Ética Médica nas Mídias Sociais: O que pode e o que não pode!

O uso das Mídias Sociais estão crescendo exponencialmente nos últimos anos e revolucionaram a prática médica, mudando a forma como estes profissionais de saúde se comunicam, sejam entre si ou com os pacientes, e compartilham experiências.

Cada plataforma de Mídia Social possui recursos específicos para interação entre os usuários. O Facebook é a mais amplamente utilizada com aproximadamente 1,9 bilhão de usuários ativos mensais. Ela permite criar um perfil pessoal, bem como profissional/institucional, que pode carregar informações, comentários e compartilhar materiais. Já o Twitter, outra plataforma também bastante utilizada para fins médicos, tem sido cada vez mais usada em todo o mundo. Nela os usuários podem compartilhar frases com “seguidores” que não excedam 140 caracteres, links diversos, além de fotos e vídeos curtos.

As finalidades mais habituais consistem em oportunidade de visibilidade das realizações, interação com pacientes, transmissão de credibilidade e confiança aos demais usuários, além de geração de tráfego para site de uma possível instituição vinculada.

Outro propósito que ganha cada vez mais adeptos é a atualização dos conhecimentos, visto serem as mídias sociais uma ferramenta rápida e direta, além de lúdica, que permite acesso à informação médica de qualidade. É neste contexto que os veículos produtores/disseminadores de evidência científica, como as revistas médicas internacionais, sites de conteúdo médico e as sociedades de especialidade, podem incrementar de maneira muito significativa o alcance de suas informações e a penetração de suas publicações no meio médico.

Diante de tantas formas de exposição nas mais variadas plataformas de Mídias Sociais, o ético exercício da medicina exige conhecimento e respeito aos limites da propaganda e da publicidade médica. Muitos profissionais ignoram este último ponto e, por vezes, se colocam em situações delicadas de afronta aos critérios estabelecidos pelo Conselho Federal de Medicina (CFM).

O CFM possui duas resoluções – nº 1.974/11 e nº 2.126/15 – que delineiam claramente o que pode e o que não pode ser feito nessa área, estabelecendo os critérios norteadores da propaganda em medicina, conceituando os anúncios, a divulgação de assuntos médicos, o sensacionalismo e a autopromoção. Além destas resoluções, existe a Comissão de Divulgação de Assuntos Médicos (CODAME) do CFM, a qual é resposável por novas proposições/atualizações de resolução acerca do tema, caso necessário, e possui um manual próprio onde estão compiladas todas as informações.

A Resolução nº 2.126 faz uma atualização da 1.974, tratando da ética médica nas redes sociais e na internet. Temas como distribuição de selfies (autorretratos), anúncio de técnicas não validadas cientificamente e a forma adequada de interação dos profissionais em mídias sociais foram abordados nesse documento.

Essa norma explica que os selfies não podem ser feitos em situações de trabalho e atendimento, orienta que nas mídias sociais (sites, blogs, Facebook, Twitter, Instagram, YouTube, WhatsApp e similares), como já havia sido determinado, continua vedado ao médico anunciar especialidade/área de atuação não reconhecida ou para a qual não esteja qualificado e registrado junto aos Conselhos de Medicina, além de desaconselhar expressamente a publicação de imagens do tipo “antes” e “depois”, de compromissos com êxito em um procedimento e a adjetivação excessiva (“o melhor”, “o mais completo”, “o único”, “o mais moderno”), tão naturais em ambiente de competição puramente comercial. A regra em questão também veda ao médico consultar, diagnosticar ou prescrever por qualquer meio de comunicação de massa ou a distância, assim como expor a figura de paciente em divulgação de técnica, método ou resultado de tratamento. Além disso, orienta que nas peças publicitárias sempre constem dados como o CRM e o Registro de Qualificação de Especialista (RQE). No caso de estabelecimentos de saúde, deve ser indicado o nome do diretor-técnico-clínico (com suas informações cadastrais visíveis).

O RQE é um número fornecido, quando do registro (obrigatório) do título de especialista nos Conselhos Regionais de Medicina, a todos os médicos que sejam especialistas em áreas reconhecidas pelo Conselho Federal de Medicina. Para obtenção do Título de Especialista, faz-se necessário realização de Residência Médica na especialidade pleiteada ou ser aprovado na Prova de Título de Especialista realizada pela sociedade da especialidade médica (AMB/CFM). Se você atua na especialidade e faz divulgação da mesma, deve fazer o seu RQE o quanto antes, pois desde 2011, publicidade sem o mesmo é infração ética.

Clique aqui e acesse as Resoluções CFM nº 1.974/11 e nº 2.126/15 na íntegra.

Compilamos as principais recomendações do CFM concernentes a prática ética da publicidade na medicina, sobretudo nas mídias sociais, para auxilar num exercício profissional sem incorrer em infrações éticas:

 




QUIZ ! Lesão esofágica.

Paciente com 38 anos, em avaliação de pirose e regurgitação de longa data, realiza endoscopia, com o seguinte achado em terço distal de esôfago:

Lesão esofágica a luz branca

Lesão esofágica ao NBI.

 




Impacto do índice de massa corporal na incidência e gravidade da pancreatite pós-colangiopancreatografia retrógrada endoscópica

RESUMO

O que já sabíamos:

– Pancreatite aguda é a maior complicação pós-CPRE

– Os fatores de risco relacionados a pancreatite pós-CPRE incluem: dificuldade ou falha na canulação biliar, dilatação balonada do esfíncter, esfincterotomia pancreática e injeção no ducto pancreático

– Os fatores de risco relacionados ao paciente incluem: pacientes jovens, mulheres, suspeita de disfunção do esfíncter de Oddi, história de pancreatite recorrente, história de pancreatite prévia e ausência de pancreatite crônica

Novos achados:

– A obesidade não aumenta a incidência ou a gravidade da pancreatite pós-CPRE

– IMC baixo não impacta na incidência ou na gravidade da pancreatite pós-CPRE

– Concluindo: o estudo mostrou que não há correlação entre obesidade e incidência ou gravidade de pancreatite.  Da mesma forma, os pacientes abaixo do peso não tiveram maior incidência ou gravidade de pancreatite. Estudos futuros sobre o assunto deveriam ser realizados de forma prospectiva, idealmente, para minimizar os vieses e deveriam ser usados outras mensurações da composição corporal para melhor avaliação da obesidade.

