Caso clínico: síndrome de artéria mesenterica superior

Paciente, feminina, 20 anos, com diagnóstico de lúpus eritematoso sistêmico há 2 meses, em uso prednisona 40 mg/dia. Evoluiu com náuseas e vômitos refratários à terapia medicamentosa, associados à inapetência, desidratação e perda ponderal de 8 kg nesse período. Apresentava IMC 17.2 e hipocalemia ao exame laboratorial. Durante investigação, realizou tomografia de abdome (Figuras 1 e 2) com evidência de hiperdistensão gástrica, obstrução em 3ª porção duodenal e diminuição do ângulo aortomesentérico, tendo como principal suspeita diagnóstica a síndrome da artéria mesentérica superior. Realizou também enteroscopia (Figura 3), mostrando estase alimentar moderada e abaulamento pulsátil entre segunda e terceira porção duodenal, provocando redução da luz do órgão, achados que também eram compatíveis com a suspeita clínica inicial.

Análise comparativa entre tomografias de abdome realizadas com 21 dias de diferença, com redução do ângulo aortomesentérico provocando obstrução duodenal (direita). AMS: artéria mesentérica superior; AA: artéria aorta.

Figura 1: Análise comparativa entre tomografias de abdome realizadas com 21 dias de diferença, com redução do ângulo aortomesentérico provocando obstrução duodenal (direita). AMS: artéria mesentérica superior; AA: artéria aorta.

Hiperdistensão gástrica e obstrução em 3ª porção duodenal em tomografia de abdome.

Figura 2: Hiperdistensão gástrica e obstrução em 3ª porção duodenal em tomografia de abdome.

Enteroscopia - abaulamento entre segunda e terceira porção duodenal, provocando redução da luz do órgão.

Figura 3: Enteroscopia – abaulamento entre segunda e terceira porção duodenal, provocando redução da luz do órgão.

Após medidas clínicas para sintomas de obstrução intestinal alta – dieta zero, passagem de sonda nasogástrica sob aspiração, hidratação venosa, correção de distúrbios hidroeletrolíticos e otimização de antieméticos –, paciente evoluiu sem melhora dos sintomas, retornando o quadro de náuseas, vômitos e distensão abdominal.

Optado, então, por tratamento cirúrgico, sendo submetida à duodenojejunostomia videolaparoscópica. Cursou com plenitude pós-prandial e novos episódios eméticos no 2º dia do pós-operatório, sendo iniciadas medidas clínicas com passagem de sonda nasogástrica sob aspiração e, posteriormente, sendo iniciada dieta por sonda nasoenteral e nutrição parenteral total, porém paciente persistiu com sintomas obstrutivos.

Evoluiu com abdome agudo obstrutivo no 13º dia do pós-operatório, realizando laparotomia exploradora, que evidenciou anastomose duodenojejunal sanfonada com acotovelamento em alça eferente por bridas em mesocólon transverso, sendo realizada gastroenteroanastomose. Evoluiu com melhora clínica progressiva, resolução completa do quadro de vômitos e ganho gradativo de peso.

Síndrome da artéria mesentérica superior

A síndrome da artéria mesentérica superior (SAMS) é uma causa incomum de obstrução intestinal alta caracterizada pela compressão da terceira porção duodenal devido ao estreitamento do espaço entre a artéria mesentérica superior e a aorta. É também conhecida como síndrome de Wilkie, tendo sido descrita pela primeira vez em 1861 por Von Rokitansky [1].

Na maioria dos pacientes, o ângulo aortomesentérico mede entre 38° e 65°, podendo ser reduzido até 6° na SAMS, estando essa redução relacionada com o índice de massa corporal, sendo a perda significativa de peso o seu principal fator de risco [2,3].

Apresenta-se clinicamente com sintomas de obstrução intestinal alta, podendo o paciente cursar com dor epigástrica pós-prandial e saciedade precoce em quadros mais leves, há náuseas, vômitos biliosos e perda ponderal em casos mais severos. Para o diagnóstico, é necessário um alto índice de suspeição, visto que os sintomas são inespecíficos e pode fazer diagnóstico diferencial com outras causas de obstrução intestinal.

A realização de exames de imagem, como estudos contrastados, ultrassonografia, tomografia computadorizada, ressonância magnética e arteriografia, pode fornecer uma série de sinais compatíveis com a SAMS, como ângulo aortomesentérico 25° e afilamento abrupto na terceira porção duodenal com peristalse ativa [4,5,6].

O principal componente da terapia conservadora é o suporte nutricional, associado à descompressão gastrointestinal através da passagem de uma sonda nasogástrica e correção dos distúrbios hidroeletrolíticos. A nutrição parenteral total (NPT) pode ser necessária caso a alimentação enteral não seja uma opção [7]. Em caso de falha do tratamento conservador, a duodenojejunostomia laparoscópica é o procedimento cirúrgico mais utilizado e com resultados superiores às outras técnicas [8], entre elas, o procedimento de Strong e a gastrojejunostomia.

Existem poucos relatos de resultados a longo prazo no pós-cirúrgico de pacientes com SAMS. Uma série incluiu 16 pacientes que foram acompanhados sete anos após a cirurgia, sendo a perda ponderal corrigida em todos os pacientes, porém os sintomas praticamente se mantiveram, com exceção dos vômitos, que apresentaram diminuição significativa8. Em outra série, foram incluídos oito pacientes, com melhora dos sintomas, porém sem ganho significativo de peso [9].

