Processo de aprendizado – Parte 2: como aprender melhor e mais rápido?

Não seria bacana aprender qualquer coisa de maneira mais eficaz e mais rápida? Sem dúvida nossa vida seria muito mais fácil! Existem vários livros e técnicas sobre esse assunto.

Na primeira parte dessa série, explicamos sobre o processo de aprendizado e a curva de esquecimento. Se você não leu a primeira parte, clique aqui nesse post.

Nesse segundo artigo, estou compartilhando algumas técnicas bacanas sobre como melhorar a memória e o aprendizado.  

O acrônimo para decorar a fim de aprender mais rápido é F.A.S.T.

F= FORGET

Para aprender melhor você precisa esquecer 2 coisas:

  1. Esqueça qualquer coisa não urgente que possa desviar sua atenção. Apesar de tentarmos fazer várias coisas ao mesmo tempo, nosso cérebro não foi desenhado para cumprir múltiplas tarefas simultâneas. Desligue o celular e concentre-se no que está estudando.
  2. Esqueça suas limitações. Se começar o aprendizado repetindo ideias como: “isso é muito difícil”, “nunca vou aprender isso”, “sou ruim com números/pessoas/pólipos/drogas/etc” muito dificilmente você aprenderá alguma coisa sobre o assunto em questão. Essa é uma dica muito poderosa.

A sigla mnemônica em inglês para esse conceito é ANT (authomatic negative thoghts). Portanto, para um melhor aprendizado você precisa acabar com esses pensamento negativos, ou seja: KILL THE ANTs! Significa eliminar os pensamentos negativos que tiram sua concentração e travam seu aprendizado. Isso vale não apenas para memória de conceitos mas também para o aprendizado técnico de endoscopia, colonoscopia, ultrassom endoscópico, etc.

Kill the ANTs!!!

A= ACTIVE

Seja ativo! Tome atitude! O aprendizado eficaz não pode ser uma atividade passiva. Isso não funciona e sabemos disso há décadas!

Lembre-se do esquema de aula na escola: os alunos entediados na sua carteira enquanto o professor falava de algum assunto que não desperta interesse. Resultado: aprendizado zero!

Assim ninguém aprende

O cérebro também aprende através da criação. Fazer perguntas, imaginar situações, se envolver no assunto, tomar notas, fazer desenhos, etc. Quanto mais ativo –> maior o aprendizado.

Por último: pratique atividade física! Existem diversos estudo científicos relacionando atividade física com melhora da capacidade de aprendizado. O que é bom para o coração, também é bom para o seu cérebro.

“Um grande estudo da Universidade de Munique, por exemplo, acompanhou 4.000 idosos durante dois anos. Aqueles que raramente faziam atividades físicas tiveram mais do que o dobro de chance de sofrer algum comprometimento cognitivo se comparados aos que faziam jardinagem, natação ou ciclismo algumas vezes por semana.” – (extrato de artigo da revista galileu – Link – original da revista new scientist por Christie Aschwanden)

Fonte: revista galileu. Renato Faccini. https://revistagalileu.globo.com/Revista/noticia/2014/02/quer-ser-mais-inteligente-corra.html

S= STATE

Seu estado emocional pode ajudar ou atrapalhar o seu aprendizado. São as emoções que você está sentindo naquele momento.

Muito mais propício para o aprendizado se você estiver empolgado, curioso ou fascinado pelo assunto. Se cansado, estressado ou se estiver pensando na praia, é melhor você não perder seu tempo e passar seu protetor solar.

INFORMAÇÃO + EMOÇÕES = MEMÓRIA DE LONGO PRAZO

T= TEACH

Todos já ouviram a máxima: “see one, do one, teach one” Durante seu estudo, aprenda como se fosse ensinar alguém. Você irá prestar mais atenção. Irá tomar notas. Querer entender o porquê. Vai repetir o conteúdo até ter certeza que a informação que você irá passar é a mais correta possível. Resultado –> melhor aprendizado pessoal!  

Duas outras dicas que eu gosto bastante!!!

1. DURMA BEM

Com uma mente tubulenta não conseguimos nos concentrar, nem tomar decisões acertadas e nem aprender nada. Uma boa noite de sono ajudará você a se concentrar, pensar com mais clareza e tomar melhores decisões. Também é essencial para a sua memória, porque durante o sono é quando você consolida a memória de curto a longo prazo.

Técnicas de meditação também funcionam para o mesmo propósito.

 

2. FAÇA PARTE DE UM GRUPO POSITIVO DE PESSOAS

As pessoas com quem você convive é quem você acabe se tornando. Em um grupo positivo de pessoas, uma pessoa acaba estimulando a outra com novidades, curiosidades, dúvidas, etc. Portanto, verifique se as pessoas com quem você está convivendo são boas para sua mente e sua vida. De alguma forma, isso é exatamente o que fazemos aqui no Endoscopia Terapêutica!

Quer saber mais?




Processo de aprendizado – Parte 1: curva de esquecimento

Nosso cérebro está constantemente registrando informações temporárias: trechos de conversas ouvidas na calçada, o que a pessoa na sua frente está falando, vestindo, fazendo, etc.

Como a maioria das informações não são necessárias e não ficam se repetindo, nosso cérebro vai se desfazendo delas. A notícia ruim, é que as informações que você realmente deseja guardar (na palestra que acabou de ouvir ou no texto que acabou de ler) também vão sendo apagadas junto com as informações banais do dia a dia.

Ebbinghaus Forgetting Curve

A curva de esquecimento de Ebbinghaus representa a diminuição da capacidade do cérebro de reter uma informação ao longo do tempo. Esse conceito foi elaborado por Hermann Ebbinghaus em 1885.

  • A capacidade de memória é máxima ao final da lição.
  • No segundo dia, se você não recapitular nada do que foi aprendido, você terá perdido 50-80% do que aprendeu (triste né?).
  • No dia 7, lembramos ainda menos, e no dia 30, retemos cerca de 5% do aprendizado original

Taxa de Esquecimento

Existem vários fatores que podem afetar a taxa de esquecimento. Alguns dos quais são

  • Significado da informação: a importância que a nova informação tem para você
  • A maneira como é apresentada: técnicas de ensino, etc.
  • Fatores fisiológicos e estado emocional (curiosidade, motivação, estresse, sono, etc.)

A taxa de esquecimento (inclinação da curva) não é a mesma entre todos.

Existem desempenhos diferentes na memória dos indivíduos que podem ser explicados pelas habilidades individuais de representação mnemônica. Em outras palavras: algumas pessoas têm naturalmente uma capacidade mnemônica extraordinária, outras são bem treinadas para melhorar sua memória, e outras não estão nem aí para esse assunto (e não há problema algum com isso).

Nem todos temos capacidade de armazenamento ilimitada….
…e não há problema algum com isso

De acordo com Ebbinghaus, os indivíduos podem ser treinados para aumentar sua capacidade mnemônica. Duas técnicas que ele destaca são:

  1. Melhor representatividade mnemônica (técnicas mnemônicas como associação, visual, etc)
  2. Repetição através da recordação ativa (repetição espaçada periódica)

Desta forma, você pode alterar a forma da curva de Ebbinghaus, estudando com mais eficiência e revisando periodicamente o material estudado.

Ao reprocessar a informação, você envia um sinal poderoso ao seu cérebro para manter esses dados. Quando a mesma coisa é repetida, seu cérebro diz: “Oh – aí está de novo, é melhor eu manter isso”. E quando você é exposto às mesmas informações repetidamente, leva cada vez menos tempo para “ativar” as informações em sua memória de longo prazo e fica mais fácil recuperar as informações quando necessário.

Após revisitar o material algumas vezes a retenção do conteúdo é muito maior, e a queda da curva é mais lenta

Um exemplo prático de como revisar o material estudado pode ser benéfico:

  • dentro de 24 horas após o estudo – gaste 10 minutos revisando e você aumentará a curva para quase 100% novamente.
  • Uma semana depois, são necessários apenas 5 minutos para “reativar” o mesmo material
  • No dia 30, seu cérebro precisará apenas de 2 a 4 minutos para fornecer o feedback “sim, eu sei disso …”

Quer saber mais sobre processo de aprendizagem e dicas de como aprender melhor e mais rápido?

Não perca a segunda parte dessa série no post que sai amanhã, aqui no site Endoscopia Terapêutica!




Injeção Endoscópica de Toxina Botulínica

 Introdução 

Esta revisão visa ilustrar a técnica de injeção endoscópica de toxina botulínica, assim como mostrar seus benefícios e limitações. Iniciaremos com o conceito de acalásia, para depois ilustrar a forma correta de aplicação da técnica citada. Serão também mostrados efeitos da intervenção e preditores de sucesso em longo prazo, além de eventuais complicações.

O principal artigo para elaboração dessa revisão foi: Chan Sup Shim, Endoscopic botulinum toxin injection: Benefit and limitation, Gastrointestinal Intervention, Volume 3, Issue 1,2014, Pages 19-23. https://doi.org/10.1016/j.gii.2014.03.001. 

Acalásia 

Conceito 

É uma desordem motora esofágica que tem como principal sintoma a disfagia, ocorrendo de forma insidiosa. Caracteriza-se pela destruição ou ausência dos plexos nervosos intramurais do esôfago. Essa condição determina ausência de peristaltismo (aperistalse) no corpo do órgão, bem como o relaxamento incompleto do esfíncter inferior do esôfago (EIE) em resposta à deglutição. Consequentemente, há estase esofágica e incoordenação motora. De modo progressivo, ocorre dilatação do órgão e diminuição de sua capacidade de contração. 

Histologia 

  • Histologicamente observa-se destruição do plexo nervoso mioentérico (Auerbach). 
  • A degeneração inflamatória envolve preferencialmente os neurônios inibitórios, que liberam óxido nítrico e peptídeo vasoativo intestinal, afetando o relaxamento da musculatura lisa. 
  • Os neurônios excitatórios estão relativamente poupados. Eles liberam acetilcolina e causam contração da musculatura lisa, contribuindo para o tônus do EIE. 
  • A perda da inervação inibitória do esfíncter inferior do esôfago faz a pressão basal do EIE aumentar, de modo a impedir o relaxamento do mesmo. 
  • No corpo esofágico, a destruição do plexo nervoso resulta em aperistalse.       
Localização dos plexos nervosos na parede do trato gastrointestinal.

O tratamento usual consiste na dilatação com balão ou na miotomia do EIE. A injeção intraesfincteriana de toxina botulínica (botox) emergiu como uma alternativa à dilatação com balão, agindo através do bloqueio da liberação de acetilcolina nos terminais nervosos. 

A toxina botulínica bloqueia a liberação de acetilcolina na junção neuromuscular, diminuindo a contração muscular.

Injeção Endoscópica de Toxina Botulínica 

Técnica endoscópica de injeção de botox: 

  • Consiste na injeção de 100 UI nos quatro quadrantes do EIE (25 UI em cada quadrante), utilizando agulha de escleroterapia.
  • A injeção deve ser feita 1 cm proximal à junção escamocolunar, de forma perpendicular à parede esofágica, na camada muscular.
  • Uma nova injeção de 100 UI após 1 mês pode aumentar a eficácia2

Para aplicação de botox, é necessário diluir o mesmo com SF 0,9% e misturar suavemente, sem agitar a solução.  

Efeitos da intervenção 

Estudos demonstraram que a injeção de toxina botulínica (ITB) nos pacientes com acalásia proporciona uma melhora sintomática significativa comparativamente ao placebo.  

A aplicação de 100 UI, seguida da repetição da dose em um mês demonstrou ser mais eficiente do que aplicações únicas de 50 ou 200 UI2. Contudo, uma redução na eficácia da toxina botulínica tem sido observada no seguimento destes pacientes, provavelmente relacionada à produção de anticorpos contra a sua molécula. 

Estudos mostram que as taxas de resposta 1 mês após a administração são em média de 82% (69–90%). Aos 6 meses, a taxa de resposta clínica cai para 57% (33–77%) e, em 12 meses, para 48% (15–76%). 

Preditores de sucesso em longo prazo 

A ITB, apesar de menos invasiva que a dilatação pneumática e miotomia, ainda apresenta piores resultados a longo prazo em relação a estes métodos. Fatores preditores de melhor resposta à toxina botulínica incluem: 

  • Acalásia vigorosa (tipo III); 
  • Pacientes com pressão do esfíncter esofágico inferior não excedendo mais de 50% do limite superior da normalidade, em pacientes sem acalasia vigorosa 
  • Idade maior que 50/55 anos, sendo a taxa de resposta nesse grupo etário próximo ao dobro da observada na população mais jovem e ainda mais evidente na acalásia clássica; 
  • Forma do tratamento, com reaplicação em 4 semanas. 

Outros fatores como sexo, duração da doença, características radiográficas basais e gravidade dos sintomas iniciais não demonstraram ser preditores de resposta ao tratamento. 

Complicações 

As complicações da administração da toxina botulínica incluem principalmente a dor torácica transitória e azia, sendo reportados casos isolados de bloqueio cardíaco, retenção urinária e pneumotórax. 

Benefícios e limitações 

A ITB, apesar de apresentar menor eficácia terapêutica que os demais métodos, é comumente utilizada como terapia inicial pela sua facilidade técnica e baixa taxa de complicações, sendo preferencialmente reservada para pacientes com comorbidades importantes, em espera para tratamento cirúrgico ou que se recusam outros métodos de tratamento. Destaca-se, porém, o aumento da taxa de perfuração esofágica quando o paciente é submetido, posteriormente, à dilatação pneumática. 

Após a aplicação da toxina botulínica, os pacientes com acalásia devem ser monitorados regularmente, pesquisando possíveis complicações, como dilatação esofágica maciça e carcinoma esofágico.  

Referências

  1. Chan Sup Shim, Endoscopic botulinum toxin injection: Benefit and limitation, Gastrointestinal Intervention, Volume 3, Issue 1,2014, Pages 19-23. https://doi.org/10.1016/j.gii.2014.03.001
  2. V. Annese, G. Bassotti, G. Coccia, M. Dinelli, V. D’Onofrio, G. Gatto, et al. A multicentre randomised study of intrasphincteric botulinum toxin in patients with oesophageal achalasia. GISMAD Achalasia Study Group, Gut, 46 (2000), pp. 597-600.

Como citar este artigo

Passos HL, Bernardes FV, Martins BC. Injeção Endoscópica de Toxina Botulínica. Endoscopia Terapeutica 2023, vol 1. Disponivel em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/injecao-endoscopica-de-toxina-botulinica/




Cold EMR – Mucosectomia à frio

As técnicas de ressecção endoscópica com uso de corrente elétrica estão associadas com eventos adversos como por exemplo a síndrome pós-polipectomia (por queimadura profunda da parede do cólon), e também com perfuração e sangramento tardio pela possibilidade de injúria mais profunda dos vasos da submucosa.

Diante do exposto, tem crescido no uso respaldado por diversos estudos na literatura das técnicas de ressecção sem uso do cautério, ou seja as técnicas à frio, sendo referenciado nos últimos anos como a “cold revolution”.

A principal indicação da polipectomia à frio é para as lesões < 10 mm, sem suspeita de invasão profunda, por possibilitar menores taxas de recidiva quando comparada com a ressecção com pinça, e bem como também associada com menores taxas de sangramento tardio, e síndrome pós-polipectomia quando comparado com a ressecção com alça diatérmica.

Posteriormente, diversos estudos recentes vem demostrando a eficácia e segurança da mucosectomia à frio (Cold EMR) para lesões > 20 mm, sem suspeita de invasão submucosa, sendo portanto uma opção para as LSTs granulares homogêneas e para as lesões sésseis serrilhadas sem displasia, como bem demonstrado por Breno Bandeira de Mello e cols em metanálise recente.1

A mucosectomia à frio pressupõe a injeção submucosa associada à ressecção fatiada com alça preferencialmente dedicada, que são as alças com fio de corte mais fino (£ 0,3 cm, mais rígidas, com abertura de 9 a 10 mm, e com cobertura rígida do cateter. Hoje em dia já existem diversas no mercado disponíveis. A alça utilizada nesse vídeo foi a Exacto (Steris)

Outras vantagens inerentes à mucosectomia à frio são:

  • Mais fácil ver os limites da lesão
  • Expansão da submucosa fazendo o corte ser mais fácil
  • Prevenção de sangramento por efeito de tamponando

Abaixo vídeo demonstrando a técnica de caso de lesão séssil serrilhada sem displasia em cólon ascendente:

Referências

  1. Mello BB, Popoutchi P, Zago R, Averbach M. Análise comparativa dos resultados de ressecções de lesões sésseis serrilhadas do cólon ≥ 20 mm com e sem o emprego de energia elétrica. Revisão sistemática e metanálise. 2022

Como citar este artigo

Franco M. Cold EMR – Mucosectomia à frio. Endoscopia Terapeutica 2023, vol. 1. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/assuntosgerais/cold-emr-mucosectomia-a-frio/




Litotripsia Intraductal na Colangiopancreatografia Retrógrada Endoscópica

Com o advento da colangioscopia digital de operador único em 2015 (SpyGlass™), superando a dificuldade técnica dos antigos aparelhos “mother-baby” que dependiam de dois operadores, diversas foram as utilidades desta nova tecnologia na colangiopancreatografia retrógrada endoscópica (CPRE): avaliação intraductal de estenoses indeterminadas das vias biliares, direcionar a drenagem de segmentos acometidos por estenose, litotripsia intraductal de coledocolitíase e hepatolitíase.

Os cálculos complexos possuem preditores para falha de remoção das vias biliares pelo método convencional, sendo: 

  • cálculos maiores que 1,5 cm;
  • cálculos múltiplos (mais de 10); 
  • cálculos com formatos em barril e longo;
  • cálculos intrahepáticos; 
  • anormalidades de colédoco distal (oblíquos, estreitos, angulados);
  • papila duodenal peridiverticular;
  • desproporção de tamanho do cálculo vs colédoco; 
  • associados a estenoses benignas e malignas;
  • alteração pós-cirúrgica do trato gastrointestinal alto

Seguindo os guidelines europeu e americano da ESGE e ASGE, após a falha de remoção convencional na CPRE, opta-se por dilatação balonada de grandes proporções (DBGP) da papila, que é definida de 12 a 20 mm, limitando-se até o diâmetro do colédoco distal, precedida de papilotomia prévia ou tática (saiba mais nesse post). Havendo a falha de extração após DBGP, os guidelines sugerem a litotripsia, que podem ser:

  • mecânica através do basket reforçado “through the scope” (convencional) ou “out the scope” (também conhecido como litotriptor de emergência);
  • intraductal com pulso eletro-hidráulico ou a laser através do uso de colangioscópio.

Caso Clínico

No vídeo a seguir, temos o caso de uma mulher jovem com coledocolitíase de 10 mm, com duas tentativas prévias de CPRE sem sucesso na remoção de cálculo devido a desproporção cálculo vs colédoco distal. Mesmo com papilotomia ampla prévia e dilatação balonada CRE até 18 mm, sem perda de cintura radiológica por fibrose de esfíncter, houve falha na apreensão do cálculo com basket trapezoid devido a impactação do cálculo em via biliar.

Neste caso, a abordagem cirúrgica seria difícil especificamente devido ao colédoco pouco dilatado, sendo optado por intervenção com colangioscopia (Spyglass) + litotripsia endoscópica a laser intraductal. Como resultado, a paciente evoluiu com alta no primeiro pós-operatório com resolução da retirada do cálculo, assintomática, podendo ser submetida a colecistectomia em seguida.

Discussão

Um estudo multicêntrico randomizado publicado na Endoscopy de Angsuwatcharakon et al. em 2019 comparou esses dois métodos, que permitia o crossover entre a litotripsia mecânica com basket de 30 mm (LithoCrush V, Olympus) e a litotripsia a laser (SpyGlass DS, Boston Scientific, com Dornier Medilas H Solvo, Wessling), chegando aos seguintes resultados:

  • 476 pacientes pós-CPRE, com 32 falhas pós-DBGP, sendo randomizados 16 em cada grupo;
  • Média do tamanho dos cálculos: 19.5 mm (5.63) no grupo laser vs 17.6 mm (3.37) no grupo litotripsia mecânica;
  • Remoção completa na primeira tentativa foi maior na litotripsia laser vs mecânica (100% vs 63%, p < 0,01);
  • Tempo de procedimento total foi menor no laser vs mecânica (83 vs. 66 min; P = 0.23);
  • Tempo de remoção foi menor no laser vs mecânica (53 vs. 39 min; P = 0.26);
  • Tempo de fluoroscopia e radiação menor no laser vs mecânica (21 vs. 11 minutes; P < 0.01 e (40 745 vs. 20989 mGycm2; P = 0.04);
  • Efeitos adversos e tempo de internação foram semelhantes entre os grupos.

As limitações do estudo estão na amostra relativamente baixa, que tange às indicações restritas da litotripsia após falha da CPRE e DBGP, bem como na avaliação de apenas a metodologia a laser, sem comparar a eletro-hidráulica, apesar da equivalência de efetividade dos dois métodos.

Embora os limites impostos pelo alto custo do dispositivo, com necessidade de expertise do uso de colangioscopia, e baixa disponibilidade desta tecnologia nos centros de endoscopia, Deprez et al. avaliou maior economia e menor custo no grupo da litotripsia intraductal devido a maior taxa de sucesso e menor número de CPREs no tratamento da coledocolitíase complexa. Salvo limitações do custo de saúde, país e moeda diferente do estudo, as justificativas de menor custo-efetividade são válidos.

Ademais, com o desenvolvimento de outras marcas de colangioscópios e a maior abrangência desta tecnologia, espera-se que esse método diagnóstico e terapêutico se popularize e se torne um novo arsenal ao endoscopista.

Referências

  1. Angsuwatcharakon P, Kulpatcharapong S, Ridtitid W, et al. Digital cholangioscopy-guided laser versus mechanical lithotripsy for large bile duct stone removal after failed papillary large-balloon dilation: a randomized study. Endoscopy. 2019 Nov;51(11):1066-1073. doi: 10.1055/a-0848-8373. Epub 2019 Feb 20. PMID: 30786315.
  2. ASGE Standards of Practice Committee; Buxbaum JL, Abbas Fehmi SM, Sultan S, et al. ASGE guideline on the role of endoscopy in the evaluation and management of choledocholithiasis. Gastrointest Endosc. 2019 Jun;89(6):1075-1105.e15. doi: 10.1016/j.gie.2018.10.001. Epub 2019 Apr 9. PMID: 30979521; PMCID: PMC8594622.
  3. Manes G, Paspatis G, Aabakken L, et al. Endoscopic management of common bile duct stones: European Society of Gastrointestinal Endoscopy (ESGE) guideline. Endoscopy. 2019 May;51(5):472-491. doi: 10.1055/a-0862-0346. Epub 2019 Apr 3. PMID: 30943551.
  4. Deprez PH, Garces Duran R, Moreels T, et al. The economic impact of using single-operator cholangioscopy for the treatment of difficult bile duct stones and diagnosis of indeterminate bile duct strictures. Endoscopy 2018;50:109-18.

Como citar este artigo

Kum AST, Ide E, Nunes BCM. Litotripsia Intraductal na Colangiopancreatografia Retrógrada Endoscópica. Disponível em Endoscopia Terapeutica 2023, vol. 1. https://endoscopiaterapeutica.net/pt/litotripsia-intraductal-na-colangiopancreatografia-retrograda-endoscopica/




Laringoespasmo

O laringoespasmo é até certo ponto uma ocorrência comum para os anestesiologistas, mas, muitas vezes, desconhecida do médico endoscopista.

Apesar de não ter uma frequência tão elevada, um episódio com tratamento tardio ou inadequado pode ser catastrófico.

De forma resumida, seria o fechamento glótico causado por um reflexo exacerbado de constrição da musculatura intrínseca da laringe. É essencialmente um mecanismo de proteção para prevenir entrada de material estranho na árvore brônquica. Como resultado, haverá impedimento da ventilação, levando à hipoxia e à hipercapnia.

O problema é autolimitado na maior parte dos casos, pois por tempo prolongado, a hipoxia e a hipercapnia cessam o reflexo de espasmo. Contudo, em certos episódios, o espasmo pode se prolongar e trazer riscos ao paciente.

Etiologia

Apesar de ter etiologia multifatorial, a manipulação da via aérea é o principal fator implicado. A incidência é maior em crianças, pacientes com infecções do trato respiratório, ou asma, tabagistas, portadores de apneia obstrutiva do sono, refluxo gastresofágico importante e obesos. Além disso, o risco é maior em casos de manipulação de via aérea e em procedimentos na cavidade oral e faringe.

A endoscopia digestiva alta e a broncoscopia estão diretamente relacionadas ao laringoespasmo pelo estímulo direto da região. Outras associações seriam anestesia superficial no início e final desses procedimentos e regurgitação.

Muitas drogas têm sido estudadas na prevenção do laringoespasmo. Pré-medicaçao com benzodiazepínicos reduz os reflexos de via aérea. Lidocaína tópica (4mg/kg) ou venosa (1,5-2mg/kg) parece também trazer benefício. Cuidados não medicamentosos: manter o paciente em decúbito lateral esquerdo no periprocedimento.

O laringoespasmo pode ser parcial, havendo passagem de certa quantidade de ar, levando a estridor inspiratório; ou completo, não havendo passagem de ar e ausência de sons respiratórios. Em ambos os casos, sinais de obstrução podem ser notados, como: retração intercostal e movimentos paradoxais do tórax e do abdome. Sinais tardios: dessaturação, bradicardia e cianose.

Tratamento

O tratamento consiste primeiramente em identificar e cessar o fator desencadeante.Após, aplicar pressão positiva com oxigênio a 100%, anteriorização da mandíbula e manobra de Larson (figura1). Essa técnica abre as vias aéreas e causa dor periosteal, ajudando a relaxar as cordas vocais pelo sistema nervoso autônomo.

  • Cessar o fator desencadeante
  • Pressão positiva com oxigênio a 100%,
  • Anteriorização da mandíbula
  • Manobra de Larson
Figura 1. Ponto do laringoespasmo (seta). Local onde se realiza a manobra de Larson: compressão simultânea em ambos os lados da cabeça, na depressão localizada atrás do lóbulo das orelhas e limitada anteriormente pelo ramo ascendente da mandíbula adjacente ao côndilo, posteriormente pelo processo mastoóide do osso temporal e superiormente pela base do crânio. Concomitantemente, deve ser feito o deslocamento anterior da mandíbula. Erro comum é aplicar pressão no ângulo da mandíbula, devendo ser mais cefálico.

Após, aplicar pressão positiva com oxigênio a 100%, anteriorização da mandíbula e manobra de Larson (figura 1). Essa técnica abre as vias aéreas e causa dor periosteal, ajudando a relaxar as cordas vocais pelo sistema nervoso autônomo. Obtendo-se melhora do quadro, o diagnóstico seria de espasmo parcial. Persistindo o quadro, seria um caso de laringoespasmo completo, sendo importante a ajuda de outro profissional e aprofundamento da anestesia com Propofol (0,25-0,8mg/kg). Provavelmente será necessário ventilar o paciente em consequência de apneia transitória.

A chance de reversão do quadro com Propofol é bastante alta. Todavia, se não houver melhora, utiliza-se Succinilcolina (0,1mg/kg-1,2mgkg EV ou 3-4mg/kg IM). Ter em mente que o Propofol é preferível frente à Succinilcolina, já que nessa dose não acarreta muita repercussão hemodinâmica e não traz risco de paralisia muscular.

Algoritmo de tratamento escalonado enquanto não há melhora do quadro:

Conclusão

É de suma importância identificar os fatores de risco para o desenvolvimento do laringoespasmo e reconhecê-lo rapidamente, antes que a condição do paciente se deteriore. Uma sedação profunda para realização da endoscopia é essencial.

Além disso, o conhecimento das doses das principais medicações utilizadas para reverter o espasmo: propofol e succinilcolina.

Finalmente, importante avaliar se o paciente não cursou com broncoaspiração ou edema agudo de pulmão por pressão negativa pelo esforço respiratório contra obstrução.

Referências:   

  1. Landsman IS. Mechanisms and treatment of Laryngospasm. Int Anesthesiol Clin. 1997 Summer;35(3):67-73. PMID: 9361977
  2. Alalami AA, Ayoub CM, Baraka AS. Laryngospasm: review of different prevention and treatment modalities. Paediatr Anaesth. 2008 Apr;18(4):281-8. doi: 10.1111/j.1460-9592.2008.02448.x. PMID: 18315632
  3. Soares RR, Heyden EG. Tratamento do Laringoespasmo em anestesia pediátrica por digitopressão retroauricular: relato de casos. Rev. Bras. Anestesiol. Dez 2008;  58:6:631-636
  4. Chen Y, Zhang X. Acute postobsctrutive pulmonry edema following laryngospasm in elderly patients: a case report. J Perianesth Nurs. 2019 Apr;34(2):250-258. PMID: 30100095
  5. Moura TSM, Silva FCP, Taves LOAF. Laringoespasmo em anestesia pediátrica. Rev Med Minas Gerais 2018;28 (Supl 8): S20-S27

Como citar este arquivo

Elder P. Laringoespasmo. Endoscopia Terapeutica 2023, Vol 1. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/laringoespasmo/

                         




Lesão Esofágica Pós-Ablação Cardíaca

A fibrilação atrial é a arritmia cardíaca mais comum sendo o tratamento através da ablação indicado nos casos de doença refratária à medicação. Entretanto devido à proximidade da parede posterior do átrio esquerdo com o esôfago (< 5mm em 40% dos casos), associado a quantidade de energia desprendida no local (potência, tempo e força de contato), tornam o esôfago um potencial sítio de eventos adversos.

Abaixo as possíveis complicações gastrointestinais pós-ablação cardíaca

Dismotilidade do trato gastrointestinal superior

O mecanismo exato dessas lesões não é conhecido, porém a lesão do nervo vago devido à sua proximidade com o esôfago e a parede do átrio esquerdo, é a teoria mais aceita. Curiosamente, a maior parte da dismotilidade parece ser subclínica e muitas vezes diagnosticada incidentalmente. 

Os sintomas geralmente se iniciam 3 dias após a ablação, sendo os mais comuns: refluxo, disfagia, dor torácica por hipomotilidade esofágica, distensão abdominal, saciedade precoce, perda de peso, náuseas e vômitos.

No único estudo prospectivo observacional realizado, 74% dos pacientes submetidos a ablação desenvolveram alguma dismotilidade, porém normalizada em até 6 meses em todos os participantes1.

O tratamento deve ser realizado nos casos sintomáticos, com refeições em menores porções e baixo teor de gordura, além do uso de pró-cinéticos. Nos raros casos refratários pode ser realizada toxina botulínica para espasmo pilórico ou mesmo cirurgia.

Lesões esofágicas

Estudos demonstram uma incidência variável de lesão esofágica após ablação por cateter, variando de 2% a 47%, sendo a grande maioria assintomáticos.

Durante a ablação, altas temperaturas são alcançadas podendo causar danos ao esôfago, variando de eritema leve (mais comum e com ótimo prognóstico) à ulcerações e, em casos raros, pode levar a perfuração esofágica e formação de fístula atrioesofágica2

Como as lesões esofágicas assintomáticas são comuns, a triagem endoscópica precoce pós ablação pode ajudar a identificar os pacientes com maior risco de perfuração esofágica, permitindo vigilância adequada. Abaixo a classificação utilizada para esse estadiamento:

Kansas City Classification (KCC)3

  • Tipo 1: eritema
  • Tipo 2A: úlcera mucosa superficial
  • Tipo 2B: úlcera profunda 
  • Tipo 3A: perfuração esofágica sem fístula atrioesofágica
  • Tipo 3B: perfuração esofágica com fístula atrioesofágica

Em uma revisão que incluiu 570 lesões esofágicas avaliadas endoscopicamente em pacientes assintomáticos, 36% eram tipo 1, 39% tipo 2A e 25% tipo 2B3. No entanto, a avaliação luminal do esôfago é limitada à superfície e pode subestimar a extensão do dano transmural, visto que as lesões são “de fora para dentro”. 3; 4

Deve-se sempre lembrar que nos casos com suspeita de fístula (febre, dor torácica, odinofagia) a endoscopia é contraindicada pelo risco de embolismo gasoso, devendo-se optar pela tomografia com contraste oral e endovenoso para avaliação.

Figura 1: lesão KCC tipo 1
Figura 2: lesão KCC tipo 2A
Figura 3: lesão KCC tipo 2B

Fístula atrioesofágica

A lesão térmica que leva à isquemia e inflamação parece resultar em dano gradual e progressivo da parede esofágica, o que pode explicar por que a perfuração esofágica e posterior fístula podem levar de 2 a 4 semanas para se desenvolverem.

É uma rara, porém gravíssima complicação, com uma incidência de 0,015 a 0,2%, apesar de provavelmente subnotificada. Sua complexidade decorre do diagnóstico tardio e falta de correção cirúrgica a tempo2

Apresenta sinais clínicos variados como febre, hematêmese, alteração do nível de consciência, dor torácica, disfagia, sepse, mediastinite, derrame pleural ou pericárdico. Acidente vascular cerebral (embolia gasosa), septicemia e sangramento gastrointestinal (GI) são os principais fatores que contribuem para taxas de mortalidade que variam de 40% a 100%4.

Conduta

  • Lesões tipo 1 e tipo 2A: inibidor de bomba de prótons (IBP), resposta completa em 2 a 4 semanas
  • Lesões 2B: apresentam 4% de risco de progressão para tipo 3. Internação, jejum / líquidos claros e TC seriadas por 4 a 6 semanas.
  • Lesões tipo 3: uma revisão de literatura demonstrou que o tratamento conservador ou stent esofágico isolado parece ter um desfecho clínico ruim, sendo o reparo cirúrgico precoce associado ou não a stent esofágico a opção de escolha. Os resultados clínicos da terapia combinada (cirurgia + stent) ainda são pouco claros devido ao número reduzido de estudos5.

Nota: apesar de nenhum estudo randomizado ter comprovado o seu benefício, a maioria dos serviços indica periprocedimento e por um período de até 6 semanas o uso rotineiro de IBP e sucralfato.

Abaixo um fluxograma da conduta nos casos suspeitos:

KEY POINTS

  • IBP e sucralfato por 4 a 6 semanas
  • EDA pós ablação para estratificação de risco
  • TC na suspeita de perfuração
  • Classificação de Kansas 
  • Maioria assintomáticos ou sintomas de dismotilidade autolimitados tratados com sintomáticos
  • Perfuração = tratamento cirúrgico precoce, associado ou não a stent esofágico

Referências

  1. LAKKIREDDY, D.  et al. Effect of atrial fibrillation ablation on gastric motility: the atrial fibrillation gut study. Circ Arrhythm Electrophysiol, v. 8, n. 3, p. 531-6, Jun 2015. ISSN 1941-3084. Disponível em: < https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/25772541 >. 
  2. GARG, L.  et al. Gastrointestinal complications associated with catheter ablation for atrial fibrillation. Int J Cardiol, v. 224, p. 424-430, Dec 01 2016. ISSN 1874-1754. Disponível em: < https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/27690340 >. 
  3. YARLAGADDA, B.  et al. Temporal relationships between esophageal injury type and progression in patients undergoing atrial fibrillation catheter ablation. Heart Rhythm, v. 16, n. 2, p. 204-212, Feb 2019. ISSN 1556-3871. Disponível em: < https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/30273767 >. 
  4. ASSIS, F. R.  et al. Esophageal injury associated with catheter ablation for atrial fibrillation: Determinants of risk and protective strategies. J Cardiovasc Electrophysiol, v. 31, n. 6, p. 1364-1376, Jun 2020. ISSN 1540-8167. Disponível em: < https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/32323383 >. 
  5. ZHOU, B.  et al. Treatment strategy for treating atrial-esophageal fistula: esophageal stenting or surgical repair?: A case report and literature review. Medicine (Baltimore), v. 95, n. 43, p. e5134, Oct 2016. ISSN 1536-5964. Disponível em: < https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/27787367 >. 

Como citar este artigo

Oliveira JFD. Lesão Esofágica Pós-Ablação Cardíaca. Endoscopia Terapeutica 2023 Vol 1. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/lesao-esofagica-pos-ablacao-cardiaca/




Com que frequência você observa úlcera de anastomose gastrojejunal pós-Bypass Gástrico em Y de Roux na sua prática diária? 

A úlcera de anastomose gastrojejunal (AGJ), também chamada de úlcera marginal, é definida como “uma úlcera péptica na mucosa jejunal distal à AGJ após gastrectomia parcial para doenças benignas, como úlceras gástricas ou duodenais, ou após cirurgias bariátricas” (1).  

Fatores de risco e Incidência

A incidência após Bypass gástrico em Y de Roux (BGYR) varia de 0,6 a 16% dos pacientes.

Sua etiologia não é totalmente compreendida, porém vários fatores parecem exercer influência como: diminuição do fluxo sanguíneo, tensão na anastomose, infecção pelo Helicobacter pylori (H. pylori), tamanho do pouch, técnica utilizada para confecção da AGJ, uso de AINEs, etilismo e tabagismo (2,3,4).

Algumas outras condições clínicas também parecem estar associadas, como imunossupressão, DRGE, DM, dislipidemia, doença arterial coronariana, doenças pulmonares crônicas, como asma e DPOC, e hipotiroidismo (5).

Além disso, visto que a mucosa do pouch não tem contato com a secreção alcalina do duodeno, a AGJ é exposta ao suco gástrico ácido não diluído produzido pela mucosa do pouch (3). O uso de inibidores de bomba de prótons (IBP) no pré-operatório parece ser um fator de proteção para o desenvolvimento das úlceras (5,6).  

Fatores de risco cirúrgicos Fatores de risco não-cirúrgicos
IsquemiaTamanho do pouchCorpo estranho (fio de sutura, grampos)Tensão na anastomoseFístula gastrogástrica TabagismoUso de AINEsAusência de uso de IBPH. pyloriConsumo de álcool 
Fatores de risco relacionados a úlcera de AGJ (adaptado de Steinemann et al) (3)

Apresentação e sintomas

A úlcera da AGJ pode ser dividida em precoce (< 12 meses) ou tardia (> 12 meses), para as quais a etiologia subjacente pode ser diferente, assim como o tratamento (1, 2).

  • As úlceras precoces geralmente estão relacionadas a problemas técnicos da cirurgia.
  • Úlceras tardias podem ter como causa deiscência dos grampos, pouch alargado, uso de AINE e infecção pelo H. pylori (5). 

Os pacientes podem apresentar uma variedade de sintomas. Para úlceras agudas, dor epigástrica, vômitos e hemorragia digestiva alta (HDA), tanto visível quanto oculta, são as principais formas de apresentação (1,7). Pacientes portadores de úlcera crônica frequentemente tem dor epigástrica noturna e bem localizada (1). Cerca de 25% dos pacientes são assintomáticos e são diagnosticados durante endoscopia digestiva alta (EDA) de rotina no pós-operatório (2). 

Papel da endoscopia 

O diagnóstico é feito por EDA, que também tem a função de tratar uma grande complicação dessas úlceras que é o sangramento.

Em caso de HDA, o tratamento endoscópico deve ser feito, assim como nas úlceras de outra etiologia, com as modalidades endoscópicas disponíveis: injeção, métodos térmicos ou mecânicos. Os métodos mecânicos devem ser preferidos nesses casos, especialmente nas úlceras agudas (7). 

Em casos em que se observa a presença de fios de sutura na anastomose, estes devem ser retirados, pois promovem uma reação inflamatória local que dificulta a cicatrização da úlcera.

De maneira geral, a endoscopia deve ser repetida em 08 semanas para confirmar a cicatrização da úlcera (7). 

Tratamento   

O tratamento é feito com IBP ou associação de IBP com sucralfato (2,3,5).

Em casos de úlceras refratárias ao tratamento clínico, é importante investigar a presença de fístula gastrogástrica ou deiscência da anastomose (7). 

Para úlceras refratárias, parte dos autores recomenda o tratamento cirúrgico (3). Um estudo mostrou que 43% dos pacientes submetidos a tratamento cirúrgico da úlcera tinham fístula gastrogástrica e que a recorrência após a reoperação pode chegar a 57% (5).   

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Referências

  1. Carr WR, Mahawar KK, Balupuri S, Small PK. An evidence-based algorithm for the management of marginal ulcers following Roux-en-Y gastric bypass. Obes Surg. 2014 Sep;24(9):1520-7. doi: 10.1007/s11695-014-1293-z. PMID: 24851857 
  2. Süsstrunk, J., Wartmann, L., Mattiello, D. et al. Incidence and Prognostic Factors for the Development of Symptomatic and Asymptomatic Marginal Ulcers After Roux-en-Y Gastric Bypass Procedures. OBES SURG31, 3005–3014 (2021). https://doi.org/10.1007/s11695-021-05363-4 
  3. Steinemann DC, Bueter M, Schiesser M, Amygdalos I, Clavien PA, Nocito A. Management of anastomotic ulcers after Roux-en-Y gastric bypass: results of an international survey. Obes Surg. 2014 May;24(5):741-6. doi: 10.1007/s11695-013-1152-3. PMID: 24347350. 
  4. Sundaresan, N., Sullivan, M., Hiticas, B.A. et al. Impacts of Gastrojejunal Anastomotic Technique on Rates of Marginal Ulcer Formation and Anastomotic Bleeding Following Roux-en-Y Gastric Bypass. OBES SURG31, 2921–2926 (2021). https://doi.org/10.1007/s11695-021-05292-2 
  5. Di Palma A, Liu B, Maeda A, Anvari M, Jackson T, Okrainec A. Marginal ulceration following Roux-en-Y gastric bypass: risk factors for ulcer development, recurrence and need for revisional surgery. Surg Endosc. 2021 May;35(5):2347-2353. doi: 10.1007/s00464-020-07650-0. Epub 2020 May 18. PMID: 32424625. 
  6. D’Hondt MA, Pottel H, Devriendt D, Van Rooy F, Vansteenkiste F. Can a short course of prophylactic low-dose proton pump inhibitor therapy prevent stomal ulceration after laparoscopic Roux-en-Y gastric bypass? Obes Surg. 2010 May;20(5):595-9. doi: 10.1007/s11695-009-0062-x. Epub 2010 Jan 8. Erratum in: Obes Surg. 2010 Jun;20(6):829. André D’Hondt, Mathieu [corrected to D’Hondt, Mathieu André]. PMID: 20058097. 
  7. Souto-Rodríguez R, Alvarez-Sánchez MV. Endoluminal solutions to bariatric surgery complications: A review with a focus on technical aspects and results. World J Gastrointest Endosc. 2017 Mar 16;9(3):105-126. doi: 10.4253/wjge.v9.i3.105. PMID: 28360973; PMCID: PMC5355758. 

Como citar este artigo

Arraes L. Com que frequência você observa úlcera de anastomose gastrojejunal pós-Bypass Gástrico em Y de Roux na sua prática diária? Endoscopia Terapeutica 2023, vol 1. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/com-que-frequencia-voce-observa-ulcera-de-anastomose-gastrojejunal-pos-bypass-gastrico-em-y-de-roux-na-sua-pratica-diaria




Laudos em endoscopia digestiva alta-parte III Como descrever as alterações encontradas.

Em nossos primeiros artigos sobre o tema (Laudos Endoscópicos e Fotodocumentação) abordamos como o laudo endoscópico deve ser estruturado, destacando a importância de uma boa foto documentação e da coerência entre o que está descrito e o que está documentado nas imagens.

A intenção deste documento é orientar como descrever as características mais importantes das principais alterações endoscópicas.

Obviamente existem preferências individuais na maneira de redigir o texto, sendo que alguns preferem texto corrido enquanto outros preferem separar em parágrafos, alguns preferem uso da voz passiva e outros voz ativa, e assim por diante. A escolha do estilo usado na descrição das alterações compete a cada profissional. No entanto, é importante estar atento a alguns princípios.

Fornecer as informações necessárias para enquadrar as lesões dentro de uma classificação validada pela literatura.

Exemplo: classificação de Los Angeles. O endoscopista deve descrever a extensão das erosões (maior ou menor do que 5 mm), se são confluentes ou não, e, em caso de erosões confluentes, descrever se acometem mais ou menos do que 75% da circunferência esofágica.

Escrever de forma objetiva

Evitar informações desnecessárias e um texto prolixo. Isso torna a leitura do seu relatório mais precisa e mais agradável. Vale a pela usar frases curtas sempre que possível.

Usar termos descritores padronizados e validados, de acordo com a Minimal Standard Terminology for Digestive Endoscopy (M.S.T. 3.0)

Segue abaixo uma lista com as alterações endoscópicas mais comuns e as sugestões para descrição que são um verdadeiro guia prático para você:

Esofagite erosiva

O que é importante?

  • descrever a extensão das erosões (maiores ou menores do que 5 mm)
  • presença de confluência ou não
  • em caso de erosões confluentes, descrever se acometem mais ou menos do que 75% da circunferência esofágica.

Exemplos:

Mucosa encontra-se opacificada e espessada na região distal, com erosões (menores/maiores) do que 5 mm, não confluentes (ou confluentes em menos do que 75% da circunferência) ao nível da transição esofagogástrica.

Mucosa do segmento distal do esôfago, ao nível da transição esofagogástrica exibe coloração opaca e perda do padrão vascular. Notam-se erosões lineares menores/maiores do que 5 mm, sem confluência (ou exibindo confluência em menos/mais do que 75% da circunferência).

Esôfago de Barrett

O que é importante?

  • descrever a extensão máxima do acometimento circunferencial (C) e a extensão máxima da projeção de epitélio colunar (M) segundo a classificação de Praga.
  • descrever os achados da avaliação do epitélio colunar, com uso de cromoscopia ou magnificação quando disponível
  • relatar a realização de biópsias e se foram realizadas de forma dirigida ou de acordo com protocolo de Seattle.

Exemplos de descrição:

Nota-se epitelização colunar em esôfago distal sendo circunferencial por 1,0 cm e com extensão máxima de 3,0 cm (Praga C1M3). Realizada cromoscopia virtual com (NBI/LCI), seguido de cromoscopia com solução de ácido acético, não se observando áreas suspeitas para displasia. Realizadas biópsias nos quatro quadrantes conforme protocolo de Seattle.

Nota-se em esôfago distal, junto à transição esofagogástrica (localizada a 38 cm dos incisivos), mucosa apresentando coloração rosa-salmão, com acometimento circunferencial de cerca de 1,0 cm (37-38 cm dos incisivos), e com duas projeções de até 3,0 cm pelas paredes anterior e posterior (35-38 cm). Realizada cromoscopia virtual com (NBI/LCI), seguido de cromoscopia com solução de ácido acético, não se observando áreas suspeitas para displasia. Realizadas biópsias nos quatro quadrantes conforme protocolo de Seattle.

Exemplos de Conclusão

  • Epitelização colunar em esôfago distal.
  • Esôfago de Barrett curto/longo (quando já existe a confirmação diagnóstica),
  • Alterações endoscópicas sugestivas de epitelização colunar em esôfago distal

Esofagite eosinofílica

O que é importante?

  • descrever os segmentos do esôfago acometidos.
  • presença de estrias longitudinais ou não
  • presença de exsudato na superfície mucosa ou não
  • presença de padrão em “traqueização” ou não
  • áreas de estenose
  • a realização de biópsias nos segmentos proximal, médio e distal.

Exemplos de descrição no corpo do laudo:

Mucosa dos segmentos proximal, médio e distal apresenta edema e perda do padrão vascular habitual. Além disso notam-se estrias longitudinais, padrão em “traqueização” e exsudato puntiforme aderido. Não visualizamos segmento estenótico. Realizadas biópsias dos segmentos de esôfago.

Mucosa do esôfago médio e distal apresenta aspecto espessado e esbranquiçado, associado a estrias e fissuras longitudinais, anéis concêntricos e exsudato pontilhado esbranquiçado. Realizadas biópsias de esôfago proximal, médio e distal.

Exemplos de Conclusão

  • Alterações endoscópicas compatíveis com esofagite eosinofílica.
  • Esofagite eosinofílica?

Hérnia hiatal

O que é importante?

  • descrever a relação entre a transição esofagogástrica e o pinçamento diafragmático
  • o endoscopista pode também descrever a distância entre as estruturas anatômicas e os incisivos (ou arcada dentária superior – ADS)

Exemplos de descrição no corpo do laudo:

Transição esofagogástrica situada 2,0 cm acima do pinçamento diafragmático.

Transição esofagogástrica situada a 38 cm da ADS, 2,0 cm acima do pinçamento diafragmático.

Exemplos de Conclusão

  • Hérnia hiatal.
  • Hérnia hiatal por deslizamento.
  • Hérnia hiatal mista (tipo III)

Fundoplicatura

O que é importante?

  • Descrever se a TEG está sob a zona de pressão constituída pela fundoplicatura + hiatoplastia ou se está deslizada (considera-se deslizamento da FPL quando a TEG está situada 2,0 cm acima da zona de pressão)
  • descrever se a fundoplicatura está intra-abdominal ou migrada
  • descrever se a fundoplicatura envolve toda a circunferência da cárdia, se envolve parcialmente a cárdia ou se está desgarrada.
  • descrever se há hérnia paraesofágica ou não

Exemplos de descrição no corpo do laudo:

À retrovisão observa-se fundoplicatura intra-abdominal (ou migrada) envolvendo circunferencialmente (ou parcialmente) a cárdia.

À retrovisão observa-se fundoplicatura migrada e parcialmente desgarrada, associada a hérnia paraesofágica.

Exemplos de Conclusão

  • Fundoplicatura íntegra
  • Fundoplicatura em bom aspecto
  • Fundoplicatura (total ou parcial) com bom aspecto 
  • Fundoplicatura migrada, porém não desgarrada
  • Fundoplicatura desgarrada e migrada

Gastrite enantemática (ou enantematosa)

O que é importante?

  • descrever a distribuição do enantema: restrito ao antro, restrito ao corpo, difuso.
  • descrever a intensidade do enantema: leve, moderado ou acentuado

Exemplos de descrição:

Mucosa de (corpo/antro) apresenta enantema difuso de (leve/moderada) intensidade.

Exemplos de Conclusão

  • Gastrite enantemática leve de antro
  • Pangastrite enantematosa moderada

Gastrite erosiva

O que é importante?

  • descrever a distribuição das erosões: restritas ao antro, ao corpo, difusas.
  • descrever o aspecto das erosões: se planas ou elevadas
  • descrever a intensidade do acometimento: leve, moderado ou acentuado

Exemplos de descrição:

Mucosa de (corpo/antro) apresenta erosões (planas/elevadas) em (pequena/grande) quantidade

Exemplos de Conclusão

  • Gastrite erosiva plana leve de antro.
  • Pangastrite erosiva intensa.

Gastrite atrófica

O que é importante?

  • descrever as características da mucosa atrófica como presença de palidez, aspecto adelgaçado da mucosa, realce da vascularização subeptielial, se há redução numérica e/ou volumétrica das pregas do corpo (em caso de gastrite atrófica de corpo)
  • descrever a extensão do acometimento: restrito ao antro, envolvendo antro e corpo, restrito ao corpo, envolvendo antro e pequena curvatura do corpo, etc.
  • documentar caso haja a realização de biópsias e os respectivos locais

Nota: o endoscopista pode utilizar classificações como a classificação de Kimura-Takenoto ou estadiamento OLGA. Estadiamento OLGA depende da coleta de biópsias nos locais adequados e da solicitação do endoscopista no pedido de anatomopatológico.

Exemplos de descrição:

Mucosa de antro apresenta sinais de atrofia que se estendem para incisura angularis e pequena curvatura de corpo distal. Realizadas biópsias de acordo com protocolo OLGA.

Mucosa de antro e pequena curvatura de corpo exibem palidez, realce da vascularização subepitelial e aspecto adelgaçado, compatível com atrofia. Realizadas biópsias de corpo, antro e incisura de acordo com protocolo OLGA.

Mucosa de corpo e fundo apresenta-se adelgaçada e com maior visualização dos vasos submucosos. Além disso há redução numérica e volumétrica das pregas gástricas. Realizadas biópsias de corpo e antro em frascos separados.

Exemplos de conclusão:

  • Gastrite atrófica de antro.
  • Gastrite atrófica de corpo.
  • Alterações endoscópicas sugestivas de gastrite atrófica de antro / corpo
  • Alterações endoscópicas compatíveis com gastrite atrófica (tipo C-2 de Kimura-Takemoto)

Metaplasia intestinal gástrica

O que é importante?

  • descrever a extensão do acometimento: restrito ao antro, envolvendo antro e corpo, restrito ao corpo, envolvendo antro e pequena curvatura do corpo, etc.
  • descrever se houve a realização de biópsias e os locais.

    • Nota: o endoscopista pode decidir pela realização de biópsias de corpo, antro e incisura e solicitar ao patologista a classificação conforme protocolo OLGIM.

Nota: importante salientar que existem variações no fenótipo da metaplasia intestinal, a qual pode apresentar-se como placas esbranquiçadas levemente elevadas, ou placas superficialmente elevadas com centro deprimido (o centro geralmente é mais avermelhado), ou apenas como múltiplas áreas deprimidas. À magnificação é possível observar alteração do padrão de microarquitetura de superfície, presença de substância branca opaca e sinal da crista azul (light blue crest).

Exemplos de descrição:

Observam-se placas esbranquiçadas discretamente elevadas, sugestivas de metaplasia intestinal, distribuídas por toda extensão do antro. Realizada cromoscopia e biópsias de acordo com protocolo OLGIM.

Notam-se inúmeras áreas superficialmente elevadas, cm coloração vermelha, exibindo padrão de microarquitetura de superfície sugestivo de metaplasia intestinal. As lesões distribuem-se pelo corpo e antro, se destacam após cromoscopia. Realizadas biópsias.

Exemplos de conclusão:

  • Alterações endoscópicas sugestivas de metaplasia intestinal em antro.
  • Focos de metaplasia intestinal em corpo gástrico

Lesão subepitelial

O que é importante?

  • descrever a localização da lesão, seu tamanho estimado, consistência e mobilidade
  • descrever o aspecto da mucosa que recobre a lesão (íntegra ou não)

Exemplos de descrição:

Observa-se lesão elevada recoberta por mucosa íntegra, medindo aproximadamente 10mm, móvel à palpação com a pinça, localizada em parede anterior de antro, compatível com lesão subepitelial.

Nota-se lesão elevada, recoberta por mucosa lisa, de aspecto subepitelial, medindo 2,5 cm, localizada em parede posterior de segmento médio de corpo, endurecida ao toque da pinça.

Exemplos de conclusão:

  • Lesão subepitelial em corpo gástrico.
  • Lesão subepitelial em antro gástrico

Úlcera gástrica

O que é importante?

Importante uma descrição detalhada da úlcera com informações importantes para guiar o tratamento, bem como para levantar suspeita quanto natureza benigna ou maligna. A descrição deve incluir:

  1. localização da úlcera
  2. tamanho
  3. formato (ovalada, alongada)
  4. profundidade (rasa, profunda)
  5. aspecto das bordas (regulares ou não / definidas ou não),
  6. retração ou deformidade das pregas,
  7. aspecto do fundo da úlcera (fibrina, restos necróticos, restos hematínicos, etc)

Finalmente, conclui-se a fase do ciclo da úlcera conforme a classificação de Sakita

No caso de úlcera hemorrágica, descrever a presença de estigmas de sangramento recente (vaso visível, coágulo aderido) conforme classificação de Forrest, e se foi realizada terapia endoscópica.

Exemplos de descrição:

Na parede anterior do antro distal observa-se uma ulceração profunda, com formato redondo, medindo cerca de 20 mm. A ulceração apresenta bordos regulares, edemaciados e com halo de enantema. O fundo da ulceração é recoberto por fibrina espessa com restos necróticos.

Na pequena curvatura do antro distal, nota-se úlcera superficial em cicatrização, com convergência de pregas, bordas regulares, hiperemiadas e com pequena área linear de fibrina medindo aproximadamente 5 mm.

Na pequena curvatura do antro, presença de retração cicatricial, compatível com cicatriz de úlcera gástrica.

Exemplos de conclusão:

  • Úlcera em atividade no antro gástrico (Sakita A1)
  • Retração cicatricial no antro gástrico (Sakita S2)
  • Cicatriz de úlcera bulbar (Sakita S2)

Anatomia alterada cirurgicamente

O que é importante?

Descrever a alteração anatômica encontrada, o tamanho do remanescente gástrico (se houver) e sempre que possível identificar o tipo de reconstrução de trânsito que foi empregada. Importante descrever o tipo, tamanho e aspecto da anastomose.

A seguir, exemplificaremos as principais cirurgias que lidamos no nosso dia a dia.

Bypass gastrico

O que é importante?

Descrever o tamanho do remanescente gástrico, presença de constrição anelar se houver e estimar o diâmetro da anastomose. Importante avaliar presença de erosões ou ulceras perianastomoticas e se há torção de eixo na alça alimentar.

Exemplos de descrição:

Estômago operado, com evidências de gastroplastia redutora e reconstrução a Y de Roux.

Coto gástrico medindo 4 cm, com mucosa de aspecto preservado.

Anastomose gastrojejunal em bom aspecto, medindo aproximadamente 1,5 cm de diâmetro e sem lesões.

Alça alimentar sem alterações de eixo ou lesões de mucosa.

Exemplos de conclusão:

Gastroplastia redutora com reconstrução a Y de Roux (Bypass gástrico)

Status pós-operatório de gastroplastia redutora com reconstrução em Y de Roux

Gastrectomia Vertical

O que é importante?

Descrever a forma do remanescente gástrico, atentando-se para a transição corpo antro, próximo da incisura angularis, onde pode haver estenose ou torção de eixo.

Exemplos de descrição:

Presença de sutura longitudinal na grande curvatura do corpo, conferindo forma tubular ao órgão.

Transição corpo-antro (ou…. região da incisura angularis) permitindo a passagem do aparelho sem dificuldades.

Mucosa….

Exemplos de conclusão:

Gastrectomia vertical.

Status pós-operatório de gastrectomia vertical.

Como citar este artigo

Cardoso DMM. e Martins BC. Laudos em endoscopia digestiva alta-parte III Como descrever as alterações encontradas. Endoscopia Terapeutica 2023, vol 1. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/laudos-em-endoscopia-digestiva-alta-parte-iii-como-descrever-as-alteracoes-encontradas/




Dicas para o uso do cianoacrilato na hemorragia digestiva varicosa

O uso do adesivo tissular, n-butil-2-cianoacrilato, foi descrito pela primeira vez em 1986 para tratamento de varizes gástricas, pelo Prof. Nib Sohendra. O cianoacrilato não depende dos fatores de coagulação por se tratar de um polímero que solidifica em segundos quando em contato com umidade, sangue ou fluídos tissulares, permitindo a interrupção do sangramento em 100% dos casos.

Nesse video, resumimos o passo a passo, as indicações clínicas e os principais cuidados com o uso do cianoacrilato. Bons estudos!