Mohamed M. Abdelfataha,b, Nicholas J. Koutlasa , Eric Gochanoura , Ahmed Hameda , Mariam Ibrahima , Mohamed Barakatc , Prashant R. Mudireddya

East Carolina University, Greenville, NC; Emory University, Atlanta, GA, USA

Ann Gastroenterol. 2019 May-Jun;32(3):298-302.

INTRODUÇÃO

Embora considerada segura, a colangiopancreatografia retrógrada endoscópica (CPRE) está entre os procedimentos endoscópicos associados a maior risco de complicações. A pancreatite pós-CPRE (PEP, do inglês pos-ERCP pancreatitis) é a complicação mais comum. A incidência de PEP varia de 1 a 9% em pacientes com risco médio e de 11 a 40% em pacientes de alto risco, com 0,1% de mortalidade.

Os fatores de risco para PEP têm sido exaustivamente estudados e são classificados em:  fatores de risco relacionados ao paciente (pacientes jovens, mulheres, com suspeita de disfunção do esfíncter de Oddi, história de pancreatite recorrente, história de PEP prévia e ausência de pancreatite crônica) e fatores relacionados ao procedimento (dificuldade ou falha na canulação biliar, dilatação balonada do esfíncter, esfincterotomia pancreática e injeção de contraste no ducto pancreático).

Alguns estudos têm mostrado que a obesidade pode contribuir na incidência, gravidade e mortalidade da pancreatite aguda. Isso deve-se provavelmente ao estado inflamatório crônico observado nos pacientes obesos.

A correlação entre obesidade e incidência e gravidade da PEP ainda não está bem elucidada. Um grande estudo retrospectivo, de Deenandayalu e colaboradores, com 964 pacientes, mostrou que a taxa de PEP não foi diferente entre pacientes com índice de massa corpórea (IMC) > 30 kg/m2 e aqueles com IMC < 30 kg/m2 (12,5% vs. 16,4%, respectivamente, p =0,14).

Em contraste, Cotton e colaboradores mostraram que a obesidade está associada com complicações pós-CPRE, incluindo pancreatite.

Um estudo retrospectivo recente com 583 pacientes, de Fujisawa e colaboradores, demostrou que pacientes obesos (IMC > 30) têm uma taxa significativamente maior de PEP comparados com pacientes com sobrepeso (IMC 25-30), com peso normal (IMC 18,5 – 25) e com pacientes abaixo do peso (< 18,5). Entretanto, uma das limitações desse estudo é que apenas 20 pacientes eram obesos. Além disso, Kumar e colaboladores realizaram uma análise na base de dados americana que foi sugestivo que há uma correlação positiva entre obesidade e PEP (odds ratio 1.55, 95% de intervalo de confiança 1.25-1.92).

PACIENTES E MÉTODOS

Estudo retrospectivo com todos os pacientes submetidos a CPRE diagnóstica ou terapêutica de janeiro de 2009 a outubro de 2016. Os procedimentos foram realizados por 04 endoscopistas experientes. Foram coletados os dados dos pacientes e os detalhes do procedimento. Os pacientes que tiveram pancreatite aguda 72 horas antes do procedimento foram excluídos.

DEFINIÇÕES

O IMC foi definido de acordo com a Organização Mundial da Saúde (IMC abaixo do peso < 18,5 kg/m2/ IMC normal ente 18,5 e 25 kg/m2/ Obesidade entre 30-40 kg/m2/ Obesidade mórbida IMC> 40 kg/m2).

PEP foi definida como início ou piora de dor abdominal causando admissão hospitalar não planejada em pacientes submetidos a CPRE de forma ambulatorial ou prolongamento de internação em pacientes internados submetidos a CPRE. O diagnóstico foi associado a aumento da amilase ou lipase sérica pelo menos 3 vezes o limite superior da normalidade aproximadamente 24 h após o procedimento.

A gravidade da pancreatite foi graduada de acordo com a classificação de Atlanta revisada: leve (sem evidência de falência orgânica sistêmica ou  local ou complicações sistêmicas); moderada (falência orgânica transitória ou falência orgânica sistêmica ou local não persistente); ou grave (falência orgânica persistente ou necrose pancreática). CPRE de alto risco foi definida baseada nos fatores de risco dos pacientes e relatados no procedimento.

OBJETIVOS

O objetivo primário foi a incidência de PEP em CPREs. O objetivo secundário foi a gravidade da CPRE.

RESULTADOS

Um total de 2236 pacientes cujo IMC foi verificado e que tiveram o seguimento adequado foram incluídos na análise final. A idade média dos pacientes foi 60±18 anos; 1247 (56%) pacientes eram mulheres e 991 (44%) eram homens. A média do IMC foi 29±8(kg/m2). Os fatores de risco não foram diferentes nos dois grupos.

 No total, 17% dos pacientes submetidos a CPRE foram de alto risco para PEP. O diagnóstico de PEP foi feito em 107  (4,8%) pacientes. No total, 921 pacientes tinham IMC ≥30 kg/m2 enquanto 1315 pacientes tinham IMC <30 kg/m2. Não houve diferença estatisticamente significativa entre os fatores de risco dos pacientes e relacionados ao procedimento nos grupos de IMC baixo (<30 kg/m2) e alto (≥30 kg/m2). Dos 921 pacientes com IMC BMI≥30, 49 foram diagnosticados com PEP (5,3%). Em comparação, 58 pacientes (4,4%) foram diagnosticados com  PEP dos 1317 com IMC <30 kg/m2 (odds ratio [OR] 1.2, 95%CI 0.82-1.8; P=0.32). Não houve diferença significativa na incidência de PEP nos subgrupos.