Como citar este artigo

Amaral K, Medrado B. Caso clínico: síndrome de artéria mesenterica superior. Endoscopia Terapêutica; 2021. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/casosclinicos/caso-clinico-sindrome-arteria-mesenterica-superior/

Referências bibliográficas

  1. Cohen LB, et al. The Superior mesenteric artery syndrome. J Clin Gastr 1985; 7: 113-116.
  2. Derrick Jr. Anatomia cirúrgica da artéria mesentérica superior. Am Surg 1965; 31:545.
  3. Ozkurt H, Cenker MM, Bas N, et al. Medição da distância e ângulo entre a aorta e a artéria mesentérica superior: valores normais em diferentes categorias de IMC. Surg Radiol Anat 2007; 29:595.
  4. Cohen LB, Field SP, Sachar DB. A síndrome da artéria mesentérica superior. A doença que não é, ou é? J Clin Gastroenterol 1985; 7:113.
  5. Neri S, Signorelli SS, Mondati E, et al. Ultrassom de imagem no diagnóstico de síndrome arterial mesentérica superior. J Intern Med 2005; 257:346.
  6. Unal B, Aktaş A, Kemal G, et al. Síndrome da artéria mesentérica superior: TC e ultrassonografia. Diagn Interv Radiol 2005; 11:90.
  7. Munns SW, Morrissy RT, Golladay ES, McKenzie CN. Hiperalimentação para síndrome mesentérica superior (elenco) após correção da deformidade espinhal. J Bone Joint Surg Am 1984; 66:1175.
  8. Ylinen P, Kinnunen J, Höckerstedt K. Síndrome da artéria mesentórica superior. Um estudo de acompanhamento de 16 pacientes operados. J Clin Gastroenterol 1989; 11:386.
  9. Merrett ND, Wilson RB, Cosman P, Biankin AV. Síndrome da artéria mesentérica superior: estratégias de diagnóstico e tratamento. J Gastrointest Surg 2009; 13:287.

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Caso clínico: ressecção endoscópica de parede total

Mulher, 76 anos, apresentando sintomas dispépticos. Endoscopia digestiva alta revelou lesão subepitelial bulbar (figura 1).

Ressecção endoscópica de parede total Figura 1 – Lesão submucosa

Figura 1: lesão submucosa

Realizada ecoendoscopia (figura 2) com evidência de uma lesão hipoecoica, homogênea, com limites bem definidos, medindo 1,5 cm, inserida na camada muscular própria, em que a punção aspirativa com agulha de biópsia (Acquire, Boston Scientific, USA) mostrou células fusiformes com positividade para c-kit no imunohistoquímico, compatível com tumor estromal gastrointestinal (GIST).

Ressecção endoscópica de parede total Figura 2 – Ecoendoscopia

Figura 2: ecoendoscopia

Procedimento

A lesão foi removida por ressecção endoscópica de espessura total com auxílio do dispositivo Padlock para aparelhos de maior calibre (Padlock Clip Pro-Select® Defect Closure Device, Steris), sendo usado um colonoscópio para aplicação do clipe (figura 3), com posterior ressecção da lesão e da parede total com alça diatérmica monofilamentar (25 mm, Mediglobe) (figura 4). A revisão do leito de ressecção (figura 5) mostrou sítio bem coaptado pelo clipe. Paciente evoluiu assintomática e recebeu alta no dia seguinte.

O anatomopatológico da lesão evidenciou o GIST, com índice mitótico nulo, G1 (baixo grau) e margens livres.

Materiais utilizados

  • Agulha de punção ecoendoscópica Acquire, Boston Scientific;
  • Padlock Clip Pro-Select® Defect Closure Device, Steris;
  • Alça monofilamentar 25 mm, Mediglobe.

Ressecção endoscópica de parede total Figura 3 – Colocação de Padlock

Figura 3: colocação de Padlock

Ressecção endoscópica de parede total Figura 4 – Exerese da lesão

Figura 4: exérese da lesão

Ressecção endoscópica de parede total Figura 5 – Exerese da lesão

Figura 5: exérese da lesão

Ressecção endoscópica de parede total Figura 6 – Lesão totalmente ressecada

Figura 6: lesão totalmente ressecada

Endoscopia de controle um mês após mostrou o clipe ainda no leito de ressecção, que apresentava bom aspecto.

Ressecção endoscópica de parede total Figura 7 – Controle tardio

Figura 7: controle tardio

Discussão

A técnica de ressecção endoscópica de espessura total (full thickness endoscopic resection) permite o tratamento definitivo de lesões envolvendo camadas mais profundas do trato gastrointestinal.

O clipe Padlock é um novo dispositivo da categoria de clipe over-the-scope que foi introduzido recentemente e que permite a apreensão total da parede do trato digestivo, tendo sido empregado com segurança para ressecção de lesões subepiteliais medindo até 1,5 cm. Lesões maiores que 1,5 cm podem apresentar dificuldade para serem aspiradas para dentro do cap antes da liberação do clipe. Em nosso caso, utilizamos o Padlock de colonoscopia por apresentar maior eixo longitudinal, que permitiria maior espaço para acomodar a lesão em seu interior. Houve leve dificuldade para passagem do dispositivo pelo cricofaríngeo, mas sem intercorrências.

Em conclusão, a ressecção endoscópica de parede total pode ser uma possibilidade terapêutica segura e curativa para casos selecionados de GIST do trato gastrointestinal.

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Como citar este artigo

Franco M. Caso Clínico: Ressecção endoscópica de parede total. Endoscopia Terapêutica; 2021. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/casosclinicos/caso-clinico-resseccao-endoscopica-de-parede-total/

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Uso de adesivos tissulares para fechamento de fístulas do trato digestivo

A fístula enterocutânea é definida como uma comunicação do trato gastrointestinal com a pele ou em ferida aberta (fístula enteroatmosférica). Em mais de 2/3 dos casos, elas decorrem de manipulação cirúrgica prévia (recentemente também associada a procedimentos endoscópicos terapêuticos), com mortalidade global de 15-25% [1]. É uma condição de alta morbidade, usualmente necessitando de internação prolongada. O tratamento das fístulas gastrointestinais requer um manejo multidisciplinar, indo desde o diagnóstico (clínico ou por imagem), controle de infecção, nutrição, avaliação para necessidade de drenagem de coleções até a escolha do melhor método de intervenção para o seu fechamento.

As fístulas enterocutâneas podem ser classificadas em superficiais (trajeto curto-menores que 2 cm de extensão ou labiadas) ou profundas (trajeto longo) e com alto (acima de 500 mL/24 horas) ou baixo débito (abaixo de 200 mL/24 horas). Fatores como obstrução distal, presença de coleções/cavitações com abscesso, desnutrição importante, neoplasia e irradiação prévia estão associados a menor chance de fechamento da fístula.

