QUIZ! Coleções Fluídas Peripancreáticas – Qual a alternativa correta?

Caso clínico

Paciente masculino, 49 anos, com histórico de abuso de álcool, fez uma TC do abdômen mostrando um pseudocisto pancreático de 4 cm cabeça do pâncreas (Imagem abaixo). O paciente teve um ataque recente de pancreatite aguda ocorrendo há 6 semanas, e se recuperou com medidas conservadoras. Ele já não consome álcool e atualmente se sente bem. Qual dos seguintes é o passo mais adequado para o tratamento da pancreatite complicada com pseudocisto deste paciente?

Pseudocisto de 4 cm na cabeça do pâncreas.

Pseudocisto de 4 cm na cabeça do pâncreas.

 




Guia Atualizado do Tratamento das Coleções Fluídas Peripancreáticas

Introdução – Terminologia:

De acordo com a Classificação de Atlanta Revisada (1), as coleções fluídas peripancreáticas (CFPs) são agrupadas de acordo com:

  • Tempo: 4 semanas
  • Presença de componentes necróticos/sólidos

 

Classificação Revisada de Atlanta. (1)

Classificação Revisada de Atlanta. (1)

Esta nova classificação é importante pois o tratamento e o manejo variam de acordo com o tipo de coleção.

As CFPs são complicações frequentes da pancreatite aguda ou crônica. Estima-se que 5% a 15% dos episódios de pancreatite são complicados com o desenvolvimento de pseudocistos. Entretanto a maioria das CFPs irão resolver-se espontaneamente.

Indicações de Tratamento:

Considerar o tratamento para coleções crônicas (> 4 semanas) e sintomáticas.

Possíveis sintomas e complicações:

  • Dor abdominal
  • Obstrução gastrointestinal
  • Compressão vascular
  • Obstrução biliar
  • Infecção

A drenagem das coleções deve ser feita após 4 semanas para permitir a maturação e o encapsulamento da lesão, com potencial redução das complicações quando a drenagem for realizada.

Tratamento endoscópico

Recomendado como terapia de primeira linha (Grau A de recomendação). (2)
Ensaio-clínico controlado e randomizado comparando o tratamento endoscópico vs cirúrgico demonstrou:

  • Sucesso técnico e taxa de complicações semelhantes;
  • A terapia endoscópica foi associada com menor tempo de internação, menor custo e melhor qualidade de vida.

 

Estudo retrospectivo comparando a drenagem endoscópica vs percutânea favoreceu a endoscopia, pois esta última esteve associada com (3):

  • Maior taxa de sucesso no tratamento;
  • Menores taxas de re-intervenção;
  • Menor tempo de internação.

 

Tipos de drenagem endoscópica:

  1. Drenagem transpapilar
  2. Drenagem transmural, que se divide em: convencional e ecoguiada.

 

Drenagem Transpapilar:

Realizada através da CPRE com colocação de prótese plástica transpapilar idealmente até o interior da coleção.

Reservada para pequenas coleções (até 6 cm), localizadas na cabeça ou corpo proximal do pâncreas, e que se comunicam com o ducto pancreático principal. (2)

Prótese plástica para drenagem de pseudocisto na cabeça do pâncreas.

Prótese plástica para drenagem de pseudocisto na cabeça do pâncreas.


Prótese plástica transpapilar.

Prótese plástica transpapilar.

Drenagem Transmural Convencional:

Requer visualização endoscópica do abaulamento causado pela CFP no trato gastrointestinal. Entretanto esta apresentação com abaulamento é descrita em cerca de 42% a 48% dos casos, o que limita a eficácia e a segurança desta técnica em quase metade dos pacientes. (4)

Abaulamento do estômago pela coleção pancreática.

Abaulamento do estômago pela coleção pancreática.


Drenagem convencional com múltiplas próteses.

Drenagem convencional com múltiplas próteses.

Drenagem Transmural Ecoguiada:

Devido ao uso da ecoendoscopia, esta técnica apresenta a capacidade de identificar e evitar estruturas vasculares entre a coleção e o lúmen gástrico/enteral. Sendo fortemente indicada para os pacientes com coleções que não produzam abaulamento e nos pacientes com hipertensão portal.
Apresenta taxa de sucesso de 94%, com taxa de complicação de 5% na drenagem de pseudocistos. (4)
Atualmente, é a técnica estabelecida como a terapia de primeira linha na drenagem de pseudocistos e de necroses pancreáticas delimitadas (NPD), do inglês walled-off necrosis.

É tradicionalmente realizada com a colocação de pelo menos 2 próteses plásticas (menor chance de oclusão comparado com apenas 1 prótese) com formato em duplo pigtail (menor chance de migração comparado com as próteses retas).
As próteses não devem ser retiradas antes da resolução do cisto (determinada pela revolução clínica e radiológica), e também não antes de pelo menos 2 meses (Grau B de recomendação). (2)

Abaixo vídeo demonstrando a técnica (gentilmente cedido por Dr Madhu Sanaka):

Mais recentemente próteses metálicas auto-expansíveis cobertas (PMAEc) passaram a ser utilizadas para durante a drenagem ecoguiada. As vantagens da utilização da PMAEc são:

  • Necessidade de apenas um único stent, portanto, simplificando e encurtando o procedimento;
  • O maior diâmetro da prótese, possibilitando uma drenagem mais rápida, com menor risco de oclusão;
  • E o potencial para entrar na colecção repetidamente com um gastroscópio para a realização de necrosectomia.

Recentes publicações demonstraram melhores resultados para a drenagem de pseudocistos e NPDs com o uso de PMAEc, quando comparadas com próteses plásticas, com benefícios em relação (6-8):

  • Tempo de procedimento mais curto;
  • Maior taxa de resolução;
  • Menor taxa de complicações.

