II Consenso Brasileiro de Ecoendoscopia

Sete anos após a publicação do I Consenso, a Sociedade Brasileira de Endoscopia Gastrointestinal (SOBED) encorajou a realização de um segundo encontro para reavaliar algumas das conclusões da 1ª edição e debater as indicações evolutivas da ecoendoscopia terapêutica.

O Núcleo de Ecoendoscopia da SOBED, coordenado pelo Prof. Dr. Fauze Maluf-Filho, reuniu-se com endoscopistas de todo o país durante o X Simpósio Internacional de Endoscopia Digestiva e no XV SBAD para formular o II Consenso Brasileiro de Ecoendoscopia, publicado na revista Endoscopic Ultrasound. Seguem abaixo as conclusões desse encontro:

 

Ecoendoscopia no tratamento das varizes gástricas

A obliteração de varizes gástricas com uso do cianoacrilato é efetiva. Recomendação: B – 100% votos; Nível de evidência 2a

Ecoendoscopia (EUS) é útil na avaliação da erradicação das varizes gástricas em caso de dúvida.  Recomendação: B – 100% votos; Nível de evidência 2a

O tratamento ecoendoscópico de varizes IGV 1 e GOV2 através da combinação de cianoacrilato e coil pode ser uma opção na falha do tratamento endoscópico convencional.  Recomendação: C – 100% votos; Nível de evidência 3a

O tratamento ecoendoscópico das varizes de fundo gástrico apresenta eficácia semelhante ao tratamento convencional porém com menor taxa de complicações, especialmente embolia pulmonar (mesmo que assintomática).  Recomendação: C – 100% votos; Nível de evidência 4

 

Ecoendoscopia no estadiamento de neoplasias pulmonares não pequenas células

É recomendada a punção ecoguiada (EUS-FNA e/ou EBUS-FNA) nos pacientes com aumento de linfonodos mediastinas visualizados no PET-TC ou TC.  Recomendação: A – 100% votos; Nível de evidência 1a

A EUS-FNA e/ou EBUS-FNA é recomendadas nos pacientes sem linfonodomegalia mediastinal quando:

  • tumor primário de localização central, ou
  • tumor primário com baixa captação no PET-TC, ou
  • presença de linfonodomegalia ipsilateral hilar (N1).

Recomendação: C e D – 100% votos; Nível de evidência 4 e 5

Complementação com estadiamento cirúrgico (mediastinoscopia ou outros métodos) é recomendado nos casos de punção ecoguiada não conclusiva.  Recomendação: B – 100 % votos; Nível de evidência 2a

EUS-FNA e EBUS-FNA combinados é preferível à execução desses métodos individualmente.  Recomendação: C – 100 % votos; Nível de evidência 4

Nos pacientes com suspeita de metástase na adrenal esquerda é sugerida a realização EUS-FNA para elucidação diagnóstica.   Recomendação: C – 100 % votos; Nível de evidência 4

Nota: EBUS não é amplamente disponível em nosso país.

 

Drenagem biliar ecoguiada
Comparação da drenagem biliar ecoguiada (DBEC) vs transparietal (percuntânea) após falha da CPRE

O sucesso técnico e clínico são similares. Com relação aos eventos adversos apesar de diferentes, apresentam também taxas similares. A expertise local e disponibilidade devem ser levadas em conta na escolha entre as técnicas. Quando disponível a definição do acesso deve ser resultado de uma avaliação multidisciplinar.  Recomendação: B – 85% votos; Nível de evidência: 2b

Acesso intra ou extra-hepático?

Na DBEC, seja pela técnica rendezvous ou transluminal, o acesso intra ou extra-hepáticos podem ser utilizados. Existem poucos estudos prospectivos comparando as duas técnicas. Evidencias atuais sugerem resultados similares porém com menores taxas de complicação no acesso extra-hepático.  Recomendação: B – 95% votos; Nível de evidência: 2b

DBEC por rendezvous vs transluminal  

Existem poucos estudos comparando as duas técnicas, porém eles sugerem resultados e segurança similares.  Recomendação: B – 95% votos; Nível de evidência: 2b

Hepatogastrostomia vs Coledocoduodenostomia

Evidências atuais sugerem eficácias similares, porém menores taxas de complicações em favor da coledocoduodenostomia.  Mais estudos de melhor nível de evidência são necessários.  Recomendação: B – 100% votos; Nível de evidência: 2b

DBEC: Próteses plásticas vs metálicas

No estudo comparativo avaliado foram encontrados sucessos clínicos e técnicos similares apesar da maior taxa de fístula biliar com uso das plásticas. O grupo recomenda o uso de stents metálicos parcialmente ou totalmente recobertos.  Recomendação: C – 100% votos; Nível de evidência: 4

 

Lesões subepiteliais (LSE)
Quando a EUS-FNA é indicada nas LSE ?

