Ressecção endoscópica com alça a frio ou diatérmica de grandes pólipos colorretais não pediculados: Estudo randomizado CHRONICLE Trial

Resumo de Steinbrück I, Ebigbo A, Kuellmer A, et al. Cold Versus Hot Snare Endoscopic Resection of Large Nonpedunculated Colorectal Polyps: Randomized Controlled German CHRONICLE Trial. Gastroenterology. 2024 Sep;167(4):764-777. doi: 10.1053/j.gastro.2024.05.013. Epub 2024 May 23. PMID: 38795735.

Introdução

A ressecção de adenomas por colonoscopia reduz a mortalidade por neoplasia colorretal (1). Em geral, ressecções de lesões ≥ 2 cm são realizadas em mais de um fragmento (piecemeal). As mucosectomias (com alça quente) estão associadas a taxas não desprezíveis de eventos adversos/EA (perfuração 0,9-2,7%; sangramento 6,2-7%; síndrome pós-polipectomia 5%) (2-7). Por outro lado, as ressecções a frio aparentam um melhor perfil de segurança (índices próximos de zero para sangramento tardio e perfuração), mas maiores taxas de recidiva (8, 9). Este estudo randomizado compara a mucosectomia a frio (cold snare endoscopic mucosal resection – CEMR) com a convencional (hot snare HEMR) para lesões não pediculadas ≥ 2 cm.

Ilustração de ressecção de lesão colorretal com cold snare.

Métodos

Trata-se de um estudo randomizado realizado em 19 centros alemães que incluiu pólipos/lesões não pediculadas ≥ 2 cm. Foram excluídas lesões recidivadas ou com suspeita/confirmação de malignidade.

Os procedimentos foram realizados conforme habitual para cada técnica, com adição de corante (índigo carmim) e solução de adrenalina na injeção submucosa variável em ambos braços do estudo, segundo a preferência do endoscopista.

O follow-up foi realizado em forma de contato telefônico após 4 semanas e com nova colonoscopia em 4 +/- 2 meses.

Desfecho primário: taxa total de EAs maiores durante e após o procedimento (perfuração, sangramento e síndrome pós-polipectomia).

Desfechos secundários: taxas individualizadas dos EAs citados acima, tempo de procedimento, recidiva/lesão residual e sucesso técnico.

A diferença esperada para o desfecho primário entre os grupos de 6,1% (2,1 x 8,2%), gerou o “n” de 428 pacientes (poder 80%, significância 5%, perdas 5%). Houve interrupção precoce do estudo após recrutar 363 pacientes, devido avaliação interina programada com 214 pacientes, que revelou a diferença de 7,9% entre os grupos na análise por intenção de tratamento.

Resultados

Um total de 396 lesões (363 pacientes) foram ressecadas, sendo 193 CEMR e 203 HEMR.

Dentre as características de base, só houve diferença entre os grupos no uso de antiplaquetários e/ou anticoagulantes (82 pacientes = 22,6%) com maior prevalência no grupo HEMR (p= 0,038). Entretanto, não houve correlação deste fato com a incidência de EA.

O tamanho médio das lesões foi de 3 +/- 1 cm (2-8 cm) e 70% eram localizadas no cólon direito.

Houve maior sucesso técnico no grupo HEMR: 97.5% (n = 198/203) x 92.2% (n = 178/193), p = 0,022. Este dado demonstrou maior necessidade de mudança de estratégia (10% = 20/193 x 3% = 6/203) no grupo a frio (como crossover com uso de corrente elétrica), não que as lesões não tenham sido ressecadas.

No grupo HEMR, houve fechamento do leito com clipes (p < 0,001), coagulação profilática de vasos da base (p < 0,001) e das bordas/margens (p < 0,001) com maior frequência.

A tabela dos desfechos original do estudo está exposta abaixo (tabela 1). Em relação ao desfecho 1ário, houve mais EA maiores foi maior no grupo HEMR (16/203 = 7,9% x 2/193 = 1%). Adentrando os EA específicos (desfechos 2ários), perfuração (p 0,007), sangramento tardio (p 0,04), sangramento intra-procedimento (p 0,026) foram mais frequentes no braço HEMR. A incidência de síndrome pós-polipectomia foi similar entre os grupos (p 0,49).

Houve mais recidiva/lesão residual no grupo CEMR (23,7% x 13,8%, p 0,02). Destas, 13,6% foram diagnosticadas em biópsias de cicatrizes não suspeitas endoscopicamente. Exceto por 2 casos que foram operados pelo diagnóstico de adenocarcinoma, todas as recorrências foram resolvidas endoscopicamente no primeiro exame de follow-up.

Não houve óbitos relacionados ao procedimento ou necessidade de cirurgia em função dos EA.

O único fator independente relacionado aos EA (considerados como um todo), foi o tamanho da lesão ≥ 4 cm. Três fatores foram relacionados à lesão recorrente/residual: tamanho ≥ 4 cm, componente nodular (granular mista ou nodular) e AP com displasia de alto grau ou adenocarcinoma.

Tabela 1 – desfechos primários e secundários por intenção de tratamento. Adaptado de Steinbrück I et al., Gastroenterology, 2024.

Discussão

As ressecções a frio (CEMR) tem se apresentado como uma ótima opção para diminuir a incidência de EA. Os achados deste trabalho corroboram com a literatura prévia, mostrando uma redução de 85% dos EA (de 7,9% para 1%). As taxas próximas de zero de EA com a CEMR dão mais força à chamada “Cold Revolution”, porém devemos considerar outros fatores, como exposto ao longo da discussão, não escolha da técnica.

O fato das ressecções a frio serem mais superficiais (51 vs 933 µm) certamente tem grande influência no sangramento tardio e nas perfurações (10). Ressecções mais profundas tendem a lesar mais estruturas vasculares e causar mais perfurações. Ademais, o dano térmico (HEMR) progride após a ressecção, podendo atingir e lesar vasos sanguíneos, mas sem a capacidade de coagulá-los, causando sangramentos tardios. Outro fator a ser considerado, é a maior identificação e consequente maior tratamento de vasos durante o procedimento a frio que, com a aplicação de corrente elétrica poderiam sangrar apenas tardiamente.

O outro lado da balança é a maior fragmentação e menor representação submucosa das lesões com a CEMR. Portanto, a maior taxa de lesão residual é algo que se deve ter em mente no momento da escolha da técnica. A impressão é que a avaliação do leito durante ressecções maiores é difícil (centro do leito e não bordas), de modo que a coagulação das bordas não seria eficaz para diminuir as lesões residuais. Isso pode tornar a CEMR menos adequada para lesões com suspeita de displasia de alto grau ou adenocarcinoma. Ademais, a necessidade de mudança de estratégia, como conversão de CEMR para HEMR, aumenta.

Uma vez conhecidas as vantagens e desvantagens de cada método, a escolha da melhor estratégia deve ser baseada na morfologia da lesão, expertise e disponibilidade de recursos. Deve-se recordar que as ressecções a frio habitualmente são feitas com alças dedicadas, com maior poder de corte quando comparadas às alças convencionais sem a corrente elétrica.

Lesões granulares homogêneas (em geral adenomatosas) e suspeitas para lesão serrilhada séssil são ótimas opções para as ressecções a frio. Por outro lado, o componente nodular (lesões granulares nodulares ou mistas) e com suspeita para displasia de alto grau/adenocarcinoma exigem ressecções com menor fragmentação. A dissecção submucosa (ESD) é uma alternativa, mas a HEMR pode ser empregada em casos selecionados, reforçando a importância de ressecar ao menos o componente nodular/suspeito para displasia/neoplasia em monobloco e com margens.

Outro ponto que merece atenção é que todos EA foram manejados endoscopicamente. Em 396 lesões complexas, não houve necessidade de abordagem cirúrgica por EA ou óbitos relacionados à intervenção endoscópica. Ademais, todas as recidivas foram resolvidas endoscopicamente. Como ouvimos habitualmente “só não tem complicação que não faz”, porém o importante é saber reconhecer o EA (sua possibilidade já era prevista de antemão) e aplicar o respectivo tratamento.

O trabalho exposto apresenta limitações como o envolvimento de centros de referência, que dificultam a aplicação dos resultados para centros de menor volume e complexidade. A inclusão de múltiplos centros também fez com que alguns centros incluíssem apenas um ou nenhum caso nos braços do estudo. O follow-up médio de 4,35 meses pode ter aumentado a incidência de recidivas em cicatrizes não suspeitas (13,6% neste estudo x 6,4-6,7% em outras casuísticas) (11, 12). A grande variabilidade técnica nestas ressecções também é de difícil avaliação.

