Avaliar endoscopicamente a competência da junção esofagogástrica por meio da observação da prega valvar gastroesofágica, classificando-a em graus que se correlacionam com o risco de doença do refluxo gastroesofágico (DRGE).
Critérios
A aparência da válvula ao retroflexo do endoscópio é graduada de I a IV:
Grau I: prega mucosa proeminente ao longo da pequena curvatura, firmemente adaptadas ao endoscópio.
Grau II: prega presente, mas com abertura intermitente durante a respiração, fechando rapidamente.
Grau III: prega pouco definida, fechamento incompleto ao redor do endoscópio; geralmente associada à hérnia hiatal.
Grau IV: ausência de prega; junção permanece aberta com visualização do epitélio escamoso; hérnia hiatal quase sempre presente.
Aplicação clínica
Predição de doença e necessidade de tratamento
Estudo de coorte (922 pacientes, 6 anos de seguimento, 2023):
Hill III–IV → fortemente associados a esofagite e necessidade de prescrição de uso de inibidores de bomba de próton ao longo do seguimento.
Hill IV → maior associação com esôfago de Barrett.
Hill II–III → maior frequência de esofagite quando comparados ao Grau I.
Observou-se que, à medida que o grau aumenta, cresce também a prevalência de sintomas de refluxo (pirose).
Implicações terapêuticas (ASGE)
Hill I–II → podem ser submetidos a procedimentos endoscópicos de correção de refluxo.
Hill III–IV → geralmente indicam necessidade de tratamento cirúrgico, dado o envolvimento anatômico do hiato e a insuficiência de terapias exclusivamente endoscópicas.
Importância na prática endoscópica
A classificação de Hill fornece um marcador objetivo da barreira mecânica antirrefluxo na transição esofagogástrica, é recomendada por guidelines internacionais e, quando incorporadas à avaliação endoscópica de pacientes com suspeita de DRGE, podem auxiliar tanto o seguimento clínico quanto a estratégia terapêutica (endoscópica vs cirúrgica).
Referências
1- Hill LD, Kozarek RA, Kraemer SJM, Aye RW, Mercer CD, Low DE, Pope CE II. The gastroesophageal flap valve: in vitro and in vivo observations. Gastrointest Endosc. 1996;44(5):541-547. doi:10.1016/S0016-5107(96)70006-8
2- Cheong JH, Kim GH, Lee BE, et al. Endoscopic grading of gastroesophageal flap valve helps predict proton pump inhibitor response in patients with gastroesophageal reflux disease. Scand J Gastroenterol. 2011 Jul;46(7-8):789-96. doi: 10.3109/00365521.2011.579154. Epub 2011 May 26. PMID: 21615222.
3- ASGE Standards of Practice Committee; Desai M, Ruan W, Thosani NC, Amaris M, Scott JS, Saeed A, Abu Dayyeh B, Canto MI, Abidi W, Alipour O, Amateau SK, Cosgrove N, Elhanafi SE, Forbes N, Kohli DR, Kwon RS, Fujii-Lau LL, Machicado JD, Marya NB, Ngamruengphong S, Pawa S, Sheth SG, Thiruvengadam NR, Qumseya BJ; ASGE Standards of Practice Committee Chair. American Society for Gastrointestinal Endoscopy guideline on the diagnosis and management of GERD: summary and recommendations. Gastrointest Endosc. 2025 Feb;101(2):267-284. doi: 10.1016/j.gie.2024.10.008. Epub 2024 Dec 17. PMID: 39692638.
MAPS III (ESGE 2025): Novas Recomendações para Lesões Gástricas
A ESGE atualizou as diretrizes para o manejo de condições gástricas pré-neoplásicas e neoplasias precoces, incorporando novas ferramentas de estratificação de risco, vigilância endoscópica e recomendações práticas para a rotina do endoscopista.
Principais Novidades
Introdução do rastreamento endoscópico para câncer gástrico.
Estratificação de risco baseada em atrofia e metaplasia intestinal.
Definição de intervalos de vigilância conforme grau de alteração histológica.
Uso recomendado das classificações Kimura-Takemoto (atrofia) e EGGIM (metaplasia).
Implementação rotineira de cromoscopia virtual (NBI/BLI) para guiar biópsias.
O que Permanece
Protocolo de biópsias de acordo com o Protocolo de Sydney.
Erradicação do H. pylori como pilar central.
Critérios de indicação e cura pós-ESD.
Vigilância individualizada para grupos de risco.
Aplicações Práticas
1. Rastreamento populacional
Risco populacional:
Alto risco (>20/100.000): EDA a cada 2–3 anos.
Risco intermediário (10–20/100.000): EDA a cada 5 anos.
Baixo risco (<10/100.000): não indicado.
Risco familiar (1º grau):
Início da EDA aos 45 anos ou 10 anos antes do diagnóstico do familiar.
Testes não invasivos para H. pylori entre 20–30 anos.
Idosos (>80 anos assintomáticos):
Screening e vigilância devem ser suspensos.
2. Exame Endoscópico de Alta Qualidade
Cromoscopia virtual para rastreamento, estadiamento e vigilância.
Biópsias dirigidas: 2 fragmentos de antro/incisura e 2 do corpo.
Incisura angularis é opcional (útil se não houver cromoscopia).
Usar Kimura-Takemoto e EGGIM para estratificação de risco.
Caracterização detalhada de lesões (Paris, padrão mucoso e vascular, etc).
Fotodocumentação adequada.
Uso de IA, se disponível.
3. Exames de Estadiamento Pré-Ressecção
EUS, TC e RM não são rotineiros.
Indicados apenas se suspeita de invasão submucosa ou ausência de critério para ressecção endoscópica.
4. Exame Histopatológico
Avaliar grau de displasia, tipo histológico (Lauren/WHO).
Severidade de atrofia e metaplasia intestinal.
Infecção por H. pylori.
Usar termos metaplasia completa/incompleta (não usar tipo I/II/III).
Recomenda-se uso de OLGA/OLGIM para estratificação.
5. Indicações de Ressecção Endoscópica (não modificada)
Displasia em biópsias randomizadas: repetir EDA em 6-12 meses conforme o grau.
ESD é o tratamento de escolha nas lesões superficiais.
EMR: alternativa para IIa ≤ 10 mm de baixo risco.
Indicações de ESD: depende de diferenciação, ulceração e tamanho.
Lesões bem diferenciadas (displasias ou neoplasia intramucosa)
qualquer tamanho se NÃO ulcerada
≤ 30 mm se ulcerada
Lesões com invasão mínima da submucosa, NÃO ulcerada, pode ser considerado ESD nas seguintes situações:
bem diferenciadas e ≤ 30 mm
indiferenciadas e ≤ 20 mm
Levar em consideração idade e comorbidades na tomada de decisão
Levar em consideração idade e comorbidades na tomada de decisão
6. Critérios de Cura Pós-Ressecção (não modificados)
Curativo / muito baixo risco (risco de LFN < 0,5-1%): ressecção en bloc, displasia ou pT1a, bem diferenciado, sem invasão linfovascular – Sem necessidade de investigação ou tratamento adicional.
independentemente do T se não houver ulceração OU
≤ 30 mm se ulcerado
Curativo / baixo risco (risco de LFN < 3%) – Estadiamento + discussão multidisciplinar
Ressecção en bloc, sem invasão linfovascular E:
pT1b, invasão ≤ 500 µm, bem diferenciado, ≤ 30 mm OU
pT1a, pouco diferenciado, ≤ 20 mm, sem ulceração
Risco local (muito baixo risco de LFN, alto risco de recorrência local ou persistência da lesão) – Vigilância, Retratamento)
Ressecção em piecemeal ou com margens horizontais comprometidas em lesão de muito baixo risco (ou baixo risco sem lesão submucosa na margem em caso de piecemeal ou sem margem horizontal positiva se pT1b)
NÃO curativo / Alto risco – ESTADIAMENTO e TRATAMENTO ADICIONAL (CIRURGIA)
margem vertical positiva se CARCINOMA ou invasão LFV ou invasão profunda da submucosa (≥ 500 µm)
pouco diferenciado se ulceração ou tamanho > 20 mm
pT1b, bem diferenciado, SM ≤ 500 µm se ≥ 30 mm
lesão intramucosa ulcerada > 30 mm
7. Seguimento
EDA em 3–6 meses e anual após ressecção curativa ou risco local de recorrência.