É sugerida sua realização nas LSE da muscular própria do estômago, duodeno e reto maiores que 10 mm. LSE não puncionadas devem ser acompanhadas, porém não há consenso do intervalo.  Recomendação: C – 95% votos; Nível de evidência: 4

O uso da elastografia e contraste de microbolhas são opções adicionais na seleção das LSE para punção.  Recomendação: C – 100% votos; Nível de evidência: 4

Metade dos pacientes assintomáticos e sem indicação absoluta de punção se recusam a realizar o seguimento e dois terços recusam ressecção nos casos de aumento de dimensões da LSE. Esses fatos podem sugerir a realização de punção ecoguiada para definição precoce do diagnóstico.  Recomendação: C – 95% votos; Nível de evidência: 4

LSE assintomáticas da muscular própria do esôfago e maiores que 3 cm devem ser puncionadas para diferenciar leiomiomas de outras lesões potencialmente malignas.   Ausência de concordância – 40% votos; Nível de evidência: 4

Na suspeita das seguintes lesões, independentemente do tamanho da lesão, a confirmação histológica é necessária:

  • GIST com indicação de terapia neoadjuvante;
  • metástases intramurais;
  • linfoma;
  • tumores neuroendócrinos;
  • neoplasias extrínsecas.

Recomendação: D – 100% votos; Nível de evidência: 5

Obtenção de material de LSE do trato digestivo: punção ecoguiada vs métodos alternativos.

Punção ecoguiada é o método mais seguro.  Recomendação: A – 100% votos; Nível de evidência: 1b

O tipo de agulha ou calibre não altera a acurácia diagnóstica na punção de LSE. A escolha da agulha depende da localização e da preferência do endoscopista.  Recomendação: B – 100% votos; Nível de evidência: 2b

Métodos alternativos como mucosectomia e “destelhamento” são melhores que a punção ecoguiada nas LSE menores que 20 mm. Na indisponibilidade da ecoendoscopia, estes podem ser utilizados apesar das significantes taxas de sangramento e perfuração.   Recomendação: C – 95% votos; Nível de evidência: 4

Nas LSE acima da muscular própria e menores que 2 cm, onde a punção ecoguiada muitas vezes é insatisfatória, biópsia sobre biópsia, “destelhamento” ou ressecção endoscópica, seja por ligadura, mucosectomia ou ESD, são opções válidas.  Recomendação: C – 100% votos; Nível de evidência: 4

Ressecções endoscópicas de LSE da muscular própria seja por ESD, tunelização ou ressecção transmural, ainda são técnicas sob avaliação e devem ser realizadas em centros de alta expertise.  Recomendação: D – 95% votos; Nível de evidência: 5

 

Ecoendoscopia nas coleções fluidas peripancreáticas (CFP)
Ecoendoscopia na caracterização das CFP

Antes da indicação de drenagem, a ecoendoscopia pode ser usada no diagnóstico diferencial de cisto pancreático neoplásico e detecção de necrose.  Recomendação: D – 100% votos; Nível de evidência: 5

Drenagem ecoguiada de pseudocistos pancreáticos: prótese plástica vs metálica

Taxas de resolução, eventos adversos e recorrências são similares: 85%, 20% e 10%, respectivamente.  Recomendação: B – 100% votos; Nível de evidência: 3a

Drenagem ecoguiada de necrose pancreática delimitada (Walled-off Necrosis): prótese plástica vs metálica

Taxas de resolução, eventos adversos e recorrências são similares: 70-75%, 20% and 10%, respectivamente.  Recomendação: B – 100% votos; Nível de evidência: 3a

Drenagem de CFP com próteses metálicas com aposição de lumens

Os resultados dessas próteses são promissores e podem melhorar os resultados obtidos.  Recomendação: D – 100% votos; Nível de evidência: 5

 

Punção ecoguiada nas lesões sólidas pancreáticas
Quando indicar?
  • Lesões ressecáveis: na suspeita de metástase, linfoma, tumor neuroendócrino ou pancreatite autoimune.
  • Lesões irressecáveis: planejamento oncológico.
  • Ressecabilidade duvidosa: complementação do estadiamento.
  • Se o resultado da punção for negativo para neoplasia, mas a suspeita é alta, nova punção deverá ser realizada.
  • Nos pacientes encaminhados para tratamento neoadjuvante.

Recomendação: B – 100% votos; Nível de evidência: 2a

Elastografia e contraste de microbolhas são métodos complementares que pretendem melhorar o valor preditivo negativo, melhorando o diagnóstico diferencial e guiando o melhor local para punção. Estes métodos não substituem a punção.  Recomendação: B – 100% votos; Nível de evidência: 2b

Técnicas de punção ecoguiada para lesões sólidas pancreáticas

Os resultados na literatura são conflitantes na comparação dos diâmetros das agulhas.  Recomendação: B – 100% votos; Nível de evidência: 2b

A agulha de 25 gauge parece ter uma vantagem diagnóstica nas punções transduodenais.  Recomendação: B – 100% votos; Nível de evidência: 2b

Punções transduodenais não devem ser realizadas com agulha não flexível de 19 gauge devido às dificuldades técnicas.  Recomendação: B – 100% votos; Nível de evidência: 2b

Não existem evidências disponíveis na literatura demonstrando superioridade entre as técnicas de aspiração, uso ou não do estilete e tração lenta (slow pull).  Recomendação: B – 100% votos; Nível de evidência: 2b

A técnica fanning parece reduzir o número de punções para o diagnóstico definitivo.  Recomendação: B – 100% votos; Nível de evidência: 2b

 

Neurólise do plexo celíaco
Injeção unilateral vs bilateral

Eficácias semelhantes.  Recomendação: B – 100% votos; Nível de evidência: 1b

Neurólise do plexo celíaco vs neurólise do gânglio celíaco

Em pacientes com gânglio visível, sua neurólise parece obter um maior alívio da dor, sendo preferível utilizar esta técnica.  Recomendação: B – 100% votos; Nível de evidência: 1b

 

Ecoendoscopia na avaliação de cistos pancreáticos incidentais
Quando é indicada?