Na análise univariada, os seguintes fatores foram associados a PEP: mulheres < 40 anos, esfincterotomia biliar, esfincterotomia pancreática, canulação do ducto pancreático principal, injeção de contraste no ducto pancreático principal, dificuldade de canulação, falha na colocação de prótese no ducto pancreático principal e história de pancreatite recorrente.

Na análise multivariada, sexo feminino e idade < 40 anos, esfincterotomia biliar, esfincterotomia pancreática, injeção de contraste no ducto pancreático principal, dificuldade de canulação e falha na colocação da prótese pancreática foram associados com PEP. Entretanto, IMC > 30 não teve impacto na incidência de PEP (OR 1.1, 95%CI 0.75-1.8; P=0.48). Da mesma forma, não houve diferença de incidência de PEP na análise de subgrupos de diferentes categorias de IMC.

Gravidade da PEP

Sete pacientes foram diagnosticados com pancreatite moderada de acordo com a classificação de Atlanta revisada: 1 do grupo com IMC baixo (<18), 2 com IMC normal, 3 do grupo com sobrepeso e 1 do grupo de obesidade mórbida.

Nove pacientes foram diagnosticados com pancreatite grave: 1 do grupo abaixo do peso, 2 do grupo com IMC normal, 1 do grupo do sobrepeso, 3 do grupo obeso e 2 do grupo obeso mórbida. Três desses 9 pacientes morreram em 30 dias: 1 do grupo obeso mórbido, 1 do grupo obeso e 1 do grupo com IMC normal.

DISCUSSÃO

Embora com limitações, esse foi o maior estudo retrospectivo que investiga a relação entre PEP e IMC. Os resultados indicam que IMC aumentado (≥30 kg/m2) não aumenta o risco de PEP. Além disso, diferentes categorias de IMC, incluindo baixo peso, sobrepeso, obesidade e obesidade mórbida, não estão associadas com uma incidência diferente de PEP comparada com pacientes de peso normal.

Leia o artigo na íntegra em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC6479648/pdf/AnnGastroenterol-32-298.pdf

Para saber mais sobre este tema e outros relacionados, acesse o site Gastropedia clicando aqui!




QUIZ – Hipertrofia de pregas gástricas

Paciente do sexo feminino com 35 anos.  Queixa de distensão abdominal pós-prandial e eructações. Nega alteração do habito intestinal.   Fez tratamento para dispepsia sem melhora.

Nega comorbidades ou cirurgias prévias. Na história familiar,  relata que o pai apresentava bastante dor epigástrica, dificuldade para se alimentar, perdeu bastante peso e faleceu aos 39 anos de uma doença não definida.

Foi submetida a uma endoscopia com o achado abaixo:

 

Realizadas biópsias gástricas que revelaram gastrite crônica inativa com leve infiltrado linfocítico.

 




Pancreatite Autoimune

 

A Pancreatite Autoimune (PAI) é uma das possíveis causas de pancreatite crônica, que cursa com infiltrado inflamatório na glândula e fibrose progressiva, podendo levar à insuficiência pancreática (1).

 

A observação do quadro clínico nos permite classificar a PAI em 2 subtipos (2,3):

  • Pancreatite Autoimune tipo 1: o envolvimento pancreático é parte de uma condição sistêmica, que acomete diversos órgãos, relacionada a infiltração por células imunes ricas em IgG4 (uma sub-fração da IgG). A principal característica é o inflitrado linfo-plasmocitário no pâncreas, com mais de 10 células / CGA positivas para IgG4, a fibrose estoriforme e a ausência de lesões granulocíticas.

 

  • Pancreatite Autoimune tipo 2: é uma doença exclusivamente pancreática, que pode cursar com episódios de Pancreatite Aguda Recorrente, e que tem como característica o infiltrado granulocítico no pâncreas e a ausência de células positivas para IgG4. O diagnóstico de PAI tipo 2 só pode ser confirmado com a histologia pancreática. Apesar de ser uma doença restrita ao pâncreas, tem associação com outras condições autoimunes, como as Doenças Inflamatórias Intestinais (especialmente RCUI).

 

Quadro clínico
  • O quadro clínico típico da PAI (em qualquer um dos subtipos) é a dor abdominal, icterícia obstrutiva e elevação de enzimas pancreáticas e canaliculares no sangue. É comum também o emagrecimento associado.
  • Em alguns casos pode-se encontrar massas pancreáticas ou biliares, que necessitam diagnóstico diferencial com neoplasias.
  • Menos comum é a ocorrência de pancreatites agudas de repetição, especialmente na PAI tipo 2 (4, 5).
  • A dosagem de IgG4 > 140 mg/dl, a hipergamaglobulinemia e o FAN + podem ser marcadores secundários da doença sistêmica (PAI tipo 1).

 

Achados Radiológicos

Associado ao quadro clínico, os achados radiológicos podem corroborar o diagnóstico. Cerca de 85% dos pacientes com PAI têm alterações radiológicas compatíveis. O achado mais típico é o edema e o aumento pancreático (pâncreas “em salsicha”) e a perda de lobulações, frequentemente associado a um halo hipoatenuante na tomografia ou na ressonância de abdome com contraste em 15-40% dos casos (6,7).