 

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Prótese metálica coberta de 18 mm de diâmetro para drenagem de coleção pancreática.

No entanto, uma importante preocupação com o uso de PMAEc é o risco de migração, levando alguns endoscopistas a colocarem uma prótese plástica de duplo pigtail por dentro da prótese metálica para sua ancoragem.

Para diminuir o risco de migração das PMAEc, novas próteses metálicas foram concebidas com bordas que possibilitam a aposição de lumens (figuras abaixo). As vantagens desses próteses são:

  • Possuem largas falanges de ancoragem e evitam a necessidade de colocar uma prótese plástica de ancoragem;
  • Apresentam largo diâmetro interno (10 ou 15 mm), que possibilita a realização da necrosectomia endoscópica através da prótese;
  • Presença de cautério na ponta de sua agulha de punção que possibilita a liberação da prótese sem a necessidade de uso de outros materiais.

 

Cautério na ponta da agulha - Hot Axios®.

Cautério na ponta da agulha – Hot Axios®.


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Prótese metálica para aposição de lumens.

Na literatura existe apenas um recente estudo retrospectivo comparando as PMAEc com as próteses metálicas para aposição de lumens (PMAL), realizado por Siddiqui et al (9). Esta publicação, com pacientes submetidos à drenagem endoscópica da NPDs, demonstrou:

  • Não houve diferença quanto às taxas de sucesso técnico e clínico, e sucesso a longo prazo (necessidade de intervenção após 6 meses da remoção da prótese);
  • Menor número necessário de procedimentos com o uso PMAL;
  • Entretanto, houve uma maior taxa de complicações precoces com o uso das PMAL.

Os autores justificaram que as complicações precoces, com ocorrência principalmente de perfurações, foram resultados da falha na liberação da prótese pelo operador, e não devido ao design da prótese. Essas complicações ocorreram principalmente no início do estudo e estiveram associadas com a curva de aprendizado do endoscopista. Com relação às complicações tardias, houve menor taxa de migração com as PMAL, como esperado pelo autores.

Abaixo vídeo demonstrando o uso da PMAL (gentilmente cedido por Dr Prabhleen Chahal):

Drenagem da necrose pancreática delimitada (NPD):

  • Dar preferência para o uso de próteses metálicas, pela necessidade da realização de necrosectomia;
  • Considerar a associação de dreno nasocístico, uma vez que publicação demonstrou que pode produzir menor taxa de oclusão das próteses e maior taxa de resolução. (10)
  • Considerar a técnica de múltiplos acessos transmurais, que pode estar associada com maior taxa de sucesso clínico. (11)
Link para caso de drenagem de CPF com necrosectomia: aqui!

Qual a necessidade da CPRE na drenagem das CFP?

Estudo retrospectivo multicêntrico (12), com 375 pacientes (54% com NPD) submetidos a drenagem endoscópica, comparou a drenagem transmural ecoguida isolada versus drenagem combinada (transmural ecoguiada + transpapilar por CPRE), e observou que não houve diferença na taxa de sucesso clínico entre ambas a terapias.
Assim, a CPRE tem sido reservada para casos selecionados, por exemplo para pacientes com suspeita de fístula pancreática ou coleções recorrentes. A CPRE em associação com a drenagem transmural tem por objetivo a colocação de uma prótese “em ponte”  para oclusão do rompimento no ducto pancreático.

Referências:
  1. Banks PA, et al. Gut 2013, 62:102
  2. Dumonceau J-M, et al. Endoscopy 2012, 44: 784
  3. Keane MG, et al. Surg Endosc 2016.
  4. Antillon MR, et al. Gastrointest Endosc 2006; 63: 797
  5. Sadik R, et al. Word J Gastroenterol 2012; 17: 499
  6. Sharaiha RZ, et al. Gastrointest Endosc. 2015;1
  7. Mukai S, et al. Endoscopy 2015;47
  8. Lee BU, et al. Endoscopy. 2014;1078.
  9. Siddiqui AA, et al. Gastrointest Endosc. 2016;
  10. Siddiqui AA, et al. Gastrointest Endosc 2013.
  11. Varadalajulu S, et al. Gastrointest Endosc 2011.
  12. Yang D, et al. Gastrointest Endosc. 2016;83(4):720



Risco de Câncer pós-CPRE

Introduzida em 1974, a colangiografia pancreática endoscópica retrógrada (CPRE) com papilotomia (ES) tornou-se o procedimento de escolha no tratamento de cálculos na via biliar comum.

Vários estudos então, tem alertado para os possíveis efeitos a longo prazo da papilotomia endoscópica. A destruição do esfíncter de Oddi levaria a colonização bacteriana da via biliar principal, resultando em colangite e formação de novos cálculos. Tal crescimento bacteriano poderia levar a inflamação crônica , com aumento de incidência de colangiocarcinoma.

Com o intuito de avaliar a risco de colangiocarcinoma e outros tumores pós CPRE por doença benigna, os autores promoveram um estudo retrospectivo. O objetivo primário foi a avaliação do risco de câncer em uma grande coorte de pacientes com longo período de follow-up. O objetivo secundário foi estudar a relação entre a exposição grave da via biliar a cálculos e relação com câncer.

Materiais e métodos:  

Foram avaliados pacientes submetidos a CPRE por doenças benignas, na Finlândia e na Suécia, de 1976 a 2010. Os pacientes foram divididos em 2 grupos:

  • CPRE apenas.
  • CPRE com papilotomia.

 

Pacientes com tumor de vias biliares diagnosticado até dois anos após a CPRE foram retirados do estudo.

Os dados de diagnóstico de neoplasias (ductos biliares, pâncreas, fígado) foram obtidos junto aos Cancer Centers nacionais, tanto para a população normal, quanto a estudada.