Na avaliação dos cistos pancreáticos incidentais identificados e caracterizados preferencialmente por ressonância magnética, cujo resultado é um cisto pancreático de morfologia indeterminada.  Recomendação: C – 100% votos; Nível de evidência: 4

Quando realizar a punção dos cistos pancreáticos incidentais?

Nos cistos de morfologia indeterminada:

– maiores 15mm;

– suspeita de nódulo ou vegetação;

– irregularidade ou espessamento da parede do cisto;

– mudança abrupta do calibre do ducto pancreático próximo ao cisto;

– ducto pancreático principal medindo entre 5 e 9mm

Recomendação: C – 100% votos; Nível de evidência: 4

Notas:

  • a punção não é indicada quando a morfologia do cisto é característica de um cistadenoma seroso, independentemente de seu tamanho;
  • o risco-benefício da punção deve ser ponderado em relação à presença de vasos, ducto pancreático principal ou mais de 10 mm de parênquima normal entre a agulha e a lesão
  • a profilaxia antibiótica está indicada;
  • o material aspirado deve ser enviado para dosagem de CEA, amilase, glicose e para citopatologia, dando preferência ao CEA;
  • no futuro, a avaliação molecular do material aspirado estará disponível e provavelmente será útil para estratificação de risco de malignidade.

 

Link para o artigo original: http://www.eusjournal.com/article.asp?issn=2303-9027;year=2017;volume=6;issue=6;spage=359;epage=368;aulast=Maluf-Filho

 

Referência:

Maluf-Filho F, de Oliveira JF, Mendonça EQ, Carbonari A, Maciente BA, Salomão  BC, Medrado BF, Dotti CM, Lopes CV, Braga CU, M Dutra DA, Retes F, Nakao F, de Sousa GB, de Paulo GA, Ardengh JC, Dos Santos JB, Sampaio LM, Okawa L, Rossini L, de Brito Cardoso MC, Ribeiro Camunha MA, Clarêncio M, Lera Dos Santos ME, Franco  M, Schneider NC, Mascarenhas R, Roda R, Matuguma S, Guaraldi S, Figueiredo V. II  Brazilian consensus statement on endoscopic ultrasonography. Endosc Ultrasound. 2017 Nov-Dec;6(6):359-368. doi: 10.4103/eus.eus_32_17. PubMed PMID: 29251269; PubMed Central PMCID: PMC5752757.




QUIZ! Técnicas de cirurgia bariátrica

Você é bom em anatomia bariátrica?  Demonstre o seu conhecimento identificando corretamente as técnicas cirúrgicas utilizadas baseando-se nas imagens endoscópicas!

Cada uma das 5 linhas de fotos corresponde a uma técnica diferente:




CPRE em mulheres grávidas é seguro ?

Já são muito bem reportados todos os benefícios que os procedimentos endoscópicos podem trazer atualmente aos nossos pacientes. Porém, para uma especial parcela destes pacientes, as gestantes, a eficácia clínica e segurança ainda suscitam dúvidas.

As gestantes estão sujeitas a vários riscos durante os procedimentos endoscópicos, como hipóxia e hipotensão, parto prematuro, trauma e teratogênese. Como regra, os procedimentos devem ser adiados para após o parto.

Porém, as gestantes também estão sujeitas à várias urgências, como : hemorragias digestivas, obstruções intestinais, neoplasias, dificuldade de alimentações e outras, que demandam a realização de procedimentos endoscópicos. Dentre estes, a coledocolitíase é umas das complicações que podem ocorrer durante a gestação e as vantagens de um procedimento menos invasivo, como a colangiografia retrógrada endoscópica (CPRE), são maiores em relação à procedimentos abertos. Outras situações que podem requerer uma CPRE durante a gestação e que dificilmente podem ser postergadas para depois do término da gravidez são: obstruções biliares malignas, colangite e  fístulas ou estenoses biliares.

A gravidez aumenta a chance de colelitíase pois o estrógeno produz aumento na síntese de colesterol, aumentando sua saturação na bile, associado a menor motilidade da vesícula, causada pela progesterona. Apesar da prevalência de 3 a 12% de colelitíase, a coledocolitíase é estimada em cerca de 1 em cada 1000 gestações.

Preparo:

A segurança do procedimento deve abranger todas as áreas. Deve-se sempre contar com a avaliação e sedação pela equipe de anestesia, que será responsável pela escolha das drogas, conforme o trimestre de gestação, manutenção de oxigenação e pressão arterial adequada. A equipe de ginecologia deve ser consultada, com avaliação do feto antes e depois do procedimento. Por fim, o procedimento obrigatoriamente deve ser realizado por profissional capacitado, e com larga experiência, sendo que médicos em treinamento ou profissionais com poucos procedimentos não devem realizar CPRE em gestantes, sem supervisão.

Indicação e tempo de realização:

A indicação adequada é fundamental. Apenas procedimentos com intuito terapêutico devem ser realizados, visto que as complicações habituais da CPRE, podem ser potencialmente mais graves em gestantes.  Colangite, pancreatites biliares graves, coledocolitíase ou lesões ductais são as indicações mais comuns. Vale citar, que adiar procedimentos com indicação formal, com frequência é uma conduta mais deletéria do que possíveis riscos da CPRE.