Destaca-se uma limitação recorrente nestes trabalhos, que é a não discriminação do tipo de corrente elétrica empregada. Se estamos falando de efeitos deletérios do dano térmico na parede colorretal, utilizar corte puro ou correntes mistas com efeito elevado ou até coagulação pura (pedal azul) entre os cortes (pedal amarelo) apresenta grande diferença e impacto na incidência de EA. Apesar das limitações, a seleção de casos (apenas 2% de adenocarcinoma entre os casos incluídos), resolutividade de lesões de alta complexidade e manejo de EA foram muito bons, produzindo resultados substanciais.

Concluímos que as ressecções a frio apresentam baixíssimas taxas de EA, porém mais lesões residuais. A escolha do método deve basear-se ainda, na morfologia da lesão e suspeita de displasia de alto grau/adenocarcinoma, como previamente exposto.

Para mais informações, clique em Até onde vamos com as ressecções “à frio”? • Endoscopia Terapeutica

Referências

  1. Zauber AG, Winawer SJ, O’Brien MJ, Lansdorp-Vogelaar I, van Ballegooijen M, Hankey BF, Shi W, Bond JH, Schapiro M, Panish JF, Stewart ET, Waye JD. Colonoscopic polypectomy and long-term prevention of colorectal-cancer deaths. N Engl J Med. 2012 Feb 23;366(8):687-96. doi: 10.1056/NEJMoa1100370.
  2. Bar-Yishay I, Shahidi N, Gupta S, Vosko S, van Hattem WA, Schoeman S, Sidhu M, Tate DJ, Hourigan LF, Singh R, Moss A, Raftopoulos SC, Brown G, Zanati S, Heitman SJ, Lee EYT, Burgess N, Williams SJ, Byth K, Bourke MJ. Outcomes of Deep Mural Injury After Endoscopic Resection: An International Cohort of 3717 Large Non-Pedunculated Colorectal Polyps. Clin Gastroenterol Hepatol. 2022 Feb;20(2):e139-e147. doi: 10.1016/j.cgh.2021.01.007.
  3. Arezzo A, Passera R, Marchese N, Galloro G, Manta R, Cirocchi R. Systematic review and meta-analysis of endoscopic submucosal dissection vs endoscopic mucosal resection for colorectal lesions. United European Gastroenterol J. 2016 Feb;4(1):18-29. doi: 10.1177/2050640615585470.
  4. Kothari ST, Huang RJ, Shaukat A, Agrawal D, Buxbaum JL, Abbas Fehmi SM, Fishman DS, Gurudu SR, Khashab MA, Jamil LH, Jue TL, Law JK, Lee JK, Naveed M, Qumseya BJ, Sawhney MS, Thosani N, Yang J, DeWitt JM, Wani S; ASGE Standards of Practice Committee Chair. ASGE review of adverse events in colonoscopy. Gastrointest Endosc. 2019 Dec;90(6):863-876.e33. doi: 10.1016/j.gie.2019.07.033.
  5. Elliott TR, Tsiamoulos ZP, Thomas-Gibson S, Suzuki N, Bourikas LA, Hart A, Bassett P, Saunders BP. Factors associated with delayed bleeding after resection of large nonpedunculated colorectal polyps. Endoscopy. 2018 Aug;50(8):790-799. doi: 10.1055/a-0577-3206.
  6. Metz AJ, Bourke MJ, Moss A, Williams SJ, Swan MP, Byth K. Factors that predict bleeding following endoscopic mucosal resection of large colonic lesions. Endoscopy. 2011;43(6):506-511. doi:10.1055/s-0030-1256346.
  7. Burgess NG, Metz AJ, Williams SJ, et al. Risk factors for intraprocedural and clinically significant delayed bleeding after wide-field endoscopic mucosal resection of large colonic lesions. Clin Gastroenterol Hepatol. 2014;12(4):651-61.e613. doi:10.1016/j.cgh.2013.09.049.
  8. van Hattem WA, Shahidi N, Vosko S, et al. Piecemeal cold snare polypectomy versus conventional endoscopic mucosal resection for large sessile serrated lesions: a retrospective comparison across two successive periods. Gut. 2021;70(9):1691-1697. doi:10.1136/gutjnl-2020-321753.
  9. Muniraj T, Sahakian A, Ciarleglio MM, Deng Y, Aslanian HR. Cold snare polypectomy for large sessile colonic polyps: a single-center experience. Gastroenterol Res Pract. 2015;2015:175959. doi:10.1155/2015/175959.
  10. Suzuki S, Gotoda T, Kusano C, et al. Width and depth of resection for small colorectal polyps: hot versus cold snare polypectomy. Gastrointest Endosc 2018; 87:1095–1103.
  11. Kandel P, Brand EC, Pelt J, Ball CT, Chen WC, Bouras EP, Gomez V, Raimondo M, Woodward TA, Wallace MB; EMR SCAR Group. Endoscopic scar assessment after colorectal endoscopic mucosal resection scars: when is biopsy necessary (EMR Scar Assessment Project for Endoscope (ESCAPE) trial). Gut. 2019 Sep;68(9):1633-1641. doi: 10.1136/gutjnl-2018-316574.
  12. Desomer L, Tutticci N, Tate DJ, Williams SJ, McLeod D, Bourke MJ. A standardized imaging protocol is accurate in detecting recurrence after EMR. Gastrointest Endosc. 2017 Mar;85(3):518-526. doi: 10.1016/j.gie.2016.06.031. Epub 2016 Jun 22.

Como citar este artigo

Funari MP. Cold Versus Hot Snare Endoscopic Resection of Large Nonpedunculated Colorectal Polyps: Randomized Controlled German CHRONICLE Trial. Endoscopia Terapeutica 2025 Vol I. Disponível em:




Doença de Whipple: O que o Endoscopista Precisa Saber

A doença de Whipple é uma condição infecciosa sistêmica rara causada pela bactéria Tropheryma whipplei, que acomete principalmente homens brancos, entre 40 e 60 anos. Como pode simular diversas patologias e afetar vários órgãos, inclusive sem sintomas gastrointestinais, é essencial que o endoscopista esteja atento a esse diagnóstico diferencial.

Um pouco de história…

Descrita pela primeira vez em 1907, a doença foi inicialmente chamada de “lipodistrofia intestinal” devido ao acúmulo de gordura nos linfáticos intestinais. A etiologia infecciosa foi confirmada em 1991 com a identificação do T. whipplei via técnicas moleculares.

Epidemiologia:

Apesar de ser rara (cerca de 30 casos/ano), o T. whipplei é está presente no ambiente, especialmente em esgoto e solo. É mais comumente detectado em trabalhadores da área rural e de pouco saneamento. A doença clássica é rara mesmo entre os portadores assintomáticos da bactéria.

Manifestações clínicas

A apresentação clássica envolve quatro sintomas principais:

  • Artralgias migratórias (geralmente anos antes dos sintomas digestivos)
  • Diarreia crônica
  • Dor abdominal
  • Perda de peso

Podem ocorrer manifestações isoladas no sistema nervoso central ou em válvulas cardíacas. A doença também pode ser desmascarada por uso de imunossupressores, muitas vezes prescritos para doenças reumatológicas presumidas.

Papel do Endoscopista no Diagnóstico

A endoscopia digestiva alta com biópsias do intestino delgado (jejuno/proximal do duodeno) é essencial.

Achados Endoscópicos Mais Comuns:

  1. Mucosa esbranquiçada ou amarelada

    • Aspecto de placas ou granulações finas na mucosa do duodeno ou jejuno.

  2. Edema da mucosa

    • A mucosa pode parecer espessada, pálida ou opaca, com perda das pregas normais.

  3. Linfangiectasia intestinal

    • Dilatação dos vasos linfáticos pode dar aspecto leitoso ou de mucosa brilhante e friável.

  4. Nódulos milimétricos

    • Pequenos nódulos na mucosa, principalmente no duodeno, conferem um aspecto de “mucosa em pedra de calçamento”.

  5. Aspecto de mucosa atrófica ou ulcerada

    • Em casos mais avançados, pode haver áreas de erosão, atrofia ou até úlceras superficiais.

Achados endoscópicos em um paciente com Doença de Whipple: pontos esbranquiçados com irregularidade de pregas duodenais e erosões. Na cromoscopia com NBI e magnificação se nota vilosidades engurgitadas com dilatação dos linfáticos.