Resultados:

Foram incluídos no estudo, 69.925 pacientes (16.575 da Finlândia e o restante da Suécia), sendo 40.193 no grupo que foi submetido a papilotomia.

Os dados de comparação entre os dois grupos e o resultados de incidência de cânceres nos dois grupos podem ser avaliados nas tabelas que se seguem (clique nas imagens para melhor visualização).

tabela1

tabela2

O risco de neoplasia, baseado no tempo de acompanhamento pós CPRE pode ser avaliado abaixo (clique nas imagens para melhor visualização).

tabela4

tabela5

O estudo  incluiu dados de dois países, e cobre quase todos os procedimentos realizados, comparando com dados fidedignos do restante da população.

Assim, os autores provaram um risco aumentado de 4 vezes para tumores de vias biliares, e de 2 vezes para tumores de vias biliares, pâncreas e fígado conjuntamente, em pacientes que realizaram a papilotomia. Este risco diminui com o tempo após o procedimento

Os autores inferem que a papilotomia não seria fator de risco para os tumores, já que um aumento com o passar dos anos de acompanhamento seria o esperado. Também discutem que o provável fator de risco observado no estudo se deva a exposição das vias biliares a cálculos. Inclusive tendo sido observado neste estudo, que em pacientes onde a colecistectomia foi realizada antes da CPRE, o risco de câncer foi menor.

Concluem então que há risco maior de neoplasia após CPRE, mas este risco não é devido a papilotomia ou outro procedimento inerente, mas sim à exposição a agentes carcinogênicos anteriores à CPRE, muito provavelmente a litíase biliar.

 

Artigo original (Open):

Strömberg C, Böckelman C, Song H, Ye W, Pukkala E, Haglund C, Nilsson M.Endoscopic sphincterotomy and risk of cholangiocarcinoma: a population-based cohort study in Finland and Sweden. Endosc Int Open. 2016 Oct;4(10):E1096-E1100.

Confira também: CPRE em pacientes com gastrectomia a Billroth II




CPRE transgástrica para tratamento de coledocolitíase pós-cirurgia bariátrica

 

Cerca de 1/3 dos pacientes submetidos a cirurgia de bypass desenvolvem colelitíase no pós-operatório. Embora não seja comum, alguns pacientes podem apresentar coledocolitíase. Devido à anatomia alterada, o tratamento endoscópico da coledocolitíase representa um desafio.

Neste vídeo, apresentamos uma possibilidade de tratamento da coledocolitíase pela abordagem combinada da laparoscopia e colangiografia endoscópica.

Importante ressaltar o uso do insuflador de CO2 para minimizar a distensão das alças e facilitar o término do procedimento pela laparoscopia (sutura do gastrostomia, revisão do leito e sutura da aponeurose).

 

 

Segue um artigo interessante para quem quiser se aprofundar no tema:

Snauwaert C, Laukens P, Dillemans B, et al. Laparoscopy-assisted transgastric endoscopic retrograde cholangiopancreatography in bariatric Roux-en-Y gastric bypass patients. Endosc Int Open. 2015;3(5):E458-63. 




ARTIGO COMENTADO – Utilidade da fistulotomia com needle-knife como método inicial na canulação biliar para prevenção de pancreatite pós CPRE

A CPRE é um procedimento amplamente utilizado no diagnóstico e tratamento de doenças do trato biliar e pancreáticas. Pancreatite pós CPRE (PEP) é o evento adverso mais comum após o procedimento, variando de 2-10% em casos não selecionados e podendo elevar substancialmente a morbidade, mortalidade e custos médicos associados. Entre os fatores de risco associados a PEP cita-se: pacientes jovens (<60 anos), sexo feminino, com ducto biliar comum (CBD) de calibre normal (<9 mm), disfunção de esfíncter de Oddi (SOD), ou uma história prévia de pancreatite. Diante da associação de fatores de risco as taxas de PEP podem alcançar até 67%.

A fistulotomia suprapapilar com needle-knife (NKF) tem sido usada como uma técnica alternativa a falha de canulação convencional via óstio papilar em casos difíceis, e pode ser recomendada como um artifício em casos de canulação pancreática repetida não intencional. O uso dessa técnica está associada a uma redução potencial do risco de PEP, enquanto a canulação biliar difícil aumenta o risco.

Objetivo:

Em artigo publicado na edição de novembro de 2016 da Gastrointestinal Endoscopy, Young-Joo Jin e colaboradores apresentaram um estudo prospectivo preliminar que objetivou avaliar a viabilidade do NKF como procedimento inicial no acesso biliar em pacientes com cálculos biliares e que possuíam risco aumentado de PEP. Foram avaliadas: taxa de incidência de pancreatite pós CPRE após NKF e taxas de sucesso da canulação biliar e remoção de cálculos após NKF.

Metodologia:

Prospectivamente, entre Julho de 2013 e Maio de 2015, foram selecionados 55 pacientes que se submeteram a CPRE com NKF por cálculos biliares em um centro de referência na Coréia do Sul. Todos os casos possuíam um ou mais do seguintes fatores de risco para PEP: pacientes jovens (<60 anos), sexo feminino ou CBD de calibre normal (<9 mm).

