Nos últimos anos o número de solicitações de biópsias seriadas em colonoscopia vem aumentando exponencialmente. Como endoscopista sempre surge o questionamento: Será que há indicação? Como proceder?
Após revisão da literatura listamos abaixo as situações em que as biópsias seriadas estão bem indicadas:
Colites microscópicas
Consistem na principal indicação de biópsias colônicas seriadas.
Compreendem as colites colágena e linfocítica. Cursam com diarreia crônica e geralmente sem alteração macroscópica na colonoscopia. O diagnóstico se dá pela identificação de bandas colágenas subepiteliais (colite colágena) ou maior densidade de linfócitos intraepiteliais (colite linfocítica). A colite linfocítica tem forte associação com a doença celíaca.
A colonoscopia é superior à retossigmoidoscopia, pois os achados microscópicos são mais evidentes em cólon direito.
A conduta preferível é:
- Realização de colonoscopia com no mínimo 2 biópsias em: cólon ascendente, transverso, descendente e sigmoide.
Ou
- Colonoscopia com 3 – 4 Fragmentos de cólon direito e esquerdo (frascos separados).
Diarréias agudas
Em imunocompetentes a retossigmoidoscopia/colonoscopia está indicada nos casos de forte suspeita de colite pseudomembranosa. A depender das condições clínicas do paciente pode-se realizar a retossigmoidoscopia com biópsias de sigmoide e reto (frascos separados). Caso resultado seja inconclusivo, realizar a colonoscopia com biópsias de cólon direito e esquerdo.
Em imunodeprimidos a retossigmoidoscopia/colonoscopia está indicada quando a diarreia é persistente e a pesquisa de agentes infecciosos nas fezes é negativa. Nesta situação a principal causa é infecção por Citomegalovírus (CMV) e o interessante é que as técnicas não invasivas de detecção, tais como PCR e sorologias nem sempre indicam doença invasiva. Daí a necessidade da realização de colonoscopia com biópsias de cólon direito e esquerdo para pesquisa de agentes infecciosos e necessidade de identificação viral por imuno-histoquímica.
Doença Inflamatória Intestinal
Há 2 situações distintas: a primeira é a avaliação de atividade de doença e a segunda é a vigilância para displasia.
Nas colites ulcerativas e nas colites de doença de Crohn devem ser feitas biópsias de quaisquer alterações macroscópicas. Em mucosa de aspecto cicatricial (quiescente) a avaliação de atividade de doença é feita através de biópsias de íleo, cólon direito, cólon esquerdo e reto com no mínimo 2 fragmentos por segmento e em frascos separados.
Outra situação distinta que geralmente confunde o endoscopista é como realizar as biópsias na vigilância endoscópica para displasias. Uma conduta cada vez menos aplicada atualmente é a realização de biópsias aleatórias a cada 10cm nos 4 quadrantes gerando o mínimo de 32 fragmentos. Há casos bem selecionados em que tal prática ainda é útil (presença de inúmeros pseudopólipos que dificultam a visualização adequada de todo o cólon, ausência de aparelhos com alta definição e de corantes como índigo Carmim ou azul de metileno). Atualmente, baseado no SCENIC (Consenso Internacional de Vigilância e Manejo de Displasia na Doença Inflamatória Intestinal) é preferível, em um cólon de padrão quiescente, a realização de biópsias dirigidas de áreas suspeitas realçadas pela cromoscopia.
Pouchitis (bolsite)
Até 60% dos pacientes portadores de colite ulcerativa submetidos a colectomia subtotal com confecção de bolsa ileal vão apresentar pelo menos um episódio de bolsite. A retossigmoidoscopia está indicada nos pacientes sintomáticos e devem ser realizadas biópsias do pouch e da alça aferente (frascos separados) em busca de agentes infecciosos e diagnóstico diferencial com a doença de Crohn.
Doença do enxerto versus hospedeiro (GVHD)
É uma complicação do transplante alogênico de medula óssea (TMO) que ocorre geralmente nos primeiros 3 meses pós transplante. Os achados endoscópicos são relacionados com o estágio da doença, apresentando desde mucosa normal até alterações como edema, enantema, erosões e/ou úlceras. Biópsias endoscópicas seriadas são necessárias pelo fato de não haver correlação direta entre os achados endoscópicos e histológicos.
