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Técnica modificada para realização da gastro-jejunostomia endoscópica percutânea

por Renzo Feitosa Ruiz
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Modified technique for percutaneous endoscopic gastrojejunostomy placement

Rev. Col. Bras. Cir. 2017; 44(4): 413-415

 

INTRODUÇÃO

A realização da gastrostomia endoscópica percutânea (PEG) proporciona nutrição enteral segura e a longo prazo em pacientes com disfagia ou ingestão oral insuficiente(1).

No entanto, as complicações relacionadas à nutrição gástrica, como pneumonia por aspiração e vazamento periostomal grave, podem impedir o uso da PEG. A nutrição jejunal pode superar essas complicações com o fornecimento de dieta após o piloro(2) .

A alimentação jejunal é comumente obtida colocando-se uma extensão jejunal através de um tubo de PEG existente. Este procedimento é referido como gastrojejunostomia endoscópica percutânea (PEG-J). A PEG-J tem algumas indicações frequentes como (3):

  • gastroparesia grave
  • obstrução pilórica
  • pacientes com gastrostomia, mas com refluxo gastroesofágico grave, e aspirações pulmonares de repetição

 

Diversas técnicas para realização da PEG-J já foram relatadas na literatura, com significativas variações técnicas entre elas e diferentes impactos na taxa de sucesso do procedimento. Neste artigo sugerimos modificações à técnica inicialmente descrita por Sibille et al. 4 , para minimizar o risco de uma de suas principais complicações: a migração da extensão jejunal de volta para o estômago.

 

RELATO TÉCNICO

A técnica modificada que estamos sugerindo deve ser realizada por um endoscopista juntamente com outro médico ou um auxiliar. Após a realização da gastrostomia endoscópica percutânea (PEG) como descrito por Gauderer, Ponsky e Izant com uma sonda de 24 Fr, o gastroscópio deve ser reintroduzido no estômago e posicionado logo abaixo da junção gastroesofágica (Figura 1). O estômago deve ser mantido insuflado enquanto o auxiliar avança o anteparo interno da sonda de gastrostomia em direção ao piloro. Eventualmente pode ser necessário usar a ponta do endoscópio para guiar a direção correta do anteparo e, se esta manobra falhar, um pinça de corpo estranho pode ser usada para carregar o anteparo interno da sonda em direção ao piloro, conforme descrito por Sibille et al. 4. Uma vez que o anteparo interno estiver posicionado na região pré-pilórica, a sonda de gastrostomia deve ter seu lúmen bem lubrificado com gel. Em seguida, o auxiliar avança suavemente a extensão jejunal através do lúmen da sonda de gastrostomia para passar o piloro em direção ao intestino delgado (a extensão jejunal atravessará diretamente o piloro sem o uso de um fio-guia). Neste ponto, o auxiliar puxa ligeiramente de volta a sonda de gastrostomia apenas para permitir que o endoscopista possa apreender a extensão jejunal com uma pinça de corpo estranho. Esta manobra irá assegurar a posição da extensão jejunal até o final do procedimento. Sob controle da visão endoscópica, o auxiliar novamente puxa a sonda de gastrostomia de volta em direção à parede gástrica até sentir resistência, o que indica que o anteparo interno está em contato novamente com a parede gástrica. Finalmente, a extremidade proximal da extensão jejunal deve ser conectada à sonda de gastrostomia e tanto a pinça como o gastroscópio são então removidos.

DISCUSSÃO

Os pacientes em condições críticas e geriátricos frequentemente necessitam de nutrição enteral, que é preferível à parenteral. No entanto, o esvaziamento gástrico é comumente prejudicado por gastroparesia, particularmente em pacientes com diabetes ou com comorbidades graves(4,6). Para permitir um fluxo adequado da dieta enteral para o intestino delgado e diminuir a regurgitação ou aspiração, a dieta deve ser fornecida após o ângulo de Treitz. Assim, a PEG-J ainda é a melhor opção para esses pacientes. Além disso, a PEG-J possibilita a sucção gástrica para reduzir a regurgitação.

