Paciente jovem, diarreia crônica, distensão abdominal e as imagens abaixo. Será que você acerta essa?

Paciente do sexo feminino, 17 anos de idade, relata queixa de diarreia há cerca de dois meses acompanhada por sintomas dispépticos e distensão abdominal, além de perda de 5 kg no período. Ao exame físico, apresenta-se pouco desidratada, com abdome levemente distendido e doloroso à palpação.

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Síndrome pós-polipectomia

 

A realização de polipectomias faz parte do dia a dia do colonoscopista, como parte de procedimentos de rotina, exames diagnósticos etc. As principais complicações evidenciadas incluem ressecção incompleta da lesão, sangramento e perfuração. A síndrome pós-polipectomia é uma complicação pouco frequente e menos conhecida que as demais, no entanto, de extrema relevância. Sobre ela comentamos:

Confira mais sobre a síndrome pós-polipectomia

A síndrome de coagulação pós-polipectomia (post-polypectomy coagulation syndrome – PPCS) foi descrita por J. Waye ao observar pacientes que apresentaram quadro de dor abdominal de forte intensidade, sinais de peritonismo, taquicardia e febre após polipectomia com uso de corrente elétrica, porém, que não apresentavam evidência de perfuração colônica nos exames de imagem.

O diagnóstico dessa síndrome é de exclusão, sendo imprescindível avaliar e descartar a presença de pneumoperitôneo.

O principal sintoma é dor abdominal após colonoscopia, o que pode ocorrer nas primeiras 12h após o procedimento, porém são descritos casos tardios, após até 5–7 dias.

Considera-se que a síndrome decorre de lesão transmural secundária à corrente diatérmica, com preservação da serosa, não havendo, portanto, pneumoperitôneo.

A incidência é baixa, sendo estimada entre 0,5 e 1,2%, porém de grande relevância, pois faz diagnóstico diferencial com perfuração colônica pós-polipectomia.

Exames de imagem (tomografia computadorizada com contraste) evidenciam: ausência de pneumoperitôneo, espessamento da parede colônica com infiltrado inflamatório adjacente e presença de líquido na camada muscular do cólon.

O tratamento é conservador, baseado em internamento hospitalar, jejum, antibioticoterapia e vigilância. Não há necessidade de intervenção cirúrgica.

É importante ressaltar que a etiologia da lesão está associada à queimadura de camadas profundas do cólon. A evolução destes casos, via de regra, é satisfatória. Havendo intercorrências ou evolução insatisfatória, a possibilidade de perfuração tardia ou diagnóstico inicial equivocado (falha nos exames de imagem) deve ser suspeitado, sendo crucial a reavaliação do caso com o cirurgião.

Alguns autores usam o termo transmural burn syndrome ou simplesmente coagulation syndrome (CS) para incluir pacientes submetidos a ressecções endoscópicas por mucosectomia (EMR) ou dissecção endoscópica da submucosa (ESD), que apresentam quadro clínico semelhante a PPCS.

Embora não haja relato de perfuração tardia em PPCS, há descrição de perfuração tardia após CS (caso de ESD), indicando a importância de manter o paciente em internamento hospitalar e vigilância.

Bacteremia transitória pode ocorrer após procedimentos diagnósticos ou terapêuticos, correspondendo à translocação de bactérias da flora do próprio paciente para a corrente sanguínea. De acordo com a ASGE, a incidência após colonoscopia com ou sem polipectomia é de aproximadamente 4%, porém raramente associadas a casos de infecção propriamente dita, como endocardite ou peritonite.

Referências:

  1. CT findings of post-polypectomy coagulation syndrome and colonic perforation in patients who underwent colonoscopy polypectomy. Shin et al. Clinical Radiology 2016;e1-e7
  2. Features of electrocoagulation syndrome after endoscopic submucosal dissection for colorectal neoplasm. Yamashina et al Gastroenterology and Hepatology 2016; 31:615–620
  3. Coagulation syndrome: Delayed perforation after colorectal endoscopic treatments. Hirasawa et al. World J Gastrointest Endosc  2015: 7(12): 1055-1061
  4. What Is Different  between Postpolypectomy Fever and  Postpolypectomy Coagulation Syndrome? Hyung Wook Kim.  Clin Endosc  2014;47:205-206

Como citar este artigo:

Ferreira F. Síndrome pós-polipectomia. Endoscopia Terapêutica; 2021. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/assuntosgerais/sindrome-pos-polipectomia/

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Agora responda a esse QUIZ sobre Síndrome pós-polipectomia.




Duplicação cística de esôfago

INTRODUÇÃO

Em exames de endoscopia digestiva alta de rotina, o achado de lesão subepitelial em esôfago é ocasional, porém presente com certa frequência.

Geralmente, o paciente se apresenta assintomático quanto à lesão encontrada, e o exame endoscópico foi indicado por outras causas, tais como dispepsia, suspeita de refluxo gastroesofágico, empachamento, etc (Figura 1).

Lesão subepitelial em esôfago distal

Figura 1: lesão subepitelial em esôfago distal.

Apesar da sintomatologia não estar relacionada à lesão subepitelial encontrada, seu esclarecimento diagnóstico nos direciona à investigação mais específica por meio de outros métodos de imagem, como a tomografia computadorizada, a ressonância magnética nuclear e a ecoendoscopia.

Nas lesões subepiteliais, as biópsias da mucosa não esclarecem o seu diagnóstico, justamente por estarem recobertas por mucosa íntegra e não serem representativas da lesão subepitelial.

Porém, quando encontramos uma solução de continuidade da lesão subepitelial com a mucosa (por exemplo, em lesões com ulcerações ou erosões na mucosa que a recobre), as amostras teciduais nas áreas ulceradas ou erodidas, por meio de biópsias endoluminais (pinças tipo fórceps), merecem ser investidas para o diagnóstico histológico.

São várias as hipóteses diagnósticas das lesões subepiteliais em esôfago:

  • Cisto de retenção;
  • Lipoma submucoso;
  • Schwannoma;
  • Hemangioma;
  • Leiomioma;
  • GIST;
  • Duplicação cística.

Dentre as possibilidades diagnósticas, a duplicação cística de esôfago deve ser considerada.

DUPLICAÇÃO CÍSTICA ESOFÁGICA

A duplicação cística é decorrente de alterações da formação do tubo digestório. Na fase embrionária, a endoderme se divide em 3 segmentos distintos:

  • intestino primitivo cefálico (foregut);
  • intestino primitivo médio (midgut);
  • intestino primitivo caudal (hindgut).

Para a formação do segmento proximal do tubo digestivo (3ª a 8ª semana de gestação) [1], o intestino primitivo cefálico (foregut), que se constitui como um único tubo, divide-se em 2 tubos paralelos e origina 2 segmentos tubulares:

  • Segmento anterior: que forma a traqueia e seus ramos segmentares;
  • Segmento posterior: que origina o todo o esôfago.

Uma grande falha na junção da endoderme possibilita uma fusão anômala e, consequentemente, formam as atresias de esôfago e de traqueia (total ou parcial) associadas ou não à fistula esofagotraqueal.

Esporadicamente, pode haver uma junção irregular dos bordos de fusão, de maneira a resultar em um recesso intramural no esôfago, ou mesmo um recesso para-esofágico (extramural), o qual origina a duplicação cística do esôfago (Figura 2).

Figura 1a: intestino primitivo cefálico com formação de traqueia e esôfago.

Figura 1b: intestino primitivo cefálico com falha e formação de duplicação cística.

Figura 2: a) Intestino primitivo cefálico com formação de traqueia e esôfago. b) Intestino primitivo cefálico com falha e formação de duplicação cística.

Histologicamente, o interior da duplicação cística de esôfago é revestido por epitélio escamoso ou entérico, os quais secretam secreção seromucosa. Externamente, é formada por dupla camada de musculatura lisa e, raramente, pode apresentar uma comunicação nítida com a luz esofágica.

Quanto à localização esofágica, a maior parte das duplicações císticas situam-se na região posterolateral direita do mediastino inferior e com maior predominância no terço distal (2/3) comparado ao terço proximal e médio (1/3) [2].

Por ser uma malformação congênita, o diagnóstico é mais frequente em crianças (80%) [3], as quais apresentam sintomas. No adulto, a sintomatologia geralmente é ausente, e, quando se apresenta algum sintoma (< 7%), está relacionado ao efeito compressivo da lesão em órgãos adjacentes [2]. Assim, a sintomatologia pode variar em função da localização da duplicação cística no esôfago (tabela 1).

Localização em esôfago Sintoma relacionado
1/3 proximal estridor, tosse
1/3 médio dor torácica, disfagia
1/3 distal disfagia, epigastralgia, vômitos, arritmia cardíaca [4]

 

INVESTIGAÇÃO DIAGNÓSTICA

Tomografia Computadorizada (CT): identifica-se uma imagem de massa homogênea, com íntimo contato com o esôfago, arredondada ou ovalada, bem delimitada, de contornos regulares, associada à densidade de fluido no seu interior e que não se altera à injeção de contraste.

Ressonância Magnética Nuclear (RMN): demonstra formação cística, localizada junto à parede esofágica, com hipossinal em T1, hipersinal em T2 e sem aspecto sólido em T1 com contraste.

Ecoendoscopia:

É indicada [5]:

  • Quando CT ou RMN não definem diagnóstico;
  • Em lesões suspeitas de malignidade;
  • Em formações atípicas.

A imagem ecográfica típica de duplicação cística de esôfago tem ecotextura anecoica ou hipoecoica, homogênea, alongada ou ovalada, de contornos regulares, limites precisos, com reforço hiperecoico no seu limite posterior. Situa-se inserida em camada submucosa, muscular própria ou até mesmo subserosa, com 3 a 5 camadas na parede [3] (Figura 3). Por vezes, podem ser múltiplas formações císticas intramurais com lobulações, e até mesmo, com septações em sua parede [6] (Figura 4). O conteúdo intracístico também pode ser heterogêneo, com imagens de debris ou pontos puntiformes de permeio (Figura 5).

Figura 3: ecoendoscopia setorial com imagem hipoecoica inserida em camada submucosa e muscular própria de esôfago distal.

Duplicação cística de esôfago

Figura 4: ecoendoscopia radial com imagem anecoica inserida em camada submucosa e muscular própria de esôfago com septos finos.

Duplicação cística de esôfago

Figura 5: ecoendoscopia setorial com imagem hipoecoica inserida em camada submucosa e muscular própria de esôfago distal com pontos hiperecoicos de permeio.

