Diagnóstico endoscópico da Doença Celíaca

             A doença celíaca (DC) é uma afecção crônica, autoimune, sistêmica, deflagrada e mantida pelo glúten, em indivíduos geneticamente predispostos. Caracteriza-se por uma variável combinação de haplótipos HLA DQ2 e/ou HLA DQ8, produção de auto anticorpos e enteropatia. A inflamação persistente da mucosa do intestino delgado causa lesões identificáveis pela endoscopia digestiva alta (EDA) e pela histopatologia.

Embora sejam descritas alterações da mucosa duodenal sugestivas de DC à EDA convencional, são poucos os médicos que as conhecem. Há, portanto, necessidade de maior divulgação delas entre os endoscopistas. Além disso, o uso de corantes e magnificação de imagem não são rotineiros e pouco se divulga sua utilidade para um diagnóstico correto. Como são escassos os trabalhos sobre o assunto, acredita-se que uma classificação endoscópica detalhada das alterações poderá facilitar o entendimento e sua reprodutibilidade e padronizar os achados, seja em relação ao diagnóstico ou em relação à intensidade e extensão da doença. Sob outra acepção, uma comparação entre os aspectos endoscópicos e histopatológicos concederá ao médico uma posição mais segura da repercussão do glúten sobre a mucosa intestinal. Tais resultados são úteis, para avaliar a gravidade ao diagnóstico da DC como para o monitoramento de Dieta isenta do glúten.

A inflamação persistente da mucosa do intestino delgado na DC causa atrofia, deformando as vilosidades com extensão variável, identificadas pela endoscopia digestiva alta (EDA). Os marcadores endoscópicos clássicos configuram-se perdas das pregas de Kerkring, pregas denteadas, fissuras entre as vilosidades, aglutinações que dão o aspecto em mosaico, vasos submucosais visíveis, e micro nódulos, descritos por Brocchi et al. (1988) e Jabbari et al. (1989). Estes marcadores podem ser melhor identificados na EDA com o uso da cromoendoscopia utilizando o índigo carmim, que é instilado sobre a mucosa intestinal mesmo com aparelhos convencionais, melhorando a acurácia na identificação destes marcadores chegando em até 91% (CAMMAROTA, et al., 2009).

 

MB FIGURA 1

Figura 1. (Clique na imagem para ampliar) EDA: cromoendoscopia com índigo carmin na segunda porção do duodeno: a) diminuição das pregas de Kerkring; b) pregas denteadas; c) fissuras; d) nódulos e e) aspecto em mosaico.

 

Proposta de uma classificação baseada no aspecto duodenal em MOSAICO:

 

EDA Tipo 0: vilosidades com formas digitiformes algum foliáceo aspecto regular e contínuo correspondendo ao Tipo 0 pré infiltrativo da classificação de Marsh.

EDA Tipo I: vilosidades na maioria regulares com alguns focos de aglutinação sem formar aspecto em mosaico, correspondendo ao Tipo 1 infiltrativo da classificação de Marsh.

EDA Tipo II: Vilosidades aglutinadas formando aspecto em mosaico com vilosidades ainda visíveis, correspondendo ao Tipo 2 infiltrativo hiperplásico da classificação de Marsh.

EDA Tipo III: Ausência de vilosidades com formação em mosaico, correspondendo aos Tipos 3 e 4 pois a superfície duodenal é semelhante na endoscopia, destrutivo plano (Tipo 3) e hiperplásico atrófico (Tipo 4) da classificação de Marsh.

 

MB FIGURA 2

Figura 2. (Clique para ampliar) Comparação  endoscópica com cromoscopia e magnificação da imagem duodenal  x   histopatologia de Marsh (1992).

 

MB FIGURA 4

Figura 3. (Clique para ampliar) Classificação proposta pelo autor com imagens em luz branca, cromoscopia com índigo carmin, magnificação de imagem e correlação histológica.

 

Algoritmo proposto associando a EDA e a histopatologia de Marsh (1992) em pacientes com DC

MB FIGURA 3

(Clique na imagem para ampliar)

A classificação proposta pretende diminuir as diferenças no diagnóstico endoscópico e histopatológico da DC, auxiliando a monitoração após a dieta isenta de glúten. Além disso, pretende  divulgar entre os médicos endoscopistas, um algoritmo padronizado que estimule a avaliação duodenal mais detalhada, utilizando cromoendoscopia nos casos suspeitos e, dessa forma, diminuir o índice de pacientes portadores desta afecção não diagnosticados.

 

O autor

O Dr Mauro W Bonatto é um entusiasta da cromoendoscopia e magnificação de imagem nos pacientes com doença celíaca. Esta classificação foi apresentada como tese de Doutorado, defendida este ano (2015) na Pontifícia Universidade Católica do Paraná.

 

Referências

BROCCHI, E., CORAZZA, G. R., CALETTI, G., et al. Endoscopic demonstration of loss of duodenal folds in the diagnosis of celiac disease. New England Journal Medical. 319(12):741-4. 1988.

CAMMAROTA, G., FEDELI P., GASBARRINI A. Emerging technologies in upper gastrointestinal endoscopy and celiac disease. Nature clinical practice. Gastroenterology & Hepatology. 6:47-56. 2009.

JABBARI, M., WILD, G., GORESKY, C. A., et al. Scalloped valvulae conniventes: an endoscopic marker of celiac sprue. Gastroenterology. 95:1518-22. 1989.

MARSH, M. N. Gluten, major histocompatibility complex, and the small intestine. A molecular and immunobiologic approach to the spectrum of gluten sensitivity (‘celiac sprue’). Gastroenterology. 102:330-54. 1992.

 

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capa MB




HDA: guia resumido de condutas desde admissão à alta hospitalar

A hemorragia digestiva alta (HDA) é definida como o sangramento intra-luminal proximal ao ligamento de Treitz. Quanto à etiologia, pode ser classificada em HDA varicosa e HDA não-varicosa. Hematêmese e melena são sinais e/ou sintomas gerais da HDA.

Os diagnósticos mais frequentes são: úlcera péptica (37-55%), erosões gastroduodenais (6-24%), varizes gastroesofágicas (10-23%), esofagite (4-6%).

 

 

AVALIAÇÃO INICIAL

 

  • Obtenção da história clínica, exame físico com toque retal, e dos parâmetros hemodinâmicos (PA, FC, SatO2).
  • Hemograma, coagulograma, eletrólitos (sódio, potássio), uréia, creatinina.
  • Tipagem sanguínea nos casos com suspeita de sangramento volumoso.
  • Internação em UTI: idosos, com comorbidades, sangramento varicoso ou grave.
  • Proteção das vias aéreas com IOT: hematêmese volumosa ou rebaixamento do nível de consciência.

 

 

ESTRATIFICAÇÃO DO RISCO

 

Utilização do escore de Glasgow-Blatchford (EGB), ver tabela abaixo:

Tabela: Escore de Glasgow Blatchford.

Tabela: Escore de Glasgow Blatchford.

  • Se EGB ≥ 1: casos de alto risco de intervenção ou morte, com sensibilidade > 99%.
  • Se EGB = 0 casos de baixo risco e podem receber alta precoce, com realização da EDA ambulatorialmente no dia seguinte.

 

RESSUSCITAÇÃO VOLÊMICA

  • Obter dois acessos periféricos calibrosos para infusão de soluções cristalóides.
  • Objetivo de alcançar uma PAS de 90 a 100 mmHg e FC abaixo de 100 bpm.

 

 

HEMOTRANSFUSÃO

 

  • Transfusão de hemácias para manutenção de Hb sérico entre 7 e 8 g/dL.
  • Idosos ou cardiopatas podem necessitar de níveis mais altos de hemoglobina.
  • Transfusão de plaquetas e plasma fresco congelado, uso de vitamina K ou sulfato de protamina, devem ser considerados nos pacientes com distúrbios da coagulação e sangramento grave.
  • Não há consenso para a correção da coagulopatia e plaquetopenia nos pacientes cirróticos com HDA.

 

 

LAVAGEM COM SONDA NASOGÁSTRICA

 

  • O aspirado pela SNG sem sangue não exclui a necessidade de EDA.
  • Pode ser considerada na necessidade de lavagem da câmara gástrica para remoção de resíduos, sangue e coágulos com objetivo de facilitar o exame endoscópico.

 

 

DROGAS PROCINÉTICAS

 

  • Casos de HDA e suspeita de terem quantidade significativa de sangue e coágulos na câmara gástrica.
  • Eritromicina intravenosa (IV) na dose de 250 mg, diluída em 100 mL de soro fisiológico (0.9%), com infusão em 30 min e cerca de 30 a 60 min antes da EDA.

 

 

INIBIDORES DE BOMBA DE PRÓTONS

 

  • Na suspeita de HDA não-varicosa.
  • Iniciar a infusão do IBP anteriormente a EDA.
  • Omeprazol em altas doses: bolus de 80 mg, seguido por 8 mg/h
  • Manter o IBP IV em altas doses por 72 h nos casos de UP com Forrest IA, IB, IIA e IIB

 

Tabela: Classificação de Forrest.

Tabela: Classificação de Forrest.

 

 

INFECÇÃO POR HELICOBACTER PYLORI

 

  • Todos os casos de HDA por úlcera péptica (UP) devem ser pesquisados para a infecção por H. pylori, e se for constatada o tratamento deve ser oferecido.
  • Teste rápido com urease realizado durante a EDA é o mais utilizado na prática clínica, por ser de baixo custo, com rápido resultado e fácil execução.

 

 

ANTIBIOTICOPROFILAXIA

 

  • Nos pacientes cirróticos com HDA, com ou sem ascite.
  • Norfloxacino 400 mg por via oral, 2x ao dia, por 7 dias.
  • Pacientes com cirrose hepática avançada e HDA: ceftriaxona intravenosa (1g/dia)  por 7 dias.

 

 

DROGAS VASOATIVAS

 

  • Na suspeita de HDA varicosa.
  • Iniciar infusão anteriormente a EDA.
  • Terlipressina com dose de ataque IV de 2 mg, com dose de manutenção a cada 4 horas de acordo com o peso corporal: 1,0 mg para pacientes com até 50 kg, 1,5 mg para pacientes entre 50 e 70 kg ou 2,0 mg para pacientes com mais de 70 kg.
  • A terlipressina deve ser mantida até que o sangramento tenha sido controlado por 24 horas. E a duração da terapia medicamentosa poderá estender-se por até 5 dias.

 

 

EDA NA HDA NÃO-VARICOSA

 

  • EDA deve ser realizada nas primeiras 24 horas.
  • Em pacientes de alto risco de eventos adversos, dado por EGB ≥ 12, EDA deve ser realizada nas primeiras 12 horas.
  • A terapêutica endoscópica nos pacientes com UP está indicada se: Forrest IA, IB e IIA.
  • Considerar terapia endoscópica se UP com Forrest IIB, especialmente nos pacientes com alto risco de ressangramento.
  • Dar preferência para uso da terapia combinada (injeção de adrenalina + segundo método), ou monoterapia com método térmico ou hemoclipe.

“Second-look” endoscópico

  • Não realizar de rotina.
  • Considerar em pacientes selecionados com alto risco de ressangramento.

 

 

EDA NA HDA VARICOSA

 

  • EDA deve ser realizada nas primeiras 12 horas.
  • Dar preferência ao uso da ligadura elástica.
  • A escleroterapia deve permanecer como opção quando a ligadura não é disponível ou quando esta não é possível devido à dificuldade técnica.

Figura: ligadura elástica de variz esofágica.

Figura: ligadura elástica de variz esofágica.

Figura: Esclerose de variz esofágica.

Figura: Esclerose de variz esofágica.

 

EDA na HDA varicosa por varizes gástricas

  • Hemostasia com injeção de cianoacrilato.

 

 

SANGRAMENTO PERSISTENTE E RESSANGRAMENTO

 

  • Uma segunda tentativa de tratamento endoscópico pode ser realizada. Deve-se considerar a utilização de método terapêutico endoscópico diferente do utilizado anteriormente.
  • Se a hemorragia não for interrompida rápida e efetivamente com a segunda terapêutica endoscópica, deve-se proceder com a realização de medidas de resgate.
  • Medidas de resgate na HDA não-varicosa: embolização por arteriografia e cirurgia.
  • Medidas de resgate na HDA varicosa: uso temporário de balão de SengstakenBlakemore (máx de 24h)TIPS e Cirurgia.

 

 

ANTES DA ALTA HOSPITALAR NA HDA NÃO-VARICOSA

 

  • IBP oral de acordo com achados da EDA.
  • Tratamento da infecção por H. pylori em casos de UP.

 

 

ANTES DA ALTA HOSPITALAR NA HDA VARICOSA

 

  • Iniciar propranalol assim que haja compensação hemodinâmica. A dose inicial é 20 mg, por via oral, a cada 12 horas, e deve ser titulada para a dose máxima tolerada pelo paciente.
  • Ligadura elástica a cada 1 a 3 semanas até erradicação das varizes esofágicas.
  • Casos de varizes de fundo gástrico: profilaxia secundária com injeção de cianoacrilato.

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Uso de prótese metálica no câncer colorretal

INTRODUÇÃO:

Cerca de 10 a 30% dos pacientes com câncer colorretal (CCR) vão apresentar obstrução colônica como apresentação inicial.

A obstrução colônica aguda é uma condição grave que traz risco de vida, e que requer tratamento cirúrgico imediato.

Dentre os diversos tratamentos cirúrgicos, a cirurgia de Hartmann é o procedimento mais comumente realizado.
Entretanto a cirurgia realizada em caráter de emergência está associada a taxa de mortalidade de 10 a 30%, e de morbidade de 10 a 36%.

Esses dados encorajaram o desenvolvimento de procedimentos alternativos, com maior destaque para o uso endoscópico de prótese metálica auto-expansível (PMAE), que permite o alívio temporário da obstrução colônica aguda (ver figuras abaixo).

 

Radioscopia exibindo cintura no meio da prótese dada pela estenose tumoral.

Radioscopia exibindo cintura no meio da prótese dada pela estenose tumoral.

Prótese metálica em paciente com câncer estenosante de reto.

Prótese metálica em paciente com câncer estenosante de reto.

 

A PMAE pode ser utilizada em 2 indicações:

  • Como ponte para cirugia;
  • Para paliação dos sintomas obstrutivos.

 

Como ponte para cirurgia, a PMAE permite que o paciente possa receber um preparo pré-operatório adequado do cólon, e também possibilita converter uma situação de emergência em um cenário eletivo. Com esta conduta, diminui-se a necessidade de realização de uma ostomia, bem como aumenta a chance de realização de anastomose primária em um único tempo cirúrgico.

No tratamento paliativo da CCR irressecável, a PMAE permite a realização de radio e quimioterapia, e em comparação com a cirurgia está associada a menor tempo internação hospitalar, além de evitar a realização de ostomias.

As complicações a curto prazo que podem ocorrer após a passagem da PMAE incluem perfuração, sangramento, tenesmo, dor e incontinência fecal. E a longo prazo as principais são reestenose e migração. Perfuração intestinal é a complicação mais grave pois pode levar a peritonite fecal, podendo ser fatal.

 

ESTUDO DO INSTITUTO DO CÂNCER DO ESTADO DE SÃO PAULO (ICESP):

Objetivo

Reportar a experiência do ICESP com o uso de PMAE no manejo da obstrução colônica de origem maligna, tanto para a paliação dos sintomas, como para ponte antes da cirurgia.

Metodologia

Análise retrospectiva de dados coletados prospectivamente, cm pacientes com obstrução colônica devido CCR submetidos a passagem de PMAE, entre julho de 2010 e Julho de 2014, no ICESP.

Sucesso técnico foi definido como a liberação correta da PMAE através da estenose maligna. E o sucesso clínico foi definido como a resolução dos sintomas de obstrução dentro das primeiras 72 horas após passagem da PMAE.

Resultados

Foram realizados 42 procedimentos de passagem de PMAE não coberta em 40 pacientes, com mediana de idade de 60.2 anos, e predomínio do sexo feminino (52.5%).

A intenção do tratamento foi paliação dos sintomas em 21 pacientes (52.5%), e ponte para cirurgia em 19 pacientes (47.5%).

A localização da obstrução foi mais predominantemente no: reto (30%), junção retossigmóide (22.5%), descendente/sigmóide (22.5%).

O aparelho de colonoscopia de 12.8 mm não pode traspor a estenose em 92.5% dos casos.

A taxa de sucesso técnico foi de 97.6%, e de sucesso clínico de 88% (ver gráfico 1 abaixo):

 

Gráfico 1: Taxas de sucesso técnico e clínico, após passagem de prótese em pacientes com CCR.

Gráfico 1: Taxas de sucesso técnico e clínico, após passagem de prótese em pacientes com CCR.

 

Dos 5 pacientes que foram submetidos a cirurgia de urgência após tentativa de PMAE sem sucesso, a taxa de criação de ostomia foi de 88% e de anastomose primária de 40%. Em comparação, dos 16 pacientes que receberam PMAE como ponte para cirurgia com sucesso, a taxa de criação de ostomia foi 50% e de anastomose primária de 75%. Ver gráfico 2 abaixo:

 

Gráfico 2: Taxas de criação de ostomia e anastomose primária, após passagem de prótese, com e sem sucesso, em pacientes com CCR.

Gráfico 2: Taxas de criação de ostomia e anastomose primária, após passagem de prótese, com e sem sucesso, em pacientes com CCR.

 

A média de tempo para realização de cirugia foi de 40 dias, e houveram 3 casos (18.7%) de complicações pela prótese: 2 perfurações e 1 ingrowth (ver gráfico 3).

Dos 21 pacientes que recebram PMAE para paliação dos sintomas obstrutivos, a taxa de sucesso foi de 91.3%. Quimio e/ou radioterapia foi realizada em 18 casos (85.7%). Durante uma mediana de acompanhamento de 3.12 meses, observaram-se complicações em 42.1%: 3 migrações, 2 ingrowth, 1 dor abdominal severa, 1 hematoquezia e 1 perfuração. A maioria desses casos foram manejados conservadoramente ou com uma segunda prótese, e apenas 1 paciente necessitou de cirurgia devido a perfuração relacionada à prótese. Ver gráfico 3 abaixo:

 

Gráfico 3: Taxas de complicações, após passagem de prótese em pacientes com CCR.

Gráfico 3: Taxas de complicações, após passagem de prótese em pacientes com CCR.

 

Conclusão

O tratamento da obstrução colônica aguda devido ao CCR com PMAE é seguro e efetivo. A PMAE evita a cirurgia de emergência, pode reduzir a taxa de criação de ostomia e permite a realização de tratamento oncológico de forma segura em pacientes com doença disseminada.

 

Referências:

Martins BC, Franco MC, Rios JT, Kawaguti FS, Lima MS, Safatle-Ribeiro AV, Sorbello MP, Pennacchi C, Retes FA, Uemura RS, Gusmon CC, Geiger SN, Baba ER, Marques CFS, Ribeiro U, Nahas SC, Maluf-Filho F. Self-Expanding metallic stents for the treatment of malignant colorectal obstruction are effective and safe. Gastrointest Endosc. 2015 May; 81(5):AB293.

Lujan HJ, Barbosa G, Zeichen MS, Mata WN, Maciel V, Plasencia G, Hartmann RF, Viamonte III M, Fogel R. Self-expanding metallic stents for palliation and as a bridge to minimally invasive surgery in colorectal obstruction. JSLS. 2013 Apr-Jun;17(2):204-11.

Repici A, de Paula Pessoa Ferreira D. Expandable metal stents for malignant colorectal strictures. Gastrointest Endosc Clin N Am. 2011 Jul;21(3):511-33.

Tan CJ, Dasari BV, Gardiner K. Systematic review and meta-analysis of randomized clinical trials of self-expanding metallic stents as a bridge to surgery versus emergency surgery for malignant left-sided large bowel obstruction. Br J Surg. 2012 Apr;99(4):469-76.

 




Underwater EMR – mucosectomia de lesões colônicas sem injeção submucosa

A mucosectomia é um método muito bem estabelecido para a ressecção de lesões benignas do cólon. A  injeção submucosa é considerada como parte fundamental durante a aplicação desta técnica, fazendo a elevação da lesão e afastando a submucosa da muscular própria, teoricamente reduzindo o risco de perfuração e lesão térmica das camadas mais profundas. Apesar disso,  a injeção submucosa pode, em alguns casos, dificultar ou até inviabilizar a captura de lesões planas, fazendo com que a alça deslize sobre elas. Outra preocupação é a possibilidade da injeção levar células para camadas profundas quando a punção é feita através do pólipo (1).

Em 2012, Binmoeller et al. publicaram a primeira série de casos de uma nova opção para realizar mucosectomias sem a necessidade de injeção submucosa. Nessas ressecções foi  utilizada  a imersão completa da lesão em água e ressecção com alça diatérmica “underwater“.  Este procedimento foi desenvolvido a partir da observação de que durante a imersão em água para fazer ecoendoscopia de lesões precoces no cólon a mucosa e a submucosa ficavam “boiando” enquanto a muscular própria se mantinha distendida (figura 1).

Underwater EMR

Figura 1 – Imagem de ecoendoscopia radial demonstrando a mucosa e submucosa “boiando” na água enquanto a muscular própria se mantém distendida (clique para aumentar)

 

Para realização da mucosectomia, após a identificação da lesão, todo o ar do cólon era aspirado e realizada a infusão de água em temperatura ambiente.  Todas as ressecções foram realizadas com  alça tipo duckbill de 15 mm (figura 2).  Em nenhum paciente a mucosa foi aproximada após a ressecção.

 

AcuSnare® Duck Bill_jfq3_esc_asdb

Figura 2 – Alça tipo duckbill de 15 mm (clique para aumentar).

 

Nesta primeira série, foram apresentados dados de 62 lesões sésseis ressecadas com a técnica de mucosectomia underwater. O tamanho médio das lesões era de 34 mm. Todas as lesões foram ressecadas com sucesso.  Não houve nenhuma perfuração. Três pacientes apresentaram sangramento tardio, e todos foram tratados conservadoramente. O seguimento médio foi de 20,4 semanas e apenas 1 paciente apresentou lesão residual de 5 mm que foi ressecada endoscopicamente (1).

 

Underwater EMR de lesão de reto.

 

Outra série publicada na Surgical Endoscopy em 2014 (2) relatou 21 pacientes com 43 lesões ressecadas utilizando a técnica de mucosectomia underwater. O tamanho médio das lesões era de 30 mm (8-50 mm).  Dezesseis lesões eram localizadas no cólon direito, 5 no transverso, 19 no cólon esquerdo e 3 no reto. Em relação à patologia, 34 eram adenomas, 3 neoplasias intraepiteliais de alto grau, 3 adenomas serrados e 3 inflamatórios.  A ressecção completa foi possível em 97,7% dos pólipos. Em relação às complicações apenas 1 paciente apresentou sangramento tardio.

Em maio deste ano (2015),  Curcio et al. (3) publicaram uma série de 72 pacientes submetidos à 81 ressecções de pólipos com a técnica de mucosectomia underwater utilizando alça de polipectomia padrão. O tamanho médio das lesões era de 18,7 mm (10-50 mm).  Cinquenta e cinco pólipos (68%) foram ressecados en bloc e o restante em piecemeal.  A histopatologia demonstrou 30,9 % de adenomas sem displasia, 42 % de adenomas com displasia de alto grau, 4,9% de pólipos serrados e 13,6% de carcinoma in situ. Em dois casos ocorreu sangramento imediato após a mucosectomia.  O autor relata que o tratamento underwater permitiu uma melhor identificação do ponto de sangramento, facilitando a realização da hemostasia. Nenhum paciente apresentou sangramento  tardio ou perfuração. A endoscopia de controle foi realizada 3 meses após, sem nenhuma recidiva.

Kim et al.(4) publicou uma série na Gastrointestinal Endoscopy demonstrando que esta técnica também pode ser aplicada para recorrências de lesões ressecadas previamente.  Neste estudo foi comparado a ressecção de lesões recidivadas utilizando a mucosectomia tradicional (n= 44) com a técnica underwater (n=36). O tamanho médio das lesões era semelhante  entre os 2 grupos (9,3 mm vs 9,4 mm). A taxa de ressecção en bloc foi maior no grupo underwater (47,2% vs 15,9%) e a necessidade de uso de APC para lesões  residuais durante a ressecção da recidiva foi menor no grupo underwater (11,1% vs 65,9%).  Na colonoscopia de seguimento a recorrência também foi menor no grupo tratado com a técnica underwater (10% vs 39,4%).

 

Underwater EMR de lesão recidivada.

 

Conclusão

A técnica de mucosectomia underwater parece apresentar benefícios significativos em relação à mucosectomia convencional. As séries iniciais demonstram que a técnica é facilmente aprendida e executada por profissionais com experiência em mucosectomia tradicional, além de apresentar um baixo índice de complicações.  Nas lesões residuais aparentemente facilita o tratamento, tem um maior índice de ressecção completa e menor recidiva. Porém ainda é cedo para tirar conclusões definitivas. Novas séries com grande número de casos e trabalhos prospectivos e controlados ainda são necessários para confirmar estes achados iniciais.

 

Referências

1          Binmoeller KF, Weilert F, Shah J, Bhat Y, Kane S. “Underwater” EMR without submucosal injection for large sessile colorectal polyps. Gastrointest Endosc. 2012;75(5):1086-91.

2          Wang AY, Flynn MM, Patrie JT, Cox DG, Mann JA, Sauer BG, Shami VM.  Underwater endoscopic mucosal resection of colorectal neoplasia is easily learned, efficacious, and safe.  Surg Endosc. 2014;28(4):1348-54.

3          Curcio G, Granata A, Ligresti D, Tarantino I, Barresi L, Liotta R, Traina M.  Underwater colorectal EMR: remodeling endoscopic mucosal resection. Gastrointest Endosc. 2015;81(5):1238-42.

4          Kim HG, Thosani N, Banerjee S, Chen A, Friedland S. Underwater endoscopic mucosal resection for recurrences after previous piecemeal resection of colorectal polyps. Gastrointest Endosc. 2014;80(6):1094-102.

 

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O papel da endoscopia no manejo das lesões pré-malignas e malignas do estômago

Post realizado por:  Alex Baia Gualter Leite

Residência de Gastroenterologia e Endoscopia Digestiva pela Escola Paulista de Medicina / UNIFESP. Médico endoscopista da Clínica Gastro Diagnóstico, Vitória.

O texto abaixo discorre sobre o papel da endoscopia nas lesões pré-malignas (tópico 1) e malignas (tópico 2) do estômago.  A fonte para referência é o recente guideline da ASGE sobre esse tema.

Abaixo tabela com os detalhes das recomendações usadas no texto:

Imagem tabela

1. CONDIÇÕES PRÉ-MALIGNAS DO ESTÔMAGO

  • Pólipos gástricos epiteliais esporádicos

A maioria (70% – 90%) são pólipos de glândulas fúndicas (PGFs) ou pólipos hiperplásicos.

PGFs podem surgir em associação ao uso crônico de IBPs, e não estão relacionados com malignização.

Pólipos hiperplásicos, por sua vez, estão associados ao aumento de risco de câncer gástrico, já que elementos displásicos e neoplasia focal podem ser encontrados em 5%-19% destes.

Pólipos adenomatosos possuem potencial maligno e devem ser removidos endoscopicamente. Durante seguimento, a recorrência após ressecção tem sido reportada em torno de 2.6%, e a presença de neoplasia gástrica em 1.3%. Recomenda-se endoscopia de controle 1 ano após ressecção de pólipo adenomatoso, com posterior seguimento endoscópico a cada 3-5 anos.

RECOMENDAÇÕES:

  • Biópsia, ou ressecção quando possível, de pólipos gástricos solitários (4+)
  • Polipectomia de PGF ≥ 1 cm, pólipo hiperplásico ≥0,5 cm, e pólipo adenomatoso de qualquer tamanho, quando possível (2+)
  • Vigilância endoscópica 1 ano após a remoção de pólipos adenomatosos (2+)
  • Na presença de múltiplos pólipos recomenda-se ressecção dos maiores e biópsias para amostragem dos demais (4+)
  • Na presença de múltiplos pólipos hiperplásicos ou adenomatosos, sugere-se biópsias da mucosa gástrica ao redor dos pólipos para avaliar a presença de pylori e gastrite atrófica metaplásica (2+)
  • Pólipos gástricos em paciente com polipose adenomatosa familiar (PAF) e Síndrome de Lynch (SL)

Pólipos gástricos são comuns em pacientes com PAF. Os PGFs são os mais frequentes, sendo encontrados em mais de 88% das crianças e adultos com PAF. Casos de adenocarcinoma gástrico associado aos PGFs têm sido descrito nesses pacientes.

Adenoma gástrico também ocorre em pacientes com PAF, e quando presente  geralmente é solitário, séssil e localizado no antro.

Até o momento, existem dados conflitantes na literatura acerca do risco de desenvolvimento de câncer gástrico em pacientes com SL.

RECOMENDAÇÕES:

  • Biópsias e, quando viável, ressecção dos pólipos gástricos maiores em pacientes com FAP, para confirmar histologia e avaliar displasia (2+)
  • Metaplasia gástrica intestinal e displasia

Metaplasia gástrica intestinal (MGI) é uma condição pré-maligna, com incidência de câncer no acompanhamento em torno de 11%, podendo chegar até 85% em pacientes com displasia de alto grau (DAG).

Vigilância endoscópica sugerida conforme recente consenso Europeu:

– MGI com displasia de baixo grau (DBG) = repetir EDA em 1 ano com biópsias (o tempo ideal de seguimento subsequente é desconhecido).

– Vigilância pode ser suspensa na presença de duas EDAs consecutivas sem displasia.

– MGI com displasia de alto grau (DAG) = ressecção endoscópica ou cirúrgica, devido à alta probabilidade de adenocarcinoma invasivo.

– Pesquisa do H. pylori e erradicação quando presente

RECOMENDAÇÕES:

  • Na população americana, acredita-se que o risco de progressão para câncer seja baixo, dessa forma a vigilância endoscópica para pacientes com MGI deve ser feita em pacientes com risco elevado, dado por antecedentes étnicos e familiares. O intervalo de vigilância ainda não é bem estabelecido, e deve ser individualizado. (2+)
  • Ressecção e vigilância endoscópica em pacientes com MGI e DAG (3+).
  • Anemia perniciosa

A prevalência de adenocarcinoma gástrico em pacientes com anemia perniciosa (gastrite atrófica tipo A) é de 1% a 3%, sendo mais elevado o risco de desenvolver câncer dentro do primeiro ano após o diagnóstico.

Tumores neuroendócrinos gástricos também foram observados em estudos prospectivos em pacientes submetidos à vigilância endoscópica.

Os benefícios de uma vigilância endoscópica ainda não estão bem estabelecidos.

RECOMENDAÇÕES:

  • EDA dentro de 6 meses após o diagnóstico de anemia perniciosa e naqueles pacientes com presença de sintomas digestivos altos (2+).
  • Tumor neuroendócrino gástrico

Clique aqui para informações detalhadas sobre o tema.

  • Pós operatório de gastrectomia parcial – por úlcera péptica

Existem dados conflitantes na literatura sobre o aumento do risco de neoplasia gástrica nesses pacientes. Estudos que demonstraram risco aumentado sugerem que o mesmo ocorre somente 15 a 20 anos após a cirurgia.

2. CONDIÇÕES MALIGNAS DO ESTÔMAGO

  •  Adenocarcinoma

É a lesão gástrica maligna mais comum, podendo se apresentar como lesão vegetante, úlcera gástrica não cicatrizada, ou na forma infiltrativa difusa conhecida como linite plástica.

EUS, com ou sem punção por agulha fina (PAF), tem papel importante no estadiamento locorregional (T e N).

Pacientes com câncer gástrico precoce (limitado à mucosa e submucosa – estágio T1), podem ser candidatos à ressecção endoscópica da lesão, realizada pela técnica de mucosectomia (EMR) ou dissecção submucosa (ESD).

Uma metanálise comparando EMR com ESD mostrou superioridade do ESD em relação à ressecção em bloco, ressecção completa, ressecção curativa e recorrência local. Eventos adversos foram maiores no grupo ESD, incluindo sangramento intraoperatório e perfuração. A mortalidade foi semelhantes entre os grupos.

RECOMENDAÇÕES:

  • Pelo menos 7 biópsias das lesões suspeitas de adenocarcinoma gástrico (4+).
  • Uso do EUS, com ou sem PAF, para estadiamento locorregional de câncer gástrico (2+).
  • Tratamento endoscópico com próteses metálicas auto expansíveis para paliação de câncer gástrico obstrutivo (3+).
  • Linfoma MALT gástrico

Achados endoscópicos variam desde erosões sutis a grandes massas.

A infecção pelo H. pylori (HP) está presente em quase todos os casos, sendo sua erradicação o tratamento de escolha em pacientes com linfoma de baixo grau, com eficácia na remissão clínica acima de 80%.

O intervalo ideal de vigilância endoscópica não está bem definido, porém importante estudo mostrou baixos índices de progressão com endoscopia com biópsias a cada 3 a 6 meses por 2 anos após a erradicação do HP, e posterior intervalo a cada 6 a 12 meses, em um seguimento de mais de 42 meses.

EUS pode ser utilizado para definição prognóstica, permitindo avaliação da profundidade de invasão, bem como da presença de acometimento linfonodal.

  • Tumor estromal gastrointestinal (GIST)

GIST é o tumor mesenquimal mais comum do estômago e caracteriza-se por ser uma lesão subepitelial.

Achados no EUS preditores de malignidade são:

– Tamanho > 2cm

– Bordas irregulares

– Heterogeneidade

– Invasão de estruturas adjacentes

A análise anatomopatológica do material obtido por PAF ecoguiada mostra células fusiformes, e a imunohistoquímica evidencia positividade para marcadores específicos, como o CD117 (KIT).

Deve-se considerar ressecção cirúrgica nos casos de: lesões sintomáticas, maiores que 2 cm, e/ou com alterações ao EUS sugestivas de potencial maligno.

RECOMENDAÇÕES:

  • EUS, com ou sem PAF, para avaliação de lesões subepiteliais gástricas (4+).
  • Vigilância com EUS anual em GIST gástrico menor que 2 cm, caso não se opte por ressecção cirúrgica, para avaliar aumento progressivo ou mudanças das características ecográficas (2+).

Para saber mais sobre este tema, acesse o site Gastropedia clicando aqui!

Referência:

ASGE Standards of Practice Committee, Evans JA, Chandrasekhara V, Chathadi KV, et al. The role of endoscopy in the management of premalignant and malignant conditions of thestomach. Gastrointest Endosc. 2015 Jul;82(1):1-8.

Assuntos relacionados:

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Assuntos gerais – Tratamento de tumor neuroendócrino gástrico

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Caso Clínico – Linfoma MALT gástrico não associado a infecção pelo Helicobacter Pylori

Quiz! – Como você descreveria esta lesão gástrica?




Como organizar seus artigos científicos com o Mendeley

Post realizado por: Rodrigo Rodrigues

Mestre e Doutor pela Escola Paulista de Medicina / UNIFESP. Médico endoscopista do Fleury Medicina e Saúde em São Paulo.

Rodrigo - Mendeley
 
Hoje em dia, devido à grande quantidade de informações científicas disponíveis e o relativo fácil acesso a periódicos com artigos digitalizados, manter e principalmente recuperar essas informações pode ser um grande desafio. Atualmente, pode-se contar com a ajuda de softwares chamados de gerenciadores de referências.
Não são muitos. Alguns são pagos, outros gratuitos, e estão aí para nos ajudar, oferecendo portabilidade à sua biblioteca particular, filtros e buscas, extração automática de metadados dos seus arquivos em pdf, possibilidade de inserir e formatar referências em seus textos, conectividade com bases de dados, além de organizar seus arquivos em estrutura de pastas e subpastas. Tudo isso sem muito esforço.
Vamos falar aqui sobre o Mendeley. Um software muitiplataforma gratuito e amigável que reúne todas estas e outras habilidades.
Por se tratar de um software, optei por demonstrar a sua utilização em dois videos que reúnem as habilidades mais cotidianas da ferramenta mas que não esgotam as suas possibilidades, uma vez que partem dos meus conhecimentos como usuário do programa.
Bons estudos!!!
 

 

 
Rodrigo Rodrigues
Médico Endoscopista do Hospital de Transplantes do Estado de São Paulo e do Fleury Medicina e Saúde.
Mestre e Doutor pela Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP/EPM.
Lattes: http://lattes.cnpq.br/0905442911956315




Como realizar cromoscopia no rastreamento de displasia em casos de doença inflamatória intestinal?

Sabe-se que os indivíduos portadores de retocolite ulcerativa e doença de Crohn possuem risco aumentado para o surgimento do câncer colorretal (CRC). Além da presença de displasia, os principais fatores conhecidos no desenvolvimento do CRC nesse grupo são a maior duração e extensão da doença, maior intensidade do processo inflamatório, presença de pseupólipos inflamatórios, estenoses que dificultam a avaliação da mucosa, colangite esclerosante primária concomitante, além da história familiar de CRC que pode haver em alguns casos.

Para evitar o surgimento do CRC nos pacientes com doença inflamatória intestinal, diversos protocolos de rastreamento de displasia são propostos, anteriormente com realização de biópsias seriadas a cada 10 cm do cólon e com um fragmento por quadrante e, mais recentemente, os principais consensos têm priorizado a realização de biópsias guiadas por cromoendoscopia.

Baseando-se nisso, elaboramos a seguir um guia de quando e como realizar cromoscopia no rastreamento de doença inflamatória intestinal.

Quando realizar a colonoscopia?

O último consenso da “American Society for Gastrointestinal Endoscopy” abordando o papel da endoscopia na doença inflamatória intestinal, que será uma das nossas principais fontes de consulta nesse guia, propõe em sua última publicação em 2015:

Primeiro exame:

  • Começar o rastreamento após 8 anos do início da doença
  • Preferencialmente em pacientes com doença em remissão
  • Pacientes com colite ulcerativa com acometimento extenso, ou cólon esquerdo
  • Pacientes com doença de Crohn que envolve pelo menos 1/3 do cólon
  • Considerar iniciar o rastreamento antes de 8 anos em pacientes com colangite esclerosante ou história familiar de CRC em parente de primeiro grau

Exames subsequentes:

  • A cada 1-3 anos
  • Presença de alguns fatores de risco implicam na necessidade de exames anuais (inflamação ativa, anormalidades anatômicas como estenoses e múltiplos pseudopólipos, história de displasia, história familiar de CRC em parente de primeiro grau, colangite esclerosante primária)
  • Pacientes com colonoscopia com remissão endoscópica e histológica da doença em 2 ou mais exames de rastreamento podem ter o intervalo entre os exames aumentado

Como fazer?

  • Utilizar preferencialmente aparelhos com alta definição (≥ 720 pixels)
  • Não há evidência atual para o uso de cromoendoscopia óptica/eletrônica (NBI, FICE, iScan)
  • Usar como meios de contraste índigo cármin ou azul de metileno
  • Certificar-se que o cólon está adequadamente limpo, sem resíduos fecais, sangue, pus ou muco
  • Após atingido o ceco inicia-se a cromoscopia
  • Injeta-se um total de aproximadamente 250 ml de contraste diluído

    • Indigo carmin 0.03% (10mL da solução de 0,8% com 250 ml de água)
    • Azul de metileno 0.04% (10 ml da solução de 1% com 240 ml de água)
    • Aplicar solução circunferencialmente no cólon utilizando-se cateter spray ou bomba injetora

  • Atentar para áreas com padrão, cor ou nível mucoso diferente
  • Quando uma lesão suspeita é identificada deve-se estudar a área com cerca de 30 ml de uma solução mais concentrada do corante

    • Indigo carmin 0.13% (5mL da solução de 0,8% com 25 ml de água)
    • Azul de metileno 0.2% (10 ml da solução de 1% com 40 ml de água)

  • Fotografar as lesões
  • Programar ressecções quando possível ou biópsias
  • Lembrar de biopsiar áreas circunjacentes a lesão para avaliação de displasia invisível
  • Tatuar se necessário
  • Mesmo que não sejam encontradas lesões displásicas, não esquecer de biopsiar cada segmento do cólon com pelo menos 2 fragmentos, na avaliação de atividade histológica de doença

Como classificar as lesões:

  • Displasia visível – displasia identificada em biópsias de uma lesão visualizada a colonoscopia
  • Pólipóide – lesão protruindo da mucosa dentro do lúmen ≥ 5 mm

    • Séssil
    • Pediculada

  • Lesão não polipoide – < 2,5 mm ou não protruindo da mucosa

    • Superficial elevada – com protrusão no lúmen < 2,5 mm
    • Plana
    • Deprimida

  • Descritores gerais

    • Ulcerada
    • Borda distinta x não distinta da mucosa adjacente

  • Displasia invisível – displasia identificada em biópsias seriadas do cólon sem lesão visível

Assista esse vídeo

Leitura recomendada:

  • Shergill, Amandeep K. et al. The role of endoscopy in inflammatory bowel disease. Gastrointestinal Endoscopy , Volume 81 , Issue 5 , 1101 – 1121.e13
  • Laine, LorenEast, James E. et al. SCENIC International Consensus Statement on Surveillance and Management of Dysplasia in Inflammatory Bowel Disease. Gastroenterology , Volume 148 , Issue 3, 639 – 651.e28
  • Veja a diretriz do SCENIC International Consensus aqui e o consenso da ASGE sobre o papel da endoscopia na doeça inflamatória intestinal aqui



Ingestão de corpo estranho

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Introdução:

  • A ingestão de corpos estranhos é responsável por cerca de 1500 mortes/ano.
  • É mais comum na infância entre seis meses e seis anos. Em 98% dos casos ocorre de forma acidental.
  • Nos adultos geralmente é secundário à ingestão alimentar (osso, bolo alimentar).
  • A ingestão de corpos estranhos não alimentar é mais comum em adultos do sexo masculino, em situações de abuso de substancias, ou doença psiquiátrica.
  • A maioria dos casos de ingestão de corpos estranhos (C.E.), se resolve de modo expectante (80%), cerca de 10 a 20% necessitam de retirada endoscópica, e uma minoria, de retirada cirúrgica.

Quadro clínico:

  • A maioria dos casos de C.E. em crianças são moedas, e em adultos, as impactações alimentares são mais comuns, e normalmente secundária a alguma alteração anatômica (estenoses, anéis esofágicos, neoplasias e esofagite eosinofílica).
  • As queixas mais comuns são disfagia, odinofagia, salivação e dor torácica.
  • Em crianças menores, o diagnóstico é mais difícil, devendo-se atentar ao sinais apresentados, como recusa em se alimentar, salivação, vômitos, alterações respiratórias e até afogamento.
  • Em todos os pacientes, deve-se investigar sinais de complicações, como dificuldades respiratórias, hemorragias digestivas ou enfisema subcutâneo.
  • Exames radiológicos podem ajudar no diagnóstico, sendo a radiografia o exame inicial, porém, na suspeita de C.E. não radiopaco (alimento, plásticos ou alumínio), a tomografia computadorizada pode ser útil, e determinar a natureza e formato do C.E.
  • Especialmente em crianças, observa-se maior impactação no esôfago cervical, ao nível do cricofaríngeo (radiologicamente, na altura das clavículas). Deve-se evitar exames contrastados, devido ao risco de aspiração.

Tratamento:

O formato e composição do C.E. influencia no tipo de tratamento. Com relação ao formato, podem ser rombos ou pontiagudos, curtos ou longos, e de composições específicas, como bezoares, bolos alimentares ou baterias.

A máxima de “cada caso é um caso” também se aplica ao tratamento de pacientes com C.E., porém, algumas orientações gerais podem ser descritas. Nos casos de C.E. pontiagudos, ou baterias no esôfago, desconforto importante, alterações respiratórias ou obstrução total (risco de aspiração), está indicada a remoção endoscópica de urgência. Na ausências destas alterações, o exame pode ser postergado porém, nenhum C.E. deve permanecer por mais de 24 horas impactado no esôfago.

A impactação alimentar (bolo), como já descrito, é normalmente secundária a alteração anatômica, e atualmente, com o aumento de cirurgias bariátricas, tem se tornado mais frequenta nestes pacientes. A obstrução normalmente é total, com desconforto torácico e salivação.  A remoção endoscópica por vezes envolve a retirada de todo o fragmento com alça, ou sua fragmentação com pinças ou alça, e secundariamente empurrar os fragmentos para o estômago ou retira-los pela boca (pode ser interessante o uso de overtube para facilitar o procedimento).

Objetos rombos (em geral, moedas), passam pelo TGI sem problemas quando menores que 2cm. A retirada endoscópica está indicada:

  • objetos rombos maiores que 2 cm,
  • objetos impactados no esôfago,
  • quando não saem do estômago após 4 semanas

Pilhas e baterias devem ser sempre retirados de forma urgente, quando impactados em esôfago, já que podem causar perfuração ( a mucosa entra em contato com os dois polos, conduzindo corrente elétrica, gerando necrose por liquefação) . Caso a bateria esteja alojada no estômago, a chance é que ela passe pelo resto do trato gastrointestinal sem intercorrências. Nestes casos , o paciente, assintomático, pode ser acompanhado com exames radiológicos a cada três ou quatro dias, optando-se pela retirada endoscópica caso a bateria tenha mais de 20mm, impactada no estômago por mais de 48 horas, ou evolua com alterações gastrointestinais (pode ser tentada retirada endoscópica).

A ingestão de imãs tem se tornado mais frequente, já que cada vez menores e mais fortes, são usados em vários objetos, especialmente em brinquedos. Quando a ingestão é única, sua retirada é indicada quando ainda no trato gastrointestinal alto, e após a passagem pelo piloro, pode ser acompanhado. Quanto a ingestão é múltipla , o risco de complicações aumenta, já que eles podem levar a perfuração mais facilmente (atração entre eles, através das paredes do intestino). A retirada deve ser urgente, e para as peças que já tenham passado pelo estômago, a consulta com o cirurgião pediátrico é fundamental. Caso o paciente esteja sintomático, a retirada deve ser cirúrgica, se o paciente esta assintomático, a retirada endoscópica pode ser tentada.

Objetos pontiagudos (agulhas, ossos, palitos de dente), devem ser retirados antes de saírem do estômago, já que a podem perfurar o intestino ou impactar (válvula íleocecal ou anus). Nos casos de impactação em esôfago, a retirada deve ser urgente, já que após 72hs, o risco de perfuração, ou erosão para vai área ou grande vasos aumenta muito. Casos em que não é possível a retirada segura (objeto pontiagudo grande, impactado há mais de três dias, sinais de perfuração) a remoção cirúrgica esta indicada.

Objetos grandes, em geral, maiores que 5cm (canetas, ferramentas , escovas de dente), em geral, não passam pelo duodeno, devendo ser retirados. Como o procedimento pode ser difícil, o controle e proteção da vai aérea é importante, podendo ser indicado intubação orotraqueal ou uso de overtube.

Bezoares (concreções secundárias a material  deglutido, como cabelos, bário, vegetais), podem ser de difícil retirada, pois em geral tendem a ser volumosos (como no tricobezoar), estando indicada a cirurgia.

No caso de