O procedimento de colocação de uma PEG-J, entretanto, é muitas vezes um desafio técnico. Neste artigo demonstramos uma técnica modificada para a colocação da PEG-J com objetivo de evitar a principal dificuldade do procedimento: formação de alça na extensão jejunal dentro do estômago.

Fluoroscopia e fio-guia não são necessários com o uso desta técnica. Na verdade, o fio-guia em si não impede a possibilidade de formação de alça enquanto se avança a extensão jejunal. E a visão endoscópica após o posicionamento da extensão jejunal no intestino delgado torna a fluoroscopia desnecessária.

Além disso, não foi adotada a técnica de passagem inicial de um fio-guia, conforme descrito por DeLegge et al. (7), pois em alguns casos esta abordagem tornou a extensão jejunal mais rígida, e impediu a passagem da extensão do bulbo para o segunda porção duodenal.

CONCLUSÕES

O passo chave na nossa técnica modificada é o posicionamento da sonda de gastrostomia junto ao piloro enquanto a extensão jejunal é avançada através do duodeno. Esta simples manobra, realizada sob controle visual, evitou a formação de alça dentro do estômago na extensão jejunal, que muitas vezes pode complicar o procedimento e torná-lo mais demorado.

Após a realização de diversos casos, tive dificuldade em posicionar alguns anteparos na região pré-pilórica devido à desvios do piloro, fato que por vezes impediu o sucesso do procedimento. Portanto, comecei “intubar” o piloro com anteparo interno posicioná-lo no bulbo duodenal (sempre com auxílio de uma pinça; de corpo estranho se possível). Veja foto abaixo. Com essa manobra observei que a taxa de sucesso aumentou consideravelmente.

E você ? Também já sofreu para passar uma sonda dessas ? Relate sua experiência para nós. Assim todos poderemos aprender juntos !

REFERÊNCIAS

1. Toh Yoon EW, Yoneda K, Nakamura S, Nishihara K. Percutaneous endoscopic transgastric jejunostomy (PEG- -J): a retrospective analysis on its utility in maintaining enteral nutrition after unsuccessful gastric feeding. BMJ open Gastroenterol. 2016;3(1):e000098. Erratum in: BMJ Open Gastroenterol. 2016;3(1):e000098corr1.

2. Zhang Z, Xu X, Ding J, Ni H. Comparison of postpyloric tube feeding and gastric tube feeding in intensive care unit patients: a meta-analysis. Nutr Clin Pract. 2013;28(3):371-80.

3. DiSario JA. Endoscopic approaches to enteral nutritional support. Best Pract Res Clin Gastroenterol. 2006;20(3):605-30.

4. Sibille A, Glorieux D, Fauville JP, Warzée P. An easier method for percutaneous endoscopic gastrojejunostomy tube placement. Gastrointest Endosc. 1998;48(5):514-7.

5. Gauderer MW, Ponsky JL, Izant RJ Jr. Gastrostomy without laparotomy: a percutaneous endoscopic technique. J Pediatr Surg. 1980;15(6):872-5. 6. Heyland D, Cook DJ, Winder B, Brylowski L, Van deMark H, Guyatt G. Enteral nutrition in the critically ill patient: a prospective survey. Crit Care Med. 1995;23(6):1055-60. 7. DeLegge MH, Patrick P, Gibbs R. Percutaneous endoscopic gastrojejunostomy with a tapered tip, nonweighted jejunal feeding tube: improved placement success. Am J Gastroenterol. 1996;91(6):1130-4

 

Renzo Feitosa Ruiz
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Doutorado pelo Depto. de Gastroenterologia da Faculdade de Medicina da USP

Especialização em Motilidade Digestiva pelo Depto. de Gastroenterologia da Faculdade de Medicina da USP