Em geral, há maior preocupação em indicar procedimentos endoscópicos no primeiro trimestre. Em estudo retrospectivo, CPREs realizadas no primeiro trimestre não diferiram em número de complicações em relação a população geral, porém, houve maior taxa de nascidos pré termo e de baixo peso. Entretanto, também se demonstrou em outro estudo, que a conduta conservadora em pacientes com coledocolitíase levou a maior número de complicações, reinternações , e por fim, maior número de cesarianas. Assim , o tempo ideal de indicação ainda não foi definido.

Precauções:

Radiação

A exposição à radiação é um fator de grande importância e o de maior preocupação. Esta pode ser extremamente deletéria, causando alterações que inclusive podem levar ao abortamento, ou acumulativas, causando danos após longos períodos, como a leucemia. Não há protocolos ou estudos que possam afirmar com certeza os níveis de radiação de segurança. Algumas sociedades de obstetrícia publicaram que um nível de radiação abaixo de 50 mGy estão associados a baixas taxas de aborto e má formações (14s de fluoroscopia em geral liberam cerca de 0,5 mGy de radiação).  Há grande variação pessoal na absorção de radiação, assim não se pode estabelecer padrões. Outros fatores como, tipo de equipamento, uso de proteção, posicionamento do paciente e técnica do endoscopista, parecem ser tão importantes quanto o tempo de fluoroscopia. Deve-se sempre ter em mente, que os efeitos são mais nocivos no primeiro trimestre (efeito tudo ou nada), e sugere-se que toda mulher em idade reprodutiva realize teste de gravidez antes de ser submetida a CPRE.

Várias medidas podem ser adotadas visando diminuir o tempo de exposição:

  • Usar o menor tempo possível para adquirir imagem necessária.
  • Intensificador de imagem o mais próximo possível do paciente
  • Usar colimadores
  • Evitar modos de zoom
  • Utilizar equipamentos modernos com modulação manual de potência (mínimo de 75 Kv)
  • Evitar fotografar procedimentos (há maior dose de radiação em equipamentos que guardam imagens)
  • Utilizar proteção – aventais de chumbo

Há várias publicações, com baixo número de pacientes, de CPRE sem uso de fluoroscopia. Em geral, são procedimentos onde após cateterização profunda (técnica americana, com introdução de cateter tipo “tandem”) onde há aspiração com saída de bile, seguida pela colocação do fio guia e papilotomia com remoção dos cálculos (nota do editor: aparentemente há a certeza do número de cálculos por exames de imagem anteriores). Há também descrição do procedimento em duas etapas, sendo a primeira etapa com colocação de prótese (com técnica semelhante a anterior), e a segunda, após nascimento, com terapia definitiva. Não há indicação formal de nenhum tipo de terapia sem radiação, por falta de estudos.

Bisturi elétrico

O líquido amniótico conduz corrente elétrica, assim a placa do bisturi elétrico deve ser posicionada acima do abdômen (tórax de preferência).

Complicações:

Há poucos estudos específicos com gestantes, mas os dados demonstram que as taxas de perfuração, sangramento e infecção não diferem da população normal submetida à CPRE. Porém, há maior taxa de pancreatite (12% vs 5%), provavelmente pela maior dificuldade do procedimento (uso de fluroroscopia, alterações anatômicas) e menor uso de stents pancreáticos.

Em suma, diante de uma indicação formal de terapêutica por CPRE, com equipe e materiais adequados, e com os cuidados acima, os procedimentos são seguros, e de pouco risco para o feto e para a mãe.

Particularmente tenho pouca experiência, tendo realizado apenas 3 CPREs em gestantes. Uma no primeiro trimestre, uma no segundo e uma no terceiro. Todas com coledocolitíase e icterícia. As três foram monitoradas com cardiotocografia e ultrassonografia fetal imediatamente antes e após o procedimento. Todas em posição supina, com avental duplo sob o dorso e sobre o abdômen. Em uma delas (primeiro trimestre), utilizei gadolínio como contraste, por orientação da equipe de ginecologia, para evitar possíveis má formações de tireoide (aparentemente este risco está restrito ao uso de iodo endovenoso). Os procedimentos não tiveram qualquer tipo de complicação. Foram resolutivos e com baixo tempo de uso total de radiação (menor que 1 minuto). Não houve acompanhamento pós exame.

Portanto, CPREs em gestante são raras, porém, podemos ser solicitados a avaliar e realizar o procedimento em gestantes.

Você tem experiência? Comente abaixo e divida seu conhecimento com a gente!

Veja mais sobre Endoscopia

Bibliografia :

  1. Savas N. Gastrointestinal endoscopy in pregnancy. World J Gastroenterol. 2014 Nov 7;20(41):15241-52. doi:10.3748/wjg.v20.i41.15241. – Open Acces
  2. Agcaoglu O, Ozcinar B, Gok AF, Yanar F, Yanar H, Ertekin C, Gunay K. ERCP without radiation during pregnancy in the minimal invasive world. Arch Gynecol Obstet. 2013 Dec;288(6):1275-8. doi: 10.1007/s00404-013-2890-0.
  3. Magno-Pereira V, Moutinho-Ribeiro P, Macedo G. Demystifying endoscopicretrograde cholangiopancreatography (ERCP) during pregnancy. Eur J Obstet Gynecol Reprod Biol. 2017 Dec;219:35-39. doi: 10.1016/j.ejogrb.2017.10.008.

