Assuntos Gerais: Estenose Péptica de Esôfago

As estenoses pépticas são as estenoses benignas mais comuns do esôfago, porém, seu diagnóstico tem diminuído muito ao longo dos anos, principalmente devido ao uso dos inibidores de bomba de próton (IBP).

A avaliação endoscópica inicial da estenose é fundamental, e deve ser sempre voltada a descartar malignidade, com realização de múltiplas biópsias. Estenose que não permitem a passagem do aparelho, podem ser avaliada com endoscópios finos, se o serviço tiver tal aparelho. Estenoses não ultrapassadas pelo aparelho, devem ser avaliadas com exame de imagem contrastado, como um esofagograma com bário.

As estenoses pépticas em geral são simples, ou seja, curtas (menores que 2 cm – foto 1), retilíneas, e localizadas no terço distal do esôfago, e em geral apresentam boa resposta ao tratamento endoscópico.  Tais estenoses podem estar associadas a outras complicações de refluxo crônico, como esôfago de Barret por exemplo (foto 2).  Deve-se lembrar de outras causas de estenose, como a esofagite eosinofílica, novamente, mostrando a importância das biópsias da área estenosada.

Foto 1 : Estenose distal.
Foto 2 : Estenose com Barret associado.

TRATAMENTO

Clínico

 É de fundamental importância o tratamento com IBP (seja dose simples ou dobrada), visando o controle do Refluxo Gastresofágico, visando o controle da esofagite e a recidiva da estenose, ou pelo menos aumentando o tempo entre as dilatações em casos refratários

Endoscópico

A escolha da terapia endoscópica se baseia no tipo de estenose, extensão e experiência do endoscopista.

A primeira escolha é o tratamento com dilatação, tanto com balão, quanto por sondas dilatadoras, não havendo diferença entre elas nos estudos realizados, sendo a escolha baseada na preferência do endoscopista. As dilatações com sonda tem a vantagem de exercerem forca radial e longitudinal, enquanto os balões apenas radial, mas estes tem a vantagem de serem facilmente acompanhados por fluoroscopia. Os balões são preferidos em estenoses muito “justas” ou anguladas, em geral são do tipo TTS (pelo canal do aparelho) e estagiados, com tamanho máximo de 20mm.

O uso das sondas dilatadoras (as mais comuns são as do tipo Savary-Gilliard) é baseado na sensibilidade tátil do endoscopista. Em geral, se aplica a “regra dos 3”. De forma arbitrária se escolhe a sonda de tamanho estimado da estenose, ou a primeira sonda que oferecer resistência a passagem (esta a importância da experiência do endoscopista), e a partir desta, se dilata com três sondas subsequentes, com aumentos de 1mm cada na mesma sessão (foto 3).

Foto 3 : Aspecto após dilatação com sonda.

Não há consenso sobre o calibre ideal a se atingir com as dilatações, mas em geral 15-16 mm é o objetivo inicial, pois em geral apresentam remissão mais durável.

Após as dilatações, deve-se avaliar o trajeto dilatado, investigando por complicações (sangramentos importante, lacerações profundas ou perfurações evidentes- videos 1 e 2).

Video 1 : Aspecto final após dilatação com sonda de 12mm (paciente 1)

Video 2 : Aspecto final após dilatação com sonda de 12mm (paciente 2)

O uso de fluoroscopia é indicado, principalmente em estenoses mais complexas. O uso de fio guia associado também é importante, sendo a fluoroscopia fundamental quando necessária a passagem de próteses.

Estenose refratária e recidivante (ou recorrente)

Estenose refratária é aquela em que não se consegue atingir o calibre almejado (15-16 mm) em 4-5 sessões

Estenose recidivante (ou recorrente) é aquela que não se mantém mesmo após ter atingido o calibre almejado inicialmente

  • A injeção de esteroides pode ser utilizada em casos onde ocorram recidivas. O mais utilizado é a triancinolona (40mg diluídos em 4 ml, sendo aplicada 1 ml em cada quadrante da estenose), sendo utilizada no máximo em três sessões.
  • Ainda em estenoses refratárias, ou onde não se consegue uma dilatação adequada, pode-se utilizar stents metálicos totalmente recobertos, com taxas de até 45% de sucesso, mas com complicações em torno de 25% como eventos adversos e principalmente migração.
  • Por fim, a cirurgia e reservada para pacientes onde todas as tentativas endoscópicas falharam, na presença de complicações (fístulas por exemplo). Felizmente poucos casos evoluem com necessidade de cirurgia.

Assim, terapia com IBP associado a terapia endoscópica é o tratamento principal para a estenose péptica de esôfago, mesmo em casos refratários, onde se pode lançar mão de injeção de corticoide e uso de próteses esofágicas.

A seguir, se propõe em algoritmo de tratamento para a estenose péptica de esôfago.

Bibliografia

  1. Desai M, Hamade N, Sharma P. Management of Peptic Strictures. Am J Gastroenterol. 2020 Jul;115(7):967-970. doi: 10.14309/ajg.0000000000000655. PMID: 32618639.



Doença do refluxo gastroesofágico no paciente com obesidade

A Doença do Refluxo Gastroesofágico (DRGE) é bastante comum na população geral, com prevalência de 10 a 20%. Nos pacientes com obesidade essa prevalência chega a ser o dobro.

Os mecanismos envolvidos no aumento do risco de DRGE na obesidade são devidos ao aumento da pressão abdominal, levando a:

  • Aumento do relaxamento transitório do esfíncter inferior do esôfago
  • Hérnia de hiato
  • Diminuição do clearence esofágico

A prevalência da DRGE está diretamente relacionada à gravidade da obesidade e ao IMC (Índice de Massa Corpórea). Pacientes com obesidade (IMC > 30) têm mais episódios de refluxo e pior escore de DeMeester do que aqueles com sobrepeso (IMC > 25). Em candidatos à cirurgia bariátrica, aqueles com IMC > 50 têm esofagite erosiva com maior prevalência aos com IMC > 40 e assim sucessivamente. Apesar disso, é incomum o achado de esofagite grave (C/D) ou até mesmo o diagnóstico de Esôfago de Barrett.

Como deve ser a investigação da DRGE no pré-operatório da cirurgia bariátrica?

Apesar de ser rotina na maioria dos serviços de bariátrica no Brasil, até recente havia grande controvérsia na literatura internacional em relação à Endoscopia Digestiva Alta (EDA) no preparo para a cirurgia bariátrica.

A recomendação atual conforme consenso de sociedade internacional é o seguinte:

  • EDA deve ser considerada para todos os pacientes com sintomas gastrointestinais que planejam realizar cirurgia bariátrica devido à frequência de achados que podem mudar conduta
  • EDA deve ser considerada também para aqueles sem sintomas devido à chance de 25% de achados endoscópicos incidentais que podem mudar conduta ou até contraindicar a cirurgia bariátrica

Como a presença de DRGE influencia na escolha técnica da bariátrica?

Atualmente a Gastrectomia Vertical (GV) é a cirurgia bariátrica mais realizada no mundo. Entretanto, com seguimento a longo prazo, temos visto com maior frequência casos com DRGE no pós-operatório. Em algumas situações, muito sintomático e refratário à tratamento clínico, com necessidade de cirurgia revisional para conversão ao Bypass Gástrico em Y-de-Roux (BGYR).

Não há conduto, evidências fortes em relação a fatores de risco no pré-operatório que possam prever quais pacientes vão evoluir com refluxo de novo. Sabemos somente que aqueles com DRGE patológica, conforme critérios de Lyon, tendem a piorar após a GV.

Por tudo isso, a presença de DRGE deve ser ponderada na decisão conjunta com o paciente entre GV ou Bypass. De modo geral, mas não obrigatoriamente, devemos favorecer Bypass Gástrico em caso de:

  • Esofagite Erosiva graus C ou D de Los Angeles
  • Esôfago de Barrett
  • Hérnia de hiato
  • Alterações motoras do esôfago

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Referencias:

  1. Ayazi S, Hagen JA, Chan LS, DeMeester SR, Lin MW, Ayazi A, Leers JM, Oezcelik A, Banki F, Lipham JC, DeMeester TR, Crookes PF. Obesity and gastroesophageal reflux: quantifying the association between body mass index, esophageal acid exposure, and lower esophageal sphincter status in a large series of patients with reflux symptoms. J Gastrointest Surg. 2009 Aug;13(8):1440-7.
  2. Derakhshan MH, Robertson EV, Fletcher J, Jones GR, Lee YY, Wirz AA, McColl KE. Mechanism of association between BMI and dysfunction of the gastro-oesophageal barrier in patients with normal endoscopy. Gut. 2012 Mar;61(3):337-43.
  3. Brown WA, Johari Halim Shah Y, Balalis G, Bashir A, Ramos A, Kow L, Herrera M, Shikora S, Campos GM, Himpens J, Higa K. IFSO Position Statement on the Role of Esophago-Gastro-Duodenal Endoscopy Prior to and after Bariatric and Metabolic Surgery Procedures. Obes Surg. 2020 Aug;30(8):3135-3153. doi: 10.1007/s11695-020-04720-z. PMID: 32472360.
  4. Bolckmans, R., Roriz-Silva, R., Mazzini, G.S. et al. Long-Term Implications of GERD After Sleeve Gastrectomy. Curr Surg Rep 9, 7 (2021).
  5. Sebastianelli L, Benois M, Vanbiervliet G, Bailly L, Robert M, Turrin N, Gizard E, Foletto M, Bisello M, Albanese A, Santonicola A, Iovino P, Piche T, Angrisani L, Turchi L, Schiavo L, Iannelli A. Systematic Endoscopy 5 Years After Sleeve Gastrectomy Results in a High Rate of Barrett’s Esophagus: Results of a Multicenter Study. Obes Surg. 2019 May;29(5):1462-1469.

Como citar este artigo

Dantas, A. Doença do refluxo gastroesofágico no paciente com obesidade. Gastropedia; 2022 Disponível em: http://endoscopiaterapeutica.net/pt/?p=13468