EDA 3/3 anos:
Kimura C3+, EGGIM 5+, OLGA/OLGIM III/IV.
Metaplasia gástrica intestinal em 1 segmento + história familiar 1º grau positiva ou metaplasia intestinal incompleta ou persistência da infecção pelo H. pylori
Sem seguimento: atrofia leve/moderada ou metaplasia restrita ao antro sem fatores adicionais.
Utilizar classificações endoscópicas validadas para estadiamento e estratificação de risco de atrofia e metaplasia intestinal (Kimura-Takemoto; EGGIM)
Preferir biópsias dirigidas em relação a biópsias randomizadas no seguimento por estadiamentos avançados de Olga/Olgim.
Recomenda-se erradicação do H. pylori em pacientes com gastrite (atrófica ou não), lesões pré-neoplásicas, neoplasia precoce após ressecção endoscópica, neoplasia avançada após ressecção cirúrgica.
Outras Recomendações
Erradicar H. pylori em gastrite, lesões pré-neoplásicas e após ressecção.
Cessar tabagismo.
Manter IBP se houver indicação clínica.
Considerar AAS em baixa dose se alto risco cardiovascular.
Não usar suplementos (probióticos) preventivamente.
Gastrite autoimune: EDA a cada 3 anos.
Síndromes hereditárias ou câncer gástrico difuso: seguir diretrizes específicas.
Referência
Dinis-Ribeiro M, Libânio D, Uchima H, et al. Management of epithelial precancerous conditions and early neoplasia of the stomach (MAPS III): European Society of Gastrointestinal Endoscopy (ESGE), European Helicobacter and Microbiota Study Group (EHMSG), and European Society of Pathology (ESP) Guideline update 2025. Endoscopy. 2025;57(5):504–554. doi:10.1055/a-2529-5025.
A Crioprevenção com Água Gelada: Uma Nova Ferramenta para Prevenir a Pancreatite Pós-CPRE
A pancreatite pós-CPRE (PPE) é, sem dúvidas, uma das complicações mais frequentes e preocupantes após a colangiopancreatografia retrógrada endoscópica (CPRE). Além do seu impacto na recuperação dos pacientes, a gravidade de casos mais avançados exige atenção redobrada às estratégias preventivas. Nesse contexto, um recente estudo multicêntrico realizado no Japão trouxe uma alternativa inovadora: o resfriamento com água gelada, chamado de crioprevenção.
O Problema: Pancreatite Pós-CPRE
Apesar das taxas gerais de PPE rondarem 10% em pacientes sem qualquer profilaxia, o problema pode alcançar consequências fatais em quadros graves. Métodos tradicionalmente adotados para a profilaxia, como anti-inflamatórios não esteroides (AINEs) retais, têm limitações específicas no Japão, principalmente devido a restrições do sistema de saúde sobre dosagens aprovadas e contraindicações em populações vulneráveis, como pacientes idosos.
A Crioprevenção: Uma Abordagem Simples e Eficaz
Adaptado de Azuma et al. 2025
O estudo, divulgado na Am J Gastroenterol, propôs um método simples e acessível: a irrigação da papila com 250 mL de água gelada ao final da CPRE. Esta técnica reduziu em 52,4% o risco relativo de PPC, com a taxa caindo de 6,8% (grupo controle) para 3,2% (grupo de crioprevenção). A segurança do método foi evidente, sem eventos adversos relacionados diretamente à intervenção.
Os pesquisadores apontaram que o resfriamento atua reduzindo o edema papilar, possivelmente por meio de vasoconstrição e controle da permeabilidade vascular, fatores-chave no desenvolvimento de PPE. O efeito foi ainda mais pronunciado em pacientes de alto risco, como aqueles submetidos a esfincterotomia endoscópica e canulação difícil.
Por Que Essa Técnica É Relevante?
Além dos resultados eficazes, algumas características tornam a crioprevenção uma alternativa promissora:
Simplicidade: A técnica utiliza apenas água gelada administrada com uma seringa, sem a necessidade de equipamentos ou medicamentos especializados.
Custo-baixo: Não há custos adicionais associados à compra de fármacos.
Adequação a Populações de Risco: Particularmente útil para idosos ou pacientes contraindicados ao uso de AINEs.
Segurança: Nenhum evento adverso significativo foi atribuído à crioprevenção.
Limitações do Estudo
Apesar dos resultados entusiasmantes, algumas limitações foram apontadas:
Não foi incluído um grupo controle que utilizasse irrigação com água em temperatura ambiente, impedindo a avaliação do efeito absoluto do resfriamento em relação à irrigação simples.
A ausência de AINEs como comparador limita a aplicabilidade global dos achados.
O volume de água gelada (250 mL) foi uma escolha arbitrária, sugerindo que estudos futuros possam investigar volumes ou durações diferentes para otimização dos resultados.
Por ser um estudo single-blind, a falta de cegamento total pode introduzir algum viés no protocolo.
Conclusão
A técnica de crioprevenção representa um marco no manejo profilático da PPE, oferecendo uma estratégia segura, eficiente e econômica para reduzir essa grave complicação. Especialmente em contextos como o Japão, onde o uso de AINEs é limitado, ou em populações de alto risco, o resfriamento local pode representar uma virada de chave no cuidado pós-CPRE.
Embora ainda existam pontos a serem avaliados em estudos futuros, como a sinergia com AINEs ou outros métodos profiláticos, a crioprevenção já se apresenta como uma ferramenta acessível para a prática clínica global. Afinal, a simplicidade, quando bem fundamentada, pode ser a mais poderosa das inovações.
Referência
Azuma S, Kobayashi Y, Harada R, Yane K, Sawada K, Tsujimoto A, et al. Local post-procedure cryoprevention significantly reduces the incidence of post-ERCP pancreatitis: a multicenter randomized clinical trial. Am J Gastroenterol. 2025;00:1–9. Published online 2025 Jul 10. doi:10.14309/ajg.000000000000000
As lesões subepiteliais são conceitualmente definidas por lesões originadas das camadas muscular da mucosa, submucosa ou muscular própria, as quais podem ocorrer em qualquer órgão do trato gastrointestinal1. O termo lesões submucosas foi antigamente empregado para essas condições, mas não deve ser mais utilizado, pois essa antiga nomenclatura remete a injúrias restritas a camadas abaixo da submucosa2.
O diagnóstico histopatológico definitivo das lesões subepiteliais é de grande importância, pois possibilita a definição do prognóstico, o risco de degeneração neoplásica e definição de conduta entre expectante, vigilância, ressecções endoscópicas ou tratamento cirúrgico. Isso se deve ao fato de existir uma ampla variedade de diagnósticos diferenciais possíveis, cuja evolução, quadro clínico, risco de complicações e taxa de degeneração neoplásica variam consideravelmente.
Epidemiologia
Apesar das lesões subepiteliais poderem ser encontradas em qualquer órgão do trato gastrointestinal, o principal sítio de localização consiste no estômago. Além disso, as exatas taxas de incidência e prevalência dessas condições são desconhecidas devido a carência de estudos epidemiológicos de condições cujo diagnóstico na maioria dos casos é incidental, dificultando o estudo na população geral. Entretanto, alguns dados na literatura já tentaram estimar essa informação, demonstrando uma prevalência de detecção de lesões subepiteliais em 1,9% das endoscopias digestivas altas realizadas na Coreia, sendo que 64,1% foi identificada no estômago.16,19 Outros estudos estimam uma incidência de cerca de 0,36% de lesões subepiteliais diagnosticas por endoscopias digestivas altas de rotina.20-23 Com relação ao prognóstico, a maioria das lesões subepiteliais são benignas ao diagnóstico, sendo estimadas lesões malignas em menos de 15% dos casos.16,18
Quadro Clínico
A grande maioria dos casos apresenta-se assintomático, principalmente lesões inferiores a 2 cm15. Dentre os casos sintomáticos, o quadro clínico é variável conforme localização, etiologia e tamanho das lesões.
Os sintomas mais frequentes são dor abdominal e hemorragia digestiva. Entretanto, podem ocorrer raramente sintomas de suboclusão do trato gastrointestinal, sendo esse quadro mais frequentemente associado a lesões no intestino delgado.