Sempre que possível, o tratamento minimamente invasivo é a primeira escolha, mas, em casos de fístulas com contaminação grosseira de cavidades, septicemia e/ou instabilidade hemodinâmica ou fístulas atmosféricas labiadas (intestino exposto com evisceração), a abordagem cirúrgica deve ser considerada. Para fístulas com orifício interno pequeno (abaixo de 5 mm) e baixo débito, o uso de selantes deve ser considerado como primeira alternativa.

O uso de selante injetado por meio endoscópico foi descrito pela primeira vez em 1990, quando Eleftheriadis et al reportaram o uso de cola de fibrina para tratamento de fístulas enterocutâneas [3].

Desde então, várias técnicas de tratamento de fístulas gastrointestinais foram desenvolvidas, com ótimos resultados no manejo dessas complicações. Em 2015, o mesmo grupo grego publicou série de 25 anos de experiência do uso de selantes (fibrina e cianoacrilato) em 63 pacientes, com sucesso clínico e técnico de 96,8%, a maior série institucional reportada até o momento [4].

O uso de selantes para o fechamento de fístulas gastrointestinais consiste na injeção de uma substância líquida biocompatível com capacidade de solidificação dentro do trajeto fistuloso. Essa técnica requer, portanto, o uso de um cateter fino dentro do trajeto fistuloso, este usualmente inserido com auxílio de fio-guia. A injeção pode ocorrer a partir do orifício interno (endoscópico) e externo (percutâneo). A injeção de selantes por cateter no trajeto fistuloso é uma técnica muito segura com risco muito baixo, usualmente relacionados à reação ao agente selante (ex. aprotinina bovina – cola de fibrina) ou ao risco anestésico do próprio ato endoscópico. Os raros relatos de embolia aérea estão relacionados ao uso concomitante de fistuloscopia (introdução do endoscópio por dentro do trajeto fistuloso e insuflação aérea). O uso de cianoacrilato em grande quantidade no trajeto fistuloso pode teoricamente originar infecção e reação de corpo estranho, como visto em uso para colagem de tela sintética para tratamento de hérnias inguinais.

Para a aplicação dos selantes, recomenda-se realizar escarificação do trajeto fistuloso com intuito de aumentar a resposta inflamatória e consequente retração cicatricial. Isso pode ser feito com uso de uma escova de citologia biliar e coagulação com plasma de argônio em baixa potência. O uso de selantes pode ser combinado com próteses digestivas ou sutura endoscópica [5], para garantir selamento ou mesmo telas biológicas servindo como matriz/ancoragem [6].

O cianoacrilato e a cola de fibrina se destacam entre os selantes tissulares comercialmente disponíveis no Brasil, com características biológicas distintas. Existem outros materiais utilizados como selantes cirúrgicos, como a mistura de albumina/gluraldeído, cujos resultados preliminares na utilização em fechamento de fístulas perianais foram associados à sepse perineal [7].

A cola de fibrina possui a vantagem de ser facilmente reabsorvível, porém, mediante contato de secreções digestivas, ela pode se dissolver precocemente antes que ocorra a cicatrização do trajeto. Os dois componentes principais da cola de fibrina são o fibrinogênio humano reconstituído com aprotinina bovina sintética e a trombina reconstituída com cloridrato cálcio, que, quando misturados, formam um coágulo de fibrina (em um processo semelhante à coagulação sanguínea). O mecanismo de ação da cola de fibrina é bloquear a passagem do conteúdo gastrointestinal e promover reparo cicatricial através de migração celular local e angiogênese com proliferação fibroblástica e de queratinócitos. A cola de fibrina possui também propriedades hemostáticas, sendo utilizada em tratamento de hemorragia digestiva por injeção direta [7].

Para aplicação de cola de fibrina no trajeto fistuloso, idealmente deve-se realizar infusão através de mecanismo de dupla seringa para evitar solidificação do mesmo no trajeto. Os kits comerciais disponíveis no Brasil possuem um conector em Y junto à saída da seringa e um cateter lúmen único curto com finalidade para injeção em campo cirúrgico ou percutâneo. O uso de fibrina por via endoscópica requer um cateter longo, sendo necessária a utilização de um cateter coaxial com lúmen bipartido ou duplo-lúmen em paralelo (este fabricado de forma caseira como alternativa) para que a mistura dos componentes ocorra em sua extremidade, evitando-se a solidificação da mesma no trajeto (FIGURA 1). O cateter com lúmen bipartido possui um calibre menor (existem modelos comerciais a partir de 1.9 mm, não disponíveis no Brasil) comparado ao alinhamento caseiro de 2 cateteres. Outra dificuldade na utilização de um cateter longo é a extrusão de todo o componente retido no cateter, visto que o volume utilizado é pequeno – lembramos que uma agulha de 23G (1.9Fr) com 180 cm de comprimento pode reter mais de 2 mL de líquido em seu interior. A diferença de viscosidade das duas soluções pode levar a velocidades de infusão diferentes; deve-se atentar ao tipo de seringa utilizado com intuito de se atingir a proporção de injeção de 1:1. O uso de gás carbônico facilita a extrusão do material.

 

cateter fibrina corte longitudinal e transversa

Figura 1 – cateter fibrina corte longitudinal e transversal

Figura 3 – Dispositivo para injeção de gás carbônico a ser utilizado para injeção de cola de fibrina (extraído de www.nordsonmedical.com) O uso de cola de fibrina humana autóloga com a centrifugação do soro do próprio paciente para obtenção de cola de fibrina foi utilizado em 2 casos de fístula esofágica, com sucesso [8]. Nesses casos, a injeção é realizada na submucosa ao redor da fístula com agulha. No Brasil, não dispomos de cateter duplo-lúmen coaxial endoscópico para uso comercial. Para fabricar de forma caseira um cateter duplo-lúmen, podem-se utilizar 2 cateteres de colangiografia finos (a partir de 4Fr) ou 2 bainhas de cateter de injeção endoscópica de 23G (retiradas as agulhas e remontado o cateter), alinhados paralelamente (FIGURA 2). Essa última opção tem sido nossa preferência devido ao custo (FIGURA 3). Deve-se atentar ao calibre obtido, pois o seu uso requer um canal de trabalho terapêutico (a partir de 3.8 mm). Na falta de um cateter duplo-lúmen, outra opção descrita é realizar a injeção sequencial através de um cateter com lúmen único. O uso de cateter de colangiografia duplo lúmen de troca rápida não deve ser utilizado pelo risco de vazamento lateral [9].