 

                                                                      * Imagens de arquivo próprio

 

Menos frequente é o acometimento focal, com presença de nodulações na glândula, podendo mimetizar neoplasia. Essa forma é mais comum na PAI tipo 2 (35-80% de incidência) e o essencial é fazer o diagnóstico diferencial com processos mitóticos. (7) Nesse contexto, o uso de exames como o Ultrassom Endoscópico ou a Colangiopancreatografia  Retrógrada Endoscópica podem ser úteis na tentativa de afastar o diagnóstico de processos neoplásicos, já que permitem a obtenção de material para avaliação histopatológica. (8)

 

 

Tratamento

O tratamento inicial é com corticoterapia, e ambas as formas da doença tem boa resposta ao curso de corticoide. O tratamento está indicado nos casos que se apresentam com icterícia obstrutiva e dor abdominal, forma nodular (massas pancreáticas ou biliares) ,  quadros simulando colangite esclerosante ou doença extra-pancreática.  A dose inicial pode ser fixa de 40mg/dia de prednisona (ou em torno de 0,6 mg/kg/dia) pelo período de 4 semanas. Após esse período é recomendada uma reavaliação clínica, laboratorial e de imagem. No caso de melhora, está indicada a redução da dose de 5mg por semana até a completa suspensão da medicação. (5, 9)

No paciente que tenha contra-indicação ao uso de corticoide (especialmente os paciente com diabetes mellitus descompensado) o Rituximab (anti CD-20) também pode ser usado como agente de primeira linha para indução de remissão.  (9, 10)

Apesar de apresentar uma boa resposta ao tratamento com corticoesteróides, a taxa de recorrência  dos sintomas é de aproximadamente 30%. Os preditores para reicidiva do quadro são: altos níveis de IgG4 ao diagnóstico e acometimento de outros órgãos, especialmente árvore biliar. Nesses casos ainda não está claro se é necessário um tratamento adjuvante com imunomoduladores (Ciclosporina, Azatioprina, Rituximab) ou se é necessário um tempo maior de terapia com corticoesteróides. (1, 2, 5, 9).

 

  Tipo 1 Tipo 2
IgG4 Relacionada a IgG4 Não relacionada a IgG4
Idade > 60 anos > 40 anos
Sex Masc > Fem Masc = Fem
IgG4 sérica Elevada Normal
Histologia Células IgG4 + Lesões epiteliais granulocíticas
Taxa de remissão Alta Baixa
Extra-pancreático Doenças relacionadas a  IgG4 DII (30%)

 

Para saber mais sobre este tema e outros relacionados, acesse o site Gastropedia clicando aqui !

 

Referências bibliográficas

  • Mahdani, K. Farrel, J. Management of Autoimmune Pancreatitis. Gastrointest Endoscopy Clin N Am 28, 2018, 493–519
  • Shimosegawa, T. et al. International Consensus Diagnostic Criteria for Autoimmune Pancreatitis Guidelines of the International Association of Pancreatology. Pancreas 2011; 40: 352-358
  • Sah, R.P., Chari, S.T. Autoimmune Pancreatitis: An Update on Classification, Diagnosis, Natural History and Management. Curr Gastroenterol Rep, 2012 14:95–105
  • Hart, P.A. et al. Recent Advances in Autoimmune Pancreatitis. Gastroenterology 2015;149:39–51
  • Nagpal, S.J.S. et al. Autoimmune Pancreatitis. Am J Gastroenterol (2018) 113:1301–1309
  • Raina A, Yadav D, Krasinskas AM, et al. Evaluation and management of autoimmune pancreatitis: experience at a large US center. Am J Gastroenterol 2009; 104(9):2295–306.
  • Sandrasegaran, K. Menias, C.O. Imaging in Autoimmune Pancreatitis and Immunoglobulin G4–Related Disease of the Abdomen. Gastroenterol Clin N Am 47 (2018) 603–619
  • Fujii-Lau, L.L.. Levy, M.J. The Role of Endoscopic Ultrasound in the Diagnosis of Autoimmune Pancreatitis. Gastrointest Endoscopy Clin N Am, 2017.
  • Kamisawa, T. et al. Advances in IgG4-related pancreatobiliary diseases. Lancet Gastroenterol Hepatol, 2018; 3: 575–85
  • Okazaki, K. Uchida, K. Current perspectives on autoimmune pancreatitis and IgG4-related disease. Jpn. Acad., Ser. B 94 (2018) 412-427.




Caso Clínico – Espiroquetose Intestinal

 

Paciente, masculino, 45 anos, HIV + há cerca de 20 anos, relata ter interrompido o uso de anti-retrovirais há 6 meses por conta própria.

Queixa-se de diarreia associada a episódios de enterorragia nos últimos 2 meses.

Foi encaminhado ao nosso serviço para realização de colonoscopia que evidenciou em cólon sigmoide, múltiplas erosões planas e desnudas esparsamente distribuídas sobre mucosa edemaciada e medindo entre 2-3 mm. Ainda em sigmoide notou-se a presença de lesões polipoides, com tamanhos em torno de 4-8 mm, avermelhadas e com erosões apicais.

Seguem as imagens:

Realizamos múltiplas biópsias que mostraram colite crônica com componente erosivo e hiperplasia folicular linfóide com presença de estruturas consistentes com espiroquetose intestinal.

 

Revisão:

  • A espiroquetose intestinal é definida histologicamente como a presença de microrganismos da família spirochetaceae ligadas ao ápice das células do epitélio cólico.
  • A doença pode ser provocada por um grupo heterogêneo de bactérias. Em humanos, a Brachyspira aalborgi e a Brachyspira pilosicoli predominam.
  • A incidência da colonização intestinal por espiroquetas varia de 1% nos países desenvolvidos a até 34% nas áreas mais pobres, atingindo taxas de colonização de 62,5% entre homossexuais e em pacientes portadores do vírus da imunodeficiência humana (HIV).
  • O significado clínico dessa colonização ainda é incerto e a maioria dos infectados permanece assintomática.
  • Quando há sintomas gastrointestinais, o tratamento mais utilizado e efetivo é feito com metronidazol na dose de 500 mg 3 vezes ao dia por 10 dias. Há relatos de séries de casos onde a clindamicina e macrolídeos foram utilizados com sucesso.
  • Manifestação de sintomas é mais comum em pacientes imunodeprimidos.
  • A infecção pelo Treponema pallidum deve ser excluída, pois os tratamentos são diferentes e as complicações por essa última são mais graves.