Com relação ao tamanho das lesões, a manifestação de sintomas será variável a depender do órgão acometido. Afinal, lesões menores no esôfago podem se manifestar com disfagia e no reto com alteração de hábito intestinal. A manifestação de sintomas suboclusivos no estômago dependerá da existência de lesões maiores diante do maior volume da câmara gástrica em relação aos demais segmentos do aparelho digestivo.
Apresentações Endoscópicas e Ecoendoscópicas das Lesões Subepiteliais
As lesões subepiteliais apresentam-se à visão endoscópica como um abaulamento ou protuberância de mucosa com tamanho variável. Em geral, a mucosa sobreposta a lesão é íntegra, mas dependendo da etiologia, é possível haver enantema, erosão ou ulceração devido efeito de pressão da lesão ou, mais raramente, degeneração maligna. Outros parâmetros endoscópicos podem ser avaliados e podem permitir uma impressão diagnóstica sobre a lesão, como: coloração, superfície, mobilidade e consistência da lesão.
Algumas manobras simples ao exame endoscópico podem garantir também maior segurança para estabelecer uma impressão de diagnóstico etiológico das lesões subepiteliais, podendo em alguns casos definir conduta expectante para essas lesões. As principais manobras consistem: sinal do travesseiro ou almofada (pillow sign), sinal do rolamento (rolling sign) e sinal da tenda (tenting sign) (figuras 1, 2 e 3).
O sinal do travesseiro consiste em manipular a lesão com a pinça de biópsia, empurrando a mesma. Caso a lesão seja compressível ao toque da pinça e haja retorno a morfologia habitual da lesão após a retirada do instrumento, a lesão é sugestiva de lipoma (98% de especificidade e 40% de sensibilidade)4.
O sinal do rolamento quando presente sugere que a lesão se encontra na muscular própria ou abaixo da mesma. É realizado sob auxílio de pinça de biópsia fechada, deslizando a mesma sobre a lesão, permitindo com que a lesão seja facilmente mobilizada.16
O sinal da tenda apresenta a mesma implicância clínica do sinal do rolamento.16 Sob auxílio de pinça de biópsia, realiza-se apreensão superficial da mucosa sobrejacente a lesão, permitindo com que a mucosa e submucosa se destaquem facilmente da lesão.
Com relação à ecoendoscopia, o método permite avaliar com muita precisão as camadas e interfaces do trato gastrointestinal, sendo o melhor método de imagem para avaliar e caracterizar as lesões subepiteliais. Com uma frequência de varredura entre 5 a 12 MHz, o ultrassom endoscópico permite distinguir as paredes do TGI em 5 camadas: mucosa superficial (1ª camada ou interface fluído luminal e mucosa), mucosa profunda (2ª camada ou muscular da mucosa), submucosa (3ª camada), muscular própria (4ª camada) e serosa (5ª camada) (figura 4)15,24-26.
Imagem 1. Sinal da almofada (“pillow sign”) Fonte: Kim GH et al.16Imagem 2. Sinal do rolamento (“rolling sign”) Fonte: Kim GH et al.16Imagem 3. Sinal da tenda (“tenting sign”) Fonte: Kim GH et al.16Imagem 4. Ecoendoscopia demonstrando lesão com ecogenicidade hipoecoica, ecotextura homogênea, arredondada, limites bem definidos, contornos regulares, medindo 15 mm x 12 mm e inserida na camada muscular própria. A imagem permite demonstrar as camadas mucosa superficial, mucosa profunda, submucosa, muscular própria. Fonte: arquivos do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (ICESP/HCFMUSP).
A tabela 1 demonstra resumidamente os achados endoscópicos e ecoendoscópicos das principais lesões do trato gastrointestinal. E as imagens de 1 a 14 demonstram exemplos de casos de lesões com suas respectivas imagens endoscópicas e ecoendoscópicas.
Lesão Subepitelial
Camada de Origem
Sítios Principais
Ecoendoscopia
Endoscopia
Cisto de duplicação
1ª, 2ª, 3ª, 4ª ou extramural
– Esôfago – Mediastino
– Anecoico – Arredondado ou oval – Sem vascularização
– Normocorado ou ligeiramente translúcido – Superfície regular – Compressível à manipulação
GIST
4ª (principal) 2ª (infrequente)
– Estômato (65%) – Delgado (25%)
– Hipoecoico – Heterogêneo – Com ou sem vascularização
– Normocorado – Superfície regular, com erosão ou ulceração – Consistência endurecida
Leiomioma
2ª (principal) 4ª (infrequente)
– Esôfago
– Hipoecoica – Homogênea – Calcificações no interior
Tabela 1. Achados Endoscópicos e Ecoendoscópicos das Lesões Subepiteliais do Trato Gastrointestinal Adaptado de: ESGE1, ASGE27, ACG14, AGA11, Kim GH16
Abordagem Diagnóstica e Aquisição Tecidual
Como mencionado, a identificação de uma lesão subepitelial é na grande maioria das vezes incidental em uma endoscopia digestiva alta. Os achados endoscópicos somados a propedêutica em muitos casos não irão permitir o estabelecimento de uma conduta definitiva sem o diagnóstico histopatológico. Além disso, as biópsias convencionas de mucosa possuem um rendimento histopatológico extremamente baixo no diagnóstico de lesões subepiteliais, afinal as lesões em sua maioria são revestidas por mucosa íntegra. A realização de biópsias sobre biópsias também não apresenta rendimento significativo (55 a 65% para lesões da terceira camada e 40% para lesões da quarta camada)6,7, não sendo um método de abordagem recomendado.
A Sociedade Europeia de Endoscopia Gastrointestinal (ESGE) recomenda aquisição tecidual de lesões subtepiteliais quando: há suspeita de tumor estromal gastrointestinal (GIST), lesões superiores a 20 mm, lesões com estigmas de alto risco ou necessidade de tratamento cirúrgico ou oncológico. Em caso de lesões assintomáticas compatíveis com lipoma, varizes ou pâncreas ectópico, não há indicação de aquisição tecidual.
Os métodos que permitem aquisição tecidual consistem nos seguintes: biópsia assistida por incisão de mucosa (mucosal incision-assisted biopsy, MIAB), punções ecoendoscópicas com agulha FNA (fine needle aspiration, EUS-FNA) ou com agulha FNB(fine needle biopsy, EUS-FNB).
Em lesões superiores a 20 mm, a ESGE recomenda igualmente como primeira escolha MIAB ou EUS-FNB. Entretanto, lesões inferiores a 20 mm, a ESGE recomenda como primeira linha o MIAB, sendo a EUS-FNB segunda escolha (tabela 2). Afinal, nessas lesões, há menor rendimento diagnóstico com punções ecoguiadas diante de maior dificuldade técnica para aquisição de amostras significativas. Para uma discussão mais aprofundada sobre MIAB, confira esse outro artigo: Biópsia Assistida por Incisão da Mucosa: Quando e Como Fazer?. Com relação às agulhas FNA, estudos prospectivos e retrospectivos vêm demonstrando que FNB possui melhor aquisição tecidual em relação a agulhas FNA quando comparadas a calibres (gauges) semelhantes, apresentando perfis de segurança semelhante e com precisão diagnóstica variando entre 75 a 100%.8-11 Portanto, o III Consenso Brasileiro de Ecoendoscopia recomenda o uso de FNB em relação ao uso de FNA para o diagnóstico de lesões subepiteliais maiores de 20 mm, sendo concordante com o guideline da ESGE13.
Tamanho
Método de Escolha
LSE > 20 mm
1ª escolha: EUS-FNB ou MIAB
LSE < 20 mm
1ª escolha: MIAB 2ª escolha: EUS-FNB
Tabela 2 Recomendações da ESGE
Vigilância
A vigilância consiste no seguimento das lesões subepiteliais, podendo ser realizado por EDA e/ou ecoendoscopia a depender do tamanho da lesão. A ESGE sugere vigilância em lesões subepiteliais esofágicas e gástrica, desde que sejam assintomática e não tenham diagnóstico histopatológico definitivo. Recomenda-se realização de EDA em 3 a 6 meses como primeiro exame de vigilância, sendo seguida de EDA a cada 2 a 3 anos para lesões inferiores a 10 mm, e EDA a cada 1 a 2 anos para lesões entre 10 a 20 mm. Além disso, como alternativa a vigilância de lesões gástricas inferiores a 20 mm e sem diagnóstico definitivo, a ESGE sugere ressecção endoscópica para esses casos.