Cateter injetor para cola de fibrina fabricado a partir de bainha de agulha injetora para endoscopia, dispostos paralelamente

Figura 2 – Cateter injetor para cola de fibrina fabricado a partir de bainha de agulha injetora para endoscopia, dispostos paralelamente

Cateter injetor para cola de fibrina fabricado a partir de bainha de agulha injetora para endoscopia, dispostos paralelamente. Detalhe – fixador de cateter

Figura 3 – Cateter injetor para cola de fibrina fabricado a partir de bainha de agulha injetora para endoscopia, dispostos paralelamente. Detalhe – fixador de cateter

Para uso em endoscopia, o cianoacrilato apresenta-se em 2 fórmulas [10]: o N-butil 2-cianoacrilato, também conhecido como embucrilato e comercializado no Brasil como Histoacryl (B. Braun Medical, Bethlehem, PA). O ocrilato, por sua vez, possui 8 carbonos em sua fórmula (2-octyl cyanoacrylate) e é comercializado no Brasil como Dermabond (Johnson & Johnson, New Bruns- wick, NJ). O Glubran 2 (GEM, Viareggio, Italy) contém metacriloxi sulfalano, o qual aumenta o tempo de polimerização e reduz a produção de calor reacional. O lipiodol é recomendado para utilização de mistura com enbucrilato na proporção de 1:1 a 1:1.6, com a vantagem de reduzir o tempo de polimerização e permitir visualização radiológica. Após injeção, a lavagem do cateter deve ser feita com água destilada. Ambas as versões farmacológicas de ocrilato não requerem uso de lipiodol e podem ser lavadas com solução salina fisiológica. As técnicas de injeção são as mesmas recomendadas para tratamento de varizes gástricas, com a diferença de a injeção ser por meio de um cateter dentro do trajeto da fístula.

Descrevemos um caso em que foi usada terapia a vácuo e colagem de fibrina por via endoscópica com sucesso como modalidade terapêutica para fístula traqueoesofágica pós esofagectomia.

O desenvolvimento de fístula traqueoesofágica (TE) é uma rara complicação associada a uma alta mortalidade em pacientes submetidos à esofagectomia. Estudos mostram que, caso a fístula TE não tenha cicatrização dentro de um período de 4 a 6 semanas, o tratamento conservador deve ser abandonado. Opções de tratamento hoje dependem de condições, como vascularização do conduto gástrico, a gravidade da pneumonia aspirativa e o volume do vazamento de ar, e usualmente podem incluir tanto intervenção cirúrgica com uso de retalhos como endoscópica com colocação de prótese intraluminal. Em outubro 2019, um indivíduo do sexo masculino de 53 anos com quadro de disfagia, astenia e emagrecimento apresentou diagnóstico de carcinoma escamocelular em esôfago distal, moderadamente diferenciado, invasor (EC III). Entre novembro e dezembro de 2019, fez tratamento neoadjuvante com quimioterapia e radioterapia (cross trial). Após exames de re-estadiamento, foi optado por esofagectomia total em 3 campos com acesso torácico por videocirurgia e reconstrução utilizando tubo gástrico em janeiro de 2020.

O pós-operatório (PO) se deu em UTI, sem necessidade de ventilação mecânica e em boas condições hemodinâmicas, com uso de baixas doses de drogas vasoativas. No 4º dia PO, o dreno em região cervical demonstrou alto débito de aspecto bilioso, sendo indicada tomografia de tórax, que visualizou uma coleção pequena entre tubo gástrico e traqueia com pequena quantidade de ar, derrame pleural à esquerda com focos de consolidação e pequeno pneumotórax. No 12º PO, iniciou com instabilidade hemodinâmica associada a desconforto respiratório e saída de ar pela ferida cervical, com necessidade de intubação orotraqueal e estabilização em UTI. Uma fibrobroncoscopia diagnóstica revelou traqueobronquite aguda leve com secreção purulenta abundante à esquerda e presença de fístula traqueomediastinal em traqueia distal, sendo realizada reabordagem cirúrgica com enxerto bovino para fechamento da mesma, sem sucesso. Após tratamento conservador com jejum e nutrição parenteral por 18 dias, sem melhora significativa do quadro, foi optado por intervenção endoscópica com terapia a vácuo. Realizou tratamento endoscópico por terapia utilizando pressão negativa (vácuo) intraluminal esofágico por 3 semanas, com trocas e reavaliações periódicas (a cada 5 dias), até redução significativa do orifício fistuloso (FIGURA 4). Em abril de 2020, realizou exame contrastado deglutido, o qual evidenciou pequeno trajeto fistuloso. Foi submetido à nova abordagem endoscópica com injeção de cola de fibrina (FIGURA 5), recebendo alta 1 semana após. Em retorno em agosto de 2021, o paciente referiu melhora clínica, sem queixas de disfagia ou respiratórias, e exames contrastado e endoscópico revelaram fechamento completo da fístula (FIGURA 6).

Orifício fistuloso em anastomose esôfago-gástrica puntiforme, com comunicação traqueal

Figura 4 – Orifício fistuloso em anastomose esôfago-gástrica puntiforme, com comunicação traqueal

Orifício fistuloso em anastomose esôfago-gástrica após injeção de cola de fibrina

Figura 5 – Orifício fistuloso em anastomose esôfago-gástrica após injeção de cola de fibrina

Anastomose esôfago-gástrica pérvia e ampla, sem solução de continuidade

Figura 6 – Anastomose esôfago-gástrica prévia e ampla, sem solução de continuidade

Autores

Eduardo A. Bonin*

Larissa M. S. Gomide*

Bruno Verschoor*

Ricardo S. de Bem*

Leticia Rosevics*

Bruna S. Fossati*

* Serviço de Endoscopia Digestiva, Hospital de Clínicas (UFPR)

Ilustrações

Rodrigo R. Tonan

Como citar este artigo

Bonin EA, Gomide LMS, Verschoor B, Bem RS, Rosevics L, Fossati BS. Uso de adesivos tissulares para fechamento de fístulas do trato digestivo. Endoscopia Terapêutica; 2021. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/assuntosgerais/uso-de-adesivos-tissulares-para-fechamento-de-fistulas-do-trato-digestivo/