 

A princípio, a diferenciação quanto à natureza sólida ou cística da imagem pode ser definida pela ecoendoscopia. Porém mesmo ecoendoscopistas experientes podem ter dúvidas, uma vez que a secreção espessa da duplicação cística (muco) pode mimetizar uma imagem sólida ecográfica.

Nessas situações, a punção ecoguiada se faz necessária para possibilitar o diagnóstico diferencial entre duplicação cística de esôfago, leiomioma, GIST ou mesmo um conglomerado linfonodal paraesofágico. A amostra da punção ecoguiada pode revelar material mucoide com células epiteliais, semelhantes ao epitélio esofágico ou entérico. A grande preocupação em relação à punção ecoguiada é a infecção. Com taxas de 14% [4] [8], a infecção intracística pós-punção ecoguiada se demonstrou com morbidade e mortalidade temerárias pela potencial evolução para mediastinite, mesmo com uso de antibióticos em doses terapêuticas. Assim, há uma tendência dos ecoendoscopistas em reservar a punção ecoguiada somente em casos extremamente necessários [9].

O tratamento da duplicação cística de esôfago é indicado em pacientes sintomáticos. A remoção ou a enucleação cirúrgica estão sendo os tratamentos de eleição.

Nos pacientes assintomáticos, o tratamento conservador é predominante frente aos riscos inerentes da cirurgia esofágica (fístula, refluxo gastroesofágico) e mortalidade cirúrgica de 1% [10]. Outros advogam que a baixa taxa anual de crescimento da duplicação cística de esôfago não justifica a morbimortalidade da cirurgia [11]. Há relatos de indicações cirúrgicas em pacientes assintomáticos, justificadas pelo risco de ulceração ou perfuração da duplicação cística de esôfago, com sucesso no seguimento [12].

Saiba mais:

Guideline comentado da ASGE sobre lesões subepiteliais TGI

Tumor de células granulares no esôfago

QUIZ! – Lesão subepitelial de esôfago

Como citar este artigo:

Matuguma, SE. Duplicação cística de esôfago. Endoscopia Terapêutica; 2021. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/assuntosgerais/duplicacao-cistica-de-esofago

Referências

  1. Nobuhara KK, Gorski YC, La Quaglia MP, Shamberger RC. Bronchogenic cysts and esophageal duplications: common origins and treatment. J Pediatr Surg [Internet]. 1997 Oct;32(10):1408–13. Available from: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/9349757
  2. Pisello F, Geraci G, Arnone E, Sciutto A, Modica G, Sciumè C. Acute onset of esophageal duplication cyst in adult. Case report. G Chir [Internet]. 30(1–2):17–20. Available from: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/19272226
  3. Whitaker JA, Deffenbaugh LD, Cooke AR. Esophageal duplication cyst. Case report. Am J Gastroenterol [Internet]. 1980 Apr;73(4):329–32. Available from: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/7416128
  4. Bowton DL, Katz PO. Esophageal cyst as a cause of chronic cough. Chest [Internet]. 1984 Jul;86(1):150–2. Available from: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/6734280
  5. Adler D, Liu R. Duplication cysts: Diagnosis, management, and the role of endoscopic ultrasound. Endosc Ultrasound [Internet]. 2014;3(3):152. Available from: http://www.eusjournal.com/text.asp?2014/3/3/152/138783
  6. Bhatia V, Tajika M, Rastogi A. Upper gastrointestinal submucosal lesions–clinical and endosonographic evaluation and management. Trop Gastroenterol [Internet]. 31(1):5–29. Available from: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/20860221
  7. Wildi SM, Hoda RS, Fickling W, Schmulewitz N, Varadarajulu S, Roberts SS, et al. Diagnosis of benign cysts of the mediastinum: the role and risks of EUS and FNA. Gastrointest Endosc [Internet]. 2003 Sep;58(3):362–8. Available from: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/14528209
  8. Cevasco M, Menard MT, Bafford R, McNamee CJ. Acute Infectious Pseudoaneurysm of the Descending Thoracic Aorta and Review of Infectious Aortitis. Vasc Endovascular Surg [Internet]. 2010 Nov 30;44(8):697–700. Available from: http://journals.sagepub.com/doi/10.1177/1538574410376449
  9. Béchade D, Desramé J, Algayres JP. Gastritis cystica profunda in a patient with no history of gastric surgery. Endoscopy [Internet]. 2007 Dec;39(S 1):E80–1. Available from: http://www.thieme-connect.de/DOI/DOI?10.1055/s-2006-945070
  10. Salo JA, Ala-Kulju K V. Congenital esophageal cysts in adults. Ann Thorac Surg [Internet]. 1987 Aug;44(2):135–8. Available from: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/3619537
  11. Versleijen MW, Drenth JP, Nagengast FM. A Case of Esophageal Duplication Cyst with a 13-year Follow-up Period. Endoscopy [Internet]. 2005 Sep;37(9):870–2. Available from: http://www.thieme-connect.de/DOI/DOI?10.1055/s-2005-870219
  12. Noguchi T, Hashimoto T, Takeno S, Wada S, Tohara K, Uchida Y. Laparoscopic resection of esophageal duplication cyst in an adult. Dis esophagus Off J Int Soc Dis Esophagus [Internet]. 2003;16(2):148–50. Available from: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/12823217

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Lesões Sésseis Serrilhadas

Introdução

No Brasil, o câncer colorretal (CCR) é o terceiro mais comum. Estimavam-se, para o ano de 2020, 17.760 novos casos em homens (7,9%) e 20.470 em mulheres (9,2%)(INCA, 2020). Considerando esses números, o CCR é o segundo tipo de câncer mais frequente nas mulheres e o terceiro na população masculina, excluindo-se os casos de tumores de pele não melanoma.

No passado, as lesões serrilhadas eram classificadas como pólipos hiperplásicos e sem potencial de malignização (Rex et al., 2012). Atualmente, estima-se que a via serrilhada de carcinogênese é responsável por cerca de 20 a 30% dos casos de CCR. Este dado nos mostra a importância de conhecermos melhor tais lesões, pois, em números absolutos, representa um impacto maior que outros tumores do aparelho digestivo, como as neoplasias de estômago e pâncreas (Rex et al., 2012; Crockett et al., 2015; Siegel et al., 2017).

Características das lesões sésseis serrilhada

As lesões sésseis serrilhadas (LSS) apresentam características clínicas, genéticas e histológicas distintas dos adenomas. Por tal motivo, a Organização Mundial de Saúde (OMS) alterou a nomenclatura da classificação dos pólipos e lesões serrilhadas. Atualmente, são aceitas as seguintes nomenclaturas: Pólipo hiperplásico (PH); Pólipo hiperplásico tipo microvesicular; Pólipo hiperplásico tipo rico em células caliciformes; Lesões sésseis serrilhadas (LSS); Lesões sésseis serrilhadas com displasia (LLSD); Adenoma serrilhado tradicional (AST) e Adenomas serrilhados não classificáveis, estes incluem os adenomas tubulovilosos serrilhados, recentemente descritos (WHO, 2019).

Epidemiologia

  • As LSSs representam cerca de 10% dos pólipos cólicos;
  • São mais comuns em idosos, mas a idade não parece ser um fator tão influenciador quanto nos adenomas convencionais;
  • São mais prevalentes em caucasianos e, discretamente, mais comuns em mulheres;
  • Tabaco, álcool e IMC alto foram relacionados com aumento do risco para LSSs;
  • Já o uso de anti-inflamatório não esteroidal, dieta rica em folato, cálcio e fibras foram relacionados como fatores de proteção (Crockett 2014; O’Connell e Crockett, 2017).

Características endoscópicas

Localizam-se mais comumente no cólon proximal (70-80%), apresentam morfologia plana, principalmente durante a insuflação do cólon, e coloração semelhante à da mucosa normal, dificultando o seu diagnóstico e tratamento endoscópico (Pohl et al., 2013; Crockett et al., 2015).

Lesões Sésseis Serrilhadas

Exame com luz branca.

Lesões Sésseis Serrilhadas

Exame com LCI.

Cromoscopia com índigo.

Lesões Sésseis Serrilhadas

Ressecção endoscópica por ESD.

Pós-ressecção por ESD.

Etiopatogenia

As LSSs estão relacionadas a uma via alternativa de carcinogênese, descrita há pouco mais de 15 anos.

A LSS pathway se caracteriza pela mutação do oncogene BRAF como evento inicial (70-80%) que pode ocorrer na mucosa normal ou em um pólipo hiperplásico tipo microvesicular.

Posteriormente, ocorre hipermetilação das ilhas CpG (regiões do genoma ricas em CpG ou Citosina – Phosfato – Guanina) nas regiões promotoras de genes supressores de tumor (CIMP). Consequentemente, ocorre o silenciamento desses genes (MGMT, MLH1, p16, MINT1, MINT2 ou MINT31) em 70-76% das lesões. CIMP pode ser alto (quando mais de dois genes são metilados), baixo ou ausente.

A progressão para displasia e câncer invasivo acontece por metilação dos genes de reparo do DNA (MLH1, MSH2, MSH6 e PMS2), levando à instabilidade de microssatélites (MSI), normalmente numa velocidade mais rápida que a via adenoma-carcinoma. (WHO, 2019; Patai et al., 2013) (Figura 1).

Diferentemente das LSSs, os ASTs se apresentam predominantemente na forma polipóide e localizados no cólon distal e reto em 70% dos casos. A carcinogênese também difere, ocorrendo a mutação KRAS, primariamente, a partir da mucosa normal ou de pólipo hiperplásico rico em células caliciformes, seguida de supressão do p53 nas lesões que evoluem para displasia de alto grau e/ou carcinoma (WHO, 2019).

Figura 1. Carcinogênese das lesões serrilhadas. Fonte: WHO, 2019

Diagnóstico

A colonoscopia é considerada menos efetiva na prevenção do CCR no cólon proximal quando comparada ao cólon distal (Nishihara et al., 2013). Fato que pode ser constatado observando os tumores denominados de intervalo, diagnosticados após um exame de rastreamento negativo. Eles, na sua maioria, apresentam características moleculares semelhantes às LSSs (Le Clercq e Sanduleanu, 2014).

Com os avanços tecnológicos, a qualidade da imagem dos exames endoscópicos permite um maior número de lesões diagnosticadas e um melhor estudo da superfície das mesmas, principalmente quando é possível utilizar magnificação de imagem e cromoscopia eletrônica e/ou convencional. Foi estudando a superfície das lesões que surgiu a classificação de Kudo. Ela prevê cinco tipos de abertura de criptas, sendo um deles, o tipo II, característico dos pólipos hiperplásicos, mas este não os difere das LSSs.

