Tratamento de fístula com vácuo endoscópico transparietal: uma alternativa eficaz que preserva o conforto do paciente
Introdução:
O tratamento de fístulas após cirurgias gastroesofágicas é um grande desafio. Nos últimos anos, a terapia a vácuo endoscópico (EVT) ganhou popularidade e se consolidou como uma ferramenta segura e eficaz para tratamento desta complicação, associando a drenagem de secreções ao estímulo à cicatrização.
Usualmente, a sonda para aspiração da terapia a vácuo é inserida através da narina, e posicionada dentro da luz do órgão ou na cavidade causada pela fístula. Entretanto, neste caso, o vácuo foi confeccionado de forma externa, transparietal, através do trajeto de um dreno cirúrgico. Este arranjo permitiu maior conforto para paciente, que continuou recebendo dieta via sonda nasoenteral.
Relato:
Paciente do sexo feminino de 70 anos submetida a gastrectomia total + esofagectomia distal com anastomose esofagojejunal intratorácica e linfadenectomia D2 devido carcinoma gástrico pouco diferenciado com envolvimento de esôfago distal.
Foram locados dois drenos perianastomose: um exteriorizado em flanco direito e um em flanco esquerdo.
No 5º. PO a paciente evoluiu com dor abdominal e distensão após infusão da dieta enteral. Foi realizado teste com azul de metileno, que extravasou pelo dreno abdominal à esquerda.
A endoscopia evidenciou deiscência de 1/3 da circunferência da anastomose esofagojejunal, na parede posterior. Era possível identificar o dreno através do orifício. A sonda nasoenteral estava locada na alça jejunal.
Figura 1: Endoscopia pós-operatória identificando fístula da anastomose esofagojejunal.Figura 2: Esquema demonstrando o posicionamento dos drenos (azul) e a deiscência esofagojejunal intratorácica (amarelo).
A terapia a vácuo endoscópica foi indicada. Duas alternativas de inserção da sonda do vácuo seriam viáveis neste momento: via nasal (convencional), ou através do dreno transparietal. Tendo em vista o conforto da paciente, e a possibilidade de mantê-la com apenas uma sonda na narina (para alimentação), foi optado por instalar o vácuo através do dreno, de maneira transparietal.
Terapêutica
O dispositivo escolhido para a terapia a vácuo foi do tipo tube in tube, confeccionado com sonda nasogástrica dentro do dreno siliconado já existente, dispensando o uso de esponjas ou gazes. A sonda foi conectada ao dispositivo de aspiração. Enquanto a sonda (tubo interno) aspirava, o dreno (tubo externo) evitava entupimentos.
Passagem de sonda nasogástrica 16 Fr através de dreno abdominal (figura 3), com o posicionamento na cavidade fistulosa confirmado pela endoscopia (figura 4).
Foi mantido vácuo com pressão negativa contínua de 125 mmHg, com auxílio de bomba eletrônica.
Paciente mantida com dieta enteral através de sonda nasoenteral locada na alça jejunal.
Figura 3: Esquema demonstrando o dispositivo da terapia a vácuo locado. A) passagem de fio-guia pelo dreno externo o qual foi capturado pela endoscopia e exteriorizado pela boca. B) inserção da sonda nasogástrica 16Fr sobre o fio-guia e posicionada a cerca de 1,5 cm da deiscência da anastomose sob supervisão endoscópica com aparelho de fino calibre.Figura 4: Local onde o dreno estava locado, e foi instalada a terapia a vácuo.
É importante salientar que, em casos em que o vácuo é instalado através de sondas nasais, muitos pacientes não toleram permanecer com uma sonda em cada narina – uma para a terapia a vácuo e uma para alimentação – ficando dependentes de nutrição parenteral.
Uma semana após a instalação da terapia a vácuo, foi realizada revisão endoscópica. O orifício fistuloso apresentava diminuição significativa de calibre, passando a medir cerca de 8 mm (figura 5).
Figura 5: A e B) Primeira revisão endoscópica após 7 dias de instalação da EVT; C, D e E) exame com aparelho de 4.9 mm através do orifício da fístula observando bom tecido de granulação no trajeto fistuloso. Dreno de silicone (azul) e sonda nasogástrica no seu interior.
Foi realizada leve tração do dreno (cerca de 2 cm) através da parede abdominal, afastando-o da luz do órgão, e reinstalado o vácuo endoscópico tipo tube in tube.
Figura 6: a) Trajeto fistuloso após tração do dreno; b) dreno realocado com dispositivo de vácuo no interior.
No 17º dia foi realizada nova revisão endoscópica, que identificou a anastomose esofagojejunal terminolateral ampla, sem sinais de fístula.
Figura 7: Segunda revisão endoscópica após 17 dias de instalação da EVT.
O dispositivo do vácuo endoscópico e o dreno abdominal foram retirados após novo teste com azul de metileno. No mesmo dia foi iniciada dieta oral, que foi progredida gradualmente até a alta hospitalar.
NOTA:
Em casos em que o paciente não possui um dreno previamente locado, a técnica tube in tube também pode ser realizada. Para isso utilizam-se duas sondas Levine de calibres diferentes. A sonda de maior calibre tem sua extremidade de conexão cortada, para que a sonda de menor calibre seja inserida. A sonda interna (a de menor calibre) é conectada à pressão negativa (figura 8).
Paciente feminina, 59 anos, portadora de fibrilação atrial paroxística, foi submetida a ablação térmica para tratamento da arritmia. Encontrava-se assintomática até que dez dias após o procedimento iniciou com quadro de dor torácica e sintomas de refluxo. Endoscopia digestiva alta demostrou o seguinte achado:
Ligadura elástica no tratamento de GAVE
Comentário do artigo “Endoscopic band ligation versus argon plasma coagulation in the treatment of gastric antral vascular ectasia: systematic review and meta-analysis” publicado na GIE em junho de 2025 [1].
A ectasia vascular antral (GAVE) é caracterizada pela dilatação anormal de vasos da mucosa e submucosa com ocorrência de trombos de fibrina e hiperplasia da lâmina própria. Sua ocorrência está relacionada a diversas patologias, dentre elas cirrose hepática, doenças autoimunes, insuficiência renal crônica, cardiopatia isquêmica e é relatada como causa de hemorragia digestiva alta não varicosa em até 4% dos casos [2].
A coagulação com plasma de argônio (APC) é considerada primeira linha no tratamento do GAVE, suas vantagens envolvem a facilidade de aplicação, eficiência no controle do sangramento a curto prazo e baixo risco de eventos adversos (EA). Há todavia, em nosso contexto, muitas vezes, limitação de disponibilidade do dispositivo e da cobertura por planos de saúde.
O uso de ligadura elástica endoscópica (EBL), método tradicionalmente empregado para tratamento de varizes de esôfago, vem sendo crescentemente descrito na literatura e reconhecido como alternativa no manejo da GAVE. A aplicação das bandas elásticas de ligadura leva a trombose, necrose e posterior fibrose, envolvendo os vasos anormais da mucosa e também da submucosa, estes não tratados pelo APC.
Figura 1 – Tratamento de GAVE com EBL e APC (acervo pessoal de Logiudice FP)
Garg e colaboradores realizaram uma revisão sistemática e metanálise comparando a eficácia e segurança da EBL à do APC, incluindo estudos de coorte retrospectivos e ensaios clínicos randomizados. Após a avaliação das bases de dados foram incluídos 10 trabalhos avaliando um total de 476 pacientes, 197 submetidos a tratamento do GAVE com EBL e 279 com APC.
A taxa de erradicação da GAVE foi avaliada em 7 estudos, abarcando um total de 263 pacientes. Na EBL a taxa de erradicação foi de 88,6% e no grupo submetido a APC 57,9%, com diferença estatísticamente significativa entre os grupos (P < 0,001).
Houve relato de eventos adversos em todos os trabalhos incluídos, com taxas de 16,8% e 9,3% respectivamente nos grupos EBL e APC (P = 0,1). Os eventos adversos relatados mais comumente foram dor abdominal, sangramento pós ligadura, presença de úlceras e pólipos. Não houve necessidade de prolongamento de internações em decorrência dos EA, necessidade de transferência para UTI ou cirurgia, sendo todos os casos manejados de forma conservadora em ambos os grupos.
O desfecho de recorrência do sangramento foi analizado em 6 estudos, sendo demonstrada menor recorrência estatística no grupo da EBL (6,6%) em comparação ao grupo APC (39,7%), RR = 0,21 (95% CI, 0,09-0,44; I2 = 0%; P < 0,001).
A recorrência do GAVE também foi reportada em seis trabalhos. No grupo de pacientes submetido a EBL houve 7,3% de recorrência da GAVE e no tratado com APC 38,5%, com presença de diferença estatística entre os métodos.
Embora houve numericamente menor internação e necessidade de menos sessões para erradicação da GAVE no grupo submetido a EBL, porém, não foi demonstrada significância estatística entre as diferenças dos métodos nestes desfechos.
Figura 2 – Graphical Abstract adaptado de Garg et al., GIE, 2025 [1] demonstrando as técnicas e os principais desfechos.
O trabalho avaliou ainda o subgrupo de pacientes que apresentavam cirrose, demonstrando diferença estatisticamente significatica favorecendo EBL nos desfechos de taxa de erradicação (RR, 1,48; P = 0,011), recorrência do sangramento (RR, 0,29; P = 0,017), recorrência do GAVE (RR, 0,28; P = 0,013), número de sessões para erradicação da GAVE (MD, 0,8; P = 0,036) e necessidade de internação hospitalar (MD, 0,45; P = 0,039) para esse subgrupo de pacientes.
Considerações
Os resultados desta revisão sistemática e metanalise indicaram resultados favoráveis à EBL nos desfechos taxa de erradicação da GAVE, recorrência do sangramento e recorrência da GAVE, sugerindo que esta possa ser alternativa viável como primeira linha de tratamento.
Uma possível explicação para estes melhores desfechos pode decorrer do tratamento por EBL envolver também os vasos da submucosa, ao passo que a profundidade de efeito do APC atinge apenas os vasos da mucosa.
Cabe-se ainda considerar na decisão terapêutica os custos envolvidos dos materiais, assim como a sua disponibilidade em cada serviço.
Garg A, Moond V, Bidani K, Garg A, Broder A, Mohan BP, Adler DG. Endoscopic band ligation versus argon plasma coagulation in the treatment of gastric antral vascular ectasia: systematic review and meta-analysis. Gastrointest Endosc. 2025 Jun;101(6):1100-1109.e13. doi: 10.1016/j.gie.2025.02.014. Epub 2025 Feb 14. PMID: 39956467.
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Doença de Whipple: O que o Endoscopista Precisa Saber
A doença de Whipple é uma condição infecciosa sistêmica rara causada pela bactéria Tropheryma whipplei, que acomete principalmente homens brancos, entre 40 e 60 anos. Como pode simular diversas patologias e afetar vários órgãos, inclusive sem sintomas gastrointestinais, é essencial que o endoscopista esteja atento a esse diagnóstico diferencial.
Um pouco de história…
Descrita pela primeira vez em 1907, a doença foi inicialmente chamada de “lipodistrofia intestinal” devido ao acúmulo de gordura nos linfáticos intestinais. A etiologia infecciosa foi confirmada em 1991 com a identificação do T. whipplei via técnicas moleculares.
Epidemiologia:
Apesar de ser rara (cerca de 30 casos/ano), o T. whipplei é está presente no ambiente, especialmente em esgoto e solo. É mais comumente detectado em trabalhadores da área rural e de pouco saneamento. A doença clássica é rara mesmo entre os portadores assintomáticos da bactéria.
Manifestações clínicas
A apresentação clássica envolve quatro sintomas principais:
Artralgias migratórias (geralmente anos antes dos sintomas digestivos)
Diarreia crônica
Dor abdominal
Perda de peso
Podem ocorrer manifestações isoladas no sistema nervoso central ou em válvulas cardíacas. A doença também pode ser desmascarada por uso de imunossupressores, muitas vezes prescritos para doenças reumatológicas presumidas.
Papel do Endoscopista no Diagnóstico
A endoscopia digestiva alta com biópsias do intestino delgado (jejuno/proximal do duodeno) é essencial.
Achados Endoscópicos Mais Comuns:
Mucosa esbranquiçada ou amarelada
Aspecto de placas ou granulações finas na mucosa do duodeno ou jejuno.
Edema da mucosa
A mucosa pode parecer espessada, pálida ou opaca, com perda das pregas normais.
Linfangiectasia intestinal
Dilatação dos vasos linfáticos pode dar aspecto leitoso ou de mucosa brilhante e friável.
Nódulos milimétricos
Pequenos nódulos na mucosa, principalmente no duodeno, conferem um aspecto de “mucosa em pedra de calçamento”.
Aspecto de mucosa atrófica ou ulcerada
Em casos mais avançados, pode haver áreas de erosão, atrofia ou até úlceras superficiais.
Achados endoscópicos em um paciente com Doença de Whipple: pontos esbranquiçados com irregularidade de pregas duodenais e erosões. Na cromoscopia com NBI e magnificação se nota vilosidades engurgitadas com dilatação dos linfáticos.
Investigação
Histologia com coloração PAS positiva em macrófagos da lâmina própria
PCR para T. whipplei
Imuno-histoquímica
Doença de Whipple: macrófagos intensamente PAS-positivos ocupando a lâmina própria da mucosa. As células caliciformes também estão positivamente coradas. A borda em escova dos enterócitos aparece marcada (como uma linha roxa intensa). Fonte: Bures et al. Gastroenterology Research and Practice 2013.
Se a suspeita for alta, mas a endoscopia não for diagnóstica, é indicado investigar outros sítios acometidos (líquor, linfonodos, valvas, líquido sinovial).
Importante: mesmo pacientes com apresentação extraintestinal devem realizar endoscopia, já que a participação intestinal subclínica é comum.
Tratamento
A doença era fatal antes da era dos antibióticos. Hoje, o tratamento é efetivo e dividido em duas fases:
Fase inicial (parenteral):
Ceftriaxona 2g IV 1x/dia ou
Penicilina G 2-4 MU IV 4/4h
Duração: 2 semanas (4 semanas se acometimento do SNC ou endocardite)
Fase de manutenção (oral por 1 ano):
TMP-SMX (160/800 mg) 2x/dia
Importante: O T. whipplei é resistente a fluoroquinolonas e a atividade do TMP-SMX é atribuída apenas ao sulfametoxazol.
Considerações finais para o endoscopista
Suspeite da doença em pacientes com síndrome diarreica crônica, perda de peso e artralgias, especialmente se do sexo masculino e com exposição a solo ou esgoto.
A biópsia de intestino delgado é a chave diagnóstica.
O endoscopista pode ser o primeiro a levantar a hipótese diagnóstica.
Mesmo rara, a doença de Whipple é potencialmente fatal se não tratada, mas curável com antibioticoterapia adequada. Estar atento à possibilidade diagnóstica é essencial.
Referências
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Apstein MD, Schneider T. Whipple’s disease. Uptodate. 2024.
Autores: Crislei Casamali e William Scheffer Chaves
Caso Clínico: Paciente masculino, 52 anos, previamente hígido, com sintomas dispépticos leves. Nega perda ponderal, febre ou sudorese noturna. Ausência de massas abdominais, inguinais ou axilares ao exame físico. Realizou endoscopia digestiva alta com biópsias, com os seguintes achados no duodeno:
Endoscopia digestiva alta: a) bulbo duodenal; b) papila duodenal maior; c) porção duodenal descendente (luz branca); d) porção duodenal descendente (NBI).Patologia: a) colocação HE; b) IHQ CD20+.
Biópsia Assistida por Incisão da Mucosa: Quando e Como Fazer?
A biópsia assistida por incisão de mucosa (mucosal incision-assisted biopsy, MIAB), denominada também biópsia por incisão única com Kneedle-Knife (incision needle‐knife biopsy, SINK biopsy) ou destelhamento, consiste em uma técnica endoscópica emergente e alternativa, descrita por Yokohata et al em 20075, utilizada para aquisição tecidual de lesões subepiteliais do trato gastrointestinal, que permite o diagnóstico histopatológico e imuno-histoquímico dessas condições.
O MIAB vem emergindo como método de abordagem de lesões subepiteliais, pois é de baixo custo-econômico e menor curva de aprendizado, mas com tempo de procedimento maior, sendo assim uma alternativa às punções ecoendoscópicas em centros de menor complexidade e com menos recursos.
Quando indicar?
O estabelecimento diagnóstico histopatológico e imuno-histoquímico das lesões subepiteliais possui importância fundamental na definição precisa de prognóstico, potencial de degeneração maligna e definição de conduta entre expectante, vigilância endoscópica e ressecções endoscópica ou cirúrgica.
Entretanto, como abordado no artigo de lesões subepiteliais, não são todas as lesões que devem ter diagnóstico anatomopatológico para definição de conduta e seguimento do caso, havendo indicações precisas para se realizar biópsias dessas lesões.
Em caso de necessidade de aquisição tecidual das lesões subepiteliais, deverá se optar por um dos três principais métodos diagnósticos: MIAB, punções ecoendoscópicas com agulha FNA (fine needle aspiration, EUS-FNA) ou com agulha FNB (fine needle biopsy, EUS-FNB).
As indicações do MIAB estão bem determinadas nos guidelines da Sociedade Europeia de Endoscopia Gastrointestinal (ESGE) e Colégio Americano de Gastroenterologia (ACG).
A ESGE recomenda que para lesões subepiteliais maiores de 20 mm, MIAB ou EUS-FNB podem ser igualmente empregados. Entretanto, em lesões subepiteliais inferiores a 20 mm, o MIAB é a primeira escolha devido maior rendimento diagnóstico, sendo a EUS-FNB segunda escolha (tabela 1).1 Com relação a taxa de rendimento do MIAB, a mesma foi avaliada em algumas metanálises, sendo demonstrado rendimento diagnóstico de 89% (IC 95% 82,7%-93,5%) para lesões subepiteliais do trato gastrointestinal superior com diâmetro médio de 21 mm, sendo 94,8% das lesões localizadas no estômago1,29.
A ACG sugere o MIAB quando o diagnóstico definitivo é necessário e as punções ecoendoscópicas prévias (FNA ou FNB) tenham sido inconclusivas.14 A diretriz recomenda igualmente como primeira escolha EUS-FNB sem avaliação macroscópica do patologista em sala (rapid on-site evaluation, ROSE) ou EUS-FNA com ROSE. Afinal, já é bem determinado na literatura que agulhas FNA possuem limitações de aquisição tecidual e seu rendimento diagnóstico adequado depende de um citopatologista em sala para atestar a representatividade da amostra periprocedimento.
A ASGE e AGA em seus guidelines descrevem o MIAB como um método diagnóstico alternativo para as lesões subepiteliais. Entretanto, não se posicionam com relação a situações de aplicabilidade.
Além disso, na escolha do método é importante considerar não somente as recomendações dos guidelines, mas também as particularidades de cada procedimento, custos hospitalares e disponibilidade de recusos. O MIAB foi associado a um maior tempo de procedimento e a um risco de fibrose perilesional, o qual pode dificultar ou impedir futuras ressecções endoscópicas28.
Tabela 1. Recomendações da ESGE¹
Tamanho
Método de Escolha
LSE > 20 mm
1ª escolha: EUS-FNB ou MIAB
LSE < 20 mm
1ª escolha: MIAB 2ª escolha: EUS-FNB
Complicações
As taxas de complicações inerente ao MIAB são baixas. Os eventos adversos mais frequentes incluem: sangramento em cerca de 2 a 5% dos casos, os quais requisitaram transfusão sanguínea e/ou tratamento endoscópico na maioria dos trabalhos29, 30-32; fibrose perilesional pós-MIAB, impossibilitando ressecções endoscópicas futuras; e mais raramente perfuração, a qual não foi observada na maioria dos ensaios clínicos, metanálises e série de casos29, 33, 34.
Como fazer?
Primeiramente, é importante ressaltar os materiais necessários para o procedimento. Necessita-se de um gastroscópio convencional com cap, afinal o uso desse dispositivo permite visualização minuciosa da mucosa e do sítio manipulado por acumular menos resíduos na lente do endoscópio.
Uma faca eletrocirúrgica endoscópica é necessária, sendo sugerido o uso de Needle Knife, pois consiste no instrumento de maior poder de corte e menor poder de coagulação, uma vez que se objetiva realizar incisão precisa da mucosa seguida de divulsão dos tecidos. Um princípio básico relacionado às facas endoscópicas consiste no fato de quanto menor a área de contato do instrumento com a mucosa, maior será o poder de corte e menor será o poder de coagulação (figura 1). Sugere-se utilizar unidade eletrocirúrgica com corte em modo endocut, efeito 3 e 40 W.
Fig. 1. Tipos de facas eletrocirúrgicas (knifes), demonstrando que a medida que reduz a área de contato do instrumento, maior será o poder de corte e menor o de coagulação. Retirado de: Miyajima NT17
Outros materiais necessários consistem em pinça de biópsia para divulsão dos tecidos e aquisição de material, assim como clipes metálicos para fechamento do sítio manipulado pós-procedimento. Caso haja necessidade de controle hemostático peri-procedimento, sugerimos o uso de pinça hemostática coagrasper.
O vídeo 1 e as figuras de 2 a 7 demonstram as etapas do procedimento.
Figura 2 a 7. Etapas da biópsia assistida por incisão de mucosa. Fig. 2. Localização da lesão utilizando gastroscópio convencional com cap.Fig. 3 e 4. Incisão na região central da lesão sob auxílio de needle-knife.Fig. 3 e 4. Incisão na região central da lesão sob auxílio de needle-knife.Fig. 5. Divulsão das camadas com pinça de biópsia.Fig. 6. Exposição da submucosa e da cápsula da lesão (seta verde).Fig. 21. Biópsias da lesão sob visão direta. Nota: Posteriormente, realizou-se incisão da cápsula da lesão para biópsia adicionais e, ao término, colocação de clipes para o fechamento do sítio manipulado. Fonte: arquivos do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (ICESP/HCFMUSP).
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Devemos fixar próteses metálicas totalmente recobertas em patologias benignas?
Resumo do artigo “Evaluating no fixation, endoscopic suture fixation, and an over-the-scope clip for anchoring fully covered self-expandable metal stents in benign upper GI conditions: a comparative multicenter international study” publicado na GIE em março de 2025.
As próteses metálicas endoscópicas foram introduzidas na década de 1990 e tem aplicação no manejo de diversas patologias. No contexto das doenças benignas, que envolvem estenoses, fístulas, perfurações e sangramento refratário de varizes esofágicas, são utilizadas as próteses totalmente recobertas (FCSEMS). Estes modelos de prótese contam com um revestimento de silicone que previne o crescimento tecidual, permitindo sua remoção, porém apresentam maior potencial de migração.
Fig. 1 – Técnicas de fixação das próteses: Superior, clipe over-the-scope. Inferior, sutura endoscópica. Adaptado de Mehta A et al., Gastrointest Endosc. 2025 [1].
O trabalho de Amit Mehta e colaboradores avaliou o benefício da fixação das FCSEMS com clipes over-the-scope ou sutura endoscopica em patologias benignas do trato gastrointestinal superior quando comparados à não fixação. Foi realizado um estudo de coorte retrospectiva que incluiu os dados de 16 centros entre 2011 e 2022, avaliando defechos que envolveram duração dos procedimentos, migração das próteses, sucesso clínico, sucesso técnico e eventos adversos.
Foram incluídos 311 pacientes com 316 FCSEMS colocadas, sendo que em 122 pacientes (39,2%) não foi realizada fixação, em 95 realizada fixação com sutura (30,5%) e em 94 fixação com clipe over-the-scope (30,2%). A necessidade de tratamento endoscópico decorreu da presença de estenose benigna em 174 pacientes (56%), fístula ou perfuração em 135 casos (43%) e sangramento refratário de varizes esofágicas em 2 (0,6%).
A duração dos procedimentos foi de 41,7 ± 34,5 minutos para o grupo sem fixação, 79,5 ± 53,3 minutos no grupo da sutura endoscópica e 66 ± 44,9 minutos nas próteses fixadas com clipe over-the-scope, observando-se menor tempo de procedimento com diferença estatisticamente significativa (p<0,01) quando não realizada fixação da prótese em comparação aos demais grupos. Não houve diferença significativa do tempo de procedimento quando comparadas as duas tecnicas de fixação.
Ocorreu migração de 88 das 316 próteses, 49 (39%) quando não foram fixadas, 23 (24%) nas fixadas com sutura endoscópica e 16 (17%) quando fixadas com clipe over-the-scope, observando-se diferença considerada estatísticamente significativa na comparação da fixação com sutura endoscópica em relação à não fixação (P = .01) e da fixação com clipe over-the-scope com a não fixação (P = .001). Não houve diferença das taxas de migração quando comparados os dois métodos de fixação (P = .2).
Fig. 2 – Comparação de migração das próteses com e sem fixação. Adaptado de Mehta A et al., Gastrointest Endosc. 2025 [1].
Atingiu-se o sucesso clínico em 194 pacientes (62%), 98 dos que apresentavam estenoses (56%), 94 daqueles com fístula/perfurações (70%) e nos 2 pacientes com sangramento refratário por varizes (100%). Comparando-se ao grupo em que não foi realizada fixação (n = 64; 52%) houve maior sucesso clínico nos grupos submetidos à fixação das próteses. No grupo de sutura, 66 casos apresentaram sucesso clínico (69%; P = .02) e no grupo com fixação por clipe over-the-scope 64 pacientes (68%; P = .03).
No que concerne à possível dificuldade de remoção dos clipes over-the-scope, o trabalho destaca que, na maioria dos casos, estes puderam ser retirados apenas com uso de pinça dente de rato, sendo em apenas 7 casos necessário o uso de dispositivo específico.
O artigo realiza tambem uma breve comparação de custos no mercado americano entre a utilização de clipes over-the-scope e sutura endoscópica, que favoreceu numericamente a fixação com over-the-scope, destacando ainda a necessidade de uso de aparelho duplo canal para o dispositivo de sutura.
Os achados do estudo embasam o benefício da utilização de fixação para FCSEMS em patologias benignas do trato gastrointestinal superior, demonstrando redução significativa na taxas de migração e melhor resposta clínica, sem diferença observada entre os métodos de fixação avaliados. O maior sucesso clínico obtido quando fixada a prótese pode ser explicado como uma representação do benefício clínico de reduzir a migração, embora a obtenção de resposta clínica seja multifatorial, dependente da patologia de base e de fatores associados ao paciente.
Comentários
Neste trabalho, os dispositivos de fixação endoscópica demonstraram benefício na redução da migração das FCSEMS com potencial melhora na resposta clínica dos pacientes. À medida que eles se tornam mais disponíveis em nosso mercado, pode ser interessante considerar sua incorporação à prática para obtenção de melhores resultados.
Mehta A, Ashhab A, Shrigiriwar A, et al. Evaluating no fixation, endoscopic suture fixation, and an over-the-scope clip for anchoring fully covered self-expandable metal stents in benign upper GI conditions: a comparative multicenter international study (with video). Gastrointest Endosc. 2025 Mar;101(3):589-597. doi: 10.1016/j.gie.2024.08.015. Epub 2024 Aug 22. PMID: 39179133
Reijm AN, Didden P, Schelling SJC, et al. Self-expandable metal stent placement for malignant esophageal strictures – changes in clinical outcomes over time. Endoscopy. 2019 Jan;51(1):18-29. doi: 10.1055/a-0644-2495. Epub 2018 Jul 10.PMID: 29991071
Bakken JC, Wong Kee Song LM, de Groen PC, Baron TH. Use of a fully covered self-expandable metal stent for the treatment of benign esophageal diseases. Gastrointest Endosc. 2010 Oct;72(4):712-20. doi: 10.1016/j.gie.2010.06.028. PMID: 20883848
Paciente do sexo feminino, 44 anos, com antecedente de cirurgia bariátrica (Bypass Gástrico em Y de Roux) realizada em 2012, e diagnóstico prévio de hipotireoidismo. Desde o final de 2022, evoluiu com dor abdominal progressiva, episódios de náuseas e vômitos, além de perda de peso significativa.
Uma endoscopia digestiva alta (EDA) realizada em junho de 2023 identificou uma estenose na anastomose gastrojejunal, com achados sugestivos de isquemia. A paciente foi submetida a revisão cirúrgica da anastomose, no entanto, os sintomas persistiram.
Em janeiro de 2024, uma tomografia computadorizada (TC) de abdome revelou perfuração bloqueada da anastomose e uma coleção perianastomótica, além de uma lesão polipoide de 2,5 cm na segunda porção do duodeno, na região periampular. Diante desses achados, foi solicitada uma ressonância magnética (RM) de abdome superior, que confirmou uma lesão polipoide intraluminal de 3,2 cm na parede lateral da segunda porção do duodeno, com realce heterogêneo.
Após discussão multidisciplinar, optou-se por nova cirurgia para drenagem da coleção, revisão da anastomose e EDA intra-operatória para avaliar a lesão polipoide em duodeno, em março de 2024. Durante o ato cirúrgico, foi realizada uma gastrotomia para acesso endoscópico ao duodeno. A endoscopia revelou uma lesão pediculada, com superfície vilosa, localizada na parede lateral da segunda porção do duodeno, oposta à papila maior (seta). A base do pedículo media 15 mm de comprimento por 12 mm de espessura, e a porção cefálica da lesão apresentava diâmetro de 30 mm.
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Uso da Terapia Endoscópica a Vácuo no Manejo de Fístula Esofágica Pós-Tireoidectomia
Relato de Caso
Paciente masculino, 46 anos, natural de Arapiraca-AL, apresentou queixa de massa cervical volumosa, rouquidão e discreta disfagia, com piora recente. Os sintomas tiveram início há três anos. Foi diagnosticado com tumoração na tireoide, sendo confirmada, por citologia aspirativa com agulha fina, a presença de carcinoma medular em estágio avançado, associado a linfonodomegalia e paralisia do nervo laríngeo recorrente direito.
O paciente foi submetido a uma tireoidectomia total com esvaziamento cervical bilateral em sua cidade de origem. Durante a cirurgia, houve lesão do esôfago cervical, prontamente reparada com rafia. Para monitoramento no pós-operatório, optou-se pela colocação de um dreno tubular, além da passagem de uma sonda nasoenteral (SNE) para alimentação precoce. No sétimo dia de pós-operatório, o paciente apresentou dor e inchaço cervical, associados a febre e deterioração do estado geral. Um teste oral com azul de metileno evidenciou extravasamento de conteúdo pelo dreno cervical. O paciente foi transferido para um hospital terciário de referência em Maceió, onde foi internado na UTI geral. Uma endoscopia à beira do leito identificou uma fístula esofagotorácica localizada abaixo do cricofaríngeo, no esôfago proximal, comunicando-se com a cavidade torácica facilmente acessada com o endoscópio.
Figura 1: cavidade por visão endoscópica.
A cavidade apresentava exsudato espesso e amarelado, aderente às superfícies e com contaminação grosseira por saliva e debris, vistos no vídeo e fotos a seguir:
Figura 2: cavidade com exsudato espesso e amarelado.
Figura 3: O ápice pulmonar direito foi visualizado.
Realizou-se uma toalete cavitária com soro fisiológico 0,9%, seguida pela instalação de um sistema de terapia a vácuo (técnica modificada) com sonda nasogástrica Nº 18. Após a primeira troca, observou-se melhora significativa do quadro clínico e laboratorial, permitindo a alta da UTI para a enfermaria após o terceiro dia de terapia com pressão negativa.
Na terceira troca, era evidente a melhora na contaminação e redução do tamanho da cavidade, que se encontrava recoberta por tecido de granulação. A evolução endoscópica positiva acompanhou-se de uma melhora clínica significativa do paciente, que permaneceu estável e sem sinais de septicemia.
Vídeo de evolução após a terceira troca.
Vídeo de evolução após a quarta troca.
Vídeo de evolução após a sexta troca.
Foram necessárias seis trocas do sistema à vácuo, realizados semanalmente até o fechamento completo da cavidade e resolução em definitivo da fístula.
O relatório patológico descreve: carcinoma medular da tireoide, tumor que mede 4 x 3,3 cm (classificação de estadiamento pT3b pN1b M0). Houve invasão linfática (8 de 10 linfonodos).
Discussão
A perfuração e o extravasamento de conteúdo esofágico são condições graves e potencialmente fatais, frequentemente levando ao desenvolvimento de sepse, com uma taxa de mortalidade variando entre 12% e 50%. O prognóstico piora significativamente com o atraso no início do tratamento: a mortalidade aumenta de 7,4% para 20,3% quando a intervenção ocorre após 24 horas do evento, ressaltando a importância crítica da identificação e intervenção precoces.
A perfuração do esôfago cervical é comumente associada a complicações decorrentes de procedimentos esofágicos ou intubação traqueal. A alta mortalidade relacionada a essa condição deve-se à anatomia do esôfago proximal, que facilita o acesso de bactérias e enzimas digestivas ao mediastino, levando ao desenvolvimento de uma condição grave, a mediastinite, além de empiema, sepse e síndrome de disfunção de múltiplos órgãos.
Diversos tratamentos para perfurações esofágicas são descritos na literatura, mas ainda não há um procedimento considerado padrão-ouro. As abordagens podem ser conservadoras ou cirúrgicas. A abordagem conservadora inclui antibioticoterapia, nutrição parenteral e drenagem torácica, sendo indicada para pacientes selecionados com perfurações bem contidas, contaminação mínima e sem sinais de obstrução ou sepse. Já a abordagem cirúrgica pode variar desde rafia primária até esofagectomia com reconstrução imediata ou tardia do trato gastrointestinal, além de drenagem extensa do mediastino. Ambos os tratamentos visam prevenir a disseminação de conteúdo para o mediastino, eliminar e controlar a infecção, manter o estado nutricional do paciente e assegurar a integridade e continuidade do trato digestivo. O diagnóstico e a intervenção imediatos permanecem de importância vital.
A tireoidectomia (total ou parcial) é o tratamento de escolha para neoplasias da tireoide, sendo as principais complicações o hematoma cervical, hipoparatireoidismo transitório e lesão do nervo laríngeo recorrente. A perfuração inadvertida do esôfago é uma complicação rara. Devido à raridade desse evento, há escassez de dados na literatura, o que torna seu manejo mais desafiador.
Nesse contexto, novas terapias têm emergido e ganhado popularidade, como o uso de endoclipes e stents metálicos. Em 2003, a terapia endoscópica a vácuo (EVT) surgiu como uma alternativa, inicialmente empregada para o fechamento de fístulas de anastomose em cirurgias retais. A terapia endoscópica assistida por vácuo para fechamento de vazamentos de anastomose foi desenvolvida para superar as limitações do tratamento convencional não cirúrgico.
O fechamento de feridas cirúrgicas com pressão negativa é uma modalidade terapêutica bem estabelecida e amplamente utilizada desde 1997 para o tratamento de lesões abertas crônicas. Esse método é aplicado em diversas especialidades, como cirurgia geral, ortopedia, plástica e vascular. O procedimento consiste em selar o sítio cirúrgico com um adesivo e aplicar pressão subatmosférica. O aumento da vascularização aliado à redução da colonização bacteriana são fatores essenciais para o sucesso dessa terapia, acelerando a reparação da ferida e preparando o leito até sua cobertura definitiva por meio de diversos métodos de reconstrução tecidual.
Na EVT, o objetivo é criar um ambiente com pressão negativa que estimula o crescimento de tecido de granulação, preenchendo a cavidade e reduzindo a presença de fibrina e tecido necrótico. Esse preenchimento contínuo da cavidade com tecido de granulação resulta em uma diminuição progressiva do diâmetro e profundidade da cavidade durante as sessões subsequentes, promovendo o fechamento do defeito transmural e acelerando a cicatrização.
Um estudo de Luttikhold et al., multicêntrico realizado em cinco hospitais de três países europeus, avaliou o sucesso do fechamento de perfurações esofágicas com EVT, alcançando uma taxa de 89%. As indicações para o uso da EVT no trato gastrointestinal incluem defeitos transmurais agudos, precoces e crônicos da parede esofágica e da junção esofagogástrica. Há evidências publicadas de sucesso no fechamento de vazamentos em linhas de sutura após ressecções oncológicas e procedimentos bariátricos, além de perfurações iatrogênicas e rupturas espontâneas. A duração média do tratamento até o fechamento completo varia entre 11 e 28 dias, sendo o intervalo de troca do dispositivo um fator crucial para o sucesso da terapia.
A técnica da esponja modificada, confeccionada com sonda nasogástrica, gaze e adesivo antimicrobiano, é uma abordagem segura e relativamente simples, que se apresenta como uma alternativa eficaz para o manejo de defeitos do trato gastrointestinal. O EVT modificado é de fácil inserção e permite intervalos maiores entre as trocas do sistema. Sua relação custo-efetividade tem o potencial de expandir seu uso, democratizando o acesso à técnica e impactando significativamente o tratamento de casos desafiadores, contribuindo para desfechos mais favoráveis.
REFERÊNCIAS
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Endoscopic vacuum therapy for esophageal perforation: a multicenter retrospective cohort study. Luttikhold J, Pattynama LMD, Seewald S, Groth S, Morell BK, Gutschow CA, Ida S, Nilsson M, Eshuis WJ, Pouw RE. Endoscopy. Sep. 2023.