Na GVHD não há uma conduta definida. Sabe-se que os locais mais frequentemente acometidos são cólon distal e reto, até mesmo nos pacientes que tem sintomas sugestivos de envolvimento do trato gastrintestinal superior.
Desta maneira 2 abordagens são aceitas:
- Retossigmoidoscopia flexível com biópsias de cólon descendente (4 fragmentos) e cólon sigmoide/reto (4 fragmentos).
Ou
- Colonoscopia com no mínimo 4 fragmentos de íleo terminal, 4 de cólon ascendente, 4 de cólon transverso, 4 de cólon descendente e 4 de cólon sigmoide/reto.
Tabela com resumo das indicações de biópsias seriadas:
DOENÇA | PROCEDIMENTO |
Colites microscópicas | Colonoscopia com no mínimo 2 biópsias em: cólon ascendente, transverso, descendente, sigmoide
Ou Colonoscopia com 3 – 4 Fragmentos de cólon direito e esquerdo (frascos separados)
|
Diarreia aguda | Imunocompetentes
· Retossigmoidoscopia com biópsias de sigmoide/reto · Colonoscopia com biópsias de cólon direito e esquerdo
Imunodeprimidos · Colonoscopia com biópsias de cólon direito e esquerdo |
Doença inflamatória intestinal | Avaliação de atividade
· Colonoscopia com biópsias de íleo, cólon direito, esquerdo e reto
Vigilância · Colonoscopia com biópsias dirigidas de lesões suspeitas Ou · Biópsias a cada 10cm nos 4 quadrantes (mínimo de 32 fragmentos) |
Pouchitis |
Biópsias do pouch e da alça aferente.
|
GVHD | Retossigmoidoscopia flexível com biópsias de cólon descendente (4 fragmentos) e cólon sigmoide/reto (4 fragmentos).
Ou Colonoscopia com no mínimo 4 fragmentos de íleo terminal, 4 de cólon ascendente, 4 de cólon transverso, 4 de cólon descendente e 4 de cólon sigmoide/reto. |
Referências:
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- Da Silva JG, De Brito T, Cintra Damião AO, et al. Histologic study of colonic mucosa in patients with chronic diarrhea and normal colonoscopic findings. J Clin Gastroenterol 2006; 40:44-8.
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- Shergill AK,Lightdale JR, Bruining DH et al. The role of endoscopy in inflammatory bowel disease. Gastrointest Endosc. 2015 May;81(5):1101-21. e1-13.
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- Sharaf RN, Shergill AK, Odze RD et al. Endoscopic mucosal tissue sampling. Gastrointest Endosc. 2013 Aug;78(2):216-24.
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- Thompson B, Salzman D, Steinhauer J, et al. Prospective endoscopic evaluation for gastrointestinal graft-versus-host disease: determination of the best diagnostic approach. Bone Marrow Transplant 2006; 38:371-6.
Médico Coordenador do Centro de Diagnóstico em Gastroenterologia do Hospital das Clínicas de São Paulo
Membro titular da FBG e SOBED
Membro titular do Grupo de Estudos da Doença Inflamatória Intestinal do Brasil (GEDIIB).
2 Comentários
Parabéns pela revisão e pela abordagem Alexandre. Para reforçar alguns conceitos e esclarecer umas duvidas:
1. Paciente com diarreia aguda, sem alterações macroscopicas que sugiram colite pseudomembranosa, está indicado biópsias? Existe uma positividade razoável? Confesso que essa não é uma prática que adoto na minha rotina.
2. É necessário realizar biopsias seriadas em pacientes com DII em fase de remissão? Isso pode impactar no tratamento?
Obrigado Bruno.
1. Realmente a acurácia das biópsias colônicas na ausência de pseudomembranas não é boa para o diagnóstico de colite pseudomembranosa. As biópsias colônias seriadas, nesses casos, são úteis mais para diagnóstico diferencial.
2. Na DII em remissão há 2 situações a serem consideradas:
–> Para avaliação de atividade histológica a necessidade de biópsias seriadas em um cólon em remissão endoscópica ainda não está bem estabelecida. O critério de “remissão histológica” é defendida por alguns grupos mas há necessidade de estudos prospectivos para determinar se realmente está associada a melhores desfechos.
–>Para vigilância endoscópica em um cólon cicatrizado e na ausência de corantes e aparelhos High definiton, a realização de biópsias seriadas a cada 10cm nos 4 quadrantes ainda tem seu espaço.
Abraço