Em 2012, Kimura et al. publicaram um novo padrão de cripta para identificar as lesões precursoras originárias de LSSs e o subclassificaram como tipo II-O (Figura 2). O estudo mostrou que o padrão tipo II-O é altamente preditivo para lesões sésseis serrilhadas com sensibilidade de 65.5% e especificidade de 97.3%. A identificação do tipo II-O também mostrou significante relação com a presença de mutação BRAF e CIMP positivo [OR (IC 95 %) 39.3 (9.9 – 155.7); 32.1 (9.1 – 113.1)], mostrando-se ser um importante achado de lesões com risco de malignização e que precisam ser tratadas (Kimura et al., 2012).

Figura 1. Carcinogênese das lesões serrilhadas. Fonte: WHO, 2019

A taxa de detecção de lesões neoplásicas é um índice de qualidade da colonoscopia, para as LSSs os números ainda são bem variáveis, mas a sociedade britânica de gastroenterologia recomenda que essa taxa seja de pelo menos 5% em paciente com indicação de realização do exame para rastreamento (East et al., 2017).

Os guidelines ocidentais recomendam que qualquer lesão serrilhada proximal ao ângulo esplênico deve ser ressecada, diferentemente de lesões com características hiperplásicas no sigmoide e reto. No Japão, a conduta nas lesões serrilhadas é variável de acordo com a instituição, mas a indicação de ressecção é baseada no exame minucioso da superfície com cromoscopia e magnificação (Tanaka et al., 2020).

Tratamento endoscópico

As LSSs menores que 10 mm devem ser tratadas sem eletrocautério, realizando-se ressecção a frio (RAF). A RAF é superior à ressecção com pinça para o tratamento de pequenos pólipos, pois é possível garantir margens, devendo-se incluir na apreensão 1 a 2 mm de mucosa normal (Ma et al., 2017).

As LSSs maiores que 10 mm devem ser tratadas como primeira opção por meio da mucosectomia (endoscopic mucosal resection – EMR) em fragmento único ou piecemeal, apesar de, nos últimos anos, alguns trabalhos mostrarem a mucosectomia a frio como uma boa opção (Ma et al., 2017; Kaltenbach et al., 2020).

Em lesões ≥ 20 mm, a EMR possui baixo risco de complicação (1%) e recorrência local (14%), como Hassan et al. evidenciaram em revisão sistemática (Hassan et al. 2016). A desvantagem da EMR piecemeal está na limitação da avaliação histológica, pois não é possível a avaliação de margens laterais, além de uma maior taxa de recidiva local em relação às ressecções em monobloco. (Okamoto et al., 2016).

Pohl et al. mostraram que a taxa de ressecção incompleta das LSSs foi quatro vezes maior que os adenomas (31.0% vs 7.2%; P ≤ 0.001), e lesões que mediam entre 10 e 20 mm foram tratadas de forma incompleta em 47,6%, possivelmente devido à localização, morfologia e dificuldade de avaliação de sua bordas (Pohl et al., 2013).

No entanto, os trabalhos mais recentes mostram uma baixa taxa recorrência de 3.6% (95% CI, 0.5%– 6.7%) para lesões ≥ 10 mm e de 7-8.7% para ≥ 20 mm com a utilização da técnica clássica de EMR (Kaltenbach et al., 2020).

Lesões neoplásicas com características de alto grau e/ou presença de fibrose são indicações de ressecção em monobloco por dissecção endoscópica da submucosa (endoscopic submucosal dissection – ESD) (Tanaka et al., 2020). Uma alternativa à ESD, nesses casos, pode ser a EMR underwater, visto que aumenta as chances de ressecção em fragmento único (Binmoeller et al., 2015). No entanto, tais técnicas apresentam um maior potencial de complicações, como perfuração e sangramento, quando comparados à EMR clássica e devem ser executadas em centros de referência (Saito et al., 2010; Tanaka et al., 2015b; Binmoeller et al., 2015).

Vigilância

O acompanhamento após ressecção de LSSs ainda possui divergências e pouca evidência científica, mas a orientação das sociedades americanas, US Society Task Force, publicada em 2020, está resumida na tabela abaixo (Tabela 1).

Tabela 1. Recomendação para seguimento com colonoscopia após polipectomia de PHs, LSSs e ASTs. Fonte: Gupta et al. 2020.

Como citar esse artigo:

Mello, BB. Lesões Sésseis Serrilhadas. Endoscopia Terapêutica; 2021. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/assuntosgerais/lesoes-sesseis-serrilhadas

Referências

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  3. East JE, Atkin WS, Bateman AC, Clark SK, Dolwani S, Ket SN, Leedham SJ, Phull PS, Rutter MD, Shepherd NA, Tomlinson I, Rees CJ. British Society of Gastroenterology position statement on serrated polyps in the colon and rectum. Gut. 2017 Jul;66(7):1181-1196.
  4. Gupta S, Lieberman D, Anderson JC, Burke CA, Dominitz JA et al. Recommendations for Follow-Up After Colonoscopy and Polypectomy: A Consensus Update by the US Multi-Society Task Force on Colorectal Cancer. Gastrointestinal Endoscopy 2020;91: 463-485.
  5. Hassan C, Repici A, Sharma P, et al. Efficacy and safety of endoscopic resection of large colorectal polyps: a systematic review and meta- analysis. Gut 2016;65:806-20.
  6. Kaltenbach T, Anderson JC, Burke CA, Dominitz JA, Gupta S, Lieberman D, Robertson DJ, Shaukat A, Syngal S, Rex DK. Endoscopic Removal of Colorectal Lesions Recommendations by the US Multi-Society Task Force on Colorectal Cancer. American Society for Gastrointestinal Endoscopy, AGA Institute, and the American College of Gastroenterology. Gastrointestinal Endoscopy 2020;91: 486-519.
  7. Kimura T , Yamamoto E , Yamano HO et al. A novel pit pattern identifies the precursor of colorectal cancer derived from sessile serrated adenoma. Am J Gastroenterol 2012 ; 107 : 460 – 9.
  8. Le Clercq CMC, Sanduleanu S. Interval colorectal cancers: What and why. Curr Gastroenterol Rep. 2014;16(3):375.
  9. Ma MX, Bourke MJ. Sessile Serrated Adenomas: How to Detect, Characterize and Resect. Gut Liver. 2017 May 11. doi: 10.5009/gnl16523.
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  11. O’Connell BM, Crockett SD. The clinical impact of serrated colorectal polyps. Clin Epidemiol. 2017, 22;9:113-125.
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  13. Patai A V, Molnár B, Tulassay Z, Sipos F. Serrated pathway: alternative route to colorectal cancer. World J Gastroenterol 2013;19(5):607–15.
  14. Pohl H, Srivastava A, Bensen SP, Anderson P, Rothstein RI, Gordon SR, et al. Incomplete polyp resection during colonoscopy-results of the complete adenoma resection (CARE) study. Gastroenterology. 2013;144(1):74-80.
  15. Rex DK, Ahnen DJ, Baron JA, Batts KP, Burke CA, Burt RW, Goldblum JR, Guillem JG, Kahi CJ, Kalady MF, O’Brien MJ, Odze RD, Ogino S, Parry S, Snover DC, Torlakovic EE, Wise PE, Young J, Church J. Serrated lesions of the colorectum: review and recommendations from an expert panel. Am J Gastroenterol 2012; 107:1315-1329.
  16. Siegel RL, Miller KD, Jemal A. Cancer Statistics, 2017. CA Cancer J Clin. 2017; 67:7
  17. Tanaka S, Kashida H, Saito Y et al. Japan Gastroenterological Endoscopy Society guidelines for colorectal endoscopic submucosal dissection/endoscopic mucosal resection. Digestive Endoscopy 2020; 32: 219–239.
  18. WHO Classification of Tumors Editorial Board. Digestive system tumours. Lyon (France): Internacional Agency for Reseach on Cancer; 2019. (WHO classification of tumor series, 5th ed.; vol 1).

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Caso Clínico – Corpo Estranho em Cólon

Relato do caso:

Paciente do sexo feminino, 75 anos, deu entrada no PS por dor abdominal em flanco esquerdo há cerca de 20 dias, hiporexia, perda ponderal de 5 kg, astenia e febre. Antecedentes: DRGE. Em uso de omeprazol e domperidona. Ao exame físico: bom estado geral, afebril, eupneica. PA: 130 x 70, FC: 110 bpm. Abdome: globoso, flácido, doloroso à palpação profunda em flanco e fossa ilíaca esquerda. DB negativo. RHA +.

RX de abdome: Ausência de sinais de pneumoperitônio, mas com distensão de alças colônicas.

RX de abdome corpo estranho em cólon

 

TC de abdome: Material hiperatenuante alongado na topografia de sigmoide associada à densificação da gordura sugerindo processo inflamatório (microperfuração). Não identificado pneumoperitônio.

TC de abdome corpo estranho em cólon

 

Optado por realizar colonoscopia que evidenciou um corpo estranho (osso de galinha) em sigmoide transfixando a parede colônica em suas duas extremidades com presença de processo inflamatório local (hiperemia e secreção purulenta), além de inúmeros óstios diverticulares. Optado por mobilizar o osso com pinça de corpo estranho (tipo “jacaré”) para o interior da luz colônica e, consequentemente, deslocamento da outra extremidade. Realizada a retirada sem intercorrências. Optado por colocação de hemoclipes em cada leito. Paciente teve alta após 48h, com melhora da dor abdominal, sem febre e boa aceitação de dieta VO.

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colonoscopia corpo estranho em cólon

Discussão:

A ingestão acidental de corpo estranho é um problema frequente em atendimentos de emergência. Felizmente, em apenas 1% dos casos ocorre perfuração em alguma porção do trato gastrointestinal. Os corpos estranhos alongados e pontiagudos (palito de dente, espinha de peixe e osso de galinha) são os que estão mais associados à perfuração, sendo o intestino delgado o local mais frequente. O diagnóstico, geralmente, é tardio e a ingestão do corpo estranho não é relatada pelo paciente. Idosos, usuários de dentaduras, alcoólatras e pacientes psiquiátricos são a população mais predisposta.

A radiografia convencional tem sensibilidade diminuída para a maioria dos corpos estranhos. A tomografia de abdome tem melhor sensibilidade e acurácia para corpos estranhos calcificados e não calcificados.