Confira também: CPRE em pacientes com gastrectomia a Billroth II




QUIZ !!! Teste seus conhecimentos !!!

 

Paciente sexo feminino, 64 anos de idade, portadora de sintomas dispépticos, submetida a EDA com os seguintes achados. Qual é o diagnóstico dessas alterações em segunda porção duodenal?




METÁSTASE GÁSTRICA DE MELANOMA

Metástases gástricas de melanoma

Metástase de melanoma pigmentado constituída de células epitelióides pleomórficas; coloração de hematoxilina e eosina, 40x.

O melanoma maligno é uma das doenças malignas mais comuns que metastatizam para o tubo digestivo. A metástase pode ocorrer no momento do diagnóstico primário ou décadas após, como primeiro sinal de recorrência. Os sítios mais comuns de metástases de melanoma maligno são o intestino delgado (50%), cólon (31,3%), estômago (20%) e ânus e reto (25%)(1).

Já melanoma maligno primário do gastrointestinal pode surgir em várias áreas do trato digestivo: 33% estão localizados na nasofaringe, 5,9% no esôfago, 2,7% no estômago, 2,3% no intestino delgado, 1,4% na vesícula biliar, 9% no cólon, 22% no reto e 31% na região anal (2, 3).

Os pacientes com metástases de melanoma para o TGI podem apresentar sintomas como dor abdominal, disfagia, obstrução do intestino delgado, diarreia, hematêmese e melena (1), mas frequentemente são inespecíficos, e a indicação de realizar a endoscopia normalmente é investigação de anemia crônica por deficiência de ferro (2).

Endoscopicamente, as metástases gástricas do melanoma podem apresentar-se como úlceras pigmentadas enegrecidas, pigmentos enegrecidos difusos na mucosa, múltiplos diminutos nódulos na mucosa ou submucosa, lesões polipoides ou massas extrínsecas. Essas lesões são frequentemente pigmentadas, porém podem apresentar-se de forma não-pigmentadas, mimetizando outras neoplasias epiteliais e linfoma MALT. Portanto, as biópsias são mandatórias em pacientes com história de melanoma submetidos à endoscopia, mesmo em lesões não-pigmentadas. A cápsula endoscópica ou enteroscopia são úteis quando há suspeita de lesão no delgado. O PET-CT tem alta sensibilidade para detectar metástases de melanoma, entretanto não é capaz de detectar metástases gástricas (2).

A intervenção cirúrgica pode ser realizada especialmente em pacientes sintomáticos, para alívio da dor e melhora da qualidade de vida. Médicos oncologistas escolhem imunoterapia sistêmica com o anticorpo monoclonal anti-CTLA4 ipilimumab, que tem sido provada como tratamento efetivo para melanoma metastático (2).

O prognóstico é ruim, com sobrevida média de 4 a 6 meses.

Referência

1. Pommer B et al. Gastric metastases from malignat melanoma. Endoscopy 2008; 40: E30-E31

2. Genova, Pietro; Sorce, Maria; Gabibi, Daniela; Genova, Gaspare; Gebbbia, Vittorio; Galanti, Daniela; Ancona, Chiara; Valerio, Maria Rosaria. Gastric and Retal Metastases From Malignant Melanoma Presenting With Anemia

Hipocrômica e Tratada com Imunoterapia. Case Report In Oncological Medicine. 2017

3. Rai MP et al. BMJ Case Rep 2018. Doi: 10.116/bcr-2018-224914




QUIZ !!! Acerta esse ?

Paciente, feminina, 64 anos, realiza endoscopia digestiva alta de rotina, a qual evidenciou, lesão gástrica subepitelial, medindo cerca de 25 mm, endurecida ao toque da pinça e recoberta por mucosa íntegra. Foi submetida à ecoendoscopia que mostrou uma lesão hipoecoica, homogênea, medindo cerca de 25 mm e inserida na quarta camada.

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Opções endoscópicas no tratamento das complicações do anel de restrição em pacientes pós by-pass gástrico. Série Endoscopia Bariátrica

O anel de contenção no by-pass gástrico (cirurgia de Fobi-Capella) foi muito utilizado no passado com o objetivo de evitar a dilatação da anastomose e perda do efeito restritivo da cirurgia, gerando assim, um melhor resultado na perda de peso a longo prazo.
Apesar das vantagens acima, as complicações do anel são relativamente frequentes. O seu uso está associado à intolerância alimentar (principalmente com carne), vômitos, e em casos mais severos,  desnutrição e deficiência de proteínas. Estas complicações costumam ocorrer tardiamente, e muitas vezes, vários anos após a cirurgia.
O tratamento destas complicações é realizado através da remoção do anel, procedimento que por muito tempo foi realizado cirurgicamente. Esta cirurgia costuma ser trabalhosa devido às aderências na região do coto gástrico e com risco de complicações como sangramento e perfuração.
Atualmente, uma opção menos invasiva tem se apresentado. Vários estudos demonstraram sucesso e segurança no tratamento endoscópico das complicações do anel.

