, Osada T, Mitomi H, Yao T, Watanabe S. Distinct endoscopic characteristics of sessile serrated adenoma/polyp with and without dysplasia/carcinoma. Gastrointest Endosc. 2017 Mar;85(3):590-600. doi: 10.1016/j.gie.2016.09.018. Epub 2016 Sep 20. PMID: 27663716.
- Tate D.J., Jayanna M., Awadie H., Desomer L., Lee R., Heitman S.J., Sidhu M., Goodrick K., Burgess N.G., Mahajan H., et al. A standardized imaging protocol for the endoscopic prediction of dysplasia within sessile serrated polyps. Gastrointest. Endosc. 2018;87:222–231. doi: 10.1016/j.gie.2017.06.031.
Como citar este artigo
Martins BC e Tanigawa R. Lesões Serrilhadas Colorretais: Dossiê Completo. Endoscopia Terapeutica, 2024 vol. 1. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.com.br/assuntosgerais/lesoes-serrilhadas-colorretais-dossie-completo/