QUIZ – Achado em segunda porção duodenal

Mulher, 64 anos, portadora de hipertensão arterial sistêmica, diabetes mellitus e doença renal crônica (não dialítica), foi encaminhada para realização de EDA devido a queixas de dores epigástricas e empachamento pós-prandial. Tem antecedente pessoal de IAM com realização de angioplastia e faz uso regular de AAS, clopidogrel, hidralazina e insulina glargina.

A EDA evidencia no bulbo e 2a porção duodenal, pontilhado difuso, plano, de coloração acastanhada, realçado à cromoscopia eletrônica com NBI, conferindo aspecto “tigróide” a mucosa que não apresenta soluções de continuidade.

Qual seu diagnóstico?




Manejo do linfoma MALT

 

LINFOMA MALT

Os linfomas gástricos são neoplasias raras e que correspondem a apenas 5% das neoplasias que acometem o estômago. Cerca de 50% dos casos são linfomas da zona marginal dos folículos linfóides (MALT) sendo que estes estão associados com a infecção pelo Helicobacter Pylori em mais de 90% dos casos. Os outros linfomas gástricos geralmente são do tipo difuso de grandes células B ou mais raramente o linfoma de Burkit ou do manto, que costumam ter uma pior evolução.

A infecção pelo H. pylori tem papel fundamental no desenvolvimento do linfoma MALT. O linfoma de tecido linfoide associado à mucosa se origina à partir da zona marginal de células B, geralmente causado pela infecção crônica pelo H. pylori, que promove um estímulo antigênico local.

O tratamento do linfoma MALT é determinado, dessa maneira, de acordo com o estadiamento clínico e a presença da infecção pelo H. pylori. A erradicação do H. pylori induz a remissão completa em 75 a 85% dos pacientes e é considerada o tratamento inicial.

O aspecto macroscópico dos linfomas MALT pode variar. Diversos autores têm proposto classificações baseadas em apresentações macroscópicas (ulcerativo, exofítico, hipertrófico, hemorrágico, infiltrativo, dentre outros). Muitas vezes as alterações se distribuem de forma desigual e em um mesmo paciente podemos encontrar várias formas macroscópicas.

Há uma desorganização estrutural das glândulas que se traduz em desestruturação macroscópica. Com a erradicação do H. pylori ocorre uma regeneração e temos uma melhora microscópica e macroscópica. O aspecto da mucosa se correlaciona com sucesso ou fracasso do tratamento. Em caso de remissão da doença há uma regeneração muitas vezes completa das lesões na mucosa. Por outro lado, a persistência de lesões  se correlaciona fortemente com falha de tratamento. A erradicação é recomendada mesmo em caso de teste negativo para H. pylori, independente do estadiamento.

Classificação de Sano

O diagnóstico endoscópico do linfoma MALT é difícil pela escassez de aspectos macroscópicos característicos. Diversos autores têm mostrado, no entanto, algumas alterações comuns em pacientes portadores de linfoma MALT. Palidez e áreas semelhantes à atrofia, dilatação e destruição de criptas,  além de dilatação de microvasos são aspectos comuns no linfoma MALT.

https://endoscopiaterapeutica.net/pt/linfoma-malt/

As alterações endoscópicas são destacadas por técnicas de cromoscopia como o NBI. A TLA ou  “Tree Like Appearance” é uma alteração descrita que consiste no achado de vasos anormais que se assemelham a galhos de árvore e traduzem perda da microestrutura tecidual. Há uma forte correlação diagnóstica do TLA visto durante NBI com diagnóstico, resposta ao tratamento e seguimento dos casos de linfoma MALT.

A erradicação do H. pylori é o tratamento inicial em casos de linfoma MALT independente do estadiamento e leva a uma resposta completa em cerca de 60 a 80% dos casos. A resposta, no entanto, nem sempre é imediata. A média para resposta completa pode variar de 1 a 14 meses, com uma média de 5 meses.

As diretrizes recomendam uma estratégia “watch and wait” com endoscopias seriadas a cada 3 a 6 meses pelo período de 1 ano. À partir de então, na persistência de lesões, está indicada radioterapia.