Tratamento endoscópico da erosão do anel com extrusão parcial

 
A incidência da erosão do anel varia na literatura de 1 até 7% dos casos de pacientes operados pela técnica de by-pass com anel. A erosão pode ser assintomática ou estar associada a dor epigástrica, sangramento, náuseas e vômitos.
Após a ocorrência da erosão a remoção do anel deve ser considerada. O diagnóstico desta complicação é fácil, já que é realizado através da identificação de um segmento do anel visível na luz do coto gástrico durante a endoscopia digestiva alta.
 

Anel extruso na luz do coto gástrico


 
A remoção endoscópica costuma ser rápida e fácil, desde que pelo menos 50% do anel esteja visível na luz gástrica. O procedimento é realizado através da secção do anel com tesoura endoscópica e posterior tração com pinça de corpo estranho. Algumas vezes a secção do silicone com a tesoura pode ser difícil. A mobilização do anel até a exposição do nó e secção direta do fio muitas vezes facilita o procedimento.
 

Remoção endoscópica de anel erodindo para a luz do coto gástrico.
Tratamento endoscópico do deslizamento ou obstrução pelo anel sem erosão

 
Nos casos em que o anel está parcialmente erodido e visível na luz gástrica ele pode ser facilmente removido com a técnica descrita previamente. O grande desafio para o endoscopista intervencionista ocorre nos casos onde o anel está causando obstrução e não existe erosão da parede gástrica.
Os sintomas de vômitos frequentes, intolerância alimentar e desnutrição podem ocorrer tanto em pacientes com anéis estreitos ou nos casos de deslizamento do anel com angulação e obstrução da saída do coto gástrico.
 

Dilatação com balão de acalasia

 
Nestes pacientes uma das opções é a dilatação do anel com balão de acalásia de 30 mm. Este procedimento é realizado através da passagem de fio guia na alça eferente e posicionamento do balão sobre o anel seguido de dilatação progressiva sob controle radiológico até a ruptura do anel. A dilatação da anastomose deve ser evitada mas muitas vezes isso acaba sendo impossível devido ao pequeno tamanho do coto gástrico e o grande tamanho do balão (10 cm de extensão). Na maioria dos casos a transição esôfago gástrica ou a anastomose vão ser dilatados junto com o anel.
Um estudo publicado em 2010 incluindo 39 pacientes obteve 66% de sucesso na ruptura completa do anel. Os outros e 34% obtiveram alargamento com melhora dos sintomas mas sem ruptura. Nenhuma complicação grave foi relatada.
A ruptura do anel costuma ocorrer facilmente. Naqueles em que isso não ocorre, a pressão excessiva deve ser evitada. Outro cuidado muito importante é que anéis deslizados e localizados sobre a alça intestinal não devem ser dilatados. A alça de intestino delgado não é tão resistente quanto o coto gástrico, podendo levar nesses casos à perfuração.
 

Dilatação do anel com balão de acalásia.
Remoção do anel com uso de prótese endoscópica

 
As próteses endoscópicas também podem ser utilizadas como primeira opção para o tratamento da obstrução por anel não erodido ou como salvamento nos pacientes em que a ruptura do anel não foi possível através da dilatação com balão de acalásia.
Campos et al em 2016 publicaram um artigo com 41 pacientes onde obteve erosão completa em 21 casos e erosão incompleta permitindo a remoção em um segundo tempo em 17 casos. Em relação às complicações foram relatadas 3 migrações de prótese e 9 estenoses tratadas com dilatação. A melhora da disfagia ocorreu em 78% dos pacientes.
O estudo acima utilizou próteses plásticas (Polyflex 25X21X90 mm). Porém, estas próteses não existem mais no mercado. As próteses indicadas para esta técnica atualmente são as metálicas totalmente recobertas.
A prótese deve ser colocada 2 cm acima do anel e abaixo da transição esôfago-gástrica para evitar vômitos. Ela é mantida por 15 dias e então removida. Se a erosão for completa, o anel muitas vezes sai junto com a prótese. Nos casos de erosão incompleta onde o anel está extruso, mas aparente na luz gástrica, ele deve ser removido após 30 dias da retirada da prótese através de secção e tração com pinça de corpo estranho.

Imagem adaptada de Campos et al 2016. Remoção do anel com auxílio de protese endoscópica. Imagem radiológica da prótese posicionada. Imagens endoscópicas da remoção da prótese e do anel completamente liberado na luz do coto gástrico.

Conclusão

O tratamento das complicações do anel de restrição em paciente pós by pass gástrico através de técnicas endoscópicas aparenta ser seguro e efetivo. Na maioria das vezes é realizado ambulatorialmente e com baixo índice de complicações.

Confira também:  Anatomia endoscópica pós cirurgia bariátrica

 

Referências

Moon Kyung Joo. Endoscopic Approach for Major Complications of Bariatric Surgery. Clin Endosc  2017;50:31-41
Josember Martins Campos, Luis Fernando Evangelista, Alvaro Antonio Ferraz et al. Treatment of ring slippage after gastric by-pass: long-term results after endoscopic dilation with na acalasia balloon. Gastrointestinal Endoscopy 2010;72(1).
Josemberg Marins Campos, Rena C. Moon, Galeno E. J. Magalhães Neto, Andre F. Teixeira, Muhammad A. Jawad, Lyz Bezerra Silva, Manoel Galvão Neto, Álvaro Antônio B. Ferraz. Endoscopic treatment of food intolerance after a banded gastric bypass: inducing band erosion for removal using a plastic stent. Endoscopy DOI http://dx.doi.org/ 10.1055/s-0042-103418


Como citar este artigo: Orso IRB. Opções endoscópicas no tratamento das complicações do anel de restrição em pacientes pós by-pass gástrico; 2018. Disponível em www.endoscopiaterapeutica.net/pt


 




QUIZ! – Qual sua hipótese sobre essas lesões elevadas gástricas?