 

Acentuamento da borda em escova, que assume aspecto felpudo à histologia

 

Referências

  1. Bechara C. S. et al. “ESPIROQUETOSE INTESTINAL ‐ RELATO DE CASO E REVISÃO DE LITERATURA.” Journal of Coloproctology vol. 38 (2018); 68. doi.org/10.1016/j.jcol.2018.08.144

2. Nadal, Luis Roberto Manzione, & Nadal, Sidney Roberto. (2011). Intestinal spirochetosis. Journal of Coloproctology (Rio de Janeiro)31(4), 405-406.

 




Journal Scan – Endocuff/ Alça a frio/ Recidiva pós-ressecção endoscópica

Selecionamos 3 artigos das principais revistas endoscópicas para discussão:

 

Effect of Endocuff use on colonoscopy outcomes: A systematic review and meta-analysis

Konstantinos Triantafyllou, Paraskevas Gkolfakis, Georgios Tziatzios, Ioannis S Papanikolaou, Lorenzo Fuccio, and Cesare Hassan 

CENÁRIO

Endocuff – um dispositivo plástico com projeções flexíveis montado na ponta do colonoscópio, promete melhorar a inspeção mucosa no cólon.

OBJETIVO

Estudar o efeito do Endocuff na taxa de detecção de adenomas (ADR), detecção de adenomas avançados (AADR) e no número médio de adenomas por colonoscopia (MAC).

MÉTODO

Buscas na literatura identificaram trials randomizados controlados avaliando colonoscopias com Endocuff (Endocuff assisted colonoscopy – EAC) vs colonoscopia convencional (CC) quanto a ADR, AADR e MAC. O tamanho de efeito no desfecho do estudo foi calculado a partir de modelo de efeito fixo ou aleatório e foi demonstrado como risco relativo (RR) [intervalo de confiança (CI) de 95%] e diferença média (MD) (95% CI). A taxa de necessidade de remoção do Endocuff também foi calculada.

RESULTADOS

Identificamos nove estudos incluindo 6038 pacientes. Todos incluíram população mista (rastreamento, seguimento e exames diagnósticos). Sete estudos avaliaram a primeira, e dois avaliaram a segunda geração do dispositivo. EAC foi associada a aumento da ADR quando comparada à CC [RR (95%CI):1.18 (1.05-1.32);Ι2 = 71%]; EAC beneficiou mais endoscopista com ADR ≤ 35% comparados aqueles com ADR > 35% [RR (95%CI): 1.37 (1.08-1.74); Ι2 = 49% vs 1.10 (0.99-1.24); Ι2 = 71%]. Quanto a AADR e MAC, não foi observada diferença entre EAC e CC [RR (95%CI): 1.03 (0.85-1.25); Ι2 = 15% e MD (95%CI): 0.30 (-0.17-0.78); Ι2 = 99%]. A análise de subgrupos não mostrou qualquer diferença entre as duas gerações do dispositivo. Nos braços EAC do estudo, o dispositivo precisou ser removido em 3% (95%CI: 2%-5%) dos casos, principalmente devido a tortuosidade do sigmoide ou presença de divertículo no seu trajeto.

CONCLUSÃO

EAC aumentou a ADR comparada com CC, especialmente para endoscopistas com baixa ADR. Não foi observado efeito significante quanto a AADR e MAC.

Comentários:

Diversos trabalhos têm se ocupado de buscar maneiras de incrementar a ADR, uma vez que a taxa é o principal indicador de qualidade de serviços de colonoscopia e em última análise a real entrega da proteção oferecida pela colonoscopia na prevenção de CCR passa por uma ADR satisfatória. Nessa busca surgem desde recomendações técnicas, como revisão de segmentos do cólon, retrovisão em cólon direito e outros, além de dispositivos capazes de aumentar a detecção de lesões.

Este estudo compila achados de outros trabalhos comparando EAC com CC e aponta para melhor desempenho de EAC, supostamente pelo acessório auxiliar a visibilização da face proximal das haustrações do cólon. No entanto, essas conclusões deve ser observadas com reserva. Vale mencionar que, as variáveis extraídas dos estudos selecionados, não incluem tempo de retirada nos exames, seja em EAC ou CC. Embora ainda haja discussão sobre o assunto, acredita-se que um maior tempo de retirada do aparelho favoreça uma maior detecção de pólipos e, consequentemente, de adenomas. Não é possível afirmar, portanto, que a maior detecção associada ao uso do acessório não seja fruto de um exame com tempo de retirada mais longo imposto pela própria presença do Endocuff.

 

 

Risk factors for local recurrence and appropriate surveillance interval after endoscopic resection

Yoriaki Komeda, Tomohiro Watanabe, Toshiharu Sakurai, Masashi Kono, Kazuki Okamoto, Tomoyuki Nagai, Mamoru Takenaka, Satoru Hagiwara, Shigenaga Matsui, Naoshi Nishida, Naoko Tsuji, Hiroshi Kashida, and Masatoshi Kudo

CENÁRIO

Fatores de risco para recorrência local após polipectomia, mucosectomia (EMR), e dissecção endoscópica da submucosa (ESD) não estão definidos. Além disso, o intervalo apropriado para seguimento endoscópico de tumores colorretais com alto risco de recorrência local não estão estabelecidos.

OBJETIVO

Identificar as características clinico-patológicas de lesões recorrentes após ressecção endoscópica de tumor colorretal e determinar o intervalo apropriado.

MÉTODO

Trezentos e sessenta pacientes (1412 tumores colorretais) submetidos a polipectomias, EMR, ou ESD e foram seguidas por mais de 1 ano para identificação de recorrência local, foram incluídos no estudo. Os achados clinicopatológicos associados com recorrência local foram determinados via análises uni e multivariada.