Em caso de lesões superiores a 20 mm, assintomática e que não tenham sido ressecadas, a ESGE recomenda vigilância com EDA e ecoendoscopia necessariamente, sendo o primeiro controle em 6 meses, sendo seguido de intervalos de 6 a 12 meses.
Além disso, nas seguintes situações, opta-se por conduta expectante, não sendo recomendado vigilância pela ESGE, desde que o paciente seja assintomático e o diagnóstico histopatológico seja definitivo: leiomiomas, lipomas, pâncreas ectópico, tumores de células granulares, schawannomas e tumores glômicos.
Veja Figuras sobre achados endoscópicos e suas correlações ecoendoscópicas a seguir:
Figuras 1 e 2. Imagem endoscópica em visão direta de lesão protrusa entre pequena curvatura e parede posterior de corpo gástrico proximal, revestida por mucosa com superfície regular, normocorada e íntegra. A imagem ecoendoscópica demonstra lesão com ecogenicidade hipoecoica, ecotextura homogênea, formato ovalado, sem características internas, sem vascularização ao doppler, limites precisos, contornos regulares, medindo aproximadamente 20 x 6 mm e inserida em camada muscular própria. Punções ecoguiadas foram realizadas com agulha FNB, sendo o anatomopatológico e imuno-histoquímica compatíveis com GIST gástrico. Fonte: arquivos do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (ICESP/HCFMUSP)Figuras 1 e 2. Imagem endoscópica em visão direta de lesão protrusa entre pequena curvatura e parede posterior de corpo gástrico proximal, revestida por mucosa com superfície regular, normocorada e íntegra. A imagem ecoendoscópica demonstra lesão com ecogenicidade hipoecoica, ecotextura homogênea, formato ovalado, sem características internas, sem vascularização ao doppler, limites precisos, contornos regulares, medindo aproximadamente 20 x 6 mm e inserida em camada muscular própria. Punções ecoguiadas foram realizadas com agulha FNB, sendo o anatomopatológico e imuno-histoquímica compatíveis com GIST gástrico. Fonte: arquivos do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (ICESP/HCFMUSP)Figuras 3 e 4. Imagem endoscópica em visão direta de abaulamento de parede em segunda porção duodenal distalmente à papila duodenal maior, revestida por mucosa com íntegra, de coloração amarelada e superfície regular. A ecoendoscopia demonstra lesão com ecogenicidade hiperecoica, ecotextura homogênea, formato arredondado, medindo cerca de 10 mm no maior eixo, com limites precisos, contornos regulares, medindo cerca de 10 mm no maior diâmetro e inserida em camada submucosa, sendo os achados endoscópicos e ecoendoscópicos compatíveis com lipoma.Figuras 3 e 4. Imagem endoscópica em visão direta de abaulamento de parede em segunda porção duodenal distalmente à papila duodenal maior, revestida por mucosa com íntegra, de coloração amarelada e superfície regular. A ecoendoscopia demonstra lesão com ecogenicidade hiperecoica, ecotextura homogênea, formato arredondado, medindo cerca de 10 mm no maior eixo, com limites precisos, contornos regulares, medindo cerca de 10 mm no maior diâmetro e inserida em camada submucosa, sendo os achados endoscópicos e ecoendoscópicos compatíveis com lipoma.Fig. 5. Imagem endoscópica em visão direta de lesão protrusa em parede anterior de antro gástrico proximal, revestida por mucosa normocorada, com superfície regular, sendo sugestiva de lesão subepitelial.Fig. 6. A ecoendoscopia evidencia lesão com ecogenicidade hipoecoica, ecotextura predominantemente homogênea, formato arredondado, limites precisos, bordos regulares, medindo aproximadamente 13,4 x 12 mm, sem focos hiperecoicos ou calcificações no interior e inserida na camada muscular própria. Punções ecoguiadas foram realizadas com agulha FNB, sendo anatomopatológico e imuno-histoquímica confirmando schwanomma gástrico.Fig. 7 e 8. Imagem de esofagogastroduodenoscopia demonstra lesão protrusa em papila duodenal maior revestida por mucosa enantemática e com superfície com três erosões recobertas por fibrina.Fig. 7 e 8. Imagem de esofagogastroduodenoscopia demonstra lesão protrusa em papila duodenal maior revestida por mucosa enantemática e com superfície com três erosões recobertas por fibrina.Fig. 9 e 10. Imagem à ecoendoscopia demonstra lesão com formato ovalado, ecogenicidade hipoecoica, ecotextura heterogênea, com contornos regulares, sem adenopatia adjacente, sem vascularização ao doppler, sem características internas, medindo cerca de 20 x 11 x 24 mm, inserida na camada submucosa, não havendo acometimento da muscular própria. Foram realizadas punções ecoguiadas com agulha FNA 22 gauge, sendo o anatomopatológico e imunohistoquímica compatíveis com tumor neuroendócrino de papila duodenal bem diferenciado grau 1.Fig. 9 e 10. Imagem à ecoendoscopia demonstra lesão com formato ovalado, ecogenicidade hipoecoica, ecotextura heterogênea, com contornos regulares, sem adenopatia adjacente, sem vascularização ao doppler, sem características internas, medindo cerca de 20 x 11 x 24 mm, inserida na camada submucosa, não havendo acometimento da muscular própria. Foram realizadas punções ecoguiadas com agulha FNA 22 gauge, sendo o anatomopatológico e imunohistoquímica compatíveis com tumor neuroendócrino de papila duodenal bem diferenciado grau 1.Fig. 11 e 12. Esofagogastroduodenoscopia demonstra abaulamento de parede anterior de corpo gástrico proximal, com mucosa normocorada, superfície regular com depressão central, sendo compatível com lesão subepitelialFig. 11 e 12. Esofagogastroduodenoscopia demonstra abaulamento de parede anterior de corpo gástrico proximal, com mucosa normocorada, superfície regular com depressão central, sendo compatível com lesão subepitelialFig. 13 e 14. Ecoendoscopia demonstrou formação com ecogenicidade hipoecoica, ecotextura homogênea, formato ovalado, limites bem definidos, contornos regulares, medindo aproximadamente 13 mm e inserida na camada submucosa. Lesão foi submetida a ressecção endoscópica transmural com dispositivo FTRD. A histopatologia e imunohistoquímica confirmaram TNE gástrico bem diferenciado grau 2.Fig. 13 e 14. Ecoendoscopia demonstrou formação com ecogenicidade hipoecoica, ecotextura homogênea, formato ovalado, limites bem definidos, contornos regulares, medindo aproximadamente 13 mm e inserida na camada submucosa. Lesão foi submetida a ressecção endoscópica transmural com dispositivo FTRD. A histopatologia e imunohistoquímica confirmaram TNE gástrico bem diferenciado grau 2.
Referências
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Profilaxia de pancreatite aguda pós-CPRE: quando utilizar prótese pancreática?
A pancreatite aguda pós-CPRE (PEP, do inglês “post-ERCP pancreatitis“) é uma das complicações mais temidas associadas à colangiopancreatografia retrógrada endoscópica (CPRE). Sua incidência varia entre 3,5% e 9,7%, sendo que de 0,3% a 0,8% evoluem com pancreatite aguda grave, associada a disfunção orgânica persistente. Como não há tratamento endoscópico para PEP, é fundamental que os endoscopistas adotem medidas profiláticas eficazes para diminuir o risco, principalmente de casos graves. Em seu guideline de 2023, a American Society for Gastrointestinal Endoscopy (ASGE) destaca três medidas principais para a profilaxia da PEP: uso de anti-inflamatórios não esteroidais (AINEs) via retal, hidratação intravenosa agressiva e a colocação de prótese pancreática (1). Neste artigo, analisaremos o estudo publicado em 2024 na Lancet por Elmunzer et al., que comparou o uso de AINE via retal com e sem a colocação de prótese pancreática em pacientes de alto risco para PEP, intitulado “Indomethacin with or without prophylactic pancreatic stent placement to prevent pancreatitis after ERCP: a randomised non-inferiority trial” (2).
Métodos
Trata-se de ensaio clínico randomizado (ECR) de não-inferioridade conduzido em 20 centros de referência nos Estados Unidos e Canadá entre 2015 e 2023. O estudo avaliou a eficácia da indometacina via retal em comparação com indometacina via retal associada à colocação de prótese pancreática profilática (PPP) em pacientes com alto risco de PEP.