 

Masculino, 45 anos

Queixa de dor epigástrica e empachamento pós-prandial

AP: HAS em uso de atenolol

AF: n.d.n.




Hemorragia digestiva média

 

Definição

Hemorragia do trato gastrointestinal médio é definida pelo sangramento localizado entre a papila duodenal maior e a válvula ileocecal. Corresponde a cerca de 5% dos casos de hemorragia digestiva.

O sangramento gastrointestinal obscuro é aquele persistente ou recidivante, não esclarecido após o exame de esofagogastroduodenoscopia e ileocolonoscopia. O sangramento obscuro pode ser classificado em:

  • oculto: quando há persistência ou recorrência de anemia ferropriva e/ou da positividade da pesquisa de sangue oculto nas fezes (PSOF), sem alterações visíveis nas fezes
  • evidente: quando há persistência ou recorrência de sangramento visível, após resultados negativos dos estudos endoscópicos.

 

Com os avanços dos exames de imagem do intestino delgado, como a cápsula endoscópica, os exames angiográficos e a enteroscopia assistida, foi possível observar o aumento dos casos diagnosticados de hemorragia obscura do trato gastrintestinal e, como resultado disso, foi proposto a mudança do termo sangramento obscuro do trato gastrointestinal para sangramento do intestino delgado.

O termo sangramento obscuro gastrointestinal, dessa forma, deve ser empregado para pacientes nos quais a causa do sangramento não pôde ser identificada em nenhum local do trato gastrointestinal após uma avaliação completa do mesmo, incluindo o estudo do intestino delgado.

Etiologia

As causas mais comuns de sangramento do trato gastrointestinal médio são: lesões vasculares, neoplasias primárias e metastáticas, síndromes polipoides, divertículo de Meckel, lesões da mucosa por medicações, doença de Crohn e enteropatia portal hipertensiva.

A incidência de cada etiologia está relacionada com a idade, sendo mais comum nos pacientes com menos de 40 anos a seguinte ordem:

  1. tumores do intestino delgado,
  2. doença de Crohn,
  3. divertículo de Meckel,
  4. síndromes polipoides e
  5. angioectasias.

 

Já nos indivíduos com mais de 40 anos, a ordem que predomina é a seguinte:

  1. angioectasias,
  2. ectasia vascular antral,
  3. tumores do intestino delgado,
  4. lesões de mucosa induzidas por medicamentos e
  5. dieulafoy.

Intervenção diagnóstica

Pacientes apresentando sangramento oculto ou evidente devem repetir a endoscopia e/ou colonoscopia a depender da suspeita da origem do sangramento (trato gastrointestinal alto ou baixo). Caso o paciente tenha realizado exame de endoscopia digestiva alta (EDA) recente, uma push enteroscopia poderá ser considerada para afastar lesões no intestino delgado proximal.

Nos pacientes hemodinamicamente estáveis e com endoscopia alta e baixa normais, a cápsula endoscópica é o próximo exame a ser indicado.

Naqueles com suspeita de obstrução ou com anatomia alterada cirurgicamente, a enterotomografia ou enterorressonância deverá ser realizada antes.

A enteroscopia assistida é recomendada como próximo passo no seguimento dos pacientes com resultados positivos da cápsula endoscópica ou dos exames radiológicos.

Pacientes hemodinamicamente instáveis e com sangramento ativo, devem ser encaminhados à angiografia para embolização ou estabilizados para realização de angiotomografia ou cintilografia com hemácias marcadas.

Em pacientes com exames negativos e sangramento recorrente, deve-se considerar a repetição dos exames endoscópicos e/ou radiológicos.

 

A terapia para o sangramento do intestino delgado vai depender da etiologia do mesmo. Lesões proximais podem ser tratadas com o endoscópio convencional. Lesões mais distais, como as angioectasias, podem ser tratadas por enteroscopia assistida ou push enteroscopia.

 

Hemorragia digestiva média

Bibliografia:

ASGE Standards of Practice Committee, Gurudu SR, Bruining DH, Acosta RD, et al. The role of endoscopy in the management of suspected small-bowel bleeding. Gastrointest Endosc. 2017 Jan;85(1):22-31.

Marco PennaziCristiano SpadaRami Eliakim, et al. Small-bowel capsule endoscopy and device-assisted enteroscopy for diagnosis and treatment of small-bowel disorders: European Society of Gastrointestinal Endoscopy (ESGE) Clinical Guideline. Endoscopy 2015; 47(04): 352-386.

Gerson LB, Fidler JL, Cave DR, Leighton JA. ACG Clinical Guideline: Diagnosis and Management of Small Bowel Bleeding. Am J Gastroenterol. 2015 Sep;110(9):1265-87.

 

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Como citar esse artigo:

Sakai CM. Hemorragia Digestiva Média. Endoscopia Terapêutica; 2018. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/assuntosgerais/hemorragia-digestiva-media/

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Pseudolipomatose de cólon

Introdução e etiopatologia

A pseudolipomatose do cólon foi descrita pela primeira vez em 1985(1) e desde então, diferentes patogenias foram postuladas para esta condição, incluindo penetração intramucosa do ar durante insuflação (barotrauma), biópsias ou outros procedimentos.

