Existem diversas indicações para realização de gastrostomia endoscópica percutânea incluindo distúrbios de deglutição, neoplasias, fístulas, estenoses complexas entre outras.
O procedimento é tecnicamente simples e rápido evitando a morbidade de técnicas cirúrgicas, no entanto, algumas vezes o endoscopista encontra uma barreira frustrante quando não consegue atingir a câmara gástrica em decorrência de estenoses. Nessas situações restam basicamente três opções para a ostomia: a) gastrostomia cirúrgica com sua morbidade associada mesmo que realizada laparoscopicamente; b) gastrostomia percutânea guiada por imagem (maior risco de lesão de órgãos adjacentes e pouco difundida no país); c) gastrostomia via endoscópica através de gastroscópios de fino calibre (indisponíveis para a grande maioria dos endoscopistas).
Um grupo de pesquisadores de Curitiba trouxe uma proposta inovadora com grande potencial de trazer mais uma opção técnica para endoscopistas e pacientes.
O grupo composto por pesquisadores das áreas de medicina, engenharia, biotecnologia e veterinária desenvolveu modelos experimentais utilizando magnetos como idéia central, sendo um deles intragástrico e outro percutâneo.
O magneto externo possuía desenho com orifício central para permitir a punção gástrica no entanto o mesmo não apresentava “força magnética” suficiente para garantir a tração do estômago durante a punção. O modelo foi substituído por um magneto cilíndrico mais robusto. O modelo de magneto interno foi realizado com uma sonda nasogástrica/nasoenteral acoplada a seis magnetos cilíndricos de 1 cmx1 cm, dispostos na extremidade distal da sonda, com espaçadores entre eles garantindo maior flexibilidade.
Inicialmente os testes foram realizados em cadáveres porcinos que eram aproveitados após o uso de cirurgias laparoscópicas que não envolvessem cirurgia gástrica ou esofágica. Após alguns protótipos e tentativas, chegou-se a um modelo final, utilizado experimentalmente em modelos vivos suínos.
A técnica pode ser resumida através dos seguintes passos:
- Passagem de sonda nasogástrica às cegas até o estômago, seguido da passagem de um fio-guia flexível.
- Remoção da sonda nasogástrica seguida da passagem da sonda com magneto interno através do fio-guia.
- Remoção do fio-guia. Insuflação de ar ambiente através da sonda com magneto interno.
- Colocação de magneto externo sobre o abdome em topografia gástrica até ser percebida uma “resistência” causada pela força magnética entre os dois imãs.
- Realizar gastropexia com auxílio de “fixadores em T” (T-tags) de forma convencional.
- Punção percutânea do estômago (já fixo à parede abdominal) com auxílio de trocarte de cistotomia.
- Remoção do mandril do cistótomo seguido de passagem de sonda de gastrostomia 14Fr. Insuflação do balão interno e fixação da sonda.
Os autores citam sucesso dessa técnica em cinco modelos animais (dois vivos), com duração aproximada de cerca de 10min. Os dois modelos vivos foram submetidos a eutanásia posteriormente com achado de adequada fixação do estômago à parede abdominal.
Comentários:
O conceito do trabalho é extraordinário assim como sua descrição mostrando as dificuldades encontradas até chegar ao modelo final. A possibilidade de realizar uma gastrostomia em paciente com estenoses esofágicas, à beira do leito, sem sedação, com mínima intervenção porém mantendo segurança é simplesmente espetacular.
A sonda de gastrostomia utilizada no estudo foi de 14Fr, sendo de pequeno calibre o que traz certas limitações ao seu uso em virtude da facilidade de obstrução.
Tive a sorte de participar de práticas experimentais com Giordano-Nappi enquanto fazia residência de endoscopia e vi de perto a realização de gastrostomia percutânea usando um trocarte de largo calibre que permitia a passagem de sondas de 20Fr. A mesma idéia pode ser aplicada à gastrostomia guiada por magnetos já que ambas técnicas são feitas após gastropexia. Outra possibilidade é de usar as sondas de 14Fr e realizar dilatações posteriormente, durante troca de gastrostomia para permitir o uso de sondas de maior calibre.
Na discussão do trabalho é citada uma limitação relacionada a espessura da parede gástrica, já que uma parede muito espessa pode inviabilizar o adequado “acoplamento” magnético entre os magnetos interno e externo. Essa limitação não deve ser comum na prática já que a maioria dos pacientes com estenose esofágica necessitando de gastrostomia deve apresentar pouco tecido adiposo e parede pouco espessa.
Parabenizo os autores pela iniciativa da pesquisa e cito que algumas imagens aqui dispostas foram editadas para melhor compreensão do leitor no entanto são de propriedade dos autores do estudo.
Link para o artigo: A novel percutaneous magnetically guided gastrostomy technique without endoscopy or imaging guidance: a feasibility study in a porcine model
Referência
A novel percutaneous magnetically guided gastrostomy technique without endoscopy or imaging guidance: a feasibility study in a porcine model. Bonin EA, Ferreira PRW, de Paula Loureiro M, Costa-Casagrande TA, de Oliveira Salvalaggio P, Gomes GF, Noda RW, Gostout CJ, Cavazzola LT.
Membro Titular da Sociedade Brasileira de Endoscopia Digestiva (SOBED);
Especialização em Endoscopia Digestiva na Universidade de São Paulo (USP);
Mestrado em Cirurgia na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE);
Médico endoscopista da NeoGastro (PE);
Coordenador do Serviço de Endoscopia Digestiva do Hospital Otávio de Freitas (PE)