RESULTADOS

Recorrência local foi observada em 31 dos 360 pacientes (8,6%) [31 das 1412 lesões (2.2%)] após ressecção de tumor colorretal. Ressecção em piecemeal, tamanho do tumor maior que 2 cm, e presença de componente viloso foram associados com recorrência local. Destes, ressecção em piecemeal foi identificada como fator de risco independente para a recorrência. Lesões ressecadas em mais de 5 fragmentos foram associadas a maior risco de recorrência com tempo médio de 3 meses entre a ressecção e a recorrência, nestes casos. O período de recorrência em casos ressecados em mais de 5 fragmentos foi mais curto que o daquelas ressecadas em menos de 4 fragmentos (3.8 ± 1.9 meses vs 7.9 ± 5.0 meses, P < 0.05).

CONCLUSÕES

Recorrência local de tumores colorretais tratados endoscopicamente depende de desfechos do primeiro procedimento. Ressecção em piecemeal foi o único fator de risco significante associado com recorrência local após ressecção endoscópica.

Comentários

Embora o estudo não tenha ineditismo sobre os fatores associados à recorrência local, seus achados, obtidos a partir de uma ampla casuística, estão alinhados com a literatura prévia e ajudam a cristalizar a importância do entendimento da lesão, no momento de definir a terapêutica endoscópica.

Já havia sido demonstrada a associação entre ressecção em piecemeal e o risco aumentado de recorrência local (PMID 25848926). Componente viloso da lesão e tamanho > 2 cm também foram apontados como fatores de risco para recorrência local na análise univariada, Adicionalmente, neste estudo, os autores observaram recorrência mais precoce na lesões ressecadas com > 5 fragmentos e embora reconheçam não ter havido critério único para o agendamento da colonoscopia de seguimento, trazem uma recomendação para esse follow-up.

Recommendation of interval before repeat colonoscopy.

Interval before a repeat colonoscopy
1-3 mo after piecemeal resection ≥ 5 pieces (high risk for recurrence)
4-6 mo after piecemeal resection ≤ 4 pieces (moderate risk for recurrence)
6 mo after en blocresection for cancer (low risk for recurrence)
≥ 12 mo after en bloc resection for adenoma (very low risk for recurrence)

Excerto de PMID 25848926

 

 

Cold snare endoscopic resection of nonpedunculated colorectal polyps larger than 10 mm: a systematic review and pooled-analysis

Viveksandeep Thoguluva Chandrasekar, MD, Marco Spadaccini, MD, Muhammad Aziz, MBBS1,2, Roberta Maselli, MD, PhD3, Seemeen Hassan, MD4, Lorenzo Fuccio, MD5, Abhiram Duvvuri, MD1,2, Leonardo Frazzoni, MD5, Madhav Desai, MD1,2, Alessandro Fugazza, MD3, Ramprasad Jegadeesan, MD1,2, Matteo Colombo, MD3, Chandra Skekhar Dasari, MD2, Cesare Hassan, MD, PhD6, Prateek Sharma, MD1,2, Alessandro Repici, MD3

CENÁRIO E OBJETIVOS

Polipectomia com alça diatérmica (hot snare polypectomy – HSP) e mucosectomia (EMR) são padrão na ressecção de pólipos colorretais ≥10 mm. Para evitar o risco de dano induzido por eletrocautério, surgem evidências recentes sobre o uso de polipectomia com alça e EMR a frio para essas lesões. O objetivo desta análise é relatar os desfechos de ressecções por alça a frio para pólipos > 10 mm.

MÉTODO

Os bancos de dados da PubMed/Medline, Embase, Google Scholar, e Cochrane foram consultados para identificar estudos, publicados até julho de 2018, que realizaram ressecções por alça a frio para pólipos colorretais ≥10 mm. Os desfechos primários foram eventos adversos (sangramento, perfuração e dor abdominal pós-polipectomia) e os secundários foram taxa de ressecção completa, taxas de pólipo residual, e taxas de adenomas versus pólipos sésseis serrilhados (SSPs). Análise de subgrupos foi realizada  considerando tamanho, localização da lesão e técnica de ressecção

RESULTADOS

Oito estudos foram incluídos na análise final, com 522 pólipos colorretais com tamanho médio de 17,5 mm (10-60). A taxa global de eventos adversos foi de 1,1% (95% CI. 0,2%-2,0%; I2 = 0%). As taxas de sangramento intra e pós-procedimento foram de 0,7% (95% CI, 0%-1.4%) e 0,5% (95% CI, 0,1%-1,2%), respectivamente, com taxa de dor abdominal de 0,6% (95% CI, 0,1%-1,3%).

Pólipos ≥20 mm tiveram taxa de sangramento intra-procedimento maior, de 1,3% (95% CI, 0,7%-3,3%) e taxa de dor abdominal de 1,2% (95% CI, 0, 7%-3,0%), mas sem sangramentos tardios. Não foram relatadas perfurações. A taxa de ressecção completa foi de 99,3% (95% CI, 98,6%-100%). Taxas agrupadas de pólipos residuais de qualquer histologia, adenomas, e SSPs foram 4,1% (95% CI, 0,2%-8,4%), 11,1% (95% CI, 4,1%-18,1%), e 1,0% (95% CI, 0,4%-2,4%), respectivamente, durante período de seguimento que variou de 154 a 258 dias.

CONCLUSÕES

Os resultados desta revisão sistemática e análise agrupada foram excelentes com ressecção com alça a frio de pólipos colorretais > 10 mm considerando as taxas de sangramento pós-polipectomia, ressecção completa e de pólipos residuais. Estudos controlados aleatorizados comparando ressecção a frio com alça diatérmica em pólipos > 10 mm são necessários para investigação adicional.

