A colonoscopia é o exame padrão ouro para detecção e prevenção do câncer colorretal (CCR). Quanto maior a taxa de detecção de adenoma (ADR – adenoma detection rate) do endoscopista, menor a taxa do CCR de intervalo. As técnicas empregadas pelo endoscopista durante a realização da colonoscopia estão relacionadas com sua ADR. Endoscopistas com altas ADR possuem técnicas minuciosas para realização do exame, especialmente durante a retirada do aparelho.
Em maio de 2023, foi publicado no World Journal of Gastrointestinal Endoscopy um artigo interessante que resumiu as evidências de técnicas simples durante a colonoscopia e seus efeitos na ADR: tempo mínimo de retirada do aparelho, mudar o paciente de posição e retrovisão no cólon direito. Ei-las:
Tempo de retirada do aparelho
O tempo de retirada é o tempo que o endoscopista leva para avaliar a mucosa do ceco ao canal anal após a intubação cecal. Uma boa técnica de retirada envolve inspeção cuidadosa atrás de dobras e flexões, distensão adequada da luz do cólon, lavagem da mucosa e aspiração de todo excesso de líquido e resíduo fecal. Endoscopistas que realizam colonoscopias de alta qualidade provavelmente levam mais tempo realizando essas manobras – o que aumenta seu tempo de retirada.
Atualmente, o tempo mínimo para retirada do aparelho em programas de rastreamento é 6 minutos, que é suficiente para detectar adenomas avançados. Um estudo sugeriu que aumentar esse tempo para 6 – 10 minutos pode aumentar a detecção de adenomas menores e lesões do cólon direito. As lesões adenomatosas do cólon direito são mais difíceis de detectar. Elas podem ser mais planas e progridem mais rapidamente para CCR. Passar mais tempo avaliando a mucosa durante a retirada, porém sem realizar manobras como exames repetidos dos segmentos do cólon e distensão adequada da luz do órgão podem não aumentar a ADR.
Lesões serrilhadas sésseis, por sua própria aparência, são mais difíceis de detectar. A maioria dos estudos que avaliaram o tempo mínimo de retirada não abordaram a detecção de lesões serrilhadas sésseis. Porém dois estudos relataram que a taxa de detecção destas lesões também aumenta com o aumento do tempo de retirada.
Uma meta-análise recente mostrou um aumento na ADR com tempo de retirada de 9 minutos, quando comparado a retirada de 6 – 9 minutos. Porém, aumentar o tempo de retirada somente, sem adoção de outras técnicas para melhorar a avaliação da mucosa, provavelmente não será tão eficaz no aumento da ADR.
Será que o tempo de retirada é uma técnica que aumenta a ADR ou endoscopistas com boas técnicas de colonoscopia (o que aumenta a ADR) levam mais tempo para retirar o aparelho?
Mudar o paciente de posição
Uma manobra essencial na técnica de colonoscopia é a adequada distensão da luz durante a retirada do aparelho. Mudar o paciente de posição neste momento leva o ar para uma posição mais alta, movimentando o líquido e facilitando a distensão. Porém a mudança de decúbito do paciente na retirada não é uma técnica realizada de rotina, ficando comumente a critério do endoscopista.
A mudança de posição dinâmica durante o exame é realizada da seguinte maneira: decúbito lateral esquerdo para avaliação do ceco, cólon ascendente e ângulo hepático; posição supina para o cólon transverso; e decúbito lateral direito para o ângulo esplênico, cólon descendente e cólon sigmoide.
Um estudo controlado, randomizado e multicêntrico com 1.072 pacientes – o maior até agora comparando a posição dinâmica com manter o paciente na mesma posição durante a retirada – mostrou significativo aumento na ADR na posição dinâmica (42,4%) quando comparado com o grupo na posição decúbito lateral esquerdo (33%). Este estudo mostrou ainda que os endoscopistas com uma ADR mais baixa (<35%) tiveram um aumento significativo em sua ADR com a posição dinâmica em comparação com endoscopistas com ADR mais altas (>35%).