Referências

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  2. Bhurwal A, Mutneja H, Tawadross A, Pioppo L, Brahmbhatt B. Gastrointestinal fistula endoscopic closure techniques. Ann Gastroenterol. 2020;33(6):554-562.
  3. Eleftheriadis E, Tzartinoglou E, Kotzampassi K, Aletras H. Early endoscopic fibrin sealing of high-output postoperative enterocutaneous fistulas. Acta Chir Scand. 1990 Sep;156(9):625-8.
  4. Kotzampassi K, Eleftheriadis E. Tissue sealants in endoscopic applications for anastomotic leakage during a 25-year period. Surgery. 2015 Jan;157(1):79-86.
  5. Bonin EA, Wong Kee Song LM, Gostout ZS, Bingener J, Gostout CJ. Closure of a persistent esophagopleural fistula assisted by a novel endoscopic suturing system. Endoscopy. 2012;44 Suppl 2 UCTN:E8-9.
  6. Abbas MA, Tejirian T. Bioglue for the treatment of anal fistula is associated with acute anal sepsis. Dis Colon Rectum. 2008 Jul;51(7):1155; author reply 1156.
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  8. Iwase H, Kusugamf K, Tuzuki T, Suga S, Furuta R, Nakamura M, Funaki Y, Honjyo T, Kojima K, Maeda O. Endoscopic Fibrin Glue Injection with Coaxial Double Lumen Needle for Severe Upper Gastrointestinal Bleeding. Dig Endosc. 1998 Oct;10(4):335-342.
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  10. Kumar N, Larsen MC, Thompson CC. Endoscopic Management of Gastrointestinal Fistulae. Gastroenterol Hepatol (N Y). 2014;10(8):495-452.
  11. Cameron R, Binmoeller KF. Cyanoacrylate applications in the GI tract. Gastrointest Endosc. 2013 Jun;77(6):846-57.

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Esofagite herpética em paciente imunocompetente: um relato de caso

Autores: Nathan Uehara Lira; Leonardo Oba; Clóvis Kuwahara; Ricardo Papi; Maria Fernanda Luchetti; Carina Fava; Isabelle Kristal.

Em geral, a infecção esofagiana pelo HSV pode ser consequência de vários eventos: contaminação pela orofaringe; reativação do vírus; disseminação para mucosa esofágica por meio do nervo vago.

Em pacientes imunocompetentes, a infecção é autolimitada. As principais manifestações clínicas são: disfagia e odinofagia (85%), dor torácica (68%) e febre (44%). Também foram descritos náuseas e vômitos em 15% dos casos e associações com lesões orais em 29%. Há também relatos de hemorragia digestiva (5,3%).

Ao exame endoscópico, as lesões esofágicas pelo HVS são localizadas no terço distal (50%), podendo ser encontradas em outros setores ou eventualmente serem difusas (32%). Inicialmente, apresentam-se como vesículas, medindo de 1 a 3 mm, localizadas principalmente em terço médio e distal do esôfago, podendo haver descamação com formação de pequenas úlceras de 1 a 3mm, que podem ser descritas como superficiais ou estelares com fundo eritematoso, edema ou eritema. Existem também algumas formas especiais com aspecto de vulcão. Eventualmente, é observada a presença de pseudomembranas, lembrando candidíase esofágica. As úlceras herpéticas podem evoluir com estenoses ou fístulas. As margens das úlceras devem ser biopsiadas ou pode ser realizado um escovado para citologia.

Descrição do caso

Paciente masculino, 19 anos, vem ao consultório apresentando queixas de epigastralgia e disfagia para sólidos e líquidos com início há dois dias. Apresentou um episódio de vômitos com vestígios hemáticos. Sem febre. Estava em uso de azitromicina e prednisona para tratamento de uma faringite.

Após a consulta, foi solicitada uma endoscopia, na qual visualizamos estas imagens:

Imagem de esofagite herpéticaImagem de esofagite herpética

Coletadas biópsias das bordas das lesões.

Anatomopatológico: esofagite crônica, moderada e erosiva, com presença de inclusões nucleares com características de herpes.

Conclusão

Esofagite herpética é uma alteração rara de ser encontrada em pacientes imunocompetentes, e seu diagnóstico depende de uma endoscopia digestiva alta com coleta de material para biópsia. O tratamento é realizado com aciclovir, e alguns artigos citam apenas tratamento de suporte por ser uma infecção autolimitada. Então, é muito importante que os endoscopistas tenham conhecimento da condição, não deixando passar seu diagnóstico e evitando assim suas possíveis complicações.

Como citar este artigo

Lira NU., Oba L., Kuwahara C., Papi R., Luchetti MF., Fava C., Kristal I. Esofagite herpética em paciente imunocompetente: um relato de caso. Endoscopia Terapêutica; 2021. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/casosclinicos/esofagite-herpetica-em-paciente-imunocompetente-um-relato-de-caso

Confira também: Esofagite por cândida – Kodsi

Bibliografia

  1. SAKAI, Paulo. Tratado de Endoscopia Digestiva Diagnóstica e Terapêutica. 3ª Edição. Editora Atheneu.
  2. PINHEIRO, Mariana. Herpetic Esophagitis: A diagnosis to remember. Birth and Grow Medical Journal. Volume 24 Nº1. 2015.
  3. MENDES, Lucas Corrêia. Esofagite herpética em criança imunocompetente. The Brazilian Journal of Infectious diseases. Volume 25. 2021.

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Caso clínico: tratamento de fístula de gastroenteroanastomose pós-bypass gástrico em Y de Roux

Apresentamos o caso de um paciente submetido à gastroplastia redutora – bypass gástrico em Y de Roux – complicada com fístula aguda de gastroenteroanastomose, em que a opção de tratamento escolhida foi a terapia endoscópica a vácuo.

 




Caso clínico: tratamento endoscópico da hemorragia digestiva não varicosa

Autores:

Rafael William Noda

Guilherme Gomes

Thienes Maria Costa Lima

Paciente feminino, 78 anos, entrada no PS com melena há 4 dias e sinais de choque hipovolêmico (PA 110/50 e 110 bpm, palidez cutânea mucosa). Em uso, há 10 dias, de AINEs por tratamento dentário.