Comentários:

O estudo chama a atenção por demonstrar segurança e bons resultados na abordagem de lesão > 10 mm, ou até mesmo > 20 mm, sem a “proteção” da coagulação vascular instantânea ou mesmo da desvitalização de lesões residuais, oferecida pelo eletrocautério, algo a ser visto com reservas por muitos até algum tempo atrás.

 




Quiz – Lesão plana de esôfago médio.

Homem, 70 anos, hipertenso, previamente hígido, foi referenciado à EDA por sintomas dispépticos de início recente. Etilista social de pequena quantidade, nunca fumou. Negava perda de peso ou disfagia. Exame físico sem anormalidades.

 

Imagem com luz branca

Na transição parede lateral direita/posterior, distando cerca de 24 cm da ADS, observa-se lesão não polipóide plana, esbranquiçada, de aspecto rugoso, formato irregular, porém bem delimitada, medindo cerca de 25mm no maior eixo.

 

Cromoscopia eletrônica com NBI

IPCL exibindo discreta dilatação, sinuosidade, calibre irregular e variação de formas.

 

Cromoscopia com Lugol

Presença de extensa área iodo-negativa em exata correspondência a lesão descrita na luz branca e na cromoscopia com NBI




Caso clínico: Doença de Crohn de íleo terminal e válvula ileocecal.

Paciente M.D., sexo feminino 36 anos. Diagnóstico de Doença de Crohn após falha de tratamento de fístula perineal complexa, de difícil controle clínico em 2014.
Em 2014, foi encaminhada para proctologista, que realizou colonoscopia, detecatndo ulcerações profundas em íleo terminal, deformidade de vávula íleocecal e leve proctite (figuras 1 a 5) As biópsias confirmaram padrão histológicos sugestivo de Doença de Crohn. Também foi realizada a época tomografia computadorizada, que evidenciou espessamento de segmento de cerca de 10 cm do íleo terminal.

Figura 1 :  Proctite Leve


Figura 2 : Proctite leve


Figura 3 : Íleite terminal com ulcerações


Figura 4 : Íleite terminal com ulcerações



Figura 5 : CecoFoi iniciado então terapia com Adalimumabe + Azatioprina e tratamento com seton da fístula, sendo que a paciente apresentou melhora clínica, com remissão e marcadores inflamatórios com melhora.
Em 2016,durante acompanhamento, foi detectado aumento de calprotectina fecal, sendo realizada nova colonoscopia, que demostrava recidiva da doença em íleo terminal, agora sendo possível apenas a avaliação dos primeiros centímetros do íleo terminal, já se notando estenose ileal e dificuldade de entrada na válvula íleocecal, por deformidade da mesma. (figuras 6 a 8).

Figura 6: Ceco


Figura 7 : Íleo Terminal


Figura 8 : Íleo Terminal


Devido a recidiva, optou-se por otimizar a dose de Adalimumabe semanal, mantendo o paciente bem ate junho de 2016.
Em dezembro de 2016, paciente apresentou novo aumento de calprotectina fecal, optando-se agora pela troca de medicamento em uso. Iniciou-se Infliximabe associado a azatioprina, mantendo-se o paciente em remissão. Uma colonoscopia realizada ao fim de 2017 mostrava agora um estenose em válvula íleocecal, não sendo possível avaliar o íleo terminal adequadamente (figuras 9 e 10).

Figura 10 : Estenose de válvula íleo cecal.


Figura 9 : Estenose de válvula íleo cecal.


 
Paciente se manteve assintomático, com remissão clínica e laboratorial até dezembro de 2018, quando começou a apresentar quadros de suboclusão e dor abdominal alguma horas após se alimentar. Nova colonoscopia confirmou o quadro de estenose de vávula ileocecal (figuras 11 a 13)

Figura 11: Ceco


Figura 12: Válvula ileocecal


Figura 13: Válvula íleocecal.


Assim, devido aos achados da colonoscopia, associado a sintomatologia, optou-se por realizar a dilatação de válvula íleocecal. Em tempo, paciente se recusou a realizar enteroressonância, por fobia, para avaliar outras possíveis estenoses ileais.
Para a dilatação, utilizou-se balão tipo C.R.E., guiado, estagiado nos tamanhos 12-13,5-15mm, preenchido com água, mantendo-se cerca de um minuto em cada estágio (três minutos no último estágio), sendo a dilatação repetida duas vezes antes da retirada do balão:

É possivel avaliar ao final do vídeo, que não havia doença ao nível da estenose, que era curta, e com nítida dilatação do íleo terminal a montante. Também se verifica a presença de grande úlceração isolada em íleo terminal, sugestiva de reativação da doença.
Hoje, passados dois meses da dilatação, paciente segue assintomática, tendo sido reajustada a dose de Infliximabe.
 
 
 




Eficácia do Amplatzer (cardiac septal occluder) no tratamento de fístula e deiscência após cirurgia bariátrica

A endoscopia digestiva possui um papel fundamental no suporte e tratamento do paciente com fístula após cirurgia bariátrica através de diferentes técnicas, incluindo uso de endopróteses, terapia a vácuo e técnicas de drenagem interna através de septotomia ou pigtail. Analisamos o excelente trabalho publicado na edição deste mês da Gastrointestinal Endoscopy que contou com Dr. Diogo Moura e Dr. Eduardo Moura como autores.

Artigo: Efficacy of the cardiac septal occlude in the treatment of post-bariatric surgery leaks and fistulas.  Publicado na Gastrointestinal endoscopy em março de 2019 (Volume 89)

 Os autores realizaram um estudo avaliando o tratamento endoscópico de fístula após cirurgia bariátrica com o uso off-label de uma prótese utilizada habitualmente para tratamento de defeitos cardíacos (persistência de ducto atrial/ventricular), com elevada taxa de sucesso.