Investigação

  • Histologia com coloração PAS positiva em macrófagos da lâmina própria
  • PCR para T. whipplei
  • Imuno-histoquímica
Doença de Whipple: macrófagos intensamente PAS-positivos ocupando a lâmina própria da mucosa. As células caliciformes também estão positivamente coradas. A borda em escova dos enterócitos aparece marcada (como uma linha roxa intensa). Fonte: Bures et al. Gastroenterology Research and Practice 2013.

Se a suspeita for alta, mas a endoscopia não for diagnóstica, é indicado investigar outros sítios acometidos (líquor, linfonodos, valvas, líquido sinovial).

Importante: mesmo pacientes com apresentação extraintestinal devem realizar endoscopia, já que a participação intestinal subclínica é comum.

Tratamento

A doença era fatal antes da era dos antibióticos. Hoje, o tratamento é efetivo e dividido em duas fases:

  1. Fase inicial (parenteral):

    • Ceftriaxona 2g IV 1x/dia ou
    • Penicilina G 2-4 MU IV 4/4h
    • Duração: 2 semanas (4 semanas se acometimento do SNC ou endocardite)

  2. Fase de manutenção (oral por 1 ano):

    • TMP-SMX (160/800 mg) 2x/dia

Importante: O T. whipplei é resistente a fluoroquinolonas e a atividade do TMP-SMX é atribuída apenas ao sulfametoxazol.

Considerações finais para o endoscopista

  • Suspeite da doença em pacientes com síndrome diarreica crônica, perda de peso e artralgias, especialmente se do sexo masculino e com exposição a solo ou esgoto.
  • A biópsia de intestino delgado é a chave diagnóstica.
  • O endoscopista pode ser o primeiro a levantar a hipótese diagnóstica.

Mesmo rara, a doença de Whipple é potencialmente fatal se não tratada, mas curável com antibioticoterapia adequada. Estar atento à possibilidade diagnóstica é essencial.

Referências

  1. Günther U, Moos V, Offenmüller G, et al. Gastrointestinal diagnosis of classical Whipple disease: clinical, endoscopic, and histopathologic features in 191 patients. Medicine (Baltimore) 2015; 94:e714.
  2. Lagier JC, Fenollar F, Lepidi H, et al. Treatment of classic Whipple’s disease: from in vitro results to clinical outcome. J Antimicrob Chemother 2014; 69:219.
  3. Apstein MD, Schneider T. Whipple’s disease. Uptodate. 2024.

Como citar este artigo

Orso IRB. Doença de Whipple: O que o Endoscopista Precisa Saber Endoscopia Terapeutica 2025 Vol I. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/assuntosgerais/doenca-de-whipple-o-que-o-endoscopista-precisa-saber/




Quiz!

Autores: Crislei Casamali e William Scheffer Chaves

Caso Clínico: Paciente masculino, 52 anos, previamente hígido, com sintomas dispépticos leves. Nega perda ponderal, febre ou sudorese noturna. Ausência de massas abdominais, inguinais ou axilares ao exame físico. Realizou endoscopia digestiva alta com biópsias, com os seguintes achados no duodeno:

Endoscopia digestiva alta: a) bulbo duodenal; b) papila duodenal maior; c) porção duodenal descendente (luz branca); d) porção duodenal descendente (NBI).
Patologia: a) colocação HE; b) IHQ CD20+.



Biópsia Assistida por Incisão da Mucosa: Quando e Como Fazer?

A biópsia assistida por incisão de mucosa (mucosal incision-assisted biopsy, MIAB), denominada também biópsia por incisão única com Kneedle-Knife (incision needle‐knife biopsy, SINK biopsy) ou destelhamento, consiste em uma técnica endoscópica emergente e alternativa, descrita por Yokohata et al em 20075, utilizada para aquisição tecidual de lesões subepiteliais do trato gastrointestinal, que permite o diagnóstico histopatológico e imuno-histoquímico dessas condições.

O MIAB vem emergindo como método de abordagem de lesões subepiteliais, pois é de baixo custo-econômico e menor curva de aprendizado, mas com tempo de procedimento maior, sendo assim uma alternativa às punções ecoendoscópicas em centros de menor complexidade e com menos recursos.

Quando indicar?

O estabelecimento diagnóstico histopatológico e imuno-histoquímico das lesões subepiteliais possui importância fundamental na definição precisa de prognóstico, potencial de degeneração maligna e definição de conduta entre expectante, vigilância endoscópica e ressecções endoscópica ou cirúrgica.

Entretanto, como abordado no artigo de lesões subepiteliais, não são todas as lesões que devem ter diagnóstico anatomopatológico para definição de conduta e seguimento do caso, havendo indicações precisas para se realizar biópsias dessas lesões.

Em caso de necessidade de aquisição tecidual das lesões subepiteliais, deverá se optar por um dos três principais métodos diagnósticos: MIAB, punções ecoendoscópicas com agulha FNA (fine needle aspiration, EUS-FNA) ou com agulha FNB (fine needle biopsy, EUS-FNB).

As indicações do MIAB estão bem determinadas nos guidelines da Sociedade Europeia de Endoscopia Gastrointestinal (ESGE) e Colégio Americano de Gastroenterologia (ACG).

A ESGE recomenda que para lesões subepiteliais maiores de 20 mm, MIAB ou EUS-FNB podem ser igualmente empregados. Entretanto, em lesões subepiteliais inferiores a 20 mm, o MIAB é a primeira escolha devido maior rendimento diagnóstico, sendo a EUS-FNB segunda escolha (tabela 1).1 Com relação a taxa de rendimento do MIAB, a mesma foi avaliada em algumas metanálises, sendo demonstrado rendimento diagnóstico de 89% (IC 95% 82,7%-93,5%) para lesões subepiteliais do trato gastrointestinal superior com diâmetro médio de 21 mm, sendo 94,8% das lesões localizadas no estômago1,29.

A ACG sugere o MIAB quando o diagnóstico definitivo é necessário e as punções ecoendoscópicas prévias (FNA ou FNB) tenham sido inconclusivas.14 A diretriz recomenda igualmente como primeira escolha EUS-FNB sem avaliação macroscópica do patologista em sala (rapid on-site evaluation, ROSE) ou EUS-FNA com ROSE. Afinal, já é bem determinado na literatura que agulhas FNA possuem limitações de aquisição tecidual e seu rendimento diagnóstico adequado depende de um citopatologista em sala para atestar a representatividade da amostra periprocedimento.

A ASGE e AGA em seus guidelines descrevem o MIAB como um método diagnóstico alternativo para as lesões subepiteliais. Entretanto, não se posicionam com relação a situações de aplicabilidade.

Além disso, na escolha do método é importante considerar não somente as recomendações dos guidelines, mas também as particularidades de cada procedimento, custos hospitalares e disponibilidade de recusos. O MIAB foi associado a um maior tempo de procedimento e a um risco de fibrose perilesional, o qual pode dificultar ou impedir futuras ressecções endoscópicas28.

Tabela 1. Recomendações da ESGE¹
Tamanho Método de Escolha
LSE > 20 mm 1ª escolha: EUS-FNB ou MIAB
LSE < 20 mm 1ª escolha: MIAB
2ª escolha: EUS-FNB

Complicações

As taxas de complicações inerente ao MIAB são baixas. Os eventos adversos mais frequentes incluem: sangramento em cerca de 2 a 5% dos casos, os quais requisitaram transfusão sanguínea e/ou tratamento endoscópico na maioria dos trabalhos29, 30-32; fibrose perilesional pós-MIAB, impossibilitando ressecções endoscópicas futuras; e mais raramente perfuração, a qual não foi observada na maioria dos ensaios clínicos, metanálises e série de casos29, 33, 34.

Como fazer?

Primeiramente, é importante ressaltar os materiais necessários para o procedimento. Necessita-se de um gastroscópio convencional com cap, afinal o uso desse dispositivo permite visualização minuciosa da mucosa e do sítio manipulado por acumular menos resíduos na lente do endoscópio.

Uma faca eletrocirúrgica endoscópica é necessária, sendo sugerido o uso de Needle Knife, pois consiste no instrumento de maior poder de corte e menor poder de coagulação, uma vez que se objetiva realizar incisão precisa da mucosa seguida de divulsão dos tecidos. Um princípio básico relacionado às facas endoscópicas consiste no fato de quanto menor a área de contato do instrumento com a mucosa, maior será o poder de corte e menor será o poder de coagulação (figura 1). Sugere-se utilizar unidade eletrocirúrgica com corte em modo endocut, efeito 3 e 40 W.