A) Critérios de Inclusão
Os critérios de inclusão foram baseados nos principais fatores de risco para PEP, divididos em critérios maiores e menores.
Critérios Maiores (≥1):
História pessoal de PEP
Canulação difícil (≥6 min ou ≥6 tentativas)
Pré-corte
Esfincterotomia pancreática
Dilatação balonada da papila sem esfincterotomia
Suspeita de disfunção do esfíncter de Oddi
Critérios Menores (≥2):
Mulher com menos de 50 anos
Pancreatite aguda recorrente (2 ou mais episódios)
Injeção de contraste no ducto pancreático principal
Critérios de Exclusão:
Indicação de ampulectomia
Indicação de prótese pancreática terapêutica
Alergia a AINEs
Pancreatite aguda há menos de 1 semana
Baixo risco de PEP (ex.: esfincterotomia prévia)
B) Procedimentos
Os pacientes randomizados para o grupo de indometacina isolada (grupo IN) receberam 100 mg de indometacina via retal imediatamente antes do procedimento. No grupo da indometacina mais prótese pancreática (grupo PP) a mesma dose de indometacina foi administrada e o endoscopista tentou ativamente a canulação do ducto pancreático principal (DPP) para a passagem da PPP, sem padronização de tempo ou técnica.
C) Desfechos
Primário: Incidência de PEP, definida como dor nova ou crescente no abdômen superior e elevação das enzimas >3x até 24h pós-CPRE.
Secundário: Casos de PEP moderada ou grave.
D) Cálculo Amostral
O cálculo amostral foi realizado com uma margem de não-inferioridade de 5% entre os grupos, considerando uma taxa esperada de PEP de 9,7% e um poder de 85%, resultando em um total de 1950 pacientes.
Resultados
O estudo incluiu 1950 pacientes, com 975 em cada braço e apenas uma perda em cada grupo. O “crossover” no grupo PP – ou seja, pacientes nos quais foi tentado, porém não houve sucesso, na passagem da prótese pancreática – foi de quase 20%, enquanto no grupo IN foi de apenas 1,6% – pacientes que não deveriam ter recebido PPP pelo grupo de randomização, porém o endoscopista optou pela passagem da PPP.
Na análise por intenção de tratamento, foram observados 110 casos (11,3%) de PEP no grupo PP, sendo 58 (6%) PEP moderada ou grave, em comparação com 145 casos (14,9%) no grupo IN, dos quais 78 (8%) foram moderados ou graves. Três óbitos (0,3%) foram reportados, todos no grupo IN. A diferença de risco para PEP entre os grupos foi estatisticamente significativa (3,6% – IC95% 0,6-6,6) a favor do grupo PP (tabela 1).
Intenção de tratamento
Por protocolo
Resultado
Indometacina + PPP (n=975)
Indometacina isolada (n=975)
Diferença de risco (IC 95%)
Indometacina + PPP (n=777)
Indometacina isolada (n=951)
Diferença de risco (IC 95%)
Desfecho primário
Pancreatite aguda pós-CPRE
110 (11,3%)
145 (14,9%)
3,6% (0,6 a 6,6)
90 (11,6%)
137 (14,4%)
2,8% (−0,3 a 6,0)
Desfechos secundários e de segurança
Pancreatite moderada ou grave pós-CPRE
58 (6,0%)
78 (8,0%)
2,1% (−0,2 a 4,3)
45 (5,8%)
74 (7,8%)
2,0% (−0,4 a 4,4)
Pancreatite grave
14 (1,4%)
20 (2,1%)
0,6% (−0,5 a 1,8)
12 (1,5%)
19 (2,0%)
0,5% (−0,8 a 1,7)
Óbito relacionado à pancreatite
0
3 (0,3%)
0,3% (0,0 a 0,7)
0
3 (0,3%)
0,3% (0,0 a 0,7)
Evento adverso grave
352 (36,1%)
355 (36,4%)
−0,3% (−4,6 a 4,0)
282 (36,3%)
345 (36,3%)
0,0% (−4,5 a 4,6)
Admissão na UTI
39 (4,0%)
29 (3,0%)
−1,0% (−2,9 a 0,9)
27 (3,5%)
32 (3,4%)
−0,1% (−2,2 a 2,0)
Tabela 1: desfechos primários e secundários (adaptado do estudo original – Elmunzer et al. (2)).
Dos 188 pacientes que foi tentada passagem de PPP sem sucesso, 19 (10,1%) tiveram PEP.
Realizando testes estatísticos “post-hoc” – ou seja, após a obtenção e análise dos dados e, portanto, sujeitos a mais vieses – os autores identificaram que o grupo IN foi inferior na profilaxia de PEP e teve um risco 32% maior de PEP do que o grupo PP.
Na análise de subgrupos avaliando múltiplas variáveis, os fatores que mais impactaram a diferença entre os grupos favorecendo o grupo PP foram: técnica do duplo-fio guia, esfincterotomia pancreática e não realização de esfincterotomia biliar (tabela 2).
Tabela 2: análise de subgrupos (adaptado do artigo original – Elmunzer et al. (2)).
Ainda foi observado que quantos mais fatores de risco o paciente apresentava, maior proteção a PPP ofereceu, partindo de um número necessário para tratar (NNT) de 44 para os pacientes que tinham apenas 1 fator de risco e chegando a um NNT=7 para pacientes com 3 ou mais fatores.
Conclusão do estudo
Os autores concluem que a combinação de indometacina e prótese pancreática foi superior à indometacina isolada na prevenção de PEP em pacientes de alto risco, especialmente em pacientes com múltiplos fatores de risco. Ainda sugerem maior treinamento na passagem de próteses pancreáticas durante a especialização em CPRE, porém alertam para o cuidado em relação à técnica e ao tempo de tentativa, que não foram padronizados no estudo.
Análise Crítica
Embora o estudo seja um ECR robusto, seus resultados e conclusões devem ser interpretadas com cautela. É fundamental considerar que o estudo foi desenhado como um ECR denão-inferioridade, o que pode gerar inconsistências nas inferências de superioridade. Testes estatísticos “post-hoc” são importantes para aproveitar ao máximo os dados do estudo e levantar novas hipóteses, porém não devem ser a base para conclusões.
A concepção das intervenções nos grupos talvez seja a principal causa dos possíveis equívocos observados nos resultados, os quais levaram a conclusões imprecisas. A profilaxia com prótese pancreática é recomendada pelas principais sociedades de endoscopia dos Estados Unidos e da Europa – ASGE e ESGE – para pacientes de alto risco nos quais o DPP foi canulado de forma inadvertida (1,3). Portanto, esses pacientes deveriam ter recebido a PPP, mesmo quando randomizados para o grupo sem PPP (grupo IN) – o que não ocorreu na maioria dos casos.
Embora o estudo não apresente explicitamente o número de pacientes do grupo IN que sofreram canulação inadvertida do DPP, a Tabela 2 revela parte dessa informação: nesse grupo, houve 68 casos com uso da técnica de duplo fio-guia, 23 esfincterotomias pancreáticas e 1 injeção com acinarização pancreática – totalizando, no mínimo, 92 pacientes com indicação formal para PPP. Considerando que apenas 16 pacientes do grupo IN foram submetidos ao “crossover” para o grupo que recebeu a prótese, pelo menos 76 pacientes elegíveis deixaram de receber a PPP – provavelmente um número ainda maior.
Esse viés é reforçado pelo fato de que os subgrupos que mais contribuíram para a diferença entre as abordagens foram justamente aqueles nos quais ocorreu canulação inadvertida do DPP – como os que realizaram técnica do duplo fio-guia e esfincterotomia pancreática (provavelmente associada à técnica de acesso transpancreático).
Uma concepção metodológica mais adequada teria sido randomizar os pacientes entre dois grupos: um com tentativa ativa de canulação do DPP para passagem de PPP e outro sem essa tentativa. Dessa forma, todos os pacientes com canulação inadvertida do DPP receberiam PPP, independentemente do grupo para o qual foram inicialmente alocados.