 

LINFOMA MALT NÃO ASSOCIADO AO H. PYLORI

Linfoma MALT gástrico não associado a infecção pelo Helicobacter Pylori

 

 

TESTE SEU APRENDIZADO COM O QUIZ:

QUIZ! Manejo do linfoma MALT

 

REFERÊNCIAS:

1.     Nonaka K, Ohata K, Matsuhashi N et al. Is Narrow-nad imaging useful for histological evaluation of gastric mucosa-associated ;ymphoid tissue lymphoma after treatment? Dig Endosc 2014; 26(3): 358-64.

2.     Mavrogenis G, Camboni A, Denis MA. Endoscopic features of lymphoproliferative diseases. Gastrointest Endosc 2015; 81(6): 1480-1.

3.     Isomoto H, Matsushima K, Hayashi T et al. Endocytoscopic findings of lymphomas of the stomach. BMC Gastroenterol 2013; 13: 174-8.

4.     Lee CM, Lee DH, Ahn BK et al. Correlation of endoscopic findings of gastric mucosa-associated lymphoid tissue lymphoma with recurrence after complete remission. Clin Endosc 2017; 50:51-57.

5.     Isomoto H, Shikuwa S, Yamaguchi N et al. Magnified endoscopic findings of gastric low-grade mucosa-associated  lymphoid tissue lymphoma. Endoscopy 2008; 40 (3): 225-8.




Estadiamento OLGA e OLGIM para atrofia gástrica

Na suspeita de câncer gástrico (CG), a endoscopia é principal ferramenta de diagnóstico. Também pode ser usado no rastreio do CG, porém,  para que possa haver equilíbrio entre custo/risco e benefício, este rastreio deve ser limitado aos pacientes com alto risco.

Com a evolução dos conhecimentos sobre o CG, tem-se demonstrado o papel da atrofia gástrica com principal preditor do CG do tipo intestinal. Porém, o risco de câncer difere nos diferentes achados de atrofia (apenas de antro, de corpo, ambos, associado a infecção com H. pylori …), dificultando o manejo dos pacientes com tais achados.

Assim, um grupo de estudo formado por patologistas e gastroenterologistas ( the Operative Link of Gastritis Assesment – OLGA), propôs um sistema, baseado em uma gradação do fenótipo da  gastrite atrófica encontrada, ao longo de uma escala evolutiva (estágios OLGA I a IV)  capaz de predizer o risco crescente de CG.

O estadiamento OLGA leva em conta a severidade da atrofia (gradação histológica) e a localização endoscópica (topografia) das amostras colhidas. O estadiamento também apresenta informações  sobre a possível etiologia da atrofia (autoimune, infecção por H. pylori, etc).

Os critérios utilizados para definir a atrofia gástrica e seu estadiamento podem ser avaliadas no quadro abaixo (figura 1)

Figura 1 : Classificação histológica para atrofia gástrica.

As biópsias  devem ser  realizadas no mínimo em cinco locais e separadas em 3 frascos. Existe uma controvérsia a respeito dos locais onde devem ser coletadas as amostras do corpo gástrico (pequena e grande curvatura ou parede anterior e parede posterior).

Uma discussão a respeito desse assunto você pode encontrar nesse outro artigo: onde coletar as biópsias para estadiamento OLGA?

Nossa recomendação é:

  • Pequena e grande curvatura de corpo (C1 e C2)
  • Incisura angularis (A3)
  • Pequena e grande curvatura de antro (A1 e A2)

Combinado os achados do estadiamento de atrofia nos diferentes locais anatômicos, criou-se o estadiamento OLGA (figura 2) :

FIGURA 2 – ESTADIAMENTO OLGA

Com base no estadiamento OLGA,  podemos nos deparar com os seguintes cenários :

Estagiamento OLGA 0 : Não há achado de atrofia . Deve-se atentar ao achado histológico de “indeterminado para atrofia”, que pode ocorrer em infecções ativas por H. pylori , estando o tratamento indicado, e novas biópsias posteriores.

Estagiamento OLGA I : Estágio de atrofia mais baixo, detectado em biópsias. E geral, podem estar associados a infecção ativa por H. pylori, ou dificuldade de análise do material por uso associado de inibidos de bomba de prótons . Deve ser mencionada no laudo histológico, a suspeita de infecção por H. pylori mesmo na ausência do achado.