Fig. 1. Tipos de facas eletrocirúrgicas (knifes), demonstrando que a medida que reduz a área de contato do instrumento, maior será o poder de corte e menor o de coagulação. Retirado de: Miyajima NT17

Outros materiais necessários consistem em pinça de biópsia para divulsão dos tecidos e aquisição de material, assim como clipes metálicos para fechamento do sítio manipulado pós-procedimento. Caso haja necessidade de controle hemostático peri-procedimento, sugerimos o uso de pinça hemostática coagrasper.

O vídeo 1 e as figuras de 2 a 7 demonstram as etapas do procedimento.

Referências

  1. Deprez PH, Moons LMG, OʼToole D, Gincul R, Seicean A, Pimentel-Nunes P, Fernández-Esparrach G, Polkowski M, Vieth M, Borbath I, Moreels TG, Nieveen van Dijkum E, Blay JY, van Hooft JE.
    Endoscopic management of subepithelial lesions including neuroendocrine neoplasms: European Society of Gastrointestinal Endoscopy (ESGE) Guideline. Endoscopy. 2022 Apr;54(4):412-429. doi: 10.1055/a-1751-5742. Epub 2022 Feb 18. PMID: 35180797.
  2. Pal S, Hodgar D. Gastrointestinal Subepithelial Lesions: A Review. J Digest Endosc 2023;14:99–105.
  3. Papanikolaou IS, Triantafyllou K, Kourikou A, Rösch T. Endoscopic ultrasonography for gastric submucosal lesions. World J Gastrointest Endosc 2011;3(05):86–94
  4. Hwang JH, Saunders MD, Rulyak SJ, Shaw S, Nietsch H, Kimmey MB. A prospective study comparing endoscopy and EUS in the evaluation of GI subepithelial masses. Gastrointest Endosc 2005; 62(02):202–208
  5. Yokohata N, Tamegai Y, Tokuhara M, et al. 3 case of gastric SMT (submucal tumor) which was diagnoced before operation: open biopsy with ESD (endoscopic submucal dissection) for interstind SMT. Prog Dig Endosc 2007;70:82–83.
  6. Ji JS, Lee BI, Choi KY, et al. Diagnostic yield of tissue sampling using a bite-on-bite technique for incidental subepithelial lesions. Korean J Intern Med (Korean Assoc Intern Med) 2009;24(02): 101–105
  7. Buscaglia JM, Nagula S, Jayaraman V, et al.
    Diagnostic yield and safety of jumbo biopsy forceps in patients with subepithelial lesions of the upper and lower GI tract. Gastrointest Endosc 2012; 75(06):1147–1152
  8. El Chafic AH, et al. Comparison of FNA and fine-needle biopsy for EUS-guided sampling of suspected GI stromal tumors. Gastrointest Endosc 2017;86:510–515.
  9. Kim GH, et al. Comparison of 22-gauge aspiration needle with 22-gauge biopsy needle in endoscopic ultrasonography-guided subepithelial tumor sampling. Scand J Gastroenterol 2014; 49:347–354.
  10. de Moura DTH, et al. EUS-guided fine-needle biopsy sampling versus FNA in the diagnosis of subepithelial lesions: a large multicenter study. Gastrointest Endosc 2020;92:108–119.e3.
  11. Sharzehi K, Sethi A, Savides T. AGA Clinical Practice Update on Management of Subepithelial Lesions Encountered During Routine Endoscopy: Expert Review. Clin Gastroenterol Hepatol. 2022 Nov;20(11):2435-2443.e4. doi: 10.1016/j.cgh.2022.05.054. Epub 2022 Jul 13. PMID: 35842117.
  12. Wani S, Muthusamy VR, Komanduri S. EUS-guided tissue acquisition: an evidence-based approach (with videos). Gastrointest Endosc 2014;80:939–959.e7.
  13. Pessoa RRP, Bestetti AM, Oliveira VL, Araujo WC, Guaraldi S, Rodrigues Silva RR, Oliveira FAA, Ribeiro MSI, Carneiro FOAA, D’Assunção MA, Medrado BFOA, Retes FA, Paulo GA, Schneider NC, Rossini LGB, Vallinoto L, Ardengh JC, Coelho Neto DE, Ide E, Silva MCB, Franco MC, Matuguma SE, Moura DTH, Arantes VN, Nahoum R, Brunaldi VO, Santos MELD, Chaves DM, Micelli-Neto O, Salomao BC, Maluf-Filho F, Luz GO. III BRAZILIAN CONSENSUS STATEMENT ON ENDOSCOPIC ULTRASOUND. Arq Gastroenterol. 2024 Oct 21;61:e24062. doi: 10.1590/S0004-2803.24612024-062. PMID: 39442127.
  14. Jacobson BC, Bhatt A, Greer KB, Lee LS, Park WG, Sauer BG, Shami VM. ACG Clinical Guideline: Diagnosis and Management of Gastrointestinal Subepithelial Lesions. Am J Gastroenterol. 2023 Jan 1;118(1):46-58. doi: 10.14309/ajg.0000000000002100. Epub 2022 Sep 6. PMID: 36602835.
  15. Landazábal B G. Lesões subepiteliais. In: Artifon ELA, Castaño R, eds. Endoscopia Digestiva Oncológica Diagnóstica-Terapêutica. 1ª ed. Rio de Janeiro: Revinter; 2015. p. 123-131.
  16. Kim GH. Systematic Endoscopic Approach for Diagnosing Gastric Subepithelial Tumors.
    Gut Liver. 2022 Jan 15;16(1):19-27. doi: 10.5009/gnl20296. PMID: 33707348; PMCID: PMC8761929.
  17. Miyajima NT, Toyonaga T. Dissecção Submucosa Endoscópica. In: Ferrari A, Maruta L, Averbach M, eds. Endoscopia Digestiva Terapêutica. Rio de Janeiro: Revinter; 2012. p. 115-134.
  18. Polkowski M. Endoscopic ultrasound and endoscopic ultrasound-guided fine-needle biopsy for the diagnosis of malignant submucosal tumors. Endoscopy 2005;37:635-645.
  19. Choe Y, Cho YK, Kim GH, et al. The prevalence, natural course, and clinical practice of upper gastrointestinal subepithelial tumors in Korea. Gastrointest Endosc 2020;91(6 Suppl):AB321.
  20. Hedenbro JL, Ekelund M, Wetterberg P. Endoscopic diagnosis of submucosal gastric lesions. The results after routine endoscopy. Surg Endosc 1991; 5: 20-23
  21. Polkowski M. Endoscopic ultrasound and endoscopic ultrasound-guided fine-needle biopsy for the diagnosis of malignant submucosal tumors. Endoscopy 2005; 37: 635-645
  22. Rösch T, Lorenz R, Dancygier H, von Wickert A, Classen M. Endosonographic diagnosis of submucosal upper gastrointestinal tract tumors. Scand J Gastroenterol 1992; 27: 1-8
  23. Papanikolaou IS, Triantafyllou K, Kourikou A, Rösch T. Endoscopic ultrasonography for gastric submucosal lesions. World J Gastrointest Endosc 2011;3(05):86–94
  24. Humphris JL, Jones DB. Subepithelial mass lesions in the upper gastrointestinal tract. J Gastroenterol Hepatol 2008;23:556-66.
  25. Hwang JH, Rulyak SD, Kimmey MB. American Gastroenterological Association Institute technical review on the management of gastric subepithelial masses. Gastroenterology 2006;130:2217-28.
  26. Forero EA, Maluf-Filho F. Ultrasonido endoscópico en lesiones subepiteliales gastrointestinales. In: Forero EA, Maluf-Filho F. (Eds.). Tratado de ultrasonido endoscópico. São Paulo: Atheneu 2008. р. 87-110.
  27. Standards of Practice Committee; Faulx AL, Kothari S, Acosta RD, Agrawal D, Bruining DH, Chandrasekhara V, Eloubeidi MA, Fanelli RD, Gurudu SR, Khashab MA, Lightdale JR, Muthusamy VR, Shaukat A, Qumseya BJ, Wang A, Wani SB, Yang J, DeWitt JM. The role of endoscopy in subepithelial lesions of the GI tract.
    Gastrointest Endosc. 2017 Jun;85(6):1117-1132. doi: 10.1016/j.gie.2017.02.022. Epub 2017 Apr 3. PMID: 28385194.
  28. Minoda Y, Chinen T, Osoegawa T et al. Superiority of mucosal inci-sion-assisted biopsy over ultrasound-guided fine needle aspiration biopsy in diagnosing small gastric subepithelial lesions: a propensity score matching analysis. BMC Gastroenterol 2020; 20: 19.
  29. Dhaliwal A, Kolli S, Dhindsa BS, Devani K, Ramai D, Sayles H, Rangray R, Bhat I, Singh S, Adler DG. Clinical efficacy and safety of mucosal incision-assisted biopsy for the diagnosis of upper gastrointestinal subepithelial tumors: A systematic review and meta-analysis. Ann Gastroenterol. 2020 Mar-Apr;33(2):155-161. doi: 10.20524/aog.2020.0460. Epub 2020 Feb 14. PMID: 32127736; PMCID: PMC7049234.
  30. Koizumi E, Goto O, Nakagome S, Habu T, Ishikawa Y, Kirita K, Noda H, Higuchi K, Onda T, Akimoto T, Omori J, Akimoto N, Iwakiri K. Technical outcomes and postprocedural courses of mucosal incision-assisted biopsy for possible gastric gastrointestinal stromal tumors: A series of 48 cases (with video).
    DEN Open. 2023 Jun 22;4(1):e264. doi: 10.1002/deo2.264. PMID: 37359151; PMCID: PMC10288069.
  31. Choi CW, Kang DH, Kim HW, et al. Direct endoscopic biopsy for subepithelial tumor larger than 20mm after removal of overlying mucosa. Scand J Gastroenterol 2017;52:779-783.
  32. Shimamura Y, Hwang J, Cirocco M, May GR, Mosko J, Teshima CW. Efficacy of single-incision needle-knife biopsy for sampling subepithelial lesions. Endosc Int Open 2017;5:E5-E10.
  33. Koizumi E, Goto O, Nakagome S, Habu T, Ishikawa Y, Kirita K, Noda H, Higuchi K, Onda T, Akimoto T, Omori J, Akimoto N, Iwakiri K. Technical outcomes and postprocedural courses of mucosal incision-assisted biopsy for possible gastric gastrointestinal stromal tumors: A series of 48 cases (with video).
    DEN Open. 2023 Jun 22;4(1):e264. doi: 10.1002/deo2.264. PMID: 37359151; PMCID: PMC10288069.
  34. Giri S, Afzalpurkar S, Angadi S, Sundaram S. Mucosal incision-assisted biopsy versus endoscopic ultrasound-assisted tissue acquisition for subepithelial lesions: a systematic review and meta-analysis. Clin Endosc. 2022 Sep;55(5):615-625. doi: 10.5946/ce.2022.133. Epub 2022 Aug 4. PMID: 36205045; PMCID: PMC9539302.