É importante contextualizar que o estudo foi iniciado em 2015, quando as recomendações sobre o uso da PPP em casos de canulação inadvertida ainda não eram tão enfáticas quanto são atualmente. Assim, a concepção adotada pode ter sido considerada aceitável à época. Entretanto, como foi publicado em 2024, os autores deveriam ter considerado essas limitações, trazendo a conclusão de que na estratégia desenhada não foi demonstrada a não-inferioridade das abordagens, sugerindo estudos para avaliar se vale a pena ou não tentar ativamente cateterizar o DPP para passagem de PPP, ao invés de estimular essa abordagem – que pode ser perigosa e até aumentar o risco de PEP.
Mensagem Final
A pancreatite aguda pós-CPRE é uma complicação crítica que requer cuidados técnicos e medidas profiláticas. As principais estratégias incluem:
Uso de AINEs via retal antes do procedimento em pacientes sem contraindicação
Hidratação intravenosa agressiva em pacientes sem contraindicação
Colocação de prótese pancreática profilática em pacientes de alto risco com canulação inadvertida do DPP
Embora o estudo de Elmunzer et al. sugira a possibilidade de tentativa ativa de canulação do DPP para passagem de PPP em pacientes de alto risco para PEP, essa abordagem deve ser considerada com cautela, dadas suas implicações potencialmente prejudiciais, e não deve ser praticada de rotina. Trabalhos futuros devem estudar adequadamente essa abordagem antes de novas recomendações serem adotadas.
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Elaboração do laudo no exame de cápsula endoscópica do intestino delgado
O laudo da cápsula endoscópica do intestino delgado é um componente crucial no diagnóstico de diversas patologias gastrointestinais. Sua elaboração deve ser feita de forma detalhada, sistemática e precisa, uma vez que é baseado na análise de uma enorme quantidade de imagens geradas durante o exame. A qualidade desse laudo tem impacto direto tanto no diagnóstico quanto na condução clínica do paciente.
O processo de elaboração do laudo deve seguir uma estrutura lógica, que contempla aspectos anatômicos, localização dos achados, a natureza das alterações e uma estimativa de sua posição dentro do intestino delgado. Inicialmente, o laudo deve apresentar uma visão geral do exame. Devem ser incluídas informações sobre o tempo de percurso da cápsula pelo intestino delgado, a qualidade do preparo gastrointestinal e a presença de eventuais artefatos que possam interferir na interpretação, como reflexos luminosos, bolhas de ar ou resíduos. Também é importante relatar qualquer dificuldade técnica, como sobreposição de imagens ou imagens obscurecidas, e indicar se houve necessidade de intervenção endoscópica adicional. Outro ponto fundamental é informar se o exame foi completo, ou seja, se a cápsula alcançou o ceco.
Em seguida, o laudo deve detalhar as condições anatômicas e patológicas observadas ao longo do exame. Pontos de referência anatômicos reconhecíveis, como a passagem pelo piloro e pela válvula ileocecal, além de características das pregas intestinais e da vascularização, devem ser utilizados para orientar a descrição. Apesar das limitações impostas pelo movimento peristáltico, que faz com que a cápsula avance e retroceda de forma irregular, o exame busca estimar a localização dos achados em segmentos como duodeno, jejuno proximal, médio, distal e íleo terminal.
Para facilitar essa estimativa, adota-se uma divisão pragmática baseada no tempo de percurso da cápsula entre o piloro e o ceco. O tempo total é dividido em três partes iguais, correspondendo aproximadamente aos terços proximal, médio e distal do intestino delgado. Assim, mesmo que a cápsula percorra segmentos de maneira não uniforme — por exemplo, permanecendo mais tempo em um segmento específico — os achados são descritos com base nessa divisão temporal, o que, embora não totalmente preciso, auxilia no planejamento de intervenções subsequentes, como a enteroscopia. Entender como se estabelece essa possível localização ajuda a quem recebe o laudo a formular a melhor intervenção a ser realizada.
Além da localização, o laudo deve tentar caracterizar detalhadamente os achados. Devem ser descritos o tipo de alteração observada, sua aparência, a distinção entre anormalidades patológicas e variações anatômicas normais e, se possível, estimar seu tamanho. Entre os achados patológicos mais comuns estão úlceras, pólipos, angiectasias, áreas de edema e tumores. É essencial ainda avaliar se as características das lesões sugerem benignidade ou malignidade, informações que são fundamentais para guiar a conduta clínica.
Um dos grandes desafios na elaboração do laudo reside na identificação de lesões sutis. Algumas anormalidades podem ser pequenas ou apresentar características discretas, exigindo um olhar treinado para que não sejam negligenciadas. Outro fator complicador é a ausência de controle direto sobre o posicionamento da câmera, o que diferencia a cápsula endoscópica da endoscopia convencional. Isso limita a obtenção de imagens direcionadas e dificulta a captura de detalhes específicos.
Para aumentar a precisão e padronização do laudo, é recomendável utilizar terminologias e escores validados para descrever os achados. Isso facilita a interpretação por outros profissionais de saúde e contribui para a uniformidade dos relatos. É importante também reconhecer as limitações do exame. Caso alguma área não tenha sido adequadamente visualizada ou haja incerteza quanto à natureza de um achado, isso deve ser claramente explicitado no laudo, com recomendação, se necessário, de exames complementares.
O laudo deve ser concluído com um resumo dos principais achados, a provável localização das lesões, e uma avaliação do grau de certeza em relação às observações feitas. Além disso, recomendações para investigação adicional ou acompanhamento devem ser incluídas quando pertinentes.
Em resumo, a interpretação e elaboração do laudo de cápsula endoscópica do intestino delgado requerem um equilíbrio entre rigor técnico e pragmatismo clínico. A abordagem estruturada e a atenção aos detalhes tornam essa ferramenta diagnóstica extremamente valiosa na investigação de doenças do intestino delgado. Apesar das dificuldades para a leitura do exame, com um laudo bem elaborado é possível promover uma abordagem diagnóstica e terapêutica mais precisa, contribuindo significativamente para o manejo eficaz das condições gastrointestinais.
Tenham excelentes laudos!
Referências:
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Doença de Whipple: O que o Endoscopista Precisa Saber
A doença de Whipple é uma condição infecciosa sistêmica rara causada pela bactéria Tropheryma whipplei, que acomete principalmente homens brancos, entre 40 e 60 anos. Como pode simular diversas patologias e afetar vários órgãos, inclusive sem sintomas gastrointestinais, é essencial que o endoscopista esteja atento a esse diagnóstico diferencial.
Um pouco de história…
Descrita pela primeira vez em 1907, a doença foi inicialmente chamada de “lipodistrofia intestinal” devido ao acúmulo de gordura nos linfáticos intestinais. A etiologia infecciosa foi confirmada em 1991 com a identificação do T. whipplei via técnicas moleculares.
Epidemiologia:
Apesar de ser rara (cerca de 30 casos/ano), o T. whipplei é está presente no ambiente, especialmente em esgoto e solo. É mais comumente detectado em trabalhadores da área rural e de pouco saneamento. A doença clássica é rara mesmo entre os portadores assintomáticos da bactéria.
Manifestações clínicas
A apresentação clássica envolve quatro sintomas principais:
Artralgias migratórias (geralmente anos antes dos sintomas digestivos)
Diarreia crônica
Dor abdominal
Perda de peso
Podem ocorrer manifestações isoladas no sistema nervoso central ou em válvulas cardíacas. A doença também pode ser desmascarada por uso de imunossupressores, muitas vezes prescritos para doenças reumatológicas presumidas.
Papel do Endoscopista no Diagnóstico
A endoscopia digestiva alta com biópsias do intestino delgado (jejuno/proximal do duodeno) é essencial.
Achados Endoscópicos Mais Comuns:
Mucosa esbranquiçada ou amarelada
Aspecto de placas ou granulações finas na mucosa do duodeno ou jejuno.
Edema da mucosa
A mucosa pode parecer espessada, pálida ou opaca, com perda das pregas normais.
Linfangiectasia intestinal
Dilatação dos vasos linfáticos pode dar aspecto leitoso ou de mucosa brilhante e friável.
Nódulos milimétricos
Pequenos nódulos na mucosa, principalmente no duodeno, conferem um aspecto de “mucosa em pedra de calçamento”.
Aspecto de mucosa atrófica ou ulcerada
Em casos mais avançados, pode haver áreas de erosão, atrofia ou até úlceras superficiais.
