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Artigo comentado: Over-the-scope clip as first-line treatment of peptic ulcer bleeding: a multicenter randomized controlled trial (TOP Study)

por Mateus Pereira Funari
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Publicado por Soriani et al. na Endoscopy em maio de 2024 (1).

Introdução

As hemorragias digestivas altas (HDA) são frequentes na prática clínica e sua principal etiologia envolve as úlceras pépticas. Recentemente, os “over-the-scope clips” (OTSC) vêm sendo empregados para a hemostasia em úlceras pépticas, inclusive como primeira linha. Estudos envolvendo diferentes etiologias demonstraram melhores resultados para o OTSC quando comparado ao tratamento padrão com clipes convencionais (“through-the-scope clips” – TTSC) (2-4). Visando compreender melhor a eficácia do OTSC, este estudo inclui apenas HDA por úlcera péptica, randomizando o tratamento para OTSC ou TTSC.

Métodos

O estudo foi conduzido em cinco centros europeus. Pacientes com HDA submetidos a EDA em até 24h da admissão com classificação de Forrest Ia, Ib e IIa (inclusive após remoção de coágulo) foram randomizados para OTSC ou TTSC. Nos casos de Forrest I submetidos a terapia com TTSC, associou-se rotineiramente o tratamento com solução de adrenalina conforme recomendação do Guideline da ESGE (5). Neste mesmo grupo, as úlceras Forrest IIa poderiam ter terapia associada com adrenalina ou não. Não houve limite na quantidade de clipes empregada em ambos os grupos.

O desfecho primário foi ressangramento em 30 dias; os secundários correspondem a sucesso clínico, necessidade de nova EDA, necessidade de transfusão de concentrado de hemácias, tempo de internação, mortalidade em 30 dias e complicações associadas a terapia endoscópica.

Resultados

Entre 2018 e 2022, foram incluídos 112 pacientes (OTSC = 61 x TTSC = 51). Todos os pacientes foram classificados como Forrest I ou IIa (15 casos após remoção de coágulo) e receberam altas doses de IBP peri-procedimento (dose não especificada). Os grupos foram similares considerando as características dos pacientes (uso de AINE, anticoagulantes, antiplaquetários, DAOC, alterações hemodinâmicas, RNI, Hb, etc) e da úlcera (tamanho, topografia, Forrest, etc).

Apenas um paciente no grupo do OTSC recebeu um segundo clipe. No grupo TTSC, a média foi de 2 clipes (variação de 1 a 8) e 28/51 receberam injeção de solução de adrenalina.

Em relação ao desfecho primário, não houve diferença entre os grupos: OTSC 1/61 paciente (1,6%) x TTSC 2/51 (3,9%) apresentaram ressangramento dentro de 30 dias (RR = 0,42 (95%CI 0,04 – 4,53, P = 0,47). Todos os casos foram tratados adequadamente em uma segunda endoscopia: o sangramento no grupo do OTSC foi resolvido com clipes convencionais e os dois casos do braço TTSC foram resolvidos, um com OTSC, e outro com método térmico.

No tocante aos desfechos secundários, a hemostasia inicial foi maior no grupo do OTSC: 98.4% (60/61) x 78.4% (40/51) (RR = 1,25, 95%CI 1,08 – 1,45, P = 0,003). O caso de insucesso inicial do OTSC foi tratado com TTSC; dos 11 casos de insucesso inicial do TTSC, 10 foram resolvidos com OTSC e um precisou associar ainda, método térmico e pó hemostático. Vale ressaltar que dos 11 casos de falha do TTSC, 7 eram úlceras fibróticas e 3 localizadas na parede posterior do bulbo.

Não houve diferença em termos de transfusão sanguínea (p = 0,66), tempo de internação (p = 0,92) e mortalidade em 30 dias (p = 0,18).

Não houve eventos adversos relacionados à terapia endoscópica.