Como citar este artigo

Balbinot RS, Martins B. Biópsia Assistida por Incisão da Mucosa: Quando e Como Fazer? Endoscopia Terapeutica 2025 Vol I. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/assuntosgerais/biopsia-assistida-por-incisao-da-mucosa-quando-e-como-fazer/




Devemos fixar próteses metálicas totalmente recobertas em patologias benignas?

Resumo do artigo “Evaluating no fixation, endoscopic suture fixation, and an over-the-scope clip for anchoring fully covered self-expandable metal stents in benign upper GI conditions: a comparative multicenter international study” publicado na GIE em março de 2025.

As próteses metálicas endoscópicas foram introduzidas na década de 1990 e tem aplicação no manejo de diversas patologias. No contexto das doenças benignas, que envolvem estenoses, fístulas, perfurações e sangramento refratário de varizes esofágicas, são utilizadas as próteses totalmente recobertas (FCSEMS). Estes modelos de prótese contam com um revestimento de silicone que previne o crescimento tecidual, permitindo sua remoção, porém apresentam maior potencial de migração.

Fig. 1 – Técnicas de fixação das próteses: Superior, clipe over-the-scope. Inferior, sutura endoscópica. Adaptado de Mehta A et al., Gastrointest Endosc. 2025 [1].

O trabalho de Amit Mehta e colaboradores avaliou o benefício da fixação das FCSEMS com clipes over-the-scope ou sutura endoscopica em patologias benignas do trato gastrointestinal superior quando comparados à não fixação. Foi realizado um estudo de coorte retrospectiva que incluiu os dados de 16 centros entre 2011 e 2022, avaliando defechos que envolveram duração dos procedimentos, migração das próteses, sucesso clínico, sucesso técnico e eventos adversos.

Foram incluídos 311 pacientes com 316 FCSEMS colocadas, sendo que em 122 pacientes (39,2%) não foi realizada fixação, em 95 realizada fixação com sutura (30,5%) e em 94 fixação com clipe over-the-scope (30,2%). A necessidade de tratamento endoscópico decorreu da presença de estenose benigna em 174 pacientes (56%), fístula ou perfuração em 135 casos (43%) e sangramento refratário de varizes esofágicas em 2 (0,6%).

A duração dos procedimentos foi de 41,7 ± 34,5 minutos para o grupo sem fixação, 79,5 ± 53,3 minutos no grupo da sutura endoscópica e 66 ± 44,9 minutos nas próteses fixadas com clipe over-the-scope, observando-se menor tempo de procedimento com diferença estatisticamente significativa (p<0,01) quando não realizada fixação da prótese em comparação aos demais grupos. Não houve diferença significativa do tempo de procedimento quando comparadas as duas tecnicas de fixação.

Ocorreu migração de 88 das 316 próteses, 49 (39%) quando não foram fixadas, 23 (24%) nas fixadas com sutura endoscópica e 16 (17%) quando fixadas com clipe over-the-scope, observando-se diferença considerada estatísticamente significativa na comparação da fixação com sutura endoscópica em relação à não fixação (P = .01) e da fixação com clipe over-the-scope com a não fixação (P = .001). Não houve diferença das taxas de migração quando comparados os dois métodos de fixação (P = .2).

Fig. 2 – Comparação de migração das próteses com e sem fixação. Adaptado de Mehta A et al., Gastrointest Endosc. 2025 [1].

Atingiu-se o sucesso clínico em 194 pacientes (62%), 98 dos que apresentavam estenoses (56%), 94 daqueles com fístula/perfurações (70%) e nos 2 pacientes com sangramento refratário por varizes (100%). Comparando-se ao grupo em que não foi realizada fixação (n = 64; 52%) houve maior sucesso clínico nos grupos submetidos à fixação das próteses. No grupo de sutura, 66 casos apresentaram sucesso clínico (69%; P = .02) e no grupo com fixação por clipe over-the-scope 64 pacientes (68%; P = .03).

No que concerne à possível dificuldade de remoção dos clipes over-the-scope, o trabalho destaca que, na maioria dos casos, estes puderam ser retirados apenas com uso de pinça dente de rato, sendo em apenas 7 casos necessário o uso de dispositivo específico.

O artigo realiza tambem uma breve comparação de custos no mercado americano entre a utilização de clipes over-the-scope e sutura endoscópica, que favoreceu numericamente a fixação com over-the-scope, destacando ainda a necessidade de uso de aparelho duplo canal para o dispositivo de sutura.

Os achados do estudo embasam o benefício da utilização de fixação para FCSEMS em patologias benignas do trato gastrointestinal superior, demonstrando redução significativa na taxas de migração e melhor resposta clínica, sem diferença observada entre os métodos de fixação avaliados. O maior sucesso clínico obtido quando fixada a prótese pode ser explicado como uma representação do benefício clínico de reduzir a migração, embora a obtenção de resposta clínica seja multifatorial, dependente da patologia de base e de fatores associados ao paciente.

Comentários

Neste trabalho, os dispositivos de fixação endoscópica demonstraram benefício na redução da migração das FCSEMS com potencial melhora na resposta clínica dos pacientes. À medida que eles se tornam mais disponíveis em nosso mercado, pode ser interessante considerar sua incorporação à prática para obtenção de melhores resultados.

Clique para mais informações sobre: Próteses metálicas de esôfago • Endoscopia Terapeutica.