Métodos:

 

Estudo multicêntrico retrospectivo envolvendo 9 hospitais terciários (Brasil, Colombia, Estados Unidos e Venezuela), no período de 2012 a 2018. Foram incluídos pacientes com diagnóstico de fístula após gastrectomia vertical (GV) ou bypass gátrico em Y de Roux (BGYR) para tratamento com Amplatzer tanto para casos de falha terapêutica de outros métodos endoscópicos tanto como terapia primária.

Prótese: O Amplatzer é uma prótese metálica autoexpansível de nitinol e polyester, em formato de ampulheta/carretel, de diversos tamanhos. O diâmetro da “cintura” da prótese (localizada dentro do orifício fistuloso) varia entre 18mm e 38mm, com extensão de 3-7mm. As extremidades proximal e distal (“bordas” intragástrica / intracavitária) variam entre 9 e 54mm. O sistema introdutor possui calibre entre 5-12Fr e comprimento de até 80cm o que não permite seu uso através do endoscópio. Para permitir o uso da prótese por endoscopia foi realizada uma adaptação através do uso de um empurrador de prótese biliar (7-10Fr) como sistema de liberação – a prótese era liberada do introdutor original e depois tracionada (encapada) dentro do empurrador com auxílio de pinça. As próteses eram selecionadas de acordo com o diâmetro do orifício fistuloso, devendo ter ao menos mais de 50% do calibre da fístula.

Imagem do dispositivo com sistema introdutor

Procedimento: Realizado por endoscopia com controle radiológico, sob sedação ou anestesia geral, sem necessidade de internamento hospitalar permitindo manejo ambulatorial dependendo das condições clínicas do paciente.  Exame contrastado era realizado logo após o procedimento para confirmar adequada oclusão da fístula. A progressão da dieta seguia os seguintes parâmetros: dieta zero (24h) seguida de 3 dias de líquida total, 3 dias de pastosa/soft solids e posteriormente dieta livre. Era prescrito uso de omprazol por 30 dias; controle com esofagograma e endoscopia após 4-6 semanas.

Sequencia de imagens evidenciando (A): fístula associada a bloqueio inflamatório (B): introdução do dispositivo (C):prótese liberada (D): exame de controle

 

Resultados:
43 pacientes foram submetidos ao tratamento dos quais 65,1% do sexo feminino, 34,9% sexo masculino, com fístulas gastrocutaneas (n=38), gastropleural (n=3) e gastrobronquica (n=2). A maior parte dos pacientes com fístulas tardias e crônicas (81,4%), seguido de precoces (entre 1-6 semanas; 5 pacientes) e agudas (n=3, 6,9%). Houve sucesso técnico em todos os casos,  com sucesso no fechamento da fístula em exame de controle em 39 dos 43 casos (90,7%).

Todos os cinco pacientes com fístulas precoces tiveram recidiva da fístula nos primeiros 30 dias e foram submetidos a troca das próteses por modelos mais calibrosos com adequado sucesso terapêutico nos exames de controle, sem outras intervenções.

Ausência de vazamento em exame contrastado (esquerda) ; re-epitelização sobre borda interna do dispositivo (direita)

Dos 4 casos de falha terapêutica (9,7%), três eram casos agudos e uma fístula tardia gastropleural onde havia uma cavidade não drenada.  Nos casos agudos, foi observada melhora inicial porém houve retorno da drenagem cutânea após 72h. Nestes, foi observado alargamento do orifício fistuloso – em todos foi realizada remoção da prótese com pinça de corpo estranho/alça polipectomia e posicionada prótese metálica autoexpansível por 6 semanas, com resolução da fístula. O paciente da fístula gastrocutânea teve piora clinico-laboratorial e foi submetido a gastrectomia total por decisão do cirurgião assistente.

 Comentários:

 

Trata-se de um trabalho muito interessante, envolvendo (mais) um método endoscópico minimamente invasivo para o tratamento de fístula pós bariátrica com grande potencial para se sedimentar como uma excelente opção, caso esses resultados sejam reproduzidos posteriormente. Os autores buscaram 20 estudos publicados como relato de caso, entre 2006 e 2018 envolvendo 23 pacientes tratados com este modelo de dispositivo, para fístulas benignas (não apenas bariátrica) com resolução da fístula em 18 casos (78,26%) o que nos sugere que estes resultados podem ser reproduzidos.

Todas as complicações e casos de falha terapêutica foram em casos agudos e precoces salvo por um caso mais complexo de paciente com fistula gastropleural em paciente sem a cavidade drenada. É possível que a oclusão aguda com estes dispositivos, em uma cavidade abdominal não drenada mantenha o processo infecioso em atividade e não permita a cicatrização da fístula.

É importante ressaltar que todos os casos de fístula aguda (até 7 dias), embora com pequena casuística (n=3), apresentaram falha terapêutica e houve alargamento do diâmetro da fístula com o dispositivo. Todos foram tratados com sucesso no estudo utilizando próteses metálicas tradicionais porém é importante considerar a possibilidade de agravamento da fístula nestes casos.

As próteses metálicas autoexpansíveis tem resultados expressivos no tratamento de fistulas agudas e precoces embora haja grande debate sobre o modelo a ser utilizado (totalmente ou parcialmente recobertas, esofágicas off-label ou bariátricas). Técnicas de drenagem interna com pigtails, septotomia + dilatação e terapia a vácuo possuem melhor eficácia em fistulas crônicas no entanto em todos casos há necessidade de re-intervenção.

Neste estudo, o amplatzer teve desempenho excelente nos casos tardios/crônicos onde não houve complicação, re-intervenção e obteve sucesso de 100%, justamente no grupo onde os outros métodos encontram mais dificuldades seja por menor eficácia (próteses) seja pela necessidade de re-intervenções (outros métodos).

A prótese em questão já está disponível no Brasil, sendo utilizada em cardiologia, o que facilita seu emprego e realização do novos estudos para comprovar sua eficácia.