Estagiamento OLGA II : Combinação de achado em geral de atrofia em diferentes locais de biópsias, mas em geral, a atrofia mais comum em região mucosecretora. Carrega um baixo risco de evolução para CG.

Estagiamento OLGA III :  Moderada atrofia nos dois compartimentos anatômicos, e mais comumente associado a metaplasia intestinal. Quando ocorre com atrofia 0 na área mucosecretora , em geral está associado a gastrite atrófica autoimune de corpo.  Não é achado comum em população de baixo risco, pode estar associado a neoplasia não invasiva  ou até avançada.

Estagiamento OLGA IV:  É o achado de atrofia em todos os compartimentos anatômicos. Raramente encontrado em áreas de baixa incidência de CG. Os dados demonstram que os programas de vigilância devem ser reservados so pacientes incluídos nos grupos OLGA IIIe IV.

Classificação OLGIM

Mais recentemente, alguns grupos propõe o uso de uma classificação diferenciada, onde histologicamente o achado mais importante seria o de metaplasia intestinal, e a porcentagem que esta metaplasia está presente nas biópsias (variação chamada de OLGIM , figura 3 ). Por fim, também se discute a não necessidade de realização de biópsias da Incisura angularis.

FIGURA 3 – ESTADIAMENTO OLGIM

Pessoalmente, entendo que o estadiamento OLGA é importante para definir o acompanhamento aos pacientes com atrofia, porém, há uma dependência grande do patalogista, que deve estar integrado a equipe de gastroenterologistas, o que pode ser problemático em muitas cidades brasileiras.

Você já teve experiência com o OLGA ? Acompanha algum paciente seguindo as condutas propostas ?

BIBLIOGRAFIA

1- Rugge M, Correa P, Di Mario F, El-Omar E, Fiocca R, Geboes K, Genta RM, Graham DY, Hattori T, Malfertheiner P, Nakajima S, Sipponen P, Sung J, Weinstein WVieth M. OLGA staging for gastritis: a tutorial. Dig Liver Dis. 2008 Aug;40(8):650-8.

2- Capelle LG, de Vries AC, Haringsma J, Ter Borg F, de Vries RA, Bruno MJ, van Dekken H, Meijer J, van Grieken NC, Kuipers EJ. The staging of gastritis with the OLGA system by using intestinal metaplasia as an accurate alternative for atrophic gastritis. Gastrointest Endosc. 2010 Jun;71(7):1150-8.

3- Zhou Y, Li HY, Zhang JJ, Chen XY, Ge ZZ, Li XB. Operative link on gastrites assessment stage is an appropriate predictor of early gastric cancer. World J Gastroenterol. 2016 Apr 7;22(13):3670-8.

4- Rugge M, Fassan M, Pizzi M, Farinati F, Sturniolo GC, Plebani M, Graham DY. Operative link for gastritis assessment vs operative link on intestinal metaplasia assessment. World J Gastroenterol. 2011 Nov 7;17(41):4596-601.




Quiz! Múltiplas angiectasias gastrointestinais

Paciente do sexo feminino com 72 anos e anemia crônica desde a juventude. Relata episódios frequentes de melena e epistaxe. Tem um irmão e uma irmã com sintomas semelhantes.

No exame físico notam-se lesões avermelhadas nos lábios e língua.

Realizou endoscopia digestiva alta que mostrou múltiplas angiectasias gástricas, bulbares, de segunda  e terceira porção duodenal. O restante do trato gastrointestinal não foi estudado até o momento.




Tratamento de estenose benigna gastrointestinal com prótese de aposição de lúmen

O artigo publicado na edição de Junho de 2017 da revista Gastrointestinal Endoscopy testa uma alternativa ao tratamento convencional da estenose benigna do trato gastrointestinal.

Essas estenoses são tradicionalmente tratadas com dilatação, estenotomias ou injeção de corticosteroides. Stents metálicos auto-expansíveis são raramente usados nessas situações e geralmente são reservados para casos refratários. Cabe destacar, ainda, a elevada taxa de migração desses stents que pode atingir 30 a 40%.