Comorbidades – HAS e DM sem uso de antiagregantes ou anticoagulantes.

Admitida em UTI para reanimação e realizada EDA 12 horas após a admissão.

Realizada EDA no setor de endoscopia com a paciente estável e sem IOT.

Revelou úlcera duodenal rasa em atividade com vaso visível e sangramento ativo em porejamento (Classificação de Forrest – IB).

Realizadas injeção de 8 ml de solução de adrenalina com glicose 50% (1:10000) e colocação de dois clipes com parada do sangramento.

Paciente evolui estável sem sinais de novo sangramento e realizou EDA 4 dias após para avaliação de todo o estômago antes da alta (no 1º exame, o estômago estava com coágulo) – clipes bem posicionados e sem estigmas de sangramento ativo ou recente.

Legenda: clipes bem posicionados no bulbo duodenal, sem sinais de ressangramento.

Tool Box

  • Agulha Interject 23 g – Boston
  • Clipes Resolution 360 – Boston
  • Gastroscópio EG 500 – Sonoscape

Guideline 2021 da ESGE recomenda

O uso do Glasgow – Blatchford Score (GBS) para estratificação de risco antes da endoscopia (se o Score <= 1, pode realizar endoscopia ambulatorial).

Endoscopia em até 24 horas após medidas de reanimação (não recomenda antes de 12 horas).

Infusão de IBP EV em bolus (80mg) e depois infusão contínua de 8mg/hora por 72 horas após a endoscopia.

Terapia endoscópica dupla – injeção de adrenalina associada a método térmico ou mecânico.

  • Pacientes em uso de anticoagulantes, preferencialmente, iniciar o seu uso novamente só após 7 dias do evento hemorrágico;
  • Em pacientes com sangramento refratário aos métodos endoscópicos tradicionais pode ser considerado o uso de agentes tópicos (hemospray – Cook) ou clip montado sob cap (Padlock – Steris).

Como citar este artigo

Noda RW, Gomes G, Lima TMC. Caso clínico – tratamento endoscópico da hemorragia digestiva não varicosa. Endoscopia Terapêutica; 2021. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/casosclinicos/caso-clinico-tratamento-endoscopico-da-hemorragia-digestiva-nao-varicosa

Referências

  1. Endoscopic diagnosis and management of nonvariceal upper gastrointestinal hemorrhage (NVUGIH): European Society of Gastrointestinal Endoscopy (ESGE) Guideline – Update 2021. Endoscopy 2021; 53: 300–332

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Caso clínico: carcinoma neuroendócrino de esôfago

Relato de caso

Homem, 45 anos, com antecedente de etilismo e tabagismo, vinha em acompanhamento com a oncologia após mandibulectomia com esvaziamento cervical por CEC (pT4a N2c), seguida de quimioterapia e radioterapia adjuvantes. No acompanhamento, cerca de 9 meses após cirurgia, PET-CT revelou captação em região esofágica média com linfonodo adjacente, além de múltiplos nódulos hepáticos (imagens abaixo).

Solicitada endoscopia, fotos abaixo:

Carcinoma Neuroendócrino de EsôfagoCarcinoma Neuroendócrino de Esôfago

Carcinoma Neuroendócrino de Esôfago

Carcinoma Neuroendócrino de Esôfago

Carcinoma Neuroendócrino de EsôfagoCarcinoma Neuroendócrino de EsôfagoCarcinoma Neuroendócrino de Esôfago

A endoscopia revelou lesão plano-elevada em esôfago médio medindo cerca de 3 cm, com acometimento de 50% da circunferência do órgão, com intensa irregularidade da vascularização e da superfície mucosa à magnificação com NBI e sendo uma lesão iodo-negativa à cromoscopia com lugol (2%). Biópsias revelaram carcinoma neuroendócrino predominantemente de pequenas células, com Ki-67 de 50%. Ademais, biópsia de nódulo hepático também exibiu carcinoma neuroendócrino de pequenas células com Ki-67 de 70%. Logo, comprovada a existência de 2º tumor primário, o carcinoma neuroendócrino de pequenas células no esôfago de alto grau metastático para o fígado. Paciente foi encaminhado para acompanhamento com oncologia.

Discussão/Conclusões

Tumores neuroendócrinos (TNE) são neoplasias heterogêneas por apresentarem características histológicas diversificadas e apresentações clínicas variadas. Apesar da relativa raridade, houve um aumento da incidência nos últimos anos, justificada, principalmente, pela melhora dos métodos diagnósticos. A maioria dos carcinomas neuroendócrinos de pequenas células são advindas do pulmão, sendo as apresentações extrapulmonares mais raras.

O carcinoma neuroendócrino de pequenas células do esôfago é um tipo raro de neoplasia, caracterizado por apresentar comportamento agressivo e por mau prognóstico, evoluindo com metástases e, por conseguinte, com sobrevida estimada em meses. Por serem extremamente incomuns, há poucas publicações sobre o tema.

Como citar este artigo

Ruiz RF. Caso clínico: Carcinoma Neuroendócrino de Esôfago. Endoscopia Terapêutica; 2021. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/casosclinicos/caso-clinico-carcinoma-neuroendocrino-de-esofago

Referências bibliográficas

  1. KANEKO, Yuki et al. Neuroendocrine carcinoma of the esophagus with an adenocarcinoma component. Clinical journal of gastroenterology, p. 1-5, 2019.
  2. KIM, Kyeong-Ok et al. Clinical overview of extrapulmonary small cell carcinoma. Journal of Korean medical science, v. 21, n. 5, p. 833-837, 2006.
  3. RINDI, Guido et al. A common classification framework for neuroendocrine neoplasms: an International Agency for Research on Cancer (IARC) and World Health Organization (WHO) expert consensus proposal. Modern Pathology, v. 31, n. 12, p. 1770, 2018.
  4. SCHIZAS, Dimitrios et al. Neuroendocrine Tumors of the Esophagus: State of the Art in Diagnostic and Therapeutic Management. Journal of gastrointestinal cancer, v. 48, n. 4, p. 299-304, 2017.
  5. WU, Zhu et al. Primary small cell carcinoma of esophagus: report of 9 cases and review of literature. World journal of gastroenterology: WJG, v. 10, n. 24, p. 3680, 2004.

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Caso clínico – mucormicose gástrica

Paciente masculino, 62 anos, sem comorbidades, vítima de ferimento por projétil de arma de fogo (PAF) em membro superior direito e hemitórax, submetido à toracotomia direita e à laparotomia com rafias diafragmática e hepática, sem intercorrências. Evoluiu com episódios de vômitos com rajas de sangue no pós-operatório, sendo realizada endoscopia para investigação diagnóstica.

Identificadas as seguintes imagens:

Mucormicose gástricaMucormicose gástricaMucormicose gástricaMucormicose gástrica

Realizadas biópsias que evidenciaram numerosas hifas fúngicas sugestivas de mucormicose.

Introduzido anfotericina B lipossomal e, após seis dias, foi realizada cirurgia para ressecção em cunha da lesão. Foi feita uma endoscopia intraoperatória que revelou considerável melhora no aspecto da lesão.

Mucormicose gástricaMucormicose gástrica

Revisão

A mucormicose é uma infecção fúngica oportunista, potencialmente fatal, causada por fungos da ordem Mucorales. Ocorre mais comumente em pacientes imunocomprometidos, como em diabéticos descompensados (principal fator de risco), queimados, desnutridos, com neoplasias hematológicas, transplantados, em uso de corticoesteroides, com insuficiência renal, uso de antifúngicos, terapia com desferroxamina, antibioticoterapia de amplo espectro, consumo de drogas intravenosas e ruptura cutânea traumática, como na perfuração por arma de fogo. No entanto, nos últimos anos, a doença também tem sido cada vez mais descrita em pacientes imunocompetentes.

Sua apresentação clínica é heterogênea, variando de acordo com o sítio da infecção. As formas mais frequentes são: seios da face (39%), pulmonar (24%), cutâneo (19%), cerebral (9%), gastrointestinal (7%), disseminada (3%) e renal (2%).

A mucormicose gastrointestinal é rara, e as manifestações variam desde a colonização de úlceras pépticas à doença infiltrativa com invasão e disseminação vascular. No envolvimento gastrointestinal, o órgão mais frequentemente comprometido é o estômago (58%), seguido pelo cólon (32%), intestino delgado e esôfago. Acarreta uma taxa de mortalidade significativa, alcançando até 85%, isso devido ao atraso no diagnóstico e a complicações, como perfuração e sangramento maciço. Na endoscopia, geralmente, pode-se observar úlcera solitária ou múltiplas, recobertas por tecido necrótico. O diagnóstico é confirmado histopatologicamente com base na biópsia da área suspeita durante cirurgia ou endoscopia.

Ainda não está claro como os Mucorales colonizam e invadem o trato gastrointestinal, mas alguns autores sugerem a ingestão de alimentos, como leite fermentado, produtos de panificação e mingaus fermentados, bebidas alcoólicas preparadas do milho, medicamentos fitoterápicos e homeopáticos, contendo esporos desse patógeno.

O manejo bem-sucedido da mucormicose inclui suporte metabólico agressivo, terapia antifúngica com anfotericina B ou posaconazol e desbridamento cirúrgico de todos os tecidos envolvidos com necrose. A duração do tratamento é individualizada, mas, geralmente, é mantida por 4 a 6 semanas.

Como citar este artigo:

Fagundes M. Caso Clínico – Mucormicose gástrica. Endoscopia Terapêutica; 2021. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/casosclinicos/caso-clinico-mucormicose-gastrica/

Referências bibliográficas:

  1. Abreu, BFBB et al. A rare case of gastric mucormycosis in an immunocompetent patient. Rev Soc Bras Med Trop 51(3):401-402, May-June, 2018.
  2. Kaur, H, et al. Gastrointestinal mucormycosis in apparently immunocompetent hosts—A review. Mycoses. May 2018.
  3. Spellberg, B, et al. Gastrointestinal Mucormycosis: An Evolving

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Caso Clínico – Corpo Estranho em Cólon

Relato do caso:

Paciente do sexo feminino, 75 anos, deu entrada no PS por dor abdominal em flanco esquerdo há cerca de 20 dias, hiporexia, perda ponderal de 5 kg, astenia e febre. Antecedentes: DRGE. Em uso de omeprazol e domperidona. Ao exame físico: bom estado geral, afebril, eupneica. PA: 130 x 70, FC: 110 bpm. Abdome: globoso, flácido, doloroso à palpação profunda em flanco e fossa ilíaca esquerda. DB negativo. RHA +.

RX de abdome: Ausência de sinais de pneumoperitônio, mas com distensão de alças colônicas.

RX de abdome corpo estranho em cólon

 

TC de abdome: Material hiperatenuante alongado na topografia de sigmoide associada à densificação da gordura sugerindo processo inflamatório (microperfuração). Não identificado pneumoperitônio.

TC de abdome corpo estranho em cólon

 

Optado por realizar colonoscopia que evidenciou um corpo estranho (osso de galinha) em sigmoide transfixando a parede colônica em suas duas extremidades com presença de processo inflamatório local (hiperemia e secreção purulenta), além de inúmeros óstios diverticulares. Optado por mobilizar o osso com pinça de corpo estranho (tipo “jacaré”) para o interior da luz colônica e, consequentemente, deslocamento da outra extremidade. Realizada a retirada sem intercorrências. Optado por colocação de hemoclipes em cada leito. Paciente teve alta após 48h, com melhora da dor abdominal, sem febre e boa aceitação de dieta VO.

colonoscopia corpo estranho em cólon colonoscopia corpo estranho em cólon colonoscopia corpo estranho em cólon

colonoscopia corpo estranho em cólon

Discussão:

A ingestão acidental de corpo estranho é um problema frequente em atendimentos de emergência. Felizmente, em apenas 1% dos casos ocorre perfuração em alguma porção do trato gastrointestinal. Os corpos estranhos alongados e pontiagudos (palito de dente, espinha de peixe e osso de galinha) são os que estão mais associados à perfuração, sendo o intestino delgado o local mais frequente. O diagnóstico, geralmente, é tardio e a ingestão do corpo estranho não é relatada pelo paciente. Idosos, usuários de dentaduras, alcoólatras e pacientes psiquiátricos são a população mais predisposta.

A radiografia convencional tem sensibilidade diminuída para a maioria dos corpos estranhos. A tomografia de abdome tem melhor sensibilidade e acurácia para corpos estranhos calcificados e não calcificados.

A perfuração é consequente à impactação e erosão progressiva do corpo estranho contra a parede intestinal. O pneumoperitônio não é comum por conta de o local da perfuração ser recoberto por fibrina, omento e outras alças intestinais, o que limita a passagem de grande quantidade de gás para a cavidade peritoneal.

O tratamento endoscópico vs cirúrgico vai depender da presença de complicações (perfurações com abscesso intracavitário, fístulas), mas, frequentemente, tende a ser conservador (endoscópico).

Como citar esse artigo:

Carlos, A. Caso Clínico – Corpo Estranho em Cólon. Endoscopia Terapêutica; 2021. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/casosclinicos/caso-clinico-corpo-estanho-em-colon/

Referências bibliográficas:

  1. Clin J Gastroenterol.2017 Dec;10(6):491-497;
  2. Nicolodi GC et al Radiol Bras. 2016 Set/Out;49(5):295–299;
  3. World J Surg Oncol.2011 Feb 18;9:24. doi: 10.1186/1477-7819-9-24;
  4. Wien Klin Wochenschr.2009;121(5-6):220-2;
  5. Acta Gastroenterol Latinoam.1997;27(5):329-30.

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Doença de Crohn com acometimento esofágico

Paciente 18 anos previamente hígido com quadro de dor epigástrica intensa há 2 meses associado à dor para engolir, náuseas e 3 episódios de vômitos na última semana. Em uso de omeprazol 40 mg/d, bromoprida 30 mg/d com pouca melhora. Nega uso de AINEs. Relata ainda diarreia com cerca de 8 episódios ao dia com muco, sem sangue. Refere perda de 8 kg em 2 meses.

Exames laboratoriais: Hb: 9,3/Hto:36%/ PCR: 29,8/Ferro:34/ Sat ferro:14%

Tomografia de abdome com contraste: normal.

Solicitadas EDA e colonoscopia que seguem abaixo.

 

ENDOSCOPIA DIGESTIVA ALTA

Doença de Crohn com acometimento esofágico

EDA: Notam-se úlceras ovaladas a 30 cm da ADS, algumas confluentes, medindo até 20 mm, bordas pouco delimitadas, localizadas em parede lateral direita. Estômago e duodeno sem alterações.

Anatomopatológico: Esofagite crônica ulcerada. Imunohistoquimica negativa para herpes e CMV.

 

COLONOSCOPIA

Doença de Crohn com acometimento esofágicoDoença de Crohn com acometimento esofágico

Doença de Crohn com acometimento esofágicoDoença de Crohn com acometimento esofágico

ColonoscopiaÍleo terminal normal. Presença de úlceras longitudinais e serpiginosas em todo o cólon, intercaladas por segmentos de mucosa normal. Aspecto sugestivo de doença de Crohn em atividade – SES CD : 25.

Anatomopatológico: Colite crônica intensa ulcerada. Imunohistoquímica negativa para CMV e herpes.

 

Diante dos tais achados, a hipótese diagnóstica mais provável é Doença de Crohn com acometimento colônico e do trato gastrintestinal superior.

Realizado tratamento medicamentoso com azatioprina 100 mg/d e infliximabe com boa resposta. Após 6 meses, apresentou remissão clínica e endoscópica.

 

Discussão

Acometimento esofágico da doença de Crohn

A doença de Crohn é uma doença inflamatória crônica que pode afetar qualquer parte do trato gastrintestinal. O envolvimento esofágico da doença de Crohn é raro, com prevalência de 6,8% no adulto e até 16% na população pediátrica.

Os sintomas são leves e inespecíficos. O envolvimento do trato gastrointestinal superior confere um fenótipo da doença mais grave com maior chance de complicações, tais como obstrução ou perfuração.

O diagnóstico se dá pela endoscopia digestiva alta (EDA), com realização de biópsias. As lesões são mais frequentes no terço distal do esôfago. Podemos observar enantema, erosões, úlceras aftoides, enquanto os quadros mais avançados podem evidenciar aparência de cobblestone, estenoses e até fístulas.

A presença de granuloma pode ser vista em até 40% dos casos. A histologia pode evidenciar as “squiggle cells” (células em rabisco), que são adensamentos de linfócitos intraepiteliais e que podem ser vistas em outras condições, tais como doença celíaca e DRGE.

Deve-se fazer diagnóstico diferencial, principalmente com etiologia péptica, medicamentosa, virais (CMV e herpes) e até neoplásicas.

Alguns pesquisadores propõem critérios diagnósticos para acometimento proximal da doença de Crohn:

  • Histologia evidenciando granulomas não caseosos com ou sem doença de Crohn ileocolônica na ausência de doenças sistêmicas granulomatosas;

OU

  • Evidência radiológica ou endoscópica de inflamação difusa consistente com Crohn em outra porção do TGI.

O tratamento clínico consiste no uso de imunossupressores e/ou terapia biológica. O tratamento endoscópico (dilatação ou próteses) se restringe às formas complicadas ou falhadas ao tratamento medicamentoso. A dilatação esofágica endoscópica com balão é efetiva nas estenoses fibróticas em até 80% dos casos, apesar de riscos de perfuração (0,1 a 0,4%). O tratamento cirúrgico é indicado para correção de fístulas e estenoses longas.

 

Como citar este artigo:

Carlos A. Doença de Crohn com acometimento esofágico. Endoscopia Terapêutica; 2020. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/casosclinicos/doenca-de-crohn-com-acometimento-esofagico/

 

Referencias bibliográficas

  1. Schwartzberg DM, et al. Crohn’s Disease of the Esophagus, Duodenum, and Stomach. Clin Colon Rectal Surg. 2019 Jul;32(4):231-242.
  2. Laube R, et al. Oral and upper gastrointestinal Crohn’s disease. Journal of Gastroenterology and Hepatology. 2017. 33(2), 355–364.

 

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