Achados endoscópicos em um paciente com Doença de Whipple: pontos esbranquiçados com irregularidade de pregas duodenais e erosões. Na cromoscopia com NBI e magnificação se nota vilosidades engurgitadas com dilatação dos linfáticos.
Investigação
Histologia com coloração PAS positiva em macrófagos da lâmina própria
PCR para T. whipplei
Imuno-histoquímica
Doença de Whipple: macrófagos intensamente PAS-positivos ocupando a lâmina própria da mucosa. As células caliciformes também estão positivamente coradas. A borda em escova dos enterócitos aparece marcada (como uma linha roxa intensa). Fonte: Bures et al. Gastroenterology Research and Practice 2013.
Se a suspeita for alta, mas a endoscopia não for diagnóstica, é indicado investigar outros sítios acometidos (líquor, linfonodos, valvas, líquido sinovial).
Importante: mesmo pacientes com apresentação extraintestinal devem realizar endoscopia, já que a participação intestinal subclínica é comum.
Tratamento
A doença era fatal antes da era dos antibióticos. Hoje, o tratamento é efetivo e dividido em duas fases:
Fase inicial (parenteral):
Ceftriaxona 2g IV 1x/dia ou
Penicilina G 2-4 MU IV 4/4h
Duração: 2 semanas (4 semanas se acometimento do SNC ou endocardite)
Fase de manutenção (oral por 1 ano):
TMP-SMX (160/800 mg) 2x/dia
Importante: O T. whipplei é resistente a fluoroquinolonas e a atividade do TMP-SMX é atribuída apenas ao sulfametoxazol.
Considerações finais para o endoscopista
Suspeite da doença em pacientes com síndrome diarreica crônica, perda de peso e artralgias, especialmente se do sexo masculino e com exposição a solo ou esgoto.
A biópsia de intestino delgado é a chave diagnóstica.
O endoscopista pode ser o primeiro a levantar a hipótese diagnóstica.
Mesmo rara, a doença de Whipple é potencialmente fatal se não tratada, mas curável com antibioticoterapia adequada. Estar atento à possibilidade diagnóstica é essencial.
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Biópsia Assistida por Incisão da Mucosa: Quando e Como Fazer?
A biópsia assistida por incisão de mucosa (mucosal incision-assisted biopsy, MIAB), denominada também biópsia por incisão única com Kneedle-Knife (incision needle‐knife biopsy, SINK biopsy) ou destelhamento, consiste em uma técnica endoscópica emergente e alternativa, descrita por Yokohata et al em 20075, utilizada para aquisição tecidual de lesões subepiteliais do trato gastrointestinal, que permite o diagnóstico histopatológico e imuno-histoquímico dessas condições.
O MIAB vem emergindo como método de abordagem de lesões subepiteliais, pois é de baixo custo-econômico e menor curva de aprendizado, mas com tempo de procedimento maior, sendo assim uma alternativa às punções ecoendoscópicas em centros de menor complexidade e com menos recursos.
Quando indicar?
O estabelecimento diagnóstico histopatológico e imuno-histoquímico das lesões subepiteliais possui importância fundamental na definição precisa de prognóstico, potencial de degeneração maligna e definição de conduta entre expectante, vigilância endoscópica e ressecções endoscópica ou cirúrgica.
Entretanto, como abordado no artigo de lesões subepiteliais, não são todas as lesões que devem ter diagnóstico anatomopatológico para definição de conduta e seguimento do caso, havendo indicações precisas para se realizar biópsias dessas lesões.
Em caso de necessidade de aquisição tecidual das lesões subepiteliais, deverá se optar por um dos três principais métodos diagnósticos: MIAB, punções ecoendoscópicas com agulha FNA (fine needle aspiration, EUS-FNA) ou com agulha FNB (fine needle biopsy, EUS-FNB).
As indicações do MIAB estão bem determinadas nos guidelines da Sociedade Europeia de Endoscopia Gastrointestinal (ESGE) e Colégio Americano de Gastroenterologia (ACG).
A ESGE recomenda que para lesões subepiteliais maiores de 20 mm, MIAB ou EUS-FNB podem ser igualmente empregados. Entretanto, em lesões subepiteliais inferiores a 20 mm, o MIAB é a primeira escolha devido maior rendimento diagnóstico, sendo a EUS-FNB segunda escolha (tabela 1).1 Com relação a taxa de rendimento do MIAB, a mesma foi avaliada em algumas metanálises, sendo demonstrado rendimento diagnóstico de 89% (IC 95% 82,7%-93,5%) para lesões subepiteliais do trato gastrointestinal superior com diâmetro médio de 21 mm, sendo 94,8% das lesões localizadas no estômago1,29.
A ACG sugere o MIAB quando o diagnóstico definitivo é necessário e as punções ecoendoscópicas prévias (FNA ou FNB) tenham sido inconclusivas.14 A diretriz recomenda igualmente como primeira escolha EUS-FNB sem avaliação macroscópica do patologista em sala (rapid on-site evaluation, ROSE) ou EUS-FNA com ROSE. Afinal, já é bem determinado na literatura que agulhas FNA possuem limitações de aquisição tecidual e seu rendimento diagnóstico adequado depende de um citopatologista em sala para atestar a representatividade da amostra periprocedimento.
A ASGE e AGA em seus guidelines descrevem o MIAB como um método diagnóstico alternativo para as lesões subepiteliais. Entretanto, não se posicionam com relação a situações de aplicabilidade.
Além disso, na escolha do método é importante considerar não somente as recomendações dos guidelines, mas também as particularidades de cada procedimento, custos hospitalares e disponibilidade de recusos. O MIAB foi associado a um maior tempo de procedimento e a um risco de fibrose perilesional, o qual pode dificultar ou impedir futuras ressecções endoscópicas28.
Tabela 1. Recomendações da ESGE¹
Tamanho
Método de Escolha
LSE > 20 mm
1ª escolha: EUS-FNB ou MIAB
LSE < 20 mm
1ª escolha: MIAB 2ª escolha: EUS-FNB
Complicações
As taxas de complicações inerente ao MIAB são baixas. Os eventos adversos mais frequentes incluem: sangramento em cerca de 2 a 5% dos casos, os quais requisitaram transfusão sanguínea e/ou tratamento endoscópico na maioria dos trabalhos29, 30-32; fibrose perilesional pós-MIAB, impossibilitando ressecções endoscópicas futuras; e mais raramente perfuração, a qual não foi observada na maioria dos ensaios clínicos, metanálises e série de casos29, 33, 34.
Como fazer?
Primeiramente, é importante ressaltar os materiais necessários para o procedimento. Necessita-se de um gastroscópio convencional com cap, afinal o uso desse dispositivo permite visualização minuciosa da mucosa e do sítio manipulado por acumular menos resíduos na lente do endoscópio.
Uma faca eletrocirúrgica endoscópica é necessária, sendo sugerido o uso de Needle Knife, pois consiste no instrumento de maior poder de corte e menor poder de coagulação, uma vez que se objetiva realizar incisão precisa da mucosa seguida de divulsão dos tecidos. Um princípio básico relacionado às facas endoscópicas consiste no fato de quanto menor a área de contato do instrumento com a mucosa, maior será o poder de corte e menor será o poder de coagulação (figura 1). Sugere-se utilizar unidade eletrocirúrgica com corte em modo endocut, efeito 3 e 40 W.
Fig. 1. Tipos de facas eletrocirúrgicas (knifes), demonstrando que a medida que reduz a área de contato do instrumento, maior será o poder de corte e menor o de coagulação. Retirado de: Miyajima NT17
Outros materiais necessários consistem em pinça de biópsia para divulsão dos tecidos e aquisição de material, assim como clipes metálicos para fechamento do sítio manipulado pós-procedimento. Caso haja necessidade de controle hemostático peri-procedimento, sugerimos o uso de pinça hemostática coagrasper.
O vídeo 1 e as figuras de 2 a 7 demonstram as etapas do procedimento.