Médico do Serviço de Endoscopia Digestiva do Hospital Israelita Albert Einstein

Médico do Serviço de Endoscopia Digestiva do Hospital Alemão Oswaldo Cruz


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6 Comentários

Renzo Feitosa Ruiz 02/09/2017 - 9:50 am

Ola, Ernesto. Conheço essa sonda que você falou, mas não tenho experiência alguma com seu uso. Já vi colegas apanharem bastante com ela. Oq pode ser feito nesses casos de troca de sonda de G-J é o uso de Buscopan, principalmente nesse tipo que você citou, que a parte jejunal é mais grossa, tvz o eelaxamento do piloto ajude na passagem do sistema. Outra coisa é o uso de um colono pediátrico, infelizmente pouco disponível, mas que já usei, e ajuda bastante para levar a sonda o mais distante possível. E por fim, levar apenas o fio guia até o duodeno, mantendo-o sempre tensionado, e somente aí passar essa sonda por cima dele. São opções que podemos usar para tentar apanhar menos nessas situações. Abs

Ernesto Quaresma Mendonça 01/09/2017 - 6:42 pm

Olá pessoal! Muito boa a dica técnica Renzo! Gostaria de fazer uma pergunta, vocês conhecem/tem experiência com aquela sonda gastrojejunal que é inteiriça? Auxiliei em uma troca de uma dessas sondas esta semana e tivemos muita dificuldade. A sonda é da marca Halyard (MIC* GJ Feeding Tube, Endoscopic/Radiologic). A paciente tinha uma hernia hiatal grande o que dificultou muito o procedimento, sendo que a sonda ficou enrolada na hérnia, mesmo após várias tentativas. Penso que o fato da sonda ser uma peça única, impossibilitando a manipulação em separado da via jejunal da gástrica, dificulta bastante o posicionamento adequado. Ela vem com um fio amarrado na ponta distal para que possa ser levada junto ao aparelho, mas pelo fato de ser mais grossa (a parte jejunal), torna-se bem difícil a transposição pilórica junto ao aparelho. Vem também com um fio-guia, para o caso de tentativa de troca por radioscopia, mas o fio guia pode sair pelas aberturas laterais, da sonda, antiga, como aconteceu conosco. Alguém já usou esta sonda? Abraços.

Renzo Feitosa Ruiz 28/08/2017 - 6:16 pm

Olá, André. Apenas li relatos dessa técnica onde aplica-se um clipe para fixar a sonda no jejuno, portanto não posso opinar se ela é de fácil realização. Dessa maneira que você relatou eu já fiz, mas achei um pouco mais difícil do que levar o anteparo interno no bulbo. Você já tentou fazer dessa maneira que descrevi ? Obteve sucesso ? Grande abraço.

André Océa 28/08/2017 - 5:05 pm

Renzo, boa técnica mesmo! Tenho feito a apreensão, com pinça, da sonda jejunal, logo que a mesma é introduzida no estômago e não a deixo “barrigar” pra o fundo gástrico, umas das dificuldades desse procedimento!
Tem um vídeo tutorial de uma marca que orienta levar a sonda pelo fio que vem na ponta, com o clipador e clipar a sonda na porção mais distal do jejuno, vc tem alguma experiência com isso?
Deixar a sonda jejunal presa com um clip?

Renzo Feitosa Ruiz 28/08/2017 - 11:46 am

Olá, Ivan. Boa pergunta! Na verdade, em todos os casos que realizei utilizei esse técnica em pacientes que já haviam feito a gastrostomia há no mínimo 3 semanas, e por algum motivo, ela estava disfuncionante. Com esse período o estômago encontra-se aderido à parede e a chance de desabamento e mesmo pneumoperitonio é mínima. Como nessa técnica o anteparo interno é levado até o bulbo, não acho prudente que seja realizada em casos de primeira punção, pois as chances de complicações nesse momento são maiores. Abs.

Ivan R B Orso 28/08/2017 - 8:56 am

Renzo, a passagem de uma sonda jejunal pela gastrostomia as vezes pode ser um procedimento bastante trabalhoso. O posicionamento do anteparo interno da sonda de gastrostomia na região pré pilórica é uma ótima ideia e parece facilitar bastante a passagem da sonda jejunal.
Você costuma realizar a gastrostomia e passar a sonda jejunal no mesmo procedimento? Nos casos em que você utilizou esta técnica, houve uma maior incidência de pneumoperitônio?
Abraço!

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