Referências

  1. Mehta A, Ashhab A, Shrigiriwar A, et al. Evaluating no fixation, endoscopic suture fixation, and an over-the-scope clip for anchoring fully covered self-expandable metal stents in benign upper GI conditions: a comparative multicenter international study (with video). Gastrointest Endosc. 2025 Mar;101(3):589-597. doi: 10.1016/j.gie.2024.08.015. Epub 2024 Aug 22. PMID: 39179133
  2. Reijm AN, Didden P, Schelling SJC, et al. Self-expandable metal stent placement for malignant esophageal strictures – changes in clinical outcomes over time. Endoscopy. 2019 Jan;51(1):18-29. doi: 10.1055/a-0644-2495. Epub 2018 Jul 10.PMID: 29991071
  3. Bakken JC, Wong Kee Song LM, de Groen PC, Baron TH. Use of a fully covered self-expandable metal stent for the treatment of benign esophageal diseases. Gastrointest Endosc. 2010 Oct;72(4):712-20. doi: 10.1016/j.gie.2010.06.028. PMID: 20883848

Como citar este artigo

Logiudice FP. Devemos fixar próteses metálicas totalmente recobertas em patologias benignas? Endoscopia Terapeutica 2025, Vol I. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/assuntosgerais/devemos-fixar-proteses-metalicas-totalmente-recobertas-em-patologias-benignas/




Trauma à órgãos abdominais sólidos – você conhecia essa incomum complicação pós colonoscopia?

Artigo original: Emara MH, Mazid U, Elshaer YA, Elkerdawy MA, Malik DF, Mahros AM. Trauma to the solid abdominal organs: The missed dark box of colonoscopy. World J Gastroenterol. 2024 Feb 21;30(7):624-630.

Acabamos de passar pelo março azul, mês de conscientização do câncer colorretal, e debatemos sobre os muitos benefícios da colonoscopia como método de prevenção desta grave patologia, sem menosprezar seus riscos inerentes.

Num artigo original publicado no ano passado, Emara MH e colaboradores discutem a lesão de órgãos sólidos abdominais, tecendo considerações sobre sua incidência, diagnóstico e manejo.

Sem entrar no mérito dos benefícios, eventos adversos após colonoscopia podem estar relacionados ao preparo colônico, sedação e ao procedimento em si, incluindo neste último dor abdominal, sangramento, perfuração e distensão abdominal. Todas estas complicações são bem descritas e conhecidas pelos colonoscopistas.

A queixa de dor abdominal após colonoscopia pode ser considerada uma manifestação comum, habitualmente associada a distensão gasosa e tração secundária ao exame, porém podem estar relacionadas a diversas outras causas. Pacientes com dor contínua, persistente ou em ascensão, associada ou não a sintomas como náuseas, vômitos, distensão abdominal relevante, hipotensão e instabilidade hemodinâmica devem despertar a atenção sobre possibilidade de perfuração, hemorragia ou lesão à órgãos intra-abdominais. Dentre as lesões de órgãos sólidos, a publicação destaca:

Lesão esplênica

Embora rara como complicação geral, é a mais frequente dentre as lesões de órgãos sólidos pós colonoscopia, com relato inicial em 1974 e incidência variável entre as publicações sendo descrita entre 0,2 – 0,3 a cada 10.000 colonoscopias em publicação de Laanani et al.

Apresenta-se habitualmente nas primeiras 24h com quadro de dor abdominal persistente, sem irritação peritoneal ou evidências de perfuração, com queda de hematimetria e sinais de choque hipovolêmico a depender da gravidade da lesão a qual pode incluir hematoma subcapsular, laceração, ruptura ou avulsão. O método diagnóstico padrão ouro é a tomografia abdominal com contraste, oferecendo detalhamento sobre a gravidade das lesões e excluindo outras causas visto que a lesão esplênica é um diagnóstico de exclusão.

O tratamento depende das condições do paciente e gravidade da lesão sendo sugerido tratamento conservador para casos de hematoma subcapsular sem repercussão hemodinâmica através de internação hospitalar, reposição volêmica, controle de níveis hematimétricos e exames de imagem de controle. Em pacientes instáveis, com sangramento ativo e peritonite, o tratamento pode ser realizado com embolização de artéria esplênica ou esplenectomia cirúrgica.

Lesão hepática

O relato desta complicação também foi descrito inicialmente na década de 70, em uma paciente com doença inflamatória intestinal que apresentou simultaneamente lesão hepática, esplênica e mesentérica. Os relatos envolvem casos de lesão hepática isolada raramente, sendo mais frequente encontrar lesão hepática e esplênica associadas. O quadro clínico descrito é semelhante ao de lesões esplênicas, dependendo de estabilidade hemodinâmica e extensão da lesão. Embora a ultrassonografia traga informações bastante precisas sobre a anatomia hepática, a tomografia computadorizada segue sendo padrão ouro pela sua habilidade em detectar outras causas ou mesmo lesões concomitantes em outros órgãos. A terapêutica inclui tratamento conservador, arteriografia, drenagem percutânea e laparotomia exploradora.

Lesão pancreática

As lesões pancreáticas descritas incluem casos de pancreatite aguda, pancreatite com sangramento na cauda do pâncreas e vazamento de ducto pancreático com posterior fístula colo-pancreática. Os sintomas foram descritos entre duas a seis horas após colonoscopia incluindo dor epigástrica, náuseas, vômitos e elevação de enzimas pancreáticas.

Dentre os fatores de risco cita-se trauma pancreático por dificuldades na progressão do colonoscópio (especialmente próximo da flexura esplênica), lesões transmurais por eletrocautério, hiperinsuflação do cólon, compressão sobre parede abdominal para facilitar passagem do colonoscópio e cirurgias prévias, aderências.O tratamento proposto segue os mesmos parâmetros de pancreatite por outras etiologias.

Lesão de outros órgãos

Não foram descritos casos de lesão direta aos rins ou adrenais, porém há relatos de laceração de mesentério, perfuração de bexiga e alça de delgado. As lesões podem ser únicas ou múltiplas e estar relacionadas ao uso de eletrocautério, distensão gasosa (hiperinsuflação), cirurgias prévias e aderências.

Mecanismos de trauma e prevenção

Organomegalias secundárias a diversas causas (hematológicas, infiltrativas ou intrínsecas) aumentam a possibilidade de lesão de vísceras, algo particularmente notado nas lesões esplênicas em pacientes com esplenomegalia. Outros fatores de risco foram identificados como histórico prévio de pancreatite, hiperinsuflação de gás durante o exame, uso de corrente elétrica, posição supina durante o exame, uso de pressão abdominal externa, formação de “alças” ou manobras de retificação do cólon esquerdo. Doença inflamatória intestinal, polipose e divertículos também são descritos como possíveis fatores predisponentes, particularmente em idosos.

O principal fator de risco para lesão de vísceras durante colonoscopia são aderências secundárias a cirurgias abdominais prévias. A passagem do aparelho pelo cólon pode exercer tração sobre os ligamentos do cólon (particularmente o ligamento espleno-cólico) e aderências entre esses órgãos e outros da cavidade abdominal causando lesões.

Por fim os autores destacam que não existem guidelines específicos para prevenção destas lesões sendo importante manter medidas de boas práticas e treinamento adequado para realização de colonoscopia evitando formação de alças e uso excessivo de força/tração.

Os sintomas variam de acordo com a severidade de lesões podendo aparecer desde horas a dias após o exame sendo essencial manter grau de suspeição, particularmente para pacientes de alto risco, informando o paciente sobre possíveis sinais de alarme como dor abdominal, distensão e hipovolemia. O diagnóstico precoce de possíveis complicações pode evitar eventos com desfecho potencialmente fatal.

Postula-se que manter o paciente em decúbito lateral esquerdo pode reduzir o risco de lesões esplênicas pois nesta posição o baço desloca-se para uma posição mais próxima ao cólon deixando possíveis aderências entre os dois órgãos mais frouxas. Em contrapartida, em posição supina a gravidade favorece o deslocamento do baço para região oposta ao cólon, aumentando a tensão sobre o ligamento espleno-cólico. Sugere-se portanto que pacientes de alto risco sejam mantidos em decúbito lateral esquerdo durante o exame. O uso de compressão manual sobre a parede abdominal, utilizada corretamente, pode reduzir a formação de alças e reduzir o risco de dano às vísceras.

Clique Perfuração na Colonoscopia: Cuidados e Manejo para mais informações sobre o tema e veja abaixo nas referências alguns artigos para quem se interessar mais no tópico com uma boa explanação sobre mecanismos de trauma e tratamento conservador na publicação de Lukies M et al. e um relato de caso com detalhamento sobre estratificação de lesões esplênicas no trabalho de Abdelrahim A et al.

