Síndrome de Lemmel

Introdução

A incidência de divertículos duodenais é rara e varia entre 1-27%, sendo mais frequente a localização periampular (70-75%). A síndrome de Lemmel trata-se da obstrução do ducto biliar devido a ação de um divertículo duodenal periampular quando o mesmo comprime ou obstrui a via biliar, podendo ocasionar sintomas como icterícia, dor abdominal e alterações nos níveis de enzimas hepáticas na ausência de coledocolitíase (vide Figura 1). É uma condição que precisa ser considerada em casos de obstrução biliar inexplicada, especialmente em pacientes com divertículos duodenais.

Fig 1. Divertículo duodenal. Ilustração cedida pela Dra. Fernanda Prado Logiudice (SP).

Classificação

Pode ser classificada de acordo com a posição da papila em relação ao divertículo: tipo I (intradiverticular), II (peridiverticular) ou III (próximo ao divertículo). Em nosso caso foi identificada através de duodenoscopia o tipo II, conforme ilustrado na imagem abaixo (Figura 2).

Fig 2. Duodenoscopia da papila duodenal maior peridiverticular (esq).
Imagem cedida por Dr. Diego Rangel (BA) e Dra. Sâmara Martins (BA).

Sintomatologia

A maioria dos casos é assintomática e diagnosticada incidentalmente durante exames endoscópicos, mas complicações podem ocorrer em 5% dos casos, como colangite, icterícia obstrutiva, sangramento, perfuração, diverticulite, pancreatite e coledocolitíase.

Diagnóstico

Exames laboratoriais podem estar alterados, como nível de bilirrubinas e enzimas canaliculares e hepáticas, entretanto, não são determinantes para o diagnóstico da Síndrome de Lemmel, pois podem estar dentro dos níveis da normalidade. Dentre os exames de imagem, a colangiopancreatografia retrógrada endoscópica (CPRE) demonstra-se mais abrangente, já que utiliza a endoscopia de visão lateral (duodenoscopia) para identificação do divertículo periampular e a colangiografia para avaliar a dilatação da via biliar, além de possibilitar a terapêutica. Apesar disso, os exames de tomografia computadorizada, ressonância magnética e endoscopia digestiva alta são inicialmente mais utilizados devido ao fácil acesso. Além deles, outros exames de imagem também podem ser utilizados, como exame radiológico contrastado, ultrassonografia endoscópica ou mesmo a laparoscopia. No caso em questão, a paciente já havia realizado exame de ressonância de abdome (Figura 3) e ecoendoscopia, ambos corroborando a hipótese diagnóstica.

Fig 3. Colangiorressonância demonstrando dilatação da via biliar extra-hepática e divertículo duodenal identificado pela seta.

Tratamento

O tratamento, apesar de ainda não bem estabelecido pela literatura, é baseado na sintomatologia e, portanto, sendo recomendada abordagem conservadora em pacientes assintomáticos. A esfincterotomia através de CPRE com ou sem colocação de stent pode ser uma excelente opção terapêutica para pacientes com obstrução da via biliar ou mesmo colangite. Outra opção terapêutica possível é o tratamento cirúrgico através da diverticulectomia, entretanto, com elevada morbimortalidade. No caso ilustrado (Figuras 4-6), a paciente foi tratada com esfincterotomia e esfincteroplastia com balão, seguida de drenagem da via biliar com prótese biliar plástica.

Fig 4. Imagem colangiográfica da CPRE exibindo dilatação importante da via biliar principal.
Imagem cedida por Dr. Diego Rangel (BA) e Dra. Sâmara Martins (BA).
Fig 5. Papilotomia endoscópica (esq.). Dilatação endoscópica da papila com balão (dir.).
Imagens cedidas por Dr. Diego Rangel (BA) e Dra. Sâmara Martins (BA).
Fig 6. Drenagem endoscópica da via biliar com prótese plástica: imagem endoscópica (esq.) e imagem colangiográfica (dir.). Imagens cedidas por Dr. Diego Rangel (BA) e Dra. Sâmara Martins (BA).

Referências

  1. Love JS, Yellen M, Melitas C, et al. Diagnosis and Management of Lemmel Syndrome: An Unusual Presentation and Literature Review. Case Rep Gastroenterol 2022; Dec 16;16(3):663-674. doi:10.1159/000528031.
  2. Battah A, Farouji I, DaCosta TR, et al. Lemmel’s Syndrome: A Rare Complication of Periampullary Diverticula. Cureus 2023; Mar 16;15(3):e36236. doi: 10.7759/cureus.36236.

Como citar este artigo

Martins S. e Logiudice FP. Endoscopia Terapeutica, 2024 vol I. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/assuntosgerais/sindrome-de-lemmel/