Resultados:
  • Risco para PEP:
    • 1 fator: 17 pacientes
    • 2 fatores: 27 pacientes
    • 3 fatores: 11 pacientes
  • Tempo médio de procedimento para NKF: 2.1 minutos (0.2–8.7 min)
  • Tempo médio de remoção de calculo biliar: 6.5 minutos (1.1–28.3 min)
  • Taxas de sucesso na canulação biliar usando NKF: 96.3% (53/55)
  • Taxas de sucesso na remoção de cálculo biliar: 92.7% (51/55)
  • Complicações:
    • Não houve caso de PEP
    • Dor: 4 pacientes (7,3%)
    • Febre: 9 pacientes (16,4%)
    • Sangramento: 2 pacientes (3,6%)
    • Perfuração duodenal retroperitoneal: 1 paciente (1.8%) que foi manejado conservadoramente

Conclui-se portanto, que NKF pode ser uma técnica viável como procedimento inicial no acesso biliar em pacientes com cálculos biliares que possuem risco elevado de pancreatite pós CPRE se o procedimento é realizado por um endoscopista biliar experiente.

Comentários:

A pancreatite é um evento comum e muito temido após CPRE. Muito tem sido discutido sobre estratégias de prevenção de PEP nos últimos anos e algumas condutas tem sido implementadas de forma regular em centros de referência como uso de AINE e de próteses pancreáticas¹.

A fistulotomia suprapapilar é uma estratégia previamente conhecida e discutida como alternativa técnica ao acesso biliar, potencialmente reduzindo o risco de pancreatite quando implementada de forma precoce².

O estudo apresentado traz novos dados a literatura atualmente existente por abordar de forma prospectiva e chamar a atenção para a potencial prevenção de pancreatite pós CPRE com uso de fistulotomia suprapapilar em pacientes de risco. Contudo, o estudo possui limitações a serem consideradas como: ter sido realizado de forma não randomizada, em centro único, com somente um endoscopista realizando os procedimentos. Novos estudos com desenho multicêntrico, prospectivos e randomizados seriam recomendáveis.

Referência e link para o artigo:

Jin YJ, Jeong S, Lee DH. Utility of needle-knife fistulotomy as an initial method of biliary cannulation to prevent post-ERCP pancreatitis in a highly selected at-risk group: a single-arm prospective feasibility study. Gastrointest Endosc. 2016 Nov;84(5):808-813.

Outras referências:
  1. Dumonceau, J.M., Andriulli, A., Elmunzer, B.J. et al. Prophylaxis of post-ERCP pancreatitis: European Society of Gastrointestinal Endoscopy (ESGE) Guideline – updated June 2014. Endoscopy. 2014; 46: 799–815
  2. Mariani A, Di Leo M, Giardullo N, et al. Early precut sphincterotomy for difficult biliary access to reduce post-ERCP pancreatitis: a randomized trial. Endoscopy. 2016;48:530–535.



Escovado citológico na estenose biliar indeterminada

escovado-citologico

Escovado citológico. Imagem criada e gentilmente cedida pelo Dr. Gustavo Rodela.

Frente ao achado de estenoses biliares, o diagnóstico correto se impõe.

História clínica, exame físico e subsidiários são fundamentais, visando sempre diferenciar as estenoses benignas (pós-cirúrgica, colangite esclerosante, radiação e outras) das malignas (neoplasias). Estas são sempre desafiadoras em seu diagnóstico e conduta terapêutica.

O diagnóstico começa com medidas não invasivas, como marcadores tumorais séricos, ultrassom, colangiorresonância magnética, PET-scan e tomografia computadorizada.

Como métodos minimamente invasivos, temos os métodos endoscópicos como a colangiopancreatografia endoscópica retrógrada (CPRE), ecoendoscopia (USE), colangioscopia, endomicroscopia confocal, tomografia por coerência óptica e ultrassom intraductal. Destes, apenas a CPRE, a colangioscopia e o USE apresentam a possibilidade de coletar amostras para estudo anatomopatológico.

Histórico e resultados

Em 1975, Osnes et al. foram os primeiros a reportarem o uso do escovado biliar. Em uma pequena série de 17 pacientes, o diagnóstico citológico maligno foi feito em oito pacientes e o diagnóstico suspeito para malignidade em dois pacientes. Dos oito pacientes, sete diagnósticos foram confirmados pela cirurgia e um pela autópsia.  Não foi reportada nenhuma complicação.

Nos últimos 20 anos a aspiração da bile e o escovado citológico têm sido os instrumentos diagnósticos mais comuns, sendo o escovado citológico o mais utilizado pela sua superioridade (maior sensibilidade) frente ao aspirado de bile, já comprovado em diversos estudos.

Na literatura, os resultados do escovado citológico nas estenoses biliares malignas são muito heterogêneos, com taxas de sensibilidade variando entre 26% e 80%, entretanto, especificamente para o colangiocarcinoma, os resultados são melhores, com a sensibilidade variando entre 63% e 80%.

Recente metanálise publicada por Navaneethan, et al em 2015, utilizando nove estudos, demonstrou taxa de sensibilidade média de 45% e especificidade média de 99%.

A diferença de sensibilidade é explicada por diversas razões, incluindo:
  • Material inadequado: escovar o local inadequado devido ou ao tamanho ou a localização da lesão, fibrose extensa, epitélio benigno recobrindo a lesão, erros técnicos;
  • Erros de interpretação do patologista: mudanças sutis em lesões bem diferenciadas , falta de familiaridade com os critérios de diagnóstico de lesão neoplásica , má preservação celular e subestimar a importância do fundo do esfregaço.

 

Assim, para aumentar a taxa diagnóstica:
  • A fixação do material na lâmina é um dos passos fundamentais no preparo da amostra para o patologista (ver figura).
  • A amostra deve ser enviada para patologistas de referência: Wight, et al. demonstraram aumento da sensibilidade de 49,4 % para 89,0% quando as amostras eram avaliadas por patologistas mais experientes.
  • Realizar dois escovados consecutivos. Esta técnica pode, segundo alguns autores, aumentar as taxas de diagnósticos.
  • Utilização de materiais adequados para realização do procedimento. No mercado existem diversos tipo de escovas citológica, sugerimos sempre o uso de escovas guiadas, pela facilidade técnica que essas proporcionam.