A perfuração é consequente à impactação e erosão progressiva do corpo estranho contra a parede intestinal. O pneumoperitônio não é comum por conta de o local da perfuração ser recoberto por fibrina, omento e outras alças intestinais, o que limita a passagem de grande quantidade de gás para a cavidade peritoneal.

O tratamento endoscópico vs cirúrgico vai depender da presença de complicações (perfurações com abscesso intracavitário, fístulas), mas, frequentemente, tende a ser conservador (endoscópico).

Como citar esse artigo:

Carlos, A. Caso Clínico – Corpo Estranho em Cólon. Endoscopia Terapêutica; 2021. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/casosclinicos/caso-clinico-corpo-estanho-em-colon/

Referências bibliográficas:

  1. Clin J Gastroenterol.2017 Dec;10(6):491-497;
  2. Nicolodi GC et al Radiol Bras. 2016 Set/Out;49(5):295–299;
  3. World J Surg Oncol.2011 Feb 18;9:24. doi: 10.1186/1477-7819-9-24;
  4. Wien Klin Wochenschr.2009;121(5-6):220-2;
  5. Acta Gastroenterol Latinoam.1997;27(5):329-30.

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IV Consenso Brasileiro sobre Infecção pelo Helicobacter pylori

A infecção pelo Helicobacter pylori (HP), bactéria gram-negativa espiralada descrita por Warren e Marshall no início da década de 80, é uma das infecções mais comuns no ser humano em todo o planeta, com prevalência estimada em 50% da população mundial. É causa de diversas patologias, incluindo gastrite crônica, úlcera péptica e câncer gástrico. Recentes avanços no estudo do HP, como o conhecimento da crescente resistência aos antimicrobianos utilizados no seu tratamento, além de progressos no estudo da microbiota gástrica e sua interação com a bactéria em questão, justificaram a realização do IV Consenso Brasileiro sobre o Helicobacter pylori, ocorrido na cidade de Bento Gonçalves entre os dias 25 e 27 de agosto de 2017. O grupo formado por 26 especialistas foi dividido em quatro grupos de trabalho menores (Epidemiologia e Diagnóstico; Dispepsia, Alterações na Microbiota Intestinal e outras desordens; Câncer Gástrico; Tratamento), cujos participantes elaboraram declarações que foram votadas por todos os integrantes. O índice de consenso adotado foi o de que 80% dos especialistas respondessem que concordavam forte ou parcialmente com cada declaração proposta, resultando nas 30 declarações finais. O grande destaque do Consenso ficou por conta da recomendação de aumento da duração do tratamento de primeira linha de 7 para 14 dias, em linha com a recomendação dos consensos europeu, canadense e americano (3, 4 e 5).

Seguem as recomendações do Consenso Brasileiro, sobre infecção pelo Helicobacter pylori, divididas nos quatro grupos citados:

Grupo 1: Epidemiologia e Diagnóstico

Declaração 1:

No Brasil, os fatores de risco para adquirir a infecção por HP são condições de vida inadequadas, status sanitário e socioeconômico baixos. Não há evidência bem estabelecida sobre a dinâmica da prevalência da infecção por HP no Brasil.

Nível de Evidência (NE): 3B

Grau de Recomendação (GR): B

Declaração 2:

O teste respiratório com ureia 13C é o método padrão-ouro para o diagnóstico não invasivo da infecção por HP. O teste de antígeno fecal usando anticorpos monoclonais é uma boa alternativa, entretanto a disponibilidade destes dois métodos no Brasil é limitada.

NE: 1A

GR: A

Declaração 3:

Para o estudo do HP usando o teste rápido da urease (TRU), recomenda-se a coleta de um fragmento do antro e um do corpo. Para exame histológico, coleta de dois fragmentos do antro e dois do corpo é recomendada porque isso permite a análise morfológica da mucosa. TRU sozinho não é recomendado para controle da terapia de erradicação.

NE: 1A

GR: A

Declaração 4:

A pesquisa de HP, após a terapia de erradicação, deve ser realizada pelo menos 4 semanas após o término do tratamento. O teste respiratório com ureia 13C e a pesquisa do antígeno fecal com anticorpo monoclonal são os métodos de escolha. Histologia é um método invasivo alternativo.

NE: 1A

GR: A

Declaração 5:

Testes moleculares podem ser usados para acessar a resistência do HP a antimicrobianos após falha ao segundo ou terceiro tratamentos. A indisponibilidade de cultura do HP e antibiograma limita o uso destes testes.

NE: 4 

GR: C

Declaração 6:

Testes sorológicos localmente validados são os métodos de escolha para estudos de rastreamento de base populacional. A sorologia pode ser usada como o teste inicial para diagnosticar a infecção por HP, especialmente na presença de sangramento gastrointestinal, gastrite atrófica, linfoma MALT ou câncer gástrico.

NE: 2A

GR: B

Declaração 7:

O uso de IBPs deve ser descontinuado por 2 semanas antes da realização de testes diagnósticos para a infecção por HP, exceto a sorologia. O uso de antibióticos e sais de bismuto deve ser descontinuado por 4 semanas antes desses testes diagnósticos.

NE: 2B 

GR: B

Declaração 8:

Indicação de endoscopia para o paciente com sangramento digestivo alto torna a histologia do teste recomendado naquele paciente com indicação para a pesquisa de HP. O teste respiratório é uma alternativa. Uma nova pesquisa de HP deve ser conduzida em pacientes com resultado negativo no primeiro teste.

NE: 4

GR: C

Grupo 2: Dispepsia, Microbiota e outras desordens

Declaração 9:

A estratégia “teste e trate” é recomendada para pacientes abaixo de 40 anos com dispepsia, ainda não diagnosticados com HP e sem sintomas de alarme. O teste de escolha para o diagnóstico e controle de tratamento é o teste respiratório com ureia 13C.

NE: 1B

GR: A

Declaração 10:

A dispepsia é muito comum e é classificada como investigada e não investigada. Após investigação, a dispepsia é agora classificada como orgânica, associada ao HP ou funcional.

NE: 1C 

GR: A

Declaração 11:

Pacientes com dispepsia e HP devem ser submetidos à terapia de erradicação do HP.

NE: 3A 

GR: B

Declaração 12:

HP e as drogas utilizadas na terapia de erradicação afetam a fisiologia das microbiotas gástrica e intestinal e podem modificar a microbiota, com graves consequências para a saúde global.

NE: 5

GR: D

Declaração 13:

O uso de probióticos associados à terapia de erradicação é uma tentativa de otimizar a erradicação do HP e minimizar os efeitos adversos, reequilibrando a microbiota. Mais estudos são necessários para melhor definir a cepa, a quantidade, o tempo e o período de suplementação.

NE: 4 

GR: C

Declaração 14:

Há evidência de uma associação entre infecção por HP, anemia ferropriva de etiologia desconhecida, Púrpura Trombocitopênica Imune (PTI) e deficiência de vitamina B12. Em outras condições extragastroduodenais, pode haver associações positivas e negativas sem nenhuma causalidade comprovada.

NE: 3A

GR: B

Declaração 15:

Não há evidência de uma associação entre infecção por HP e Doença do Refluxo Gastroesofágico (DRGE). A erradicação da bactéria usualmente não leva ao início de sintomas de DRGE. Evidência epidemiológica indica uma correlação negativa entre infecção por HP, esôfago de Barret e adenocarcinoma do esôfago distal.

NE: 3A

GR: B

Declaração 16:

Em pacientes infectados por HP, o uso de anti-inflamatórios não esteróides (AINEs) ou ácido acetil salicílico (AAS), mesmo em baixas doses, aumenta o risco de úlcera e suas complicações. Anticoagulantes (cumarínicos, Clopidogrel e os novos anticoagulantes orais) podem aumentar o risco de úlcera/sangramento em pacientes infectados por HP. Em pacientes sob alto risco de desenvolvimento de úlceras, antes do início de tratamento de longo prazo com AINEs ou AAS, mesmo em baixas doses, HP deve ser pesquisado e erradicado. Entretanto, a erradicação isoladamente não previne a recorrência de úlcera/sangramento.

NE: 1B 

GR: A

Grupo 3: Câncer gástrico

Declaração 17:

O câncer gástrico tem uma incidência intermediária no Brasil; é uma das cinco principais causas de mortalidade por câncer no país e sua incidência apresenta diferenças regionais.

NE: 2C  

GR: B

Declaração 18:

A erradicação do HP associa-se com um decréscimo nas taxas de câncer gástrico.

NE: 1A 

GR: A

Declaração 19:

A análise sorológica da atrofia gástrica utilizando o pepsinogênio I (PGI) e o pepsinogênio II (PGII), combinados com anticorpos contra HP e gastrina 17, pode ser usada para identificar populações sob risco de câncer gástrico. Entretanto, mais estudos são necessários para validar esse instrumento no Brasil.

NE: 3A

GR: B

Declaração 20:

Estudos epidemiológicos, experimentais, moleculares e clínicos têm confirmado o papel do HP como fator de risco para câncer gástrico.

NE: 1A

GR: A

Declaração 21:

O diagnóstico de linfoma MALT baseia-se na avaliação histopatológica e imunohistoquímica das biópsias gástricas junto com a pesquisa de HP.

NE: 1A 

GR: A

Declaração 22:

O seguimento de pacientes com linfoma MALT após a erradicação do HP requer avaliações histopatológicas periódicas. O sistema GELA é um método morfológico adequado para o seguimento.

NE: 4

GR: C

Declaração 23:

O estadiamento de lesões pré-neoplásicas deve ser baseado em pelo menos quatro biópsias endoscópicas (duas do antro e duas do corpo) usando o sistema OLGA para estadiamento histológico da gastrite. Pacientes classificados como OLGA III ou IV devem ser submetidos a seguimento endoscópico a cada 2 anos.

NE: 2C 

GR: B

Grupo 4: Tratamento

Declaração 24:

Apesar dos níveis de resistência crescentes à Claritromicina e às Fluoroquinolonas no Brasil, o seu uso ainda é recomendado no tratamento do HP. Apesar da alta resistência in vitro aos nitroimidazólicos, estas drogas podem ser prescritas em situações, doses e períodos específicos.

NE: 2C 

GR: B

Declaração 25:

A duração da terapia de erradicação do HP deve ser de 14 dias, especialmente para a terapia tripla padrão, a fim de alcançar uma alta taxa de erradicação.