Figura 2 a 7. Etapas da biópsia assistida por incisão de mucosa. Fig. 2. Localização da lesão utilizando gastroscópio convencional com cap.Fig. 3 e 4. Incisão na região central da lesão sob auxílio de needle-knife.Fig. 3 e 4. Incisão na região central da lesão sob auxílio de needle-knife.Fig. 5. Divulsão das camadas com pinça de biópsia.Fig. 6. Exposição da submucosa e da cápsula da lesão (seta verde).Fig. 21. Biópsias da lesão sob visão direta. Nota: Posteriormente, realizou-se incisão da cápsula da lesão para biópsia adicionais e, ao término, colocação de clipes para o fechamento do sítio manipulado. Fonte: arquivos do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (ICESP/HCFMUSP).
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Devemos fixar próteses metálicas totalmente recobertas em patologias benignas?
Resumo do artigo “Evaluating no fixation, endoscopic suture fixation, and an over-the-scope clip for anchoring fully covered self-expandable metal stents in benign upper GI conditions: a comparative multicenter international study” publicado na GIE em março de 2025.
As próteses metálicas endoscópicas foram introduzidas na década de 1990 e tem aplicação no manejo de diversas patologias. No contexto das doenças benignas, que envolvem estenoses, fístulas, perfurações e sangramento refratário de varizes esofágicas, são utilizadas as próteses totalmente recobertas (FCSEMS). Estes modelos de prótese contam com um revestimento de silicone que previne o crescimento tecidual, permitindo sua remoção, porém apresentam maior potencial de migração.
Fig. 1 – Técnicas de fixação das próteses: Superior, clipe over-the-scope. Inferior, sutura endoscópica. Adaptado de Mehta A et al., Gastrointest Endosc. 2025 [1].
O trabalho de Amit Mehta e colaboradores avaliou o benefício da fixação das FCSEMS com clipes over-the-scope ou sutura endoscopica em patologias benignas do trato gastrointestinal superior quando comparados à não fixação. Foi realizado um estudo de coorte retrospectiva que incluiu os dados de 16 centros entre 2011 e 2022, avaliando defechos que envolveram duração dos procedimentos, migração das próteses, sucesso clínico, sucesso técnico e eventos adversos.
Foram incluídos 311 pacientes com 316 FCSEMS colocadas, sendo que em 122 pacientes (39,2%) não foi realizada fixação, em 95 realizada fixação com sutura (30,5%) e em 94 fixação com clipe over-the-scope (30,2%). A necessidade de tratamento endoscópico decorreu da presença de estenose benigna em 174 pacientes (56%), fístula ou perfuração em 135 casos (43%) e sangramento refratário de varizes esofágicas em 2 (0,6%).
A duração dos procedimentos foi de 41,7 ± 34,5 minutos para o grupo sem fixação, 79,5 ± 53,3 minutos no grupo da sutura endoscópica e 66 ± 44,9 minutos nas próteses fixadas com clipe over-the-scope, observando-se menor tempo de procedimento com diferença estatisticamente significativa (p<0,01) quando não realizada fixação da prótese em comparação aos demais grupos. Não houve diferença significativa do tempo de procedimento quando comparadas as duas tecnicas de fixação.
Ocorreu migração de 88 das 316 próteses, 49 (39%) quando não foram fixadas, 23 (24%) nas fixadas com sutura endoscópica e 16 (17%) quando fixadas com clipe over-the-scope, observando-se diferença considerada estatísticamente significativa na comparação da fixação com sutura endoscópica em relação à não fixação (P = .01) e da fixação com clipe over-the-scope com a não fixação (P = .001). Não houve diferença das taxas de migração quando comparados os dois métodos de fixação (P = .2).
Fig. 2 – Comparação de migração das próteses com e sem fixação. Adaptado de Mehta A et al., Gastrointest Endosc. 2025 [1].
Atingiu-se o sucesso clínico em 194 pacientes (62%), 98 dos que apresentavam estenoses (56%), 94 daqueles com fístula/perfurações (70%) e nos 2 pacientes com sangramento refratário por varizes (100%). Comparando-se ao grupo em que não foi realizada fixação (n = 64; 52%) houve maior sucesso clínico nos grupos submetidos à fixação das próteses. No grupo de sutura, 66 casos apresentaram sucesso clínico (69%; P = .02) e no grupo com fixação por clipe over-the-scope 64 pacientes (68%; P = .03).
No que concerne à possível dificuldade de remoção dos clipes over-the-scope, o trabalho destaca que, na maioria dos casos, estes puderam ser retirados apenas com uso de pinça dente de rato, sendo em apenas 7 casos necessário o uso de dispositivo específico.
O artigo realiza tambem uma breve comparação de custos no mercado americano entre a utilização de clipes over-the-scope e sutura endoscópica, que favoreceu numericamente a fixação com over-the-scope, destacando ainda a necessidade de uso de aparelho duplo canal para o dispositivo de sutura.
Os achados do estudo embasam o benefício da utilização de fixação para FCSEMS em patologias benignas do trato gastrointestinal superior, demonstrando redução significativa na taxas de migração e melhor resposta clínica, sem diferença observada entre os métodos de fixação avaliados. O maior sucesso clínico obtido quando fixada a prótese pode ser explicado como uma representação do benefício clínico de reduzir a migração, embora a obtenção de resposta clínica seja multifatorial, dependente da patologia de base e de fatores associados ao paciente.
Comentários
Neste trabalho, os dispositivos de fixação endoscópica demonstraram benefício na redução da migração das FCSEMS com potencial melhora na resposta clínica dos pacientes. À medida que eles se tornam mais disponíveis em nosso mercado, pode ser interessante considerar sua incorporação à prática para obtenção de melhores resultados.
Mehta A, Ashhab A, Shrigiriwar A, et al. Evaluating no fixation, endoscopic suture fixation, and an over-the-scope clip for anchoring fully covered self-expandable metal stents in benign upper GI conditions: a comparative multicenter international study (with video). Gastrointest Endosc. 2025 Mar;101(3):589-597. doi: 10.1016/j.gie.2024.08.015. Epub 2024 Aug 22. PMID: 39179133
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Durante anos, a presença de vasos de grande calibre entre o ecoendoscópio e a lesão representava um obstáculo intransponível. Mas os tempos mudaram: a evolução técnica e a experiência crescente com punção transvascular guiada por EUS/EBUS (TVNA) mostram que esse caminho, antes temido, pode ser seguro e altamente eficaz, desde que bem indicado.
O que é a TVNA?
A TVNA é uma técnica de punção por agulha fina em que a agulha atravessa um vaso sanguíneo interposto (como a aorta, artéria pulmonar ou veia cava) para alcançar uma lesão torácica ou abdominal.
Objetivo: coletar tecido para análise citopatológica ou histológica
Guia: ecoendoscopia em tempo real com doppler
Público alvo: pacientes sem outra via de acesso para diagnóstico
Quando considerar?
Abaixo um fluxograma para indicar a técnica:
Evidências atuais:
Estudo multicêntrico espanhol (Garcia-Sumalla et al., 2020)
Pacientes: 49 (50 procedimentos)
Vasos transfixados: Aorta (n=19), sistema portal (n=17)
Figura: punção ecoguiada transfixando veia cava inferior com agulha 22G para investigação linfonodo suspeito. Imagem retirada de Garcia-Sumalla et al., 2020.
Meta-análise (Giri et al., 2023)
Estudos analisados: 17
Pacientes: 411
Acurácia diagnóstica: 85%
Adequação da amostra: 91,5%
Taxa de sangramento: 1,4% (todos autolimitados)
Técnica passo a passo:
Avaliação prévia com imagem (TC ou RNM)
Estudo cuidadoso com doppler
Evitar vasos com calcificação ou aneurismas
Escolher agulhas finas (FNA 25G ou 22G)
Preferir técnica com ROSE, se disponível
Após punção, monitorar área por 2 minutos com doppler
Observação clínica de 6 horas à 24 horas
Pontos-chave:
Permite diagnóstico de lesões “inacessíveis”
Evita procedimentos cirúrgicos mais invasivos
Alta acurácia quando bem indicada
Necessita de centro especializado
Contraindicado em coagulopatia ou hipertensão portal
Monitoramento rigoroso no pós-procedimento
Ainda sem estudos com FNB
Conclusão
A TVNA representa uma verdadeira virada de chave na econdoscopia diagnóstica. Ao vencer a barreira dos grandes vasos com precisão, segurança e racionalidade, ampliamos o espectro de pacientes que podem se beneficiar de diagnósticos menos invasivos e mais ágeis. É uma técnica que exige respeito, preparo e critério, mas que, nas mãos certas, torna o impossível acessível.
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