O stent metálico com aposição de lúmen tem um design diferente e foi aprovado para uso nos EUA inicialmente para a drenagem de coleções pancreáticas (Axios stent, Boston Scientific). Esse stent tem extensão longitudinal curta (limitada em apenas 10 mm) com extremidades amplas (23 a 28 mm) e com diâmetros que variam de 10 a 15 mm. O artigo trata de um estudo multicêntrico que avalia o uso desse stent para o tratamento de estenoses benignas do TGI.

Axios stent. Divulgação Boston Scientific

 

MÉTODO

No período de Agosto de 2014 a Novembro de 2015, 25 pacientes de 2 hospitais terciários foram tratados. A programação era que os pacientes permanecessem com os stents por cerca de 90 dias.

O Sucesso técnico foi definido como a colocação adequada dos stents, confirmada endoscopicamente e radiologicamente. Sucesso clínico foi definido como a melhora clínica dos sintomas por pelo menos 6 meses após a colocação dos stents.

Foram realizadas 28 colocações de stents (3 pacientes colocaram stents com diâmetro de 10 mm que imediatamente foram removidos para recolocarem um de 15 mm) para tratar diferentes estenoses benignas com extensão menor do que 1 cm.

A localização das estenoses variou incluindo anastomoses esofagogástricas (n=4), anastomoses gastrojejunais (n=13), estenoses pilóricas (n=6), estenose pós gastroplastia vertical (n=1) e anastomose ileocolócia (n=1).

Vinte pacientes haviam sido previamente tratados com dilatação isolada, 11 pacientes com dilatação e injeção de corticosteroides, 2 pacientes com estenotomia e 1 paciente com colocação de um stent metálico auto-expansível totalmente recoberto convencional, que migrou precocemente.

Prótese metálica de aposição de lúmen. Tratamento de estenose de anastomose. Adaptado de Shayan et al. http://dx.doi.org/10.1016/j.gie.2016.08.028

RESULTADOS

  • Média de idade  de 54 anos. Foram tratados 7 pacientes do sexo masculino e 18 do sexo feminino.
  • Sucesso técnico foi alcançado em todos os pacientes,
  • Sucesso clínico foi alcançado em 15 dos 25 pacientes (60%).
  • Tempo médio de permanência do stent  de 92 dias com seguimento médio  de 301 dias para as diferentes causas de estenose.
  • As estenoses de anastomoses gastrojejunais e estenoses pilóricas apresentaram as respostas mais favoráveis.

Complicações

  • Migração de stent foi observada em 2 de 28 procedimentos (7%)
  • 5 eventos adversos: Dor que necessitou remoção do stent em 2 pacientes, formação de nova estenose em 2 pacientes e sangramento em 1 paciente.

 

DISCUSSÃO

Estenose benigna não constitui indicação precisa para o uso de stent. Próteses parcialmente recobertas são de difícil manejo e remoção. As próteses totalmente recobertas migram com facilidade e mesmo quando são utilizados dispositivos para evitar a migração como clipes ou  sutura endoscópica as taxas podem atingir 15%. O estudo apresentado mostrou uma taxa de migração baixa, de 7%, provavelmente devido ao design do stent utilizado.

Outro fato a ser destacado é que as próteses tradicionais são muito longas em relação à extensão das estenoses e podem provocar lesões teciduais adicionais. Neste estudo, dois pacientes desenvolveram estenoses proximais aos stents, associadas a tecido de granulação. Isso pode ter ocorrido, também, devido ao design do stent (curta extensão e extremidades amplas), os mesmos atributos que resultam em menores taxas de migração.

O pequeno número de pacientes e o curto acompanhamento limitam as conclusões, bem como seu desenho retrospectivo, abordagem de causas diversas de estenose e a falta de um braço de tratamento de controle.

Os autores concluem que a colocação desses stents é tecnicamente fácil e relativamente segura. No entanto, algumas questões permanecem: apesar do sucesso técnico ter sido obtido em todos os pacientes, a resposta clínica global foi de 60%. Não se sabe qual é o diâmetro ideal do stent, não há estudos de custo-efetividade e a comparação entre as diferentes técnicas é difícil.