 

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Em nosso serviço (HCFMUSP) após padronização da utilização de dois escovados consecutivos (1 lâmina fixada ao ar, 2 lâminas fixadas ao álcool 70% e 1 frasco com a ponta da escova no formol para emblocado), conseguimos um aumento importante em nossa taxa diagnóstica. Em protocolo de pesquisa ainda em andamento, apresentamos taxas de sensibilidade (67%), especificidade (100%), valor preditivo positivo (100%), valor preditivo negativo (13%) e acurácia (69%).

 

Como realizamos o escovado citológico:
  1. Cateterização da via biliar e infusão do contraste para avaliação da estenose
  2. Papilotomia endoscópica
  3. Manter o fio guia na via biliar
  4. Introdução da escovada citológica (guiada pelo fio-guia)
  5. No local da estenose, expor a escova citológica e realizar 20 movimentos de progressão em retração da escova (movimentos de “vai e vem”)
  6. Retrair a escova citológica e retirar o cateter com a escova citológica
  7. Expor a escova e preparar a lâminas
  8. Fixar o material nas lâminas (2 lâminas fixadas ao álcool e 1 fixada ao ar)
  9. Cortar (com tesoura forte ou alicate) a ponta da escova e colocar num frasco de formol para emblocado. Também realizamos um flush com SF 3 ml para aproveitar o material que restou no cateter para o emblocado junto a ponta da escova.
  10. Enviar material ao patologista experiente

A literatura, assim como nossa experiência, demonstra altas taxas de especificidade e valor preditivo positivo, assumindo que um teste com resultado positivo é confiável.

As complicações do procedimento são raras; mas deve-se evitar a manipulação da via biliar em casos de colangite.

Portanto é fundamental a realização do escovado citológico nas estenoses biliares indeterminadas, por ser um método simples, rápido e seguro, podendo confirmar um possível doença maligna, facilitando e adiantando a decisão da terapêutica empregada.

E atualmente :

Devido a baixa sensibilidade do escovado, há décadas, os grandes centros tentam realizar a medição do teor de DNA de potenciais genes oncogenicos para tentar aumentar a sensibilidade no diagnóstico de colangiocarcinoma em amostras de escovado citológico. A partir disso, surgiram os ensaios utilizando hibridização fluorescente in situ (FISH), que já está disponível no mercado. A FISH apesar do seu alto custo, tem demonstrado aumento da sensibilidade em alguns estudos.

Curiosidade:

Alguns serviços americanos com maiores recursos financeiros utilizam duas escovas citológicas por procedimento.

Veja o vídeo de como realizar o escovado citológico
https://endoscopiaterapeutica.net/pt/video/escovado-citologico-de-via-biliar/
Referências:

Navaneethan U, Njei B, Lourdusamy V, Konjeti R, et al. Comparative effectiveness of biliary brush cytology and intraductal biopsy for detection of malignant biliary strictures: a systematic review and meta-analysis. Gastrointest Endosc. 2015 Jan;81(1):168-76.

Pugliese V, Conio M, Nicolo G, Saccomanno S, Gatteschi B. Endoscopic retrograde forceps biopsy and brush cytology of biliary strictures: a prospective study. Gastrointest Endosc. 1995;42:520–6.

DeWitt J, Misra VL, Leblanc JK, McHenry L, et al. EUS-guided FNA of proximal biliary strictures after negative ERCP brush cytology results. Gastrointest Endosc. 2006;64(3):325-33.

Rösch T, Hofrichter K, Frimberger E, Meining A, et al. ERCP or EUS for tissue diagnosis of biliary strictures? A prospective comparative study. Gastrointest Endosc. 2004;60(3):390-6.

Osnes M, Serck-Hanssen A, Myren J. Endoscopic retrograde brush cytology (ERBC)of the biliary and pancreatic ducts. Scand J Gastroenterol. 1975;10(8):829-31.

Selvaggi SM. Biliary brushing cytology. Cytopathology. 2004 Apr;15(2):74-9. Review.

Singhi AD, Slivka A. Evaluation of indeterminate biliary strictures: Is it time to FISH or cut bait? Gastrointest Endosc. 2016 Jun;83(6):1236-8.

 




Esfincterotomia precoce através de pré-corte não aumenta o risco de pancreatite pós CPRE em pacientes com acesso biliar difícil

Esse artigo foi publicado em março de 2016 no The Journal of the American Medical Association.

O uso da esfincterotomia através do pré-corte durante colangiopancreatografia retrógrada endoscópica (CPRE) pode aumentar as chances de sucesso na cateterização da via biliar, porém está associada a um risco aumentado de pancreatite pós-CPRE. A realização do pré-corte mais precocemente para casos com acesso biliar difícil pode reduzir este risco. Foi realizada uma meta-análise de ensaios clínicos randomizados para determinar como o uso pré-corte influencia o risco de pancreatite e a taxa de sucesso de canulação da via biliar em comparação com persistentes tentativas de canulação padrão.

Métodos: Foram pesquisados MEDLINE, EMBASE, e a biblioteca Cochrane de ensaios clínicos, juntamente com resumos de reuniões, até agosto de 2014 para ensaios clínicos randomizados em que a esfincterotomia precoce por pré-corte foi comparada com canulação padrão persistente em adultos com acesso biliar difícil. Os eventos pesquisados foram:

  • Taxa de sucesso de canulação primária (ou seja, não foram necessárias outras técnicas de acesso a via biliar)
  • Taxa global de canulação
  • Incidência de pancreatite pós-CPRE pancreatite
  • Taxa de eventos adversos em geral

Os resultados de um modelo de efeitos aleatórios foram expressos como razões de risco agrupados (RR) com intervalo de confiança de 95% (IC).