Referências

  1. Emara MH, Mazid U, Elshaer YA, Elkerdawy MA, Malik DF, Mahros AM. Trauma to the solid abdominal organs: The missed dark box of colonoscopy. World J Gastroenterol. 2024 Feb 21;30(7):624-630.
  2. Lukies M, Clements W. Splenic artery embolisation for splenic injury during colonoscopy: A systematic review. United European Gastroenterol J. 2024 Feb;12(1):44-55. doi: 10.1002/ueg2.12498. Epub 2023 Dec 4. PMID: 38047383; PMCID: PMC10859723.
  3. Abdelrahim A, Ali O, Khawaja A. Splenic haematoma: a rare complication of colonoscopy. BMJ Case Rep. 2021 Mar 24;14(3):e240253. doi: 10.1136/bcr-2020-240253. PMID: 33762280; PMCID: PMC7993349.
  4. D’Orazio B, Cudia B, Martorana G, Di Vita G, Geraci G. Conservative Treatment of Splenic Haematoma After Colonoscopy: A Case Report. Cureus. 2020 Sep 18;12(9):e10531. doi: 10.7759/cureus.10531. PMID: 33094071; PMCID: PMC7574971.

Como citar este artigo

Ferreira F. Trauma à órgãos abdominais sólidos – você conhecia essa incomum complicação pós colonoscopia? Endoscopia Terapeutica, 2025 Vol I. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/artigoscomentados/trauma-a-orgaos-abdominais-solidos-voce-conhecia-essa-incomum-complicacao-pos-colonoscopia/




Schwannoma de cólon ascendente: Uma rara lesão diagnosticada por ecoendoscopia

Apresentação do caso:

Paciente de 73 anos, do sexo feminino, foi submetida a colonoscopia de rastreamento que evidenciou lesão elevada séssil de aspecto subepitelial, sinal da tenda positivo e do travesseiro negativo, no cólon ascendente, medindo 30 mm, recoberta por mucosa íntegra e com suspeita tomográfica de pólipo inflamatório.

Optado pela investigação adicional com ecoendoscopia para decisão terapêutica, sendo possível alcançar a lesão com ecoendoscópio setorial.

Avaliação ecográfica revelou lesão nodular hipoecoica, heterogênea, de limites bem definidos, medindo 27 x 26 mm, localizada e restrita a camada muscular própria, sem linfonodomegalias perilesionais.

Realizada punção ecoguiada utilizando agulha FNB 22 Gauge, revelando neoplasia fusocelular de baixo grau.

Exame imunohistoquímico com resultado positivo para S100 e negativo para C-KIT , DOG-1, actina e CD34.

Tais achados corroboram o diagnóstico de Schwannoma.

Paciente foi submetida a colectomia direita videolaparocópica com retirada completa da lesão e sem necessidade de fazer linfadectomia oncológica.

Discussão:

O Schwannoma é um tumor originário de células de Schwann, presente na bainha de mielina de nervos periféricos.

Essa neoplasia possui menor incidência no trato gastrointestinal acometendo o plexo mioentérico de Auerbach, nos quais a maioria dos casos reportados estão localizados no estômago e intestino delgado, acometendo raramente o cólon.

Possui maior prevalência a partir da sexta década de vida e não tem predominância de gênero.

O quadro clínico comumente é assintomático ou composto por sintomas inespecíficos como dor e desconforto abdominal, tenesmo, constipação, sangramento retal ou melena.

A descoberta geralmente é incidental por meio do rastreamento endoscópico, revelando lesão de aspecto subepitelial de formato regular e bem definido, podendo ou não ser ulcerada.

O diagnóstico definitivo é por meio de exame patológico com imunohistoquímica positiva para S100 e negativo para SMA, Desmina, CD117 e P53.

A ecoendoscopia baixa é desafiadora, mas com habilidade técnica ela pode ser realizada de forma eficaz, contribuindo para a definição diagnóstica e direcionando a escolha da técnica cirúrgica, resultando em uma abordagem menos invasiva.

Usualmente os tumores são benignos com prognóstico favorável, com raros casos de transformação maligna.

De forma geral, a ressecção cirúrgica é o tratamento de escolha para evitar a transformação maligna.

Comentários finais:

Schwannoma de cólon é uma lesão extremamente rara, sendo diagnóstico diferencial de tumor estromal gastrointestinal. A avaliação por ecoendoscopia com punção permite o diagnóstico pré-operatório, possibilitando ressecções cirúrgicas menos extensas e com menor morbidade, contribuindo com um bom prognóstico. Na maioria dos casos o diagnóstico é feito após análise histopatológica de peça cirúrgica. Se faz necessário a avaliação imunohistoquímica para diferenciação de outros tipos histológicos de tumores que acometem o cólon.

Referências

  1. Bohlok, A., El Khoury, M., Bormans, A., et al. Schwannoma of the colon and rectum: a systematic literature review. World Journal of Surgical Oncology, 16, 125 (2018). DOI: 10.1186/s12957-018-1427-1.
  2. Schwannoma of the ascending colon: A rare case report. Asian Journal of Surgery, Volume 46, Issue 6, 2023, Pages 2417-2418. ISSN: 1015-9584.
  3. Kim, G., Kim, S. I., Lee, K. Y. Schwannoma of the sigmoid colon: a case report and review of literature*. Journal of Surgical Case Reports, 2019 Feb;2019(2):rjz046. DOI: 10.1093/jscr/rjz046.
  4. Baig, M. M. A. S., Patel, R., Kazem, M. A., Khan, A. Schwannoma in the ascending colon, a rare finding on surveillance colonoscopy. Journal of Surgical Case Reports, 2019 Feb;2019(2):rjz 046. DOI: 10.1093/jscr/rjz046.

Como citar este artigo

Botelho PF, Costa LS. Schwannoma de cólon ascendente: Uma rara lesão diagnosticada por ecoendoscopia Endoscopia Terapeutica 2025 Vol I. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/casosclinicos/schwannoma-de-colon-ascendente-uma-rara-lesao-diagnosticada-por-ecoendoscopia/




Quiz!

Colaboração: Ygor Rocha Fernandes, Mateus Pereira Funari

Paciente do sexo feminino, 44 anos, com antecedente de cirurgia bariátrica (Bypass Gástrico em Y de Roux) realizada em 2012, e diagnóstico prévio de hipotireoidismo. Desde o final de 2022, evoluiu com dor abdominal progressiva, episódios de náuseas e vômitos, além de perda de peso significativa.

Uma endoscopia digestiva alta (EDA) realizada em junho de 2023 identificou uma estenose na anastomose gastrojejunal, com achados sugestivos de isquemia. A paciente foi submetida a revisão cirúrgica da anastomose, no entanto, os sintomas persistiram.

Em janeiro de 2024, uma tomografia computadorizada (TC) de abdome revelou perfuração bloqueada da anastomose e uma coleção perianastomótica, além de uma lesão polipoide de 2,5 cm na segunda porção do duodeno, na região periampular. Diante desses achados, foi solicitada uma ressonância magnética (RM) de abdome superior, que confirmou uma lesão polipoide intraluminal de 3,2 cm na parede lateral da segunda porção do duodeno, com realce heterogêneo.

Após discussão multidisciplinar, optou-se por nova cirurgia para drenagem da coleção, revisão da anastomose e EDA intra-operatória para avaliar a lesão polipoide em duodeno, em março de 2024. Durante o ato cirúrgico, foi realizada uma gastrotomia para acesso endoscópico ao duodeno. A endoscopia revelou uma lesão pediculada, com superfície vilosa, localizada na parede lateral da segunda porção do duodeno, oposta à papila maior (seta). A base do pedículo media 15 mm de comprimento por 12 mm de espessura, e a porção cefálica da lesão apresentava diâmetro de 30 mm.




Como fazer uma punção ecoguiada transvascular?

Durante anos, a presença de vasos de grande calibre entre o ecoendoscópio e a lesão representava um obstáculo intransponível. Mas os tempos mudaram: a evolução técnica e a experiência crescente com punção transvascular guiada por EUS/EBUS (TVNA) mostram que esse caminho, antes temido, pode ser seguro e altamente eficaz, desde que bem indicado.

O que é a TVNA?

A TVNA é uma técnica de punção por agulha fina em que a agulha atravessa um vaso sanguíneo interposto (como a aorta, artéria pulmonar ou veia cava) para alcançar uma lesão torácica ou abdominal.

  • Objetivo: coletar tecido para análise citopatológica ou histológica
  • Guia: ecoendoscopia em tempo real com doppler
  • Público alvo: pacientes sem outra via de acesso para diagnóstico

Quando considerar?