No entanto, evidências mostraram sua associação com colite química causada pelo peróxido de hidrogênio (H2O2) após desinfecção com ácido peracético. Quando o ácido peracético se dissolve em água, ele se decompõe em peróxido de hidrogênio e ácido acético, que, por sua vez, se transforma em água, oxigênio e dióxido de carbono. Assim, o peróxido de hidrogênio resultante induz colite química causada pela irritação direta da mucosa(2).

Entretanto, há dois relatos na literatura que descreveram seu aparecimento após desinfecção de alto nível com água ácida eletrolisada(3) e Sterilox (água super oxidada)(4); sua patogênese é incerta, pois sabe-se, que, em ambos, não há produção do peróxido de hidrogênio.

Endoscopia

Endoscopicamente, caracterizam-se por placas elevadas, tipicamente esbranquiçadas ou branco-amareladas, aderentes, múltiplas e isoladas, também denominadas de “snow white sign” ou “frozen sign”. Seus tamanhos variam de milímetros a centímetros e são encontradas tanto no cólon esquerdo quanto no direito.

Mecanismos de contato

Há dois mecanismos possíveis de contato da substância com a mucosa, ambos em decorrência da utilização de aparelhos não enxaguados adequadamente:

  1. após irrigação de água pelos canais de água/ar, de trabalho, de corantes (colonoscópios Fujinon) ou pelo canal acessório (colonoscópios Olympus);
  2. em decorrência da insuflação de ar durante a inserção do aparelho no paciente, na qual ocorre pulverização do vapor de peróxido de hidrogênio.

Na primeira situação, as lesões aparecem imediatamente sob visão direta e tem aspecto efervescente; na segunda, elas podem ser desencadeadas à distância, antes mesmo do aparelho chegar ao local, simulando lesões pré-existentes e confundindo o colonoscopista.

Histologia

A histologia mostra criptas aparentemente preservadas, porém espaçadas por numerosos vacúolos vazios, que correspondem a gases sequestrados (setas), semelhantes a adipócitos. A imuno-histoquímica e análise ultraestrutural confirmam ausência de conteúdo lipídico, o que originou o termo “pseudolipomatose”. Estes achados foram reproduzidos em laboratório após instilação de H2O2 em cólon de cobaias(5).

Evolução clínica

Os pacientes geralmente evoluem sem sintomas, mas podem apresentar, em raras exceções, dor abdominal leve e sangramento retal. As lesões regridem espontaneamente, não havendo necessidade de tratamento específico ou hospitalização. Não é achado exclusivo do cólon; pode ocorrer em qualquer mucosa do trato digestório. Portanto, todo cuidado deve ser dado durante o enxague dos aparelhos, para que o ácido peracético e o peróxido de hidrogênio sejam completamente eliminados da superfície e dos canais dos aparelhos, especialmente o dos corantes dos colonoscópios da Fujinon(6,7).

Aspecto histológico de pseudolipomatose do cólon (A- HE, 40x e B- HE, 250 x), com glândulas cólicas aparentemente preservadas, espaçadas pela presença de numerosos vacúolos vazios, que correspondem a gases sequestrados (setas), simulando “adipócitos”.

Conclusão:

A pseudolipomatose do cólon é condição iatrogênica rara, benigna e autolimitada, que, geralmente, se apresenta de forma assintomática, com raros quadros de dor abdominal leve e sangramento retal. Não é achado exclusivo do cólon; pode ocorrer em qualquer mucosa do trato digestório. O aspecto endoscópico e os achados histopatológicos são característicos e as lesões regridem espontaneamente, não havendo necessidade de tratamento específico ou hospitalização.

Referências:

(1)  Snover DC, Sandstad J, Hutton S. Mucosal pseudolipomatosis of the colon. Am J Clin Pathol 1985; 84:575-580.

(2)  Kara M, Turan I, Polat Z, Dogru T, Bagci S. Chemical colitis caused by peracetic acid or hydrogen peroxide: a challenging dilemma. Endoscopy 2010;42 Suppl 2:E3-4.

(3)  Souza JLS, Ribeiro TM, Borges LV, da Silva JGN. Electrolyzed acid water can cause colitis? Endoscopy 2008;40(7):620.

(4)  Suzuki N, Talbot IC, Saunders BP. The “frost sign”: an inadvertent minor complication of endoscopic mucosal resection. Endoscopy 2004;36(9):835.

(5)  Zullo A., Hassan C., Guarini A., Lorenzetti R., Campo S., Morini S. Chemical Colitis due to Peracetic Acid: a case report and review of Literature. Journal of Digestive Endoscopy 2011; 2(1):15-17.

(6)  Cammarota G, Cesaro P, Cazzato A, Fedeli P, Riccioni ME, Sparano L, Vitale G, Costamagna G, Gasbarrini G, Larocca LM. Hydrogen peroxide-related colitis (previously known as “pseudolipomatosis”): a series of cases occurring in an epidemic pattern. Endoscopy 2007; 39:916-919.

(7)  Coriat R, Chaput U, Ismaili Z, Chaussade S. What induces colitis? Hydrogen peroxide or peracetic acid. Endoscopy 2008;40(3):231.