A abordagem algorítmica usual para estenoses GI benignas permanece a mesma. Deve-se começar com a dilatação endoscópica, aumentando até atingir 14 a 15 mm. Estenotomia pode ser realizada para estenoses curtas e semelhantes a anéis. Injeções de corticosteroides podem ser tentadas após falha na dilatação isolada e progredindo para colocação de stent em casos selecionados, apenas após sucessivas falhas das intervenções acima.

 

REFERÊNCIA

Use of a lumen-apposing metal stent to treat GI stricture. Gastrointestinal endoscopy Vol 85 N.06, 2017.  Link para o artigo – clique aqui

Nota: O artigo contém um  vídeo muito didático demonstrando a técnica, porém, é necessário login e senha para acessar o conteúdo restrito do Jornal Gastrointestinal Endoscopy.




SÍNDROME BLUE RUBBER BLEB NEVUS

Paciente  masculino, 16 anos,  com história de anemia ferropriva persistente secundária a hemorragia digestiva baixa (HDB) recorrente desde os 3 anos de idade sendo necessárias inúmeras hemotransfusões.
Antecedente cirúrgico de laparotomia aos 6 anos com realização de enterectomia (1,5 m de jejuno) e ressecção de 13 lesões cujo anatomopatológico concluiu se tratarem de hemangiomas cavernosos.
Foi admitido para investigação com relato de episódio de HDB há 30 dias. Apresentava-se hipocorado, com Hb: 4,1 g/dl e Ht: 12,5%. Estava em uso de talidomida. No exame físico destacava-se a presença de um nódulo violáceo em dorso de mão e diminuta lesão em pé (vide fotos abaixo).


Realizou tomografia de abdome identificou várias lesões com características vasculolinfáticas  nas alças de intestino delgado e cólon. Identificadas também lesões na adrenal esquerda, peritônio, parênquima e hilo hepático.
Endoscopia digestiva alta sem alterações.
A colonoscopia (vide abaixo) evidenciou 4 lesões polipoides subpediculadas, medindo até 25mm, bem delimitadas, levemente violáceas, localizadas em cólon transverso, descendente, ângulo esplênico e reto, porém sem sinais de sangramento. Tais achados eram sugestivos de hemangiomas.


A enteroscopia alta identificou 2 lesões em jejuno: um hemangioma de 1,5 cm e uma angioectasia, ambas tratadas com argônio.
Baseado nos achados da colonoscopia e no passado de hemangiomas em intestino delgado foi aventada a hipótese da Síndrome do Nevo Azul (Blue Rubber Bleb Nevus – BRBN).
Neste caso, por conta do tamanho das lesões colônicas optamos por realizar o tratamento endoscópico com injeção de cianoacrilato.  Esta conduta foi baseada em relatos da literatura que mostram uma boa taxa de sucesso e menor recorrência. O procedimento foi realizado sem intercorrências.
 
 

A colonoscopia de controle em 1 semana e após cerca de 5 meses apresentaram bons resultados. Paciente não apresentou mais HDB e manteve hemoglobina após 1 ano em torno de 15,1 g/dl e Ht de 43%.
Discussão
A Blue Rubber Bleb Nevus Syndrome (SBRBN) é uma doença rara caracterizada por malformações vasculares (hemangiomas carvenosos) localizadas principalmente na pele e trato gastrintestinal. A maior parte dos casos são esporádicos, mas há alguns relatos em grupos de famílias, o que sugere ter uma base genética com herança autossômica dominante.
A maior morbidade desta doença se deve ao sangramento gastrintestinal, geralmente auto-limitado, evidenciando-se pela perda oculta nas fezes. A depender do tamanho e extensão dos hemangiomas pode ocorrer hematêmese, melena ou enterorragia. Outras complicações gastrintestinais, quando as lesões são de grandes dimensões, são: volvo, intussuscepção e isquemia intestinal.
O diagnóstico diferencial se dá com outras síndromes que cursam com lesões vaculares cutâneas e similares em outros órgãos que são:

  • Redu Osler Weber (TGI e pulmão)
  • Klippel- Trenaunay (osso, tecidos moles e S. Nervoso)
  • Sturge Weber (meninges)
  • Von Hippel Lindau (SNC e retina)
  • Maffucci (esqueleto)
  • Cobb (Medula espinhal)

Nos casos leves o tratamento é conservador com suplementação de ferro e/ou transfusões sanguíneas. Em casos de HDB recorrente é necessário o tratamento endoscópico ou eventualmente o cirúrgico. A ecoendoscopia pode ser útil para confirmar a natureza hemangiomatosa das lesões.
Para as lesões localizadas no trato gastrintestinal as modalidades terapêuticas endoscópicas a depender do tamanho e da extensão são:

  • Terapia injetora com adrenalina
  • Terapia térmica com Argônio
  • Ligadura elástica
  • Cianoacrilato
  • Polipectomia
  • Dissecção endoscópica submucosa

A recorrência das lesões é alta. Há possibilidade de tratamento farmacológico complementar com agentes antiangiogênicos ou antiproliferativos (talidomida, octreotide, corticoides, interferon gama).
O prognóstico depende da extensão do envolvimento visceral. Não há relação com transformação maligna.
Apesar da raridade do caso a mensagem a ser passada é que o tratamento endoscópico pode contribuir para a melhora na qualidade de vida com menor necessidade de hemotransfusões, menor custo e tempo de internação de pacientes. Optamos pela terapia com cianoacrilato por ser uma opção segura e eficaz.
 
* Caso clínico relatado com a colaboração da Dra Marina Pamponet Motta.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Dwivedi M, et al. Gastrointestinal endoscopy 2002; 55(7): 943-9461
Zurakowski J, et al. Endoscopy 2008, 40: E120-E121
Ferreira, M. J Port Gastroenterol 2009; 16;115-119
Mavrogenis, G. Endoscopy 2011, 43: E291-292
 




QUIZ! O que é esta alteração esofágica?

Qual a sua hipótese para a imagem acima? Paciente masculino, 48 anos, com queixa de plenitude gástrica de longa data.




Caso Clínico – Pancreatite induzida por corpo estranho

A ingestão de corpos estranhos (CE) é um problema clínico comum. A maioria (80%) dos CE ingeridos passa pelo trato gastrointestinal (TGI) sem intercorrências dentro de uma semana, sendo a perfuração um evento raro, que ocorre em menos de 1% dos pacientes. Os ossos de peixe (espinhas) são os objetos mais comumente ingeridos e a causa mais frequente de perfuração do TGI.

CASO CLÍNICO

O caso a seguir é de uma paciente do sexo feminino, com 63 anos de idade, que procurou a urgência do nosso hospital com queixas de dor em “barra” no andar superior do abdome associada a náuseas há 24h. Os exames laboratoriais evidenciaram: leuco 11.500/mm3, PCR 13,02 mg/dL e lipase 230 U/L. Realizou Tomografia Computadorizada (TC) de abdome para avaliar possível pancreatite, que demonstrou um corpo estranho radiopaco, linear, transfixando o antro gástrico e atingindo a cabeça do pâncreas, ocasionando aumento focal deste.

 
Em virtude dos achados, a paciente foi referenciada à Endoscopia Digestiva para realização de EDA de urgência, que evidenciou espinha de peixe impactada na pequena curvatura da região pré-pilórica antral, medindo cerca de 3cm. Realizada retirada endoscópica com auxílio de pinça de corpo estranho sem intercorrências.

 
Após a confirmação do CE se tratar realmente de espinha de peixe, a paciente foi indagada e confirmou ingestão de peixe há 3 dias, no entanto, sem recordar de qualquer eventualidade durante a alimentação. Evoluiu com resolução completa da dor abdominal e normalização de todos os exames laboratoriais, recebendo alta hospitalar após 72h com boa aceitação alimentar e sem intercorrências.