Um outro estudo que randomizou 776 pacientes para “mudança de posição que o endoscopista realiza habitualmente” ou para posição dinâmica não mostrou aumento na ADR dos endoscopistas. Este estudo foi único pois, ao contrário dos outros, a retirada do grupo controle não ficava limitada somente ao decúbito lateral esquerdo – e sim à mudança que o endoscopista julgasse necessária.
Um meta-análise recente mostrou que a mudança de posição dinâmica durante a retirada aumenta a ADR. As recomendações da meta-análise para adoção da mudança de posição foram: decúbito lateral esquerdo para o cólon direito, supina para o cólon transverso e decúbito lateral direito para o cólon esquerdo.
A mudança de posição dinâmica durante a colonoscopia pode melhorar a ADR dos endoscopistas – porém com evidências ainda conflitantes.
Retrovisão no cólon direito
Acredita-se que a retrovisão no cólon direito aumente a detecção de pólipos em pontos cegos. A colonoscopia deixa de detectar mais lesões no cólon direito que esquerdo, possivelmente porque estes pólipos não são vistos atrás das pregas e flexuras. Há ainda o fato que os endoscopistas tem dificuldade de detectar lesões serrilhadas sésseis, que são mais comuns no cólon direito.
A retrovisão no cólon direito é uma manobra fácil de realizar, com taxa de sucesso variando de 82 a 96% e baixo índice de complicação.
Em um estudo controlado e randomizado, 850 pacientes foram randomizados para uma segunda avaliação no cólon direito na visão frontal ou na retrovisão. Não houve diferença significativa na ADR entre as duas formas no segundo exame.
Um outro estudo observacional com 1.020 pacientes avaliou a retirada de 3 examinadores no cólon direito: 2 em visão frontal e um terceiro em retrovisão. Houve aumento estatisticamente significativo na ADR na retirada em retrovisão em comparação com as retiradas em visão frontal combinadas. Porém os examinadores fizeram uso de cap no colonoscópio, sendo este então um fator confundidor.
Um outro estudo controlado, randomizado e multicêntrico com 692 pacientes que repetiram a avaliação do cólon direito em visão frontal e retrovisão não mostrou diferença significativa entre os tipos de retirada. Houve aumento na detecção de lesões serrilhadas sésseis no segundo exame, também sem diferença significativa entre a visão frontal e a retrovisão. Esse estudo corrobora as evidências que uma segunda avaliação do cólon direito aumenta a ADR, qualquer que seja a forma de retirada adotada – visão frontal ou retrovisão.
Uma meta-análise recente mostrou que a detecção adicional de adenomas foi menor em retrovisão em 4 estudos controlados e randomizados do que na visão frontal. Esta meta-análise mostrou ainda que, em 6 estudos observacionais, a ADR foi maior em exames cominados com retrovisão (duas avaliações: visão frontal e retrovisão) que em uma única retirada em visão frontal ou ainda dupla avaliação em visão frontal.
As evidências sugerem que o endoscopista deve considerar uma segunda avaliação do cólon direito durante a colonoscopia. Mais informações são necessárias antes que se recomende que a segunda avaliação deva ser feita em retrovisão.
Referências:
Rajivan R, Thayalasekaran S. Improving polyp detection at colonoscopy: Non-technological techniques. World J Gastrointest Endosc 2023; 15(5): 354-367
DOI: https://dx.doi.org/10.4253/wjge.v15.i5.354
Como citar este artigo
ARRAES L. Como melhorar sua taxa de detecção de adenoma com técnicas não-tecnológicas Disponível em: Endoscopia Terapeutica 2023, vol. 1. endoscopiaterapeutica.net/pt/como-melhorar-sua-taxa-de-deteccao-de-adenoma-com-tecnicas-nao-tecnologicas/
Especialista em Gastroenterologia HC-FMRP-USP e em Endoscopia Gastrointestinal HC-FM-USP
Membro titular da Federação Brasileira de Gastroenterologia (FBG) e da Sociedade Brasileira de Endoscopia Digestiva (SOBED)
Doutorado em andamento - USP
Presidente do capítulo Maranhão da SOBED gestão 2019-2020