Introdução
A coledocolitíase é uma situação muito comum, sendo encontrada em 5-15% dos pacientes com cólica biliar, 10-20% dos submetidos à colecistectomia e 18 a 21% das pancreatites agudas, necessitando da sua extração, sempre que possível.
O diagnóstico da coledocolitíase pode ser difícil, devido à falta de especificidade do quadro clínico e laboratorial.
As modalidades diagnósticas não invasivas, como a ultrassonografia e a tomografia computadorizada de abdome, tem sensibilidade de 25-58% e especificidade de 68-91%.
De acordo com o Guideline da ASGE, os pacientes com suspeita de coledocolitíase podem ser divididos em baixa (<10%), intermediária (10-50%) e alta (>50%) probabilidade, conforme critérios clínicos e radiológicos (vide tabela abaixo).
(Clique para ampliar) – Adaptado do guideline da ASGE.
Alguns estudos demonstram que a CPRE tem maior custo-benefício, pois a maior parte dos pacientes necessitarão do procedimento em algum momento do quadro clínico.
Já Buscarini e cols. mostraram uma taxa de 66,4% e 44,2% de coledocolitíase nos pacientes de alta e média probabilidade. Outros estudos demonstraram que a taxa de complicação da CPRE pode chegar a 10% e mortalidade de 0,5%.
Três séries randomizadas demonstraram que o USE (Ultrassonografia Endoscópica) pré CPRE nos pacientes de moderado risco, diminuíram em 60-75% as CPREs diagnósticas.
Objetivo
- USE pré-CPRE deve ser aplicada a todos os pacientes com suspeita de coledocolitíase?
- Primário: Investigar o impacto clínico da USE no início do manejo na suspeita de coledocolitíase.
- Secundário: Papel da endoscopia, tanto na avaliação como no manejo na suspeita de coledocolitíase, em contraste com as diretrizes atuais (critérios clínicos e laboratoriais).
Métodos
- Departamento de Gastroenterologia e Endoscopia de um hospital secundário no noroeste da Itália (600 EUS e 350 CPRE por ano), de jan/10 a jan/12
- Pacientes com dor em HCD + exames laboratoriais e/ou imagem com hipótese de coledocolitíase (classificados em baixo, médio ou alto risco)
- Critérios de exclusão: recusa do paciente, incapacidade de dar o consentimento, impossibilidade de ser submetido à endoscopia, dilatação intra-hepática isolada, gastrectomizados, esfincterotomia prévia, colecistite aguda, pancreatite aguda, colangite, identificação clara de obstrução das vias biliares pela USG ou TC.
- USE em até 48h da admissão
- CPRE logo após, nos pacientes com coledocolitíase
- Colecistectomia em até 4 meses após a alta
- Seguimento: telefonema em 1, 3 e 6 meses
- Procedimento: EUS por 2 experientes (> 5 anos de experiência), com Olympus GF-UCT 140 linear ou GF-UM 160 radial (5-10 MHz), CPRE no mesmo procedimento com contraste iodado a 50%.
- Análise Estatística (Mann-Whitney U test, Teste do chi-quadrado e p < 0,05)
- Fatores estudados: Idade e sexo, bilirrubina, AST, ALT, GGT, FA, amilase, febre e dilatação de hepatocolédoco (≥ 6 mm ou ≥ 8 mm)
Resultados
- 324 pacientes, sendo 125 excluídos por coledocolitíase no USG ou TC (58) , pancreatite (50), gastrectomia prévia (2), esfincterotomia prévia (6), colangite (4), impossibilidade de ser submetido à endoscopia (2), incapacidade de dar o consentimento (3) e colecistite (11)
- 199 foram submetidos à USE, sendo 20 excluídos por neoplasia (8) e tempo > 48h (12)
- 179 pacientes incluídos na análise (53% mulheres)
- Em 86 pacientes dos 179 foi confirmado o diagnóstico de coledocolitíase pela USE (48%)
- Todos os 86 foram submetidos à CPRES, porém, não foram encontrados cálculos em 7 (8%):
- 3 baixo risco
- 2 moderado
- 1 alto
- 1 PTC (papila peridiverticular)
- USE identificou cálculo em 3 de 10 pacientes com USG/TC negativo para colecistolitíase
- Complicações das CPRE: 3 sangramentos pós esfincterotomia, 1 pancreatite moderada e 2 pacientes com dessaturação durante o exame (> 1 min).
- Dos 93 pacientes sem coledocolitíase pela USE, todos tiveram alta 2 dias após com melhora clínica e laboratorial.
- Seguimento telefônico com 1, 3 e 6 meses (12 perdas).
- 2 pacientes voltaram com novo quadro de cólica biliar (1 após 3 dias e outro após 6 meses) – tratadas por CPRE com sucesso.
Discussão
- Abordagem recomendada
- CPRE terapêutica: pacientes de alto risco
- CPRM e / ou ecoendoscopia: risco moderado
- monitorar a evolução clínica de pacientes com baixo risco sem uma investigação mais aprofundada da árvore biliar.
- Apenas 67% dos pacientes de alto risco realmente tinham cálculo (CPRE).
- 20% dos pacientes de baixo risco tinham coledocolitíase (USE e CPRE).
- Os presentes dados apoiam fortemente a necessidade de repensar o papel do ecoendoscopia no manejo de suspeita coledocolitíase.
- 21% de coledocolitíase (< 8 mm): melhora espontânea
- 70% dos pacientes ainda apresentam um risco para as complicações, apoiando assim a necessidade de investigar os pacientes sintomáticos, a fim de identificar aqueles com coledocolitíase para quem um manejo terapêutico adequado é obrigatória.
Conclusão
- Os resultados confirmam que a CPRE indicada pós ecoendoscopia é uma estratégia precisa, segura e rápida, como um primeiro passo no manejo de pacientes com suspeita de coledocolitíase.
- Esta técnica permite não apenas identificar os pacientes que serão beneficiados com a CPRE terapêutica, mas também para selecionar os pacientes que não precisam de CPRE (custo-efetivo).
- As guidelines atuais devem considerar a ecoendoscopia como um procedimento de rotina para todos os pacientes com suspeita de coledocolitíase e, idealmente, os gastroenterologistas responsáveis pela CPRE devem ser treinados em ecoendoscopia
Link para o artigo original
Profilaxia da pancreatite pós CPRE. O que realmente funciona?
Diretrizes – Papel da CPRE nas doenças benignas do trato biliar.
Artigo comentado – Papel do refluxo duodeno biliar em pacientes com cálculos biliares recorrentes.
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O autor
1 Comentário
Kengo, Parabéns pelo post, muito interessante este tema.
Apesar de ser um estudo não comparativo e com acompanhamento de 6 meses apenas, acredito que o EUS sirva sim como uma boa ferramenta na seleção dos pacientes com suspeita de coledocolitíase que devem ser submetidos posteriormente à CPRE.
A RM também pode ser um método de avaliação pré-CPRE nesses pacientes, mas o EUS tem mostrado maior acurácia, principalmente em pacintes com cálculos pequenos, barro biliar e com via biliar não dilatada (Verma D, et al. GIE 2006).
Abraço