Discussão

Com o desenvolvimento de novas tecnologias, é interessante compreender seu papel e vantagens em relação a outros métodos. Devemos considerar que os métodos que temos atualmente para hemostasia das úlceras pépticas, sendo os principais térmicos e TTSC associados ou não à injeção de adrenalina, são altamente eficazes na grande maioria dos casos. De antemão, reconhecemos limitações principalmente dos TTSC para úlceras fibróticas, de grandes dimensões, e em posições desfavoráveis, como parede posterior do bulbo e pequena curvatura gástrica. Neste contexto, e ainda em casos de falha de um método prévio, ou seja, como terapia de resgate, percebe-se o maior benefício potencial dos OTSC.

O trabalho exposto mostra justamente este resultado, uma vez que o posicionamento/estabilização do cap e maior abrangência tecidual pelos OTSC favorecem este método em casos previamente reconhecidos como de difícil abordagem com os TTSC. A diferença em termos de resultados apresentou-se basicamente no crossover com uso de OTSC em casos de falha de TTSC (11 casos, sendo 7 úlceras fibróticas e 3 na parede posterior do bulbo). Nos demais casos, permanece a impressão de uma alta eficácia dos métodos convencionais (como TTSC) que justifica seu uso, mesmo com os OTSC disponíveis. Por outro lado, também é adequado optar pelos OTSC nestas ocasiões, uma vez que esta recurso apresenta eficácia e segurança similares.

Em outras palavras, em situações “comuns”, podemos optar pelos TTSC ou pelos OTSC, porém em situações em que os TTSC apresentam pior desempenho (ex.: úlceras fibróticas, localização em parede posterior de bulbo e pequena curvatura de corpo gástrico), os OTSC devem ser empregados como primeira escolha.

Esta colaboração foi muito importante em termos de conduta baseada em evidências, pois foi o primeiro trabalho que randomizou OTSC e TTSC no contexto exclusivo de úlceras pépticas. Se por um lado, poderia haver a impressão de que existe uma superioridade em quase todas as situações, do outro, poderia existir o receio de dificuldade técnica e eventos adversos associados. Como habitual, nenhum dos extremos foi demonstrado e cabe o reconhecimento dos benefícios e limitações de cada método para o melhor emprego do arsenal terapêutico disponível. Novos estudos, a experiência prática e o aprimoramento das tecnologias certamente poderão elaborar ainda mais as discussões, bem como aumentar a eficácia das terapias hemostáticas endoscópicas.

Para mais informações sobre HDA clique: abordagem inicial, plano de ação e outras recomendações.

Referências

  1. Soriani P, Biancheri P, Bonura GF, et al. Over-the-scope clip as first-line treatment of peptic ulcer bleeding: a multicenter randomized controlled trial (TOP Study). Endoscopy. 2024;56(9):665-673. doi:10.1055/a-2303-4824. 38599622.
  2. Jensen DM, Kovacs T, Ghassemi KA, Kaneshiro M, Gornbein J. Randomized Controlled Trial of Over-the-Scope Clip as Initial Treatment of Severe Nonvariceal Upper Gastrointestinal Bleeding. Clin Gastroenterol Hepatol. 2021;19(11):2315-2323.e2. doi:10.1016/j.cgh.2020.08.046.
  3. Meier B, Wannhoff A, Denzer U, et al. Over-the-scope-clips versus standard treatment in high-risk patients with acute non-variceal upper gastrointestinal bleeding: a randomized controlled trial (STING-2). Gut. 2022;71(7):1251-1258. doi:10.1136/gutjnl-2021-325300.
  4. Bapaye J, Chandan S, Naing LY et al. Safety and efficacy of over-the-scope clips versus standard therapy for high-risk nonvariceal upper GI bleeding: systematic review and meta-analysis. Gastrointest Endosc 2022; 96: 712–720 doi:10.1016/j.gie.2022.06.032.
  5. Gralnek IM, Stanley AJ, Morris AJ, et al. Endoscopic diagnosis and management of nonvariceal upper gastrointestinal hemorrhage (NVUGIH): European Society of Gastrointestinal Endoscopy (ESGE) Guideline – Update 2021. Endoscopy. 2021;53(3):300-332. doi:10.1055/a-1369-5274.

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