Abaixo um fluxograma para indicar a técnica:

Evidências atuais:

Estudo multicêntrico espanhol (Garcia-Sumalla et al., 2020)

  • Pacientes: 49 (50 procedimentos)
  • Vasos transfixados: Aorta (n=19), sistema portal (n=17)
  • Lesões: Linfonodos mediastinais (n=13), tumores pancreáticos (n=11)
  • Sensibilidade: 88%
  • Especificidade: 100%
  • Acurácia: 90%
  • Complicações: 3 leves (2 hematomas murais, 1 sangramento autolimitado)
Figura: punção ecoguiada transfixando veia cava inferior com agulha 22G para investigação linfonodo suspeito. Imagem retirada de Garcia-Sumalla et al., 2020.

Meta-análise (Giri et al., 2023)

  • Estudos analisados: 17
  • Pacientes: 411
  • Acurácia diagnóstica: 85%
  • Adequação da amostra: 91,5%
  • Taxa de sangramento: 1,4% (todos autolimitados)

Técnica passo a passo:

  • Avaliação prévia com imagem (TC ou RNM)
  • Estudo cuidadoso com doppler
  • Evitar vasos com calcificação ou aneurismas
  • Escolher agulhas finas (FNA 25G ou 22G)
  • Preferir técnica com ROSE, se disponível
  • Após punção, monitorar área por 2 minutos com doppler
  • Observação clínica de 6 horas à 24 horas

Pontos-chave:

  • Permite diagnóstico de lesões “inacessíveis”
  • Evita procedimentos cirúrgicos mais invasivos
  • Alta acurácia quando bem indicada
  • Necessita de centro especializado
  • Contraindicado em coagulopatia ou hipertensão portal
  • Monitoramento rigoroso no pós-procedimento
  • Ainda sem estudos com FNB

Conclusão

A TVNA representa uma verdadeira virada de chave na econdoscopia diagnóstica. Ao vencer a barreira dos grandes vasos com precisão, segurança e racionalidade, ampliamos o espectro de pacientes que podem se beneficiar de diagnósticos menos invasivos e mais ágeis. É uma técnica que exige respeito, preparo e critério, mas que, nas mãos certas, torna o impossível acessível.

Referências

  1. GARCIA-SUMALLA, Albert et al. Endoscopic ultrasound-guided transvascular needle biopsy of thoracic and abdominal lesions: a multicenter experience. Endoscopy International Open, v. 8, p. E1900–E1908, 2020. DOI: 10.1055/a-1288-0030
  2. GIRI, Suprabhat et al. Efficacy and safety of endosonography-guided transvascular needle aspiration of thoracic and abdominal lesions: A systematic review and meta-analysis. Journal of Clinical Ultrasound, v. 51, n. 4, p. 723–730, 2023. DOI: 10.1002/jcu.23441
  3. KAZAKOV, Jordan et al. Endobronchial and Endoscopic Ultrasound-Guided Transvascular Biopsy of Mediastinal, Hilar, and Lung Lesions. The Annals of Thoracic Surgery, v. 103, n. 3, p. 951–955, 2017.
  4. MOLINA, Juan Carlos et al. Transvascular endosonographic-guided needle biopsy of intrathoracic lesions. The Journal of Thoracic and Cardiovascular Surgery, v. 159, n. 5, p. 2057–2065, 2020. DOI:
    10.1016/j.jtcvs.2019.10.017

Como citar este artigo

Oliveira JF. Como fazer uma punção ecoguiada transvascular? Endoscopia Terapeutica 2025, Vol 1. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/assuntosgerais/como-fazer-uma-puncao-ecoguiada-transvascular/




Paciente atrasado: devo atender ou não?

Em nossa profissão é comum que pacientes cheguem atrasados às consultas e exijam serem atendidos. A questão é que tal comportamento não apenas pode prejudicar o atendimento médico de outros pacientes como a negativa em atendê-lo pode levar a uma relação conturbada entre ele e o profissional.

Como você tem resolvido estas questões? Seu comportamento é baseado no conhecimento do que dizem os pareceres dos conselhos médicos? Você se sente obrigado a atender o paciente atrasado? Vamos expor algumas decisões dos Conselhos sobre este assunto.

No Parecer no 1882/2007, respondendo a questionamento sobre se é infração ética do profissional deixar de atender paciente agendado eletivamente porque ele não chegou no horário agendado e se cabe à operadora de saúde impor algum tipo de penalidade ao profissional ou à clínica, o Conselho Regional de Medicina do Paraná expõe: “No compromisso de consultar e ser consultado, tanto o médico quanto o paciente, tem obrigações e deveres. Quando existe agendamento prévio deduz-se que outras pessoas também assim o fizeram, e que o profissional programa-se em função daquele, ao paciente cabe estar presente no horário estabelecido, devendo avisar de possíveis atrasos ou desistências em tempo hábil, no entanto, quando ocorre um atraso é prerrogativa do profissional liberal aguardar ou não, pelo período que considerar adequado, sendo prática médica diária habitual aguardar-se, mas não obrigatória. A relação com a operadora de plano de saúde deverá seguir o que estiver estabelecido em contrato ou adesão.”

No mesmo sentido o Conselho Regional de Medicina do Espirito Santo aborda o tema com as seguintes exposições baseadas no Código de Ética Médica, ao responder no Parecer no 000014/ 2014 a dúvida se é obrigatório o atendimento de paciente que chega atrasado em consulta:

– segundo o Capítulo I – Princípios Fundamentais – inciso II, “(…) “o alvo de toda a atenção do médico é a saúde do ser humano, em benefício da qual deverá agir com o máximo de zelo e o melhor de sua capacidade profissional” e o inciso IV do Código de Ética: “Ao médico cabe zelar e trabalhar pelo perfeito desempenho ético da Medicina, bem como pelo prestígio e bom conceito da profissão”, o referido CRM expõe que “Esse zelo inclui também a pontualidade a ser buscada em respeito às pessoas que comparecem para atendimento nos horários agendados, tornando-se imperiosa a recusa à inserção de pessoas retardatárias em horários já destinados aos clientes pontuais.”;

– do inciso VII: “O médico exercerá sua profissão com autonomia, não sendo obrigado a prestar serviços que contrariem os ditames de sua consciência ou a quem não deseje, excetuadas as situações de ausência de outro médico, em caso de urgência ou emergência, ou quando sua recusa possa trazer danos à saúde do paciente.”, ressalta que o “médico não é obrigado a prestar atendimento em desacordo com a organização da agenda a ser seguida e dos horários a serem respeitados, ressalvadas as excepcionalidades previstas no inciso acima.”;

– do inciso VIII dos Princípios Fundamentais: “O médico não pode, em nenhuma circunstância ou sob nenhum pretexto, renunciar à sua liberdade profissional, nem permitir quaisquer restrições ou imposições que possam prejudicar a eficiência e a correção de seu trabalho.”, refere que “Mesmo que tais imposições procedam de cliente que, qualquer que seja o motivo, não compareceu com pontualidade para o atendimento regular.”

– do Capítulo II, inciso VIII, que afirma ser direito do médico: “Decidir, em qualquer circunstância, levando em consideração sua experiência e capacidade profissional, o tempo a ser dedicado ao paciente, evitando que o acúmulo de encargos ou de consultas venha a prejudicá-lo.”, explica que “A consequência dessa decisão é a recusa em reduzir o tempo de atendimento à clientela para permitir inserções e também a recusa em atender cliente sem dispor de tempo suficiente para tal, ressalvadas as excepcionalidades acima citadas”.

Dado o exposto, o referido Conselho conclui que “entende que o médico não é obrigado a prestar atendimento eletivo a clientes em atraso, havendo até mesmo a obrigação de não fazê-lo caso isso resulte em uma redução do tempo a ser empregado com a clientela pontual.”

Podemos então inferir que as decisões dos Conselhos concordam com a não obrigatoriedade do atendimento ao paciente atrasado, principalmente se seu atraso prejudique o atendimento dos demais. Lógico que o profissional deve levar em consideração o bom-senso para resolver cada caso, inclusive considerando que o paciente também deve ter a responsabilidade de suas obrigações.

Para mais informações, veja outros temas:

Até a próxima!

Referências

  1. https://sistemas.cfm.org.br/normas/arquivos/pareceres/PR/2007/1882_2007.pdf
  2. https://sistemas.cfm.org.br/normas/arquivos/pareceres/ES/2014/5_2014.pdf

Como citar este artigo

Brito HP. Paciente atrasado: devo atender ou não? Endoscopia Terapeutica 2025 Vol I. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/assuntosgerais/paciente-atrasado-devo-atender-ou-nao/