NE: 2A

GR: B

Declaração 26:

Usar IBPs após a erradicação do HP para cicatrizar úlcera péptica duodenal é desnecessário. Em casos de úlcera gástrica ou úlceras gastroduodenais complicadas, tratamento com IBPs por 4 a 8 semanas após a terapia de erradicação é recomendado.

NE: 2C

GR: B

Declaração 27:

A terapia tripla consistindo na combinação de IBP, Amoxicilina e Claritromicina por 14 dias é recomendada como tratamento de primeira linha. Alternativas incluem terapia quádrupla com Bismuto por 10 a 14 dias e terapia concomitante por 14 dias.

NE: 2A 

GR: B

Declaração 28:

Em casos de falha à terapia tripla com Claritromicina ou à terapia quádrupla concomitante, as estratégias recomendadas são terapia tripla com Levofloxacina ou terapia quádrupla com Bismuto, ambas por 10 a 14 dias. Em caso de falha de um dos dois regimes de segunda linha recomendados, o outro regime de tratamento deve ser usado como terapia de terceira linha.

NE: 2A

GR: B

Declaração 29:

O tratamento do HP após três falhas terapêuticas deve ser restrito a casos especiais e guiado por testes fenotípicos ou genotípicos de susceptibilidade antimicrobiana. O uso de Rifabutina, quando disponível, pode ser uma alternativa.

NE: 3A

GR: B

Declaração 30:

A recomendação para indivíduos com alergia à Amoxicilina é IBP 2x/dia + Claritromicina 500 mg 2x/dia + Levofloxacina 500 mg 1x/dia por 14 dias;

ou

IBP 2x/dia + Doxiciclina 100 mg 2x/dia ou Tetraciclina 500 mg 4x/dia + Metronidazol 500 mg 3x/dia + Bismuto 240 mg 2x/dia por 14 dias.

NE: 4 

GR: C

Como citar este artigo:

Caetano J. IV Consenso Brasileiro sobre Infecção pelo Helicobacter pylori. Endoscopia Terapêutica; 2021. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/assuntosgerais/iv-consenso-brasileiro-sobre-infeccao-pelo-helicobacter-pylori

Link: clique aqui e leia o artigo original

Bibliografia:

  1. Coelho LGV, Marinho JR, Genta R, Ribeiro LT, Passos MCF, Zaterka S, Assumpção PP, Barbosa AJA, Barbuti R, Braga LL, Breyer H, Carvalhaes A, Chinzon D, Cury M, Domingues G, Jorge JL, Maguilnik I, Marinho FP, Moraes Filho JP, Parente JML, Paula-e-Silva CM, Pedrazzoli Júnior J, Ramos AFP, Seidler H, Spinelli JN, Zir JV. IVth Brazilian Consensus Conference on Helicobacter pylori infection
  2. Helicobacter pylori – Edições Monotemáticas FBG – Edição 2011.
  3. Malfertheiner P, Megraud F, O’Morain CA, Gisbert JP, Kuipers EJ, Axon AT, et al. Management of Helicobacter pylori infection-the Maastricht V/Florence Consensus Report. Gut. 2017;66:6-30.
  4. Carlo A. Fallone, Naoki Chiba, Sander Veldhuyzen van Zanten, Lori Fischbach, Javier P. Gisbert, Richard H. Hunt, Nicola L. Jones, Craig Render, Grigorios I. Leontiadis, Paul Moayyedi and John K. Marshall. The Toronto Consensus for the Treatment of Helicobacter pylori Infection in Adults. Canadian Association of Gastroenterology. Gastroenterology 2016;151:51–69.
  5. W i l l i a m D . C h e y , M D , F A C G, Grigorios I. Leontiadis , MD, PhD, Colin W. Howden , MD, FACG a n d S t e v e n F . M o s s , M D , F A C G. ACG Clinical Guideline: Treatment of Helicobacter pylori Infection. Am J Gastroenterol 2017; 112:212–238; doi:10.1038/ajg.2016.563; published online 10 January 2017.

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As principais lesões musculoesqueléticas que acometem os médicos endoscopistas e a importância da correta ergonomia em seu ambiente de trabalho

ergonomia na endoscopia

 

As doenças ocupacionais estão ligadas às mais variadas profissões, tendo evoluído ao longo dos anos e ocorrendo silenciosamente nos ambientes de trabalho.

Esse termo se originou a partir do grego ergon, que significa “trabalho”, e nomos, que quer dizer “leis ou normas”.

A escolha pela realização de uma revisão da literatura se fez necessária para comprovar a necessidade de se conhecer melhor a realidade do ambiente de trabalho do médico endoscopista devido ao aumento constante do volume e tempo dos procedimentos endoscópicos nos últimos anos.

Devido à escassez de estudos recentes sobre esse tema, foram escolhidos artigos publicados entre os anos 1994 a 2018, sendo encontrados 17 artigos específicos sobre o tema.

No Brasil, a norma regulamentadora NR-17, publicada em 1978 pelo Ministério de Trabalho e Emprego, dispõe sobre os “parâmetros que permitam a adaptação das condições de trabalho às características psicofisiológicas dos trabalhadores, de modo a proporcionar um máximo de conforto, segurança e desempenho eficiente” (Brasil, 1978).

As atividades ocupacionais desenvolvidas nos setores médico-hospitalares, clínicas e ambulatórios merecem maior atenção devido à importante demanda ergonômica.

Estudos recentes mostram que os médicos endoscopistas gastam pelo menos 43% do seu tempo realizando procedimentos endoscópicos, sendo a necessidade da avaliação ergonômica, primordial, devido às altas taxas de sintomas musculoesqueléticos e lesões por esforço repetitivo nesses profissionais.

Os artigos concordam em informar que as lesões e dores nos polegares, nas mãos, pescoço, costas, polegares (principalmente o esquerdo), ombro e punho são as mais comumente relatadas e, não surpreendentemente, os riscos parecem estar relacionados principalmente a fatores como: tempo de profissão, constante aumento do volume de exames e aumento da dificuldade para execução de novos procedimentos, que antigamente eram exclusivo de cirurgiões, postura e tempo prolongado do exame em que o profissional precisa se manter em pé, manipulação do aparelho e execução de força e torque com a mão direita.

Os estudos mostraram a prevalência de cerca de 37% a 89% de queixas musculoesqueléticas entre os endoscopistas, sendo que cerca de 67% desses profissionais trabalham em locais com péssima ergonomia e/ou possuem hábitos ergonômicos ruins.

Estudos mais recentes estimam que, após 10 anos de exposição ao trabalho, aproximadamente 10% dos endoscopistas teriam uma doença musculoesquelética, portanto, princípios ergonômicos claros e básicos deveriam ser incorporados à prática da endoscopia.

A aplicação de princípios ergonômicos básicos, como manter posturas neutras do punho, pescoço e ombros durante a endoscopia, não exagerar na força com as mãos e otimizar o design do aparelho usado, pode reduzir as queixas de dores e risco de lesões, além de tornar os procedimentos mais confortáveis para o médico.

Para que os endoscopistas consigam se manter em posturas neutras, o local de trabalho deve ser planejado para se adequar à maioria da população de endoscopista, de ambos os sexos, pois nem todos endoscopistas estão cientes dos riscos físicos aos quais estão expostos a cada dia como resultado do esforço repetitivo que aumenta o risco de sofrer lesões musculoesqueléticas agudas, podendo resultar em lesões permanentes e incapacidade.

O ambiente em que se trabalha e a rotina adquirida pode influenciar diretamente na saúde desses profissionais, como as superfícies do piso, macas, assentos, alturas de monitores de vídeo, qualidade dos aparelhos, falta de pausas entre longos procedimentos, entre outros.

Os sintomas podem variar desde dores leves até lombalgias mais graves, dormência, formigamento, atrofia e fraqueza e, inevitavelmente, a carreira profissional pode ser seriamente afetada por essas lesões permanentes decorrentes dos seus hábitos de trabalho.

Portanto, percebe-se que a maior parte dos médicos endoscopistas não está ciente dos perigos físicos a que estão expostos durante o trabalho e como preveni-los.

Principais lesões que acometem os endoscopistas

Síndromes do pescoço e do ombro

Com a introdução da videoendoscopia no lugar da fibroendoscopia, seria de esperar que as lesões no pescoço e ombros ocorressem com menos frequência, porém, as queixas de dores em pescoço e ombro foram umas das mais frequentes entre os endoscopistas, sendo necessário que a altura dos monitores seja ajustável ao nível dos olhos dos profissionais, evitando a hiperextensão cervical.

Lesões ulnar e radial

Alguns endoscopistas apresentaram parestesias em seu braço dominante, que emana de seus cotovelos e pode ser secundário ao aprisionamento do nervo ulnar ou radial.

Com o esforço repetitivo ocorrido durante os exames, ocorreu inflamação aumentando a compressão, comprimindo o nervo e produzindo parestesias e inibindo toda a amplitude de movimento.

Lombalgia e doenças da coluna lombar e sacral

A maior parte dos endoscopistas queixava-se de moderada ou forte dor nas costas após um dia de realização de procedimentos, pelo resultado de trauma contínuo ou repetitivo na coluna lombo-sacral, especialmente pelo longo período em pé.

A maioria dos endoscopistas contorce seus corpos e costas de acordo com as exigências de se levantar e trabalhar em posições inadequadas, sendo que em alguns exames, como a colangiopancreatografia retrógrada endoscópica, por exemplo, é obrigatório o uso de um pesado e desconfortável avental de chumbo.

Essas ações resultaram em algumas complicações, como a hérnia de disco em uma pequena porcentagem dos endoscopistas estudados.

Síndrome do polegar do endoscopista

A lesão conhecida como “polegar do endoscopista” – ou Síndrome de De Quervain (tenossinovite ou um espessamento inflamatório da bainha tendínea do extensor curto e abdutor longo do polegar) – foi relatada por muitos desses profissionais como uma das lesões mais comuns que os acometem, pois resulta do uso repetitivo do polegar esquerdo, que é essencial para girar as manoplas que controlam a angulação da ponta distal do endoscópio. É possível usar a técnica de duas mãos para evitar essa lesão, mas não é tão eficiente quanto a técnica de um polegar.

Ferimento do punho e mão

A lesão mais comum que afeta o punho ou a mão é a síndrome do túnel do carpo, a qual foi relatada por acometer médicos endoscopistas devido ao resultado de rotação repetitiva e torque do punho e da mão durante os procedimentos.

Lesões nos quadris, joelhos, pernas e pés

Devido ao longo tempo em pé gasto pelos endoscopistas durante os procedimentos, os mesmos relataram contorcer seus corpos, correndo o risco de ferir o sistema musculoesquelético de suporte.