Resultados: Foram analisados dados a partir de 5 estudos (523 participantes). A incidência de pós-CPRE pancreatite e sucesso de canulação geral não diferiram significativamente entre o pré-corte precoce e em grupos onde foi tentada a canulação persistente. O uso precoce do pré-corte foi associado à maior chance de sucesso da canulação (RR, 1,32; IC 95%, 1,04-1,68). Na análise de um subgrupo de estudos que envolveram somente endoscopistas (não residentes), encontramos uma redução significativa no risco de pancreatite em pacientes que tiveram sua via biliar acessada através de pré-cortes precoces vs o acesso pela técnica padrão (RR, 0,29; IC 95%, 0,10-0,86).

Conclusão: Em comparação com a terapia padrão, o uso precoce da esfincterotomia pelo pré-corte não aumentou o risco de pancreatite pós-CPRE nessa meta-análise. Quando o procedimento é realizado por endoscopistas experientes e qualificados, o pré-corte precoce pode reduzir o risco de pancreatite pós-CPRE. As taxas de cateterização aumentaram quando o pré-corte precoce foi adotado. Mais estudos são necessários para confirmar estes resultados.

Comentário: 

Pontos fortes desse estudo:

  • Incluiu apenas trabalhos controlados e randomizados
  • Todos os trabalhos incluídos foram bem conduzidos
  • Grupo estudado bem pré-definido (pacientes com acesso difícil da via biliar)
  • O grupo estudado teoricamente está mais susceptível a ser necessário  a adoção do pré-corte

Pontos fracos desse estudo:

  • Pequeno número de trabalhos incluídos e a heterogenicidade entre os desenhos do estudo
  • A definição de canulação difícil variou entre os estudos
  • A técnica de pré-corte variou entre os estudos (foi incluído também pacientes que foram submetidos à fistulopapilotomia, técnica que já demonstrou em diversos estudos diminuir a taxa de pancreatite pós-CPRE).
  • Os pacientes incluídos nesses trabalhos não foram submetidos a nenhuma profilaxia para pancreatite (AINESs e/ou prótese pancreática), o que pode ter tido impacto na taxa de pancreatite pós-CPRE.

O presente estudo mostra que embora não haja nenhuma diferença na taxa global de acesso em pacientes com via biliar de acesso difícil, a adoção precoce da esfincterotomia pelo pré-corte parece aumentar as taxas de canulação em comparação com a técnica padrão (diversas tentativas). O uso precoce do pré-corte não aumentou o risco de pancreatite pós-CPRE e em mãos experientes pode realmente reduzir esse risco. Novos estudos que usam critérios de consenso para definir o acesso biliar difícil são necessários para confirmar a segurança dos pré-corte e determinar o momento ideal para adotá-lo.

Acesse o link desse artigo : aqui  

Confira também: CPRE em pacientes com gastrectomia a Billroth II




Prótese biliar metálica retida – Qual a melhor conduta para este caso?

Paciente de 88 anos, feminina, com antecedente de insuficiência cardíaca, trombose venosa profunda em uso de anticoagulação oral, colecistectomia há 40 anos, e CPRE há 3 meses por icterícia obstrutiva.

Durante a CPRE foi observado uma estenose em colédoco distal, cuja biópsia e escovado descartaram malignidade. Neste procedimento foi optado pela passagem de prótese metálica auto-expansível totalmente coberta de 10 mm por 4 cm. Na segunda CPRE após 3 meses, houve foi falha na retirada da prótese metálica devido a migração proximal e crescimento tecidual ao redor da borda distal (overgrowth). Imagens abaixo:

Prótese metálica com migração proximal.

Prótese metálica com migração proximal.

Fluoroscopia: Dilatação da via biliar extra-hepática; tentativa de remoção da prótese com balão sem sucesso.

Fluoroscopia: Dilatação da via biliar extra-hepática; tentativa de remoção da prótese com balão sem sucesso.

Falha na remoção da prótese com pinça de corpo estranho devido a crescimento tecidual ao redor da prótese.

Falha na remoção da prótese com pinça de corpo estranho devido a crescimento tecidual ao redor da prótese.

 

 

 




Complicações da pancreatite crônica cursando com dor abdominal – manejo endoscópico

Relatamos o caso de uma paciente feminina de 56 anos, com história de alcoolismo e tabagismo de longa data, cursando com dor abdominal por 12 meses, até ser internada na enfermaria de Gastroenterologia do Hospital São Paulo, UNIFESP, com piora importante da dor, emagrecimento e aumento do volume abdominal.

Ao exame na admissão hospitalar apresentava-se emagrecida com IMC=19Kg/m2, descorada, anictérica e com ascite moderada, sem sinais de insuficiência hepática. Hemoglobina 11 g/dL, albumina 2,8 g/dL, bilirrubina total 0,39 mg/dL, FA 233 U/L, GGT 114 U/L, amilase 463 U/L, PCR 48 mg/dL e AP/RNI 84%/1,14.  Líquido ascítico com total de 350 células, amilase de 1884 e albumina de 1,6.  RNM apresentou pâncreas com dimensões reduzidas, cisto de parede espessada (3,5 x 3,8 cm) na porção cefálica, dilatação de ducto pancreático principal (DPP), trombose parcial da veia porta e ascite. (Figura 1)

Figura1

Figura 1: Colangiorressonância.

Feito hipótese de pancreatite crônica complicada com ascite pancreática (provável fístula do DPP) e pseudocisto de cabeça de pâncreas.

Primeira PCRE: dilatação e tortuosidade do DPP com extravasamento de contraste (ponto da fístula) na cauda, além de pseudocisto na cabeça pancreática. Foi colocado uma prótese pancreática plástica de 7 Fr x 10 cm. (Figuras 2, 3 e 4).

Figura 2

Figura 3

Figura 4

Figura 4

Não apresentou melhora da dor, nem da ascite, e passou a apresentar febre com quadro de sepse. Hipótese: complicação da drenagem transpapilar (prótese ocluída e contaminação da cavidade peritoneal pelo extravasamento de contraste), apesar de antibioticoterapia profilática.

Segunda PCRE: persistia com pseudocisto de cabeça de pâncreas e extravasamento de contraste na cauda. Notado ainda possível estenose do DPP na transição cabeça/corpo. Feito esfincterotomia pancreática, dilatação da estenose pancreática com balão de via biliar de 10 mm e colocação de prótese biliar 10 Fr x 10 cm. (Figuras 5, 6 e 7). Ampliado espectro de antibióticos.

Figura 5

Figura 5

Figura 6

Figura 6

Figura 7

Figura 7

Apresentou melhora clínica da dor, ascite e quadro da sepse. Recebeu alta hospitalar e seguiu no ambulatório de pâncreas, recebendo pancreatina via oral. Evoluiu sem dor, com ganho de peso e regressão da ascite. TC de abdomen confirmou 3 meses após ausência de ascite e do pseudocisto. Retornou para nova PCRE.

Terceira PCRE (3 meses depois da segunda PCRE): retirada a prótese pancreática. DPP dilatado, tortuoso, sem sinais de extravasamento de contraste (sem fistula e sem pseudocisto). Colédoco distal com estenose regular e dilatacão da via biliar a montante. Realizado troca da prótese pancreática por uma de 10 Fr x 12 cm (biliar). Esfincterotomia biliar, dilatação da estenose biliar com balão de 10 mm e colocação de prótese biliar auto-expansível totalmente recoberta de 10 mm x 6 cm. (Figuras 8, 9, 10, 11, 12 e 13).

Figura 8

Figura 8

Figura 9

Figura 9

Figura 10

Figura 10

Figura 11

Figura 11

Figura 12

Figura 12

Figura 13

Figura 13

No seguimento evoluiu sem dor abdominal, com ganho de peso, em uso de pancreatina, em abstinência do álcool.

Retornou para a quarta PCRE (3 meses após) quando foi trocado a prótese do pâncreas por outra biliar de 10 Fr, sendo mantida a prótese biliar auto-expansível.

Por fim, retornou para quinta PCRE quando foram retiradas as duas próteses, a biliar auto-expansível (permaneceu 6 meses) e a prótese do pâncreas (pelo menos 10 meses de permanência).

Desde então, é acompanhada clinicamente no ambulatório de pâncreas, assintomática, em uso de pancreatina, há cerca de 3 anos.

O objetivo deste relato foi demonstrar um complexo caso de pancreatite crônica com várias complicações, tratado com múltiplos e diferentes procedimentos disponíveis na terapia endoscópica para pancreatite crônica, além do tratamento clinico de suporte.

Excelente revisão da literatura sobre o assunto pode ser vista em artigo publicado na Endoscopy (link): “Endoscopic treatment of chronic pancreatitis: European Society of Gastrointestinal Endoscopy (ESGE) Clinical Guideline”. Endoscopy 2012; 44(8):784-800.

Para saber mais sobre este tema, acesse o site Gastropedia clicando aqui!




Tratamento endoscópico dos cálculos biliares difíceis

O tratamento da coledocolitíase evoluiu muitos nas ultimas 4 décadas graças ao avanço das técnicas endoscópicas. Hoje sabemos que entre 85 e 90 % dos casos de coledocolitíase são bem resolvidos pelas técnicas  habituais da Colangiopancreatografia Retrógrada Endoscópica (CPRE) : papiloesfincterotomia e extração com basket ou balão.
Alguns fatores de risco devem ser considerados como preditores de dificuldades na extração destes cálculos, sendo eles:

  •         Idade > 65 anos
  •         Cálculo > 15 mm de diâmetro
  •         Cálculo em posição peri-ampular ( <36 mm da papila)
  •         Múltiplos cálculos (>10)
  •         Cálculos em forma de barril ou muito longos
  •         Cálculos intra-hepáticos
  •         Vias viliares muito dilatadas
  •         Angulação das vias biliares < 135°
  •         Estenose biliar distal

As opções técnicas nestes casos são muitas, dependendo do arsenal de acessórios, bem como da experiência e preferência do endoscopista.
coledocolitiase multiplos calculos

Clique na imagem para ampliar. A)Paciente com múltiplos cálculos. B)Remoção iniciada pelos cálculos distais para evitar impactação. C) Remoção dos cálculos proximais. D) Colangiografia controle confirmando ausência de cálculos residuais.

Stents Biliares

Muito utilizados quando ocorre falha na retirada completa dos cálculos. O uso de stents, tanto plásticos como metálicos, são grandes aliados nestas situações. Para os stents plásticos, os modelos em pigtail apresentam menor risco de migração. Apesar do maior custo em nosso meio, os stents metálicos totalmente recobertos também podem ser usados e alguns estudos mostram melhores resultados, com menores complicações a longo prazo, provavelmente devido a maior força radial e por promoverem maior dilatação papilar.

Vantagens:

  •           Permite ampla drenagem biliar até a solução definitiva
  •           Sucesso de implantação em quase 100% dos casos
  •           Promove redução progressiva do tamanho dos cálculos
  •           Passagem espontânea dos cálculos em alguns casos
  •           Aumenta a taxa de extração em até 92 % na segunda tentativa

Desvantagens:

  •           Risco de oclusão e  colangite em até 40% dos casos
  •           Risco de migração
  •           Troca necessária a cada 3 meses

coledocolitiase colangite protese

Clique na imagem para ampliar. Paciente de 78 anos, múltiplas comorbidades e com quadro de sepse e colangite. A) Colangiografia mostrando múltiplos cálculos de colédoco e estenose na via biliar distal. B) Detalhe da redução de calibre no colédoco distal. C) Tentativa de remoção dos cálculos com papilotomia e balão extrator sem sucesso. D) Devido às condições clínicas ruins da paciente foi optado por passar uma prótese plástica e tratar a colangite com reabordagem endoscópica a ser programada após compensação clínica da paciente.

Dilatação Papilar com Balão de Grande Calibre

O uso de balões de grande calibre ( 12 a 20 mm) tem se mostrado efetivo em várias publicações. Esta técnica é indicada para a abordagem de cálculos maiores do que 13 ou 14 mm, diminuindo nestes casos a necessidade de litotripsia mecânica, bem como em casos de Síndrome de Mirizzi e impactação de basket. Outras  indicações incluem anatomia alterada, como gastrectomia B II,  by-pass gástrico e divertículo peri-ampular, sem aumento do risco de complicações. O uso do balão hidrostático, associado ao balão extrator ou basket, se torna mais econômico em nosso meio quando comparado ao uso das diversas opções de litotripsia.
Detalhes técnicos:

  • Realizar papilotomia entre 1/3 e ½ da distância até a primeira prega duodenal
  • Nos casos com papilotomia prévia a ampliação de papilotomia pode aumentar risco de sangramento
  • Acesso por infundibulotomia não aumenta risco de complicações
  • Dilatar até no máximo o calibre da via biliar, lenta e progressivamente, abaixo dos cálculos
  • Inflar o balão com água e contraste hidrossolúvel, sob controle fluoroscópico
  • Cinturas persistentes podem significar estenoses ocultas, com maior risco de perfuração

Coledocolitiase dilatacao balao grande calibre

Clique na imagem para ampliar. A) Grande cálculo na via biliar com desproporção entre o seu tamanho e a via biliar distal. B) Visão fluoroscópica da dilatação com balão – balão insuflado com contraste e soro para melhor visualização. C) Colangiografia após a remoção do cálculo. D) Visão endoscópica da dilatação com balão. E) Grande cálculo na luz duodenal. F) Optado por remoção endoscópica do cálculo devido ao risco de íleo biliar.

Litotripsia Mecânica

Tem como princípio fundamental a fratura do cálculo, através de sua apreensão por um basket e a pressão deste sobre uma bainha metálica, exercendo força suficiente para a fragmentação do cálculo. Apresenta taxas de sucesso de até 90% e baixo índice de complicações, sendo as mais comuns a fratura do sistema com retenção do cálculo e basket, pancreatite e sangramento.

Litotripsia Intraductal

Consiste na fragmentação dos cálculos através de contato direto com uma sonda, sob controle endoscópico ( colangioscópico), utilizando-se o sistema Eletrohidráulico ou o sistema a Laser. Ambos apresentam taxas de sucesso em torno de 90%, com complicações entre 10 e 18%, sendo a colangite e sangramento as mais comuns. Devido ao alto custo destes equipamentos, não apresentam grande disponibilidade em nosso meio.

Litotripsia Extra-Corpórea

Realizada através da emissão de ondas de choque, por um gerador externo. Necessita de localização radiológica ou ultrassonográfica dos cálculos, normalmente através de um dreno nasobiliar ou biliar externo. Após a fragmentação dos cálculos necessita de CPRE para limpeza das vias biliares e tem taxas de sucesso entre 70 e 90%. Complicações ocorrem entre 30 a 40% dos casos, mais frequentemente cólica biliar, hemobilia, colangite, hematoma perinefrético e hematúria.
Em recente revisão, foi proposto um algoritmo para estes casos difíceis.
algoritmo calculos dificeis

Clique para ampliar. Adaptado de Esler JJ et al. Gastrointest Endosc Clin N Am. 2015;25(4):657-75.

Nestes últimos anos tenho usado com muito mais frequência a dilatação com balão, seja de calibre normal ( 10 a12 mm), ou mesmo os de grande calibre, quando nestas situações de cálculos difíceis como descritas aqui, e muito raramente tenho necessitado de stents ou mesmo litotripsia mecânica. O uso destes balões é fácil, mais barato que a litotripsia, e muito seguro, quando respeitados os detalhes técnicos aqui discutidos.
Para finalizar, um último cuidado quando se trata de cálculos volumosos, é a fragmentação dos mesmos no duodeno, ou retirada per-oral, para se evitar o íleo biliar ou mesmo a Síndrome de Bouveret (obstrução duodenal pelo cálculo).

Clique para assistir o video.  Paciente com via biliar bastante dilatada e cálculo gigante. Após a remoção do cálculo foi realizada a fragmentação do mesmo no duodeno para prevenir o íleo biliar.

Referências

Easler JJ et al. Endoscopic Retrograde Cholangiopancreatography for the management of common bile duct stones and gallstone pancreatitis.Gastrointest Endosc Clin N Am. 2015;25(4):657-75.
Yang J et al. Endoscopic biliary stenting for irretrievable common buli duct stones: Indications, advantages, disadvantages and follow up results. The sugeon. 2012;10:211-217.
Park JS et al. Endoscopic balloon dilation lithotripsy for difficult bile duct stones. Dig Dis Sci. 2014;59:1898-1901.
Kim JH et al. Endoscopic papillary large balloon dilation for the removal of bile duct stones. World J Gastroenterol. 2013;19(46).
Mangiavillano B et al. Outcome of stenting in biliary and pancreatic benign and malignant diseases. World J Gastroenterol 2015;21(30).
Orso I. Tratamento endoscópico da coledocolitíase. in: Paulo Sakai. Tratado de endoscopia digestiva – Vias biliares e pâncreas. 2015; Volume 3, Segunda edição.