DISCUSSÃO

CE não metálicos, especialmente espinhas de peixe e outros fragmentos ósseos, representam um problema singular no diagnóstico da perfuração do TGI. As ocasiões onde esses objetos podem ser engolidos são numerosas e subnotificadas. A ingestão de espinhas de peixe é especialmente frequente em culturas (por exemplo, chinesa) onde o peixe inteiro é uma iguaria culinária. Os ossos são ingeridos frequentemente de maneira acidental e esquecidos. As manifestações clínicas decorrentes da perfuração do TGI tem amplo espectro de apresentação e o intervalo tempo entre a ingestão e o início dos sintomas pode ser agudo ou crônico, alcançando meses ou até mesmo anos, o que torna um evento difícil de diagnosticar no pré-operatório.
A perfuração induzida por CE ocorre em todos os segmentos do TGI, embora tende a ocorrer em regiões de angulação acentuada, como as junções ileocecal e retossigmoideana. Outros locais possíveis de perfuração são os sacos herniários, divertículo de Meckel e o apêndice. Quando a perfuração segue um curso mais insidioso pode mimetizar uma série de patologias diferentes, de acordo com o local anatômico, conforme a tabela abaixo:

H.E. Williams et al. / International Journal of Surgery Case Reports 5 (2014) 437–439

 
A radiografia não é confiável para diagnóstico da perfuração por espinha de peixe. Este problema foi ilustrado em estudos de ingestão de ossos de peixes, mostrando que o grau de radiopacidade do osso varia de acordo com as espécies. Em contraste, os ossos de frango são quase sempre radiopacos. Mesmo quando os ossos dos peixes são suficientemente radiopacos para serem visualizados nas radiografias, grandes massas de tecido mole e líquido podem obscurecer o conteúdo mínimo de cálcio do osso, particularmente em pacientes obesos. A TC tem sido útil na detecção de perfuração por CE não-metálicos. A perfuração ocasionada por espinha de peixe tipicamente aparece na TC como uma lesão calcificada linear, cercada por uma área de inflamação. Apesar de sua superioridade sobre a radiografia no diagnóstico da perfuração por espinha de peixe, a TC tem potenciais limitações na detecção de ossos de peixe intra-abdominais.
A pancreatite induzida por corpo estranho é infrequente e, quando ocorre, geralmente é decorrente de inflamação da papila duodenal maior ou de impactação com obstrução do ducto biliar. A pancreatite causada por traumatismo direto de uma espinha de peixe ingerida é evento extremamente raro. A TC é útil para fazer um diagnóstico precoce.
 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
  1. Chiu YH, How CK, Chen JD. Fish Bone-Induced Pancreatitis. Clin Gastroenterol Hepatol. 2010;8(3):e27.
  2. Goh BKP, Tan YM, Lin SE, et al. CT in the preoperative diagnosis of fish bone perforation of the gastrointestinal tract. Am J Roentgenol. 2006;187(3):710–714.
  3. McCanse D, Kurchin A. Gastrointestinal Foreign Bodies. The American Journal of Surgery. 1981;142(September):335–37.
  4. Williams HE, Khokhar A a., Rizvi M, Gould S. Gastric perforation by a foreign body presenting as a pancreatic pseudotumour. Int J Surg Case Rep. 2014;5(7):437–439.
  5. Pereira B, Santos A, Pereira E, Banhudo A. Letters To the Editor. Rev Esp Enferm Dig. 2013;105(7):439–40.

 




QUIZ! – Qual a alternativa correta nesse caso?

TO, feminina, 54 anos, há cerca de 2 anos com episódios de pancreatite aguda recorrente (ao menos 4 episódios), com necessidade de internação e comprovada elevação de enzimas pancreáticas. Paciente foi submetida a colecistectomia há 1 ano, porém voltou a apresentar mais 2 ataques de pancreatite após a cirurgia. Nega tabagismo e etilismo. Foi submetida a colangiopancreatografia por ressonância magnética (imagens abaixo):




Pneumoperitônio após gastrostomia endoscópica – O que você faria neste caso?

 

Paciente de 78 anos com sequela de AVC, internada em unidade de terapia intensiva.  Foi submetida à gastrostomia endoscópica sem intercorrências. No dia seguinte ao procedimento foi obtida a radiografia acima.

A paciente é não comunicante, estava hemodinamicamente normal, com abdome flácido e sem sinais de dor a palpação. A sonda de gastrostomia estava na mesma posição em que havia sido fixada no dia do procedimento (2,5 cm).  Qual seria a sua conduta em relação à este achado?