Ao ferir as costas, os profissionais tentam mudar a posição para aliviar o desconforto e, ao fazê-lo, pode ocorrer inflamação, transferindo a lesão para quadris, joelhos, pernas e pés.

Dor nas pernas e nos pés

A maior parte das dores nas pernas apresentada pelos endoscopistas é transferida da dor nas costas ou quadris, sendo que a permanência por longos períodos em pé pode predispor à flebite e à fasceíte plantar.

O que fazer para evitar essas lesões?

Para otimizar a ergonomia na endoscopia, os artigos estudados recomendam:

  • Os principais determinantes das posturas da parte superior do corpo são a localização do paciente, colocação do equipamento que vai ser utilizado e localização do monitor;
  • Em todos exames endoscópicos, o posicionamento do monitor é um importante determinante da postura do tronco e cabeça. Os monitores devem ser colocados em frente ao endoscopista, para evitar rotação e flexão da coluna cervical e devem ser ajustáveis ao nível dos olhos. Com isto, percebeu que a colocação do monitor diretamente em frente ao endoscopista atinge uma postura neutra do pescoço e minimiza a rotação cervical;

O conjunto de endoscopia deve ser configurado com o monitor posicionado diretamente em frente ao endoscopista enquanto a endoscopia é realizada. A altura do monitor deve estar logo abaixo do nível dos olhos, com um ângulo de visão ideal de 15 a 25 graus abaixo do horizonte dos olhos, com uma distância de visualização de 52 cm a 182 cm, dependendo do tamanho do monitor e da preferência do endoscopista. Para acomodar o quinto percentil feminino à altura do 95º percentil do olho masculino, a altura do monitor deve ser ajustável de 93 cm a 162 cm.

Altura ideal do leito

A mesa de exame deve estar na altura do cotovelo ou abaixo dele (0-10 cm abaixo do cotovelo). Para acomodar o 5º percentil feminino ao percentil 95º da altura do cotovelo masculino, a altura da mesa de exame deve ser ajustável de 85 cm a 120 cm.

Os aparelhos utilizados pelos médicos endoscopistas devem ser feitos para facilitar o direcionamento e serem mais confortáveis para esses profissionais, devido a uma seção de controle mais leve, ao torque de angulação reduzido e ao melhor controle da ergonomia corporal. Devem integrar os avanços ergonômicos e tecnológicos de imagem para que os médicos tenham um melhor manuseio e operação por meio de um sistema completamente reprojetado, bem como uma tela de imagem para visualização de alta qualidade.

Sala ergonomicamente correta

Sala ergonomicamente correta. Fonte: Singa et al., 2018

 Medidas gerais

  • Fazer pequenas pausas e alongamentos simples após término de procedimentos prolongados;
  • Existem algumas técnicas para otimizar a ergonomia após e entre os exames endoscópicos, como: exercícios das mãos, punho, cotovelo, ombros, costas e pescoço com objetivo de prevenir lesões relacionadas a longos e/ou difíceis procedimentos;
  • Usar sapatos confortáveis;
  • Fazer exercícios físicos regularmente;
  • Ter alimentação saudável;
  • Se comportar como um “Endo atleta”, segundo o mais recente artigo sobre o tema (Singla M, Kwok RM, Deriban G, Young PE. Training the endo-athlete: an update in ergonomics in endoscopy. Clin Gastroenterol Hepatol. 2018;16(7):1003-6.).

Alongamento - ergonomia na endoscopia

A: alongamento de pulso. B: exercícios de fortalecimento para os músculos extensores dos dedos. C: alongamento do ombro. D: alongamento de costas.Fonte: Chang et al., 2017

Embora tenha havido avanços substanciais na tecnologia de imagem endoscópica, o processo de rotação do endoscópio e a deflexão da ponta pouco mudaram desde o desenvolvimento da endoscopia flexível.

Numerosas pesquisas estão em processo sobre novos dispositivos projetados para examinar e administrar novos tratamentos ao trato digestivo. Esses dispositivos podem diminuir o risco de lesão em um endoscopista por meio do uso de melhores princípios ergonômicos.

Uma solução proposta é o uso de um sistema com plataforma de controle do tipo joystick, usando assistência eletromecânica – em oposição à força mecânica pura – para transmitir energia ao eixo do instrumento. Tais tecnologias têm o potencial de diminuir as lesões pela diminuição da carga. Embora interessante e potencialmente útil, nenhum dos produtos está atualmente disponível para uso, nem mesmo nos Estados Unidos.

O artigo mais recente, de 2018, informa que devemos tratar nossos corpos como os atletas profissionais fazem: manter boa forma, incentivar os colegas a observar e fornecer feedback sobre nossas ações, otimizar nossas instalações de prática e alongar nossos músculos.

No futuro, as inovações tecnológicas prometem reduzir os estresses físicos inerentes ao trabalho do médico endoscopista, podendo preservar nossa própria saúde e continuar a melhorar a saúde dos nossos pacientes.

Resumo das medidas essenciais para melhoria do local de trabalho do médico endoscopista e prevenção das lesões:

  1. O monitor de vídeo deve estar posicionado preferencialmente em frente ao endoscopista durante a realização do exame;
  2. A altura do monitor deve estar logo abaixo do nível do olho, com um ângulo de visão ideal de 15 a 25 graus abaixo do horizonte dos olhos, com uma distância de visão de 52 cm a 182 cm. Para acomodar o percentil feminino à altura do percentil do olho masculino, a altura do monitor deve ser ajustável entre 93 cm a 162 cm. A mesa de exame deve estar abaixo da altura do cotovelo;
  3. Durante o CPRE, um avental mais adequado deve ser usado para reduzir as cargas na parte superior das costas e na coluna cervical;
  4. O tempo de recuperação do profissional entre os exames é muito importante;
  5. Uma pausa na endoscopia, preferencialmente com alongamento, é muito importante, pois permite que os grupos musculares descansem durante um ciclo de trabalho de endoscopia.

É necessária a realização de novos estudos que proporcionem um ambiente seguro, tanto no projeto da estação de trabalho como na melhoria dos aparelhos endoscópicos com objetivo de minimizar e evitar dores e lesões ocupacionais, o que pode ter um efeito prejudicial à saúde, à produtividade e à carreira desses profissionais.

Portanto, para um médico endoscopista que espera trabalhar por muitos anos, a compreensão sobre ergonomia e a prevenção de lesões são essenciais e devem ser integradas nessa profissão desde a residência e praticadas diariamente.

Como citar este artigo:

Dragojevic PR. As principais lesões musculoesqueléticas que acometem os médicos endoscopistas e a importância da correta ergonomia em seu ambiente de trabalho. Endoscopia Terapêutica; 2021. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/assuntosgerais/as-principais-lesoes-musculoesqueleticas-que-acometem-os-medicos-endoscopistas-e-importancia-da-correta-ergonomia-em-seu-ambiente-de-trabalho/

Para saber mais:

  1. ASGE Technology Committee, Pedrosa MC, Farraye FA, Shergill AK, Banerjee S, Desilets D, Diehl DL, Kaul V, Kwon RS, Mamula P, Rodriguez SA, Varadarajulu S, Song LM, Tierney WM. Minimizing occupational hazards in endoscopy: personal protective equipment, radiation safety, and ergonomics. Gastrointest Endosc. 2010;72(2):227-35.

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*Post editado pelo Dr Gerson Brasil




Estudo controlado e randomizado em pacientes com cálculos biliares grandes

Endoscopia Terapêutica

Recentemente, foi publicado na Endoscopy por Korugue e colaboradores o resultado de um estudo japonês multicêntrico, controlado e randomizado, em que pacientes com cálculos biliares grandes foram alocados em dois grupos: dilatação balonada da papila com balão dilatador grande (DBP) sem esfincterotomia ou somente esfincterotomia isolada.

O estudo foi realizado em 19 centros japoneses. Todos os pacientes com idade de 60 anos ou mais que foram encaminhados para CPRE por cálculos grandes do ducto biliar comum (maior ou igual a 10 mm) foram colocados no estudo. Para permitir o uso da dilatação balonada da papila, o tamanho do colédoco distal precisava ser maior ou igual a 12 mm e não apresentar sem estenose distal.

PROCEDIMENTOS:

* Dilatação sem papilotomia: após a canulação biliar, dilatação com balão grande tipo CRE (Boston) foi realizada. O tamanho máximo da dilatação foi determinado de acordo com o tamanho dos cálculos, mas não excedia o diâmetro do colédoco distal. O balão era desinsuflado imediatamente após a perda da cintura. Pacientes sem dilatação ou com estenose do colédoco distal eram relocados para o grupo da papilotomia.

* Papilotomia sem dilatação: após a canulação, a papilotomia foi feita, podendo ser completa (até a prega duodenal) ou média (cerca de 2/3 da completa).

papilotomia

CÁLCULOS DOS RESULTADOS:

A análise do estudo foi planejada inicialmente em duas etapas. Na primeira etapa, foram avaliados os resultados a curto prazo, como a eficácia da remoção do cálculo. Na segunda etapa, resultados a longo prazo, como eventos biliares tardios (os pacientes serão seguidos por 5 anos). Nesse estudo, eles relatam a análise de curto prazo, da primeira etapa.

O resultado primário foi a taxa de remoção completa do cálculo em uma única sessão. Os resultados secundários foram a taxa geral de remoção completa do cálculo, uso de litotripsia, tempo de procedimento, eventos adversos iniciais e custos do procedimento.

RESULTADOS:

Pacientes

Um total de 181 pacientes foram inscritos entre fevereiro de 2013 a janeiro 2015, sendo 91 randomizados para o grupo dilatação balonada da papila (DBP) e 90 para o grupo da papilotomia isolada (PI). Após exclusão de 10 pacientes, 171 foram colocados na análise (86 no grupo dilatação e 85 no grupo papilotomia).

Eficácia em remover o cálculo

A taxa de remoção completa do cálculo em uma única sessão foi significativamente maior no grupo da dilatação: 90,7% (78/86) vs. 78,8% (67/85) da papilotomia.

Embora o grupo da dilatação tenha tido taxa alta de cálculos maiores que 15 mm, o uso da litotripsia não foi frequente 30,2% (26/86) vs. 48,2% (41/85) da papilotomia.

A taxa de remoção completa usando somente um único acessório não foi alta em grupo algum: < 5% com basket e cerca de 30% com balão extrator.

O tempo e o custo do procedimento foram semelhantes nos dois grupos.

A análise do subgrupo de 67 pacientes que tinham cálculos maiores que 15 mm mostrou que: remoção completa do cálculo em sessão única foi maior no grupo da DBP (85,4%) comparado ao grupo da papilotomia isolada (53,8%). Uma diferença absoluta na taxa de remoção completa do cálculo entre DBP e papilotomia foi mais proeminente naqueles com cálculos maiores que 15 mm: 31,6% comparado com 11,9%.

A necessidade de litotripsia nesse grupo com cálculos maiores de 15 mm também foi maior: 43,9% no grupo DBP e 69,2% no grupo papilotomia.

papilotomia

papilotomia

Segurança

Os efeitos adversos precoces foram semelhantes: 9,3% DBP vs. 9,4% papilotomia. Pancreatite ocorreu em 4,7% no grupo DBP e 5,9% no grupo papilotomia, todas classificadas com leve. Não houve mortes dentro de 30 dias.

DISCUSSÃO

Muitos estudos comparativos prospectivos têm sido feitos para avaliação da DBP, com ou sem papilotomia. Não há diferença significativa na remoção completa do cálculo nos estudos, porém dois deles demonstraram uma maior taxa de remoção completa do cálculo em uma só sessão na DBP com papilotomia quando comparada à papilotomia isolada. Houve dois estudos comparando a DBP sem papilotomia com a papilotomia, mas esse estudo foi o primeiro a mostrar a superioridade da DBP sem papilotomia sobre a papilotomia isolada, com taxa de remoção completa em uma sessão única de 90,7 % (contra 78,8% no grupo da papilotomia, com p=0,04).

A DBP pode ser realizada com ou sem papilotomia prévia. Enquanto a papilotomia completa (até a prega transversal) foi relatada como sendo fator de risco para hemorragia após dilatação em um estudo multicêntrico, a segurança da DBP sem papilotomia gera preocupação, incluindo sobre o risco de pancreatite. Nos estudos controlados e randomizados prévios, a papilotomia prévia não teve efeito sobre a remoção completa do cálculo nem sobre os efeitos adversos. As vantagens da DBP sem papilotomia são a natureza simples do procedimento e seu custo. Em pacientes com divertículo periampular, com anatomia alterada cirurgicamente ou naqueles em uso de agentes antitrombóticos, a DBP sem papilotomia é o tratamento de primeira escolha para cálculos grandes.

Sobre as limitações do estudo: os endoscopistas não eram blindados para o tipo de procedimento, mas o limite de tempo para cada procedimento foi de 1 hora; foi definido como cálculo grande quando maior ou igual a 10 mm, mas a vantagem do DBP sem papilotomia foi maior em cálculos > 15 mm. Além disso, foram selecionados somente pacientes > 60 anos por causa da ausência de dados nos resultados a longo prazo pós-DBP sem papilotomia, o que também limita a generalização do estudo. Uma análise dos resultados a longo prazo será conduzida sobre as alterações biliares após 5 anos. DBP sem papilotomia pode potencialmente preservar a função do esfíncter quando comparada com a esfincterotomia. A função do esfíncter preservada após comparada com a papilotomia.

Em resumo, dilatação balonada da papila com balão grande sem papilotomia alcançou uma taxa significativamente maior de remoção completa do cálculo em uma única sessão, sem aumentar os eventos adversos. Os resultados a longo prazo, como cálculos recorrentes do ducto biliar comum, devem ser avaliados no futuro.

Considerações:

  • No Brasil, o grupo do Serviço de Endoscopia Gastrointestinal do Hospital das Clínicas (FMUSP) realizou uma metanálise envolvendo 9 estudos controlados randomizados e 1.230 pacientes com coledocolitíase (611 pacientes submetidos a papilotomia isolada e 619 submetidos papilotomia e dilatação com balão) em que não se observou diferença na taxa de remoção de cálculos como desfecho primário, no entanto a dilatação balonada da papila com papilotomia obteve menor necessidade de litotripsia mecânica. Não foram observadas, ainda, diferenças estatísticas nas taxas de eventos adversos (pancreatite, sangramento e perfuração).

  • A Endoscopy publicou na última edição um editorial sobre esse trabalho, escrito pelo Prof. James Lau, denominado “Endoscopic papillary large ballon dilation: more questions than answers” em que ele interroga o que aprendemos com esse trabalho, citando:

    • Os pacientes devem ser selecionados cuidadosamente;
    • Os cálculos devem ser grandes (> 10 mm) para justificar a dilação com balão grande e a porção distal do ducto também deve ser suficientemente dilatada para acomodar o balão;
    • O balão não deve ser inflado além do diâmetro máximo do colédoco distal;
    • Quando a papilotomia sabidamente será difícil como nos pacientes com gastrectomia a Billroth II ou com coagulopatia, a dilatação com balão grande é uma solução legítima a aceitável.

Referências:

  1. Kogure Hirofume et al. Multicenter randomized trial of endoscopic papillary large balloon dilation without sphincterotomy versus endoscopic sphincterotomy for removal of bile duct stones: MARVELOUS trial. Endoscopy 2020; 52 (09): 736-744. DOI: 10.1055/a-1145-3377
  2. Lau, J. Endoscopic papillary large balloon dilation: more questions than answers Endoscopy 2020; 52(09): 745 – 746 DOI: 10.1055/a-1189-3035
  3. Moura, EGH; Sakai, P.; Bernardo, V.M. Série Manual do Médico-Residente do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo – Volume Endoscopia Baseada em Evidências 2017.



Lesão de Dieulafoy: um desafio para o endoscopista

CASO 1

Paciente masculino de 65 anos em investigação de hepatopatia, apresentando episódios intermitentes de melena.  Já realizou 2 endoscopias e uma colonoscopia não evidenciando o foco do sangramento.   Hoje novo episódio de  melena e queda significativa da hemoglobina. Indicada nova endoscopia.

A endoscopia evidenciou um coágulo no ápice bulbar e após a sua remoção foi possível identificar um pequeno coto vascular com sangramento ativo. O coto foi tratado com injeção de solução de adrenalina seguida de aplicação de clipes.  O paciente não apresentou novos sangramentos.

CASO 2

Menino de 6 anos com início há 3 dias com quadros de enterorragias volumosas intermitentes. Admitido no hospital com Hb de 6,0.  Endoscopia digestiva alta normal.  Indicada colonoscopia.

Após o preparo o cólon estava limpo e não apresentava mais resíduos hemáticos.  No ceco foi identificado pequeno coágulo. Após a limpeza do ceco e  avaliação detalhada underwater foi observado que o coágulo estava aderido a um coto  vascular superficial com pequeno ponto de ruptura.  Foi realizada a aplicação de clipes e a criança não apresentou mais episódios de sangramento.

Lesão de Dieulafoy

A lesão de Dieulafoy foi descrita pelo cirurgião francês Paul Georges Dieulafoy em 1898 e é uma causa pouco frequente de hemorragia gastrointestinal, mas de relevância, pois geralmente se apresenta com sangramentos volumosos.  O grande desafio desta doença está no pequeno tamanho da lesão e na sua característica de sangramento intermitente com  uma  difícil localização endoscópica se o sangramento não estiver ativo.  Isso leva à sua clássica apresentação de hematêmese e melena com significativa queda de hemoglobina e um exame de endoscopia normal ou com achados que não explicam o sangramento.

Ficou curioso? Clique aqui https://en.wikipedia.org/wiki/Paul_Georges_Dieulafoy

Patologia

As arteríolas normais da submucosa tem menos de 1 mm pois os vasos vão afilando progressivamente enquanto atravessam as camadas da parede do trato gastrointestinal.  A lesão de Dieulafoy é um desses vasos, mas que não afilou após atravessar a muscular e chega à camada submucosa com um calilbre de 1-3 mm. Este vaso corre tortuosamente na submucosa e protrui através da mucosa para a luz gástrica através de um pequeno defeito na mucosa de 2 a 5 mm geralmente sem sinais inflamatórios mas podendo apresentar uma pequena área de fibrina adjacente.

A) Arteríola aberrante dilatada na submucosa. B) Arteríola de calibre normal. C) Muscular própria

O estômago é o local mais comum, geralmente na pequena curvatura alta. Até 1/3  das lesões são extra-gástricas sendo o duodeno e o cólon os locais mais frequentes. Já foram descritas lesões de Dieulafoy no esôfago, intestino delgado, reto, canal anal e nos brônquios.

Etiologia

A lesão provavelmente é de origem congênita. Patologicamente o vaso é normal, reduzindo a probabilidade de causa aneuristmática. Também fortalece a teoria congênita os casos descritos de lesões de Dieulafoy em recém-nascidos.

Uma grande proporção dos pacientes com ruptura deste vaso está internado sugerindo que a lesão por estresse está envolvida no sangramento. A hemorragia pode ocorrer em qualquer faixa etária mas é mais frequente acima dos 60 anos e duas vezes mais frequente em homens do que em mulheres.  Comorbidades estão presentes em 90% dos pacientes sendo cardiopatias e insuficiência renal as mais comuns.  Drogas como anti inflamatórios, aspirina e warfarina também podem estar relacionadas com o aumento da incidência do sangramento.

Embora a patogenia exata do que leva ao sangramento de um vaso previamente assintomático não é completamente compreendida mas o consenso é de que alguma forma de lesão mucosa por erosão ou injúria isquêmica expõe o vaso e predispõe ao sangramento.

Apresentação Clínica e Diagnóstico

A lesão de Dieulafoy tipicamente se apresenta agudamente com hemorragia maciça que geralmente é recorrente.

A endoscopia digestiva alta é efetiva no diagnóstico em até 70% dos pacientes.  Porém, algumas vezes várias endoscopias podem ser necessárias  para se fazer o diagnóstico.  Até 6%  dos pacientes necessitam 3 ou mais exames endoscópicos para encontrar a lesão.  Entre os pacientes que o diagnóstico não foi feito na primeira endoscopia, 40% foi devido à presença de sangue acumulado impedindo a avaliação e 60% foi porque a lesão não pôde ser encontrada.

Existem relatos do uso de ecoendoscopia para identificar um vaso calibroso na submucosa mesmo na ausência de sangramento e também de seu uso para controle após tratamento endoscópico avaliando o desaparecimento do fluxo no vaso submucoso.

Características Endoscópicas da lesão de Dieulafoy

Os achados se dividem em 3 categorias:

  • Sangramento ativo que  pode ser em jato ou babação.
  • Coágulo aderido que após a lavagem evidencia  um mínimo defeito mucoso
  • Vaso visível isolado com mucosa normal adjacente ou com pequena quantidade de fibrina, menor que 5 mm, não associado à úlcera.

Da esquerda para a direita: Sangramento ativo em jato, sangramento ativo com vaso visível em babação, coágulo aderido, vaso visível com pequena quantidade de fibrina, menor que 5 mm.

Tratamento

O tratamento endoscópico é o método de escolha nas lesões acessíveis endoscopicamente.  O sucesso é reportado acima de 90%.  Podem ser utilizados métodos térmicos (heaterprobe, APC, coagrasper, eletrocoagulação com alça), injeção de agentes esclerosantes  e terapias mecânicas (ligadura elástica e clipes).    Cada técnica tem suas vantagens e desvantagens mas existe evidência na literatura de que as terapias mecânicas são mais efetivas.  Terapias combinadas também apresentam menores taxas de ressangramento quando comparadas com a monoterapia.

Tratamento endoscópico da lesão de Dieulafoy no duodeno. Superior da esquerda para a direita. a) coágulo aderido b)vaso visível com sangramento em babação após lavagem do coáugulo. c) escleroterapia com injeção de glicose e adrealina 1:10000. Inferior esquerda para a direita: d) aspecto após eslceroterapia. e)aplicação do primeiro clipe. e) aspecto após aplicação do segundo clipe.

A angiografia pode ser utilizada em casos que falham à terapia endoscópica. Nestes pacientes, a colocação de um clipe endoscópico próximo da lesão sangrante, quando possível, facilita bastante a localização da artéria a ser tratada. Esta técnica apresenta um risco considerável de isquemia na área da artéria obliterada que deve ser levado em conta no acompanhamento do paciente após o procedimento devido à possibilidade de perfuração tardia.

A angiografia é o método de escolha para lesões de Dieulafoy nos brônquios.

Angiografia demonstrando extravasamento de contraste em topografia gástrica. A seta demonstra a presença de um clipe endoscópico guiando o procedimento. Adaptado de Barbosa et. al 2016.

A cirurgia é reservada apenas para os  casos onde existe falha endoscópica e angiográfica.  O tratamento laparoscópico é possível e realizado através de ressecções em cunha ou gastrectomias parciais, mas depende da correta localização da lesão no  intra-operatório.  Por isso, nos pacientes que serão operados, a tatuagem endoscópica deve ser realizada para facilitar a identificação  da área a ser ressecada.

Pontos importantes

A lesão de Dieulafoy é um desafio diagnóstico e terapêutico.  Devemos sempre lembrar desta lesão nos casos de hemorragia obscura em todas as faixas etárias.

A repetição da endoscopia o mais precoce possível na recorrência da hemorragia permite a visualização do sangramento ativo facilitando muito a identificação da lesão.

O tratamento endoscópico é altamente efetivo e as terapias mecânicas são preferidas. Quando a posição da lesão não permitir a colocação de um clipe ou ligadura, terapias térmicas e injeção de agentes esclerosantes podem ser utilizados.

Referências

  1. Baxter M, Aly EH. Dieulafoy’s lesion: current trends in diagnosis and management. Ann R Coll Surg Engl. 2010;92(7):548‐554.
  2. Lee YT, Walmsley RS, Leong RW, Sung JJ. Dieulafoy’s lesion. Gastrointest Endosc. 2003;58:236–43.
  3. Clements J, Clements B, Loughrey M. Gastric Dieulafoy lesion: a rare cause of massive haematemesis in an elderly woman. Case Reports 2018;2018:bcr-2017-223615.
  4. Linda L. Manning-Dimmitt, Steven G. Dimmitt, and George R. Wilson, Am Fam Physician. 2005 Apr 1;71(7):1339-1346.
  5. Barosa, Rita et al. “Dieulafoy’s Lesion: The Role of Endoscopic Ultrasonography as a Roadmap.” GE – Portuguese Journal of Gastroenterology 24 (2016): 95 – 97.
  6. Ghazi Alshumrani, Angiographic findings and endovascular embolization in Dieulafoy disease: a case report and literature reviewDiagn Interv Radiol 2006; 12:151-154

Para saber mais:

Quiz – lesão de Dieulafoy
Lesão de Deiulafoy de Cárdia




Tratamento do Divertículo de Zenker por Z-POEM

 

Divertículo de Zenker (DZ) são protrusões saculiformes da mucosa e submucosa esofágica que ocorre na parede posterior da junção faringoesofágica, logo acima do músculo cricofaríngeo (MCF), com prevalência entre 0,01% e 0,1%.

O tratamento endoscópico ganhou espaço nas últimas décadas sobre o tratamento cirúrgico, visto ser um tratamento minimamente invasivo, com menor morbidade e eficaz.

Várias técnicas endoscópicas foram descritas como a diverticulotomia (link), uso de ultracision, plasma de argônio, etc. Os resultados das técnicas endoscópicas estão resumidos a seguir:

  • Sucesso clínico entre 56% e 100%
  • Eventos adversos média de 15%
  • Recidiva clínica 10,5%

 

Essa recidiva relativamente alta é atribuída a dificuldade em se identificar com precisão o final do músculo cricofaríngeo, o que pode levar a septotomia incompleta. Por outro lado, a secção além do limite do músculo pode abrir comunicação com o mediastino e consequente risco infeccioso.

Neste cenário surgiu a possibilidade de aplicar uma nova técnica endoscópica, baseada na experiência prévia com o POEM (miotomia esofágica perioral) utilizada para tratamento da acalásia. Esse novo procedimento foi apelidado de Z-POEM ou D-POEM, ou seja, a miotomia do divertículo de Zenker com criação de um túnel submucoso.

As vantagens teóricas dessa técnica seriam:

  1. Melhor identificação e secção completa do músculo cricofaríngeo
  2. Possibilidade de fechar a mucosa com clipes, trazendo menos dor, possibilitando cicatrização mais rápida e minimizando riscos infecciosos.

 

Indicação

  • Diverticulotomia do Zenker está indicada nos pacientes com DZ que apresentam disfagia, regurgitação, engasgos ou pneumonia de aspiração.

 

Avaliação pré-procedimento

  • Deglutograma contrastado
  • Endoscopia digestiva alta
  • Pré-operatório para anestesia geral (ECG, RX tórax, exames laboratoriais com coagulograma)

 

Cuidados pré-operatórios:

  • Recomendamos dieta líquida na véspera do procedimento e jejum de 12 horas para evitar presença de resíduos alimentares no interior do divertículo
  • Antibióticos de amplo espectro na indução anestésica.

 

Sedação e posicionamento sugerido

  • Anestesia geral
  • Nossa preferência é pelo DLE, embora alguns autores realizem o procedimento na posição supina

 

Materiais necessários

  • Agulha de esclerose
  • Cap, de preferência o cap cônico.
  • Faca de dissecção submucosa (Hybrid-knife Erbe)
  • Bisturi elétrico Erbe com função endocut
  • Pinça hemostática (coagrasper ou hot-biopsy Boston)
  • Insuflador de CO2 (imprescindível). Recomendado baixo fluxo para evitar enfisema subcutâneo

 

Passos técnicos do procedimento

  • Injeção e secção da mucosa 2 cm acima do septo do DZ
  • Criação do túnel submucoso
  • Identificação do septo (MCF)
  • Dissecção meticulosa do septo na sua face anterior e posterior.
  • Secção do septo
  • Revisão da hemostasia
  • Fechamento da mucosa com clips

 

Cuidados pós-operatórios

  • Antibióticos. EV são mantidos por 24horas após o procedimento e na alta são substituídos por ATB via oral por 5-7 dias (solução líquida de amoxicilina ou amoxicilina + clavulanato).
  • Aguá e chá frio podem ser iniciados 6 horas após o procedimento.
  • Dieta líquida no primeiro PO, com progressão gradual para dieta pastosa e dieta leve conforme ausência de dor e boa aceitação via oral.
  • IBP por 4 semanas.
  • Controle endoscópico em 3 meses

 

Video do Procedimento

 

Procedimento realizado por Dr. Nelson Miyajima + Dr. Bruno Martins

 

Resultados

O maior estudo até então foi publicado este ano na GIE. [2]

  • Estudo internacional multicêntrico envolvendo 10 instituições
  • 75 pacientes, média idade 73 anos
  • Sucesso técnico 97% (73/75)
  • Eventos adversos em 6,7% (5/75)
    • 1 sangramento leve tratado de forma conservadora
    • 4 perfurações (1 grave e 3 moderadas)
  • Tempo médio do procedimento 52 minutos
  • Média de estadia hospitalar 1,8 dias
  • Sucesso clínico 92% (69/75)
  • Média de follow-up 291 dias
  • Com 12 meses de follow-up, um paciente referiu recidiva dos sintomas

 

Conclusões: 

O tratamento endoscópico do divertículo de Zenker utilizando a técnica do Z-POEM é promissora, eficaz e apresenta bons resultados.

Imagina-se que essa técnica possa oferecer uma resposta mais duradoura a longo prazo, visto possibilitar a secção completa do músculo cricofaríngeo com segurança, já que a mucosa pode ser fechada com clipes ao término do procedimento.

No entanto, estudos com follow-up a longo prazo ainda são necessário para nos certificarmos da resposta duradoura do procedimento.

Tampouco existem estudos comparando o Z-POEM com a técnica tradicional, embora existam estudos em andamento. Os resultados desses estudo são aguardados ansiosamente.

 

Referências:

 

  1. Li QL, Chen WF, Zhang XC, et al. Submucosal Tunneling Endoscopic Septum Division: A Novel Technique for Treating Zenker’s Diverticulum. Gastroenterology. 2016;151(6):1071‐1074. doi:10.1053/j.gastro.2016.08.064
  2. Yang J, Novak S, Ujiki M, et al. An international study on the use of peroral endoscopic myotomy in the management of Zenker’s diverticulum. Gastrointest Endosc. 2020;91(1):163‐168. doi:10.1016/j.gie.2019.04.249
  3. Maydeo A, Patil GK, Dalal A. Operative technical tricks and 12-month outcomes of diverticular peroral endoscopic myotomy (D-POEM) in patients with symptomatic esophageal diverticula. Endoscopy. 2019;51(12):1136‐1140. doi:10.1055/a-1015-0214

 

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Como citar esse artigo:

Martins, BC. Tratamento do Divertículo de Zenker por Z-POEM. Endoscopia Terapêutica; 2020. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/casosclinicos/tratamento-do-diverticulo-de-zenker-por-z-poem/