Drenagem ecoguiada da vesícula biliar na colecistite aguda: o que diz a literatura atual?
Introdução
A drenagem da vesícula biliar guiada por ecoendoscopia (EUS-GBD) tem emergido como uma alternativa minimamente invasiva para o manejo de pacientes com colecistite aguda com alto risco cirúrgico para a abordagem cirúrgica por colecistectomia, podendo também ser utilizada para internalização de drenagem percutânea em pacientes que não serão candidatos à abordagem cirúrgica1.
As principais técnicas de drenagem incluem o uso de stents metálicos autoexpansíveis, com destaque para a utilização do stent metálico com aposição de lúmens (LAMS) – clique aqui para saber mais sobre LAMS. Em casos que envolvam dificuldade de posicionamento, vesícula fibrótica ou presença de drenos percutâneos que dificultem a visualização da vesícula, o uso de fio guia pode trazer maior segurança ao procedimento.
A escolha da janela de drenagem é indicada com base na anatomia do paciente e na proximidade das estruturas, sendo a distância de 10 mm entre a parede do TGI e o lúmen da vesícula considerada segura. O acesso pode ser realizado pela janela transgástrica ou transduodenal, sendo que a primeira tem por vantagem a facilidade de acesso cirúrgico ao sítio de punção em caso de colecistectomia posterior, enquanto que o posicionamento no bulbo duodenal pode reduzir a ocorrência de migração da prótese e impactação alimentar. O posicionamento de próteses duplo pig tail no interior da LAMS pode mitigar a ocorrência de sangramento e impactação alimentar2.
Algumas contraindicações ao procedimento incluem a presença de coagulopatia significativa, perfuração da vesícula biliar, peritonite biliar e ascite volumosa1,2,3.
Resultados da literatura atual
Em comparação à drenagem percutânea, a EUS-GBD demonstra resultados que indicam vantagens, como menor risco de infecção e complicações pós-procedimento, podendo promover melhores resultados de longo prazo. Estudo randomizado multicêntrico com 80 pacientes, comparando as duas técnicas, demonstrou redução significativa de eventos adversos em um ano, reintervenções e internações hospitalares, com resultados similares em sucesso técnico, clínico e mortalidade4. Da mesma forma, uma metanálise abarcando 1155 pacientes em 11 estudos demonstrou menores eventos adversos, reintervenções e recorrência da colecistite na EUS-GBD com LAMS com eletrocautério acoplado, quando comparada à drenagem percutânea, porém, quando incluídos estudos com todos os modelos de próteses para EUS-GBD, não houve diferença estatística entre as abordagens5.
No que tange aos eventos adversos relacionados ao procedimento, os principais relatados envolvem obstrução ou deslocamento da prótese, peritonite, pneumoperitônio, abscesso e recorrência da colecistite. Em um estudo que realizou o seguimento dos pacientes ao longo de 3 anos a ocorrência de eventos adversos foi de 18%, 20% e 26% em cada ano, com recorrência de colangite em 4% dos casos6. Foi relatado ainda que os eventos sintomáticos relacionados à LAMS ocorriam principalmente no posicionamento gástrico em comparação ao duodenal6.
Podem também ocorrer eventos adversos intra-procedimento que envolvem sangramento, mal posicionamento ou deslocamento da prótese, perfuração e complicações cardiovasculares. Estes algumas vezes podem ser manejados por endoscopia com uso de métodos hemostáticos, reposicionamento ou colocação de novas próteses, mas por vezes podem requerer abordagem cirúrgica de urgência7.
A realização de colecistoscopia pode ser indicada após a resolução da colecistite aguda visando a remoção completa dos cálculos da vesícula biliar, nesta ocasião pode-se substituir a LAMS por prótese do modelo duplo pig tail. Outra abordagem, principalmente utilizada em pacientes de alto risco, é manter a LAMS, com realização de nova abordagem apenas caso necesário2.
Considerações finais
A EUS-GBD vem se tornando uma opção estabelecida no manejo de pacientes com colecistite aguda e alto risco cirúrgico, apresentando resultados favoráveis reportados na literatura. A adequada seleção de pacientes envolve abordagem multidisciplinar entre as equipes de endoscopia, radiologia intervencionista e cirurgia, devendo-se considerar fatores como comorbidades, potencial para abordagem cirúrgica posterior, características anatômicas e disponibilidade de profissionais e material.
Há tendência a escolha pela EUS-GBD em pacientes que não sejam bons candidatos à abordagens de repetição, presença de fatores de obstrução do ducto cístico e pacientes com múltiplos cálculos que possam se beneficiar da realização de colecistoscopia2
Referências
- Chan SM, Teoh AYB. Endoscopic Ultrasonography-Guided Gallbladder Drainage. Gastrointest Endosc Clin N Am. 2024 Jul;34(3):523-535.
- Irani SS, Sharzehi K, Siddiqui UD. AGA Clinical Practice Update on Role of EUS-Guided Gallbladder Drainage in Acute Cholecystitis: Commentary. Clin Gastroenterol Hepatol. 2023 May;21(5):1141-1147.
- Pawa S, Marya NB, Thiruvengadam NR, et al. American Society for Gastrointestinal Endoscopy guideline on the role of therapeutic EUS in the management of biliary tract disorders: summary and recommendations. Gastrointest Endosc. 2024 Jul 29:S0016-5107(24)00188-3.
- Teoh AYB, Kitano M, Itoi T , et al. Endosonography-guided gallbladder drainage versus percutaneous cholecystostomy in very high-risk surgical patients with acute cholecystitis: an international randomised multicentre controlled superiority trial (DRAC 1). Gut. 2020 Jun;69(6):1085-1091.
- Hemerly MC, de Moura DTH, do Monte Junior ES, et al. Endoscopic ultrasound (EUS)-guided cholecystostomy versus percutaneous cholecystostomy (PTC) in the management of acute cholecystitis in patients unfit for surgery: a systematic review and meta-analysis. Surg Endosc. 2023 Apr;37(4):2421-2438.
- Martinez-Moreno B, López-Roldán G, Martínez-Sempere J, et al. Long-term results after EUS gallbladder drainage in high-surgical-risk patients with acute cholecystitis: A 3-year follow-up registry. Endosc Int Open. 2023 Nov 10;11(11):E1063-E1068.
- Binda C, Anderloni A, Forti E, et al. EUS-Guided Gallbladder Drainage Using a Lumen-Apposing Metal Stent for Acute Cholecystitis: Results of a Nationwide Study with Long-Term Follow-Up. Diagnostics (Basel). 2024 Feb 13;14(4):413.
Como citar este artigo
Logiudice FP. Drenagem ecoguiada da vesícula biliar na colecistite aguda: o que diz a literatura atual?. endoscopia Terapeutica 2024, vol II. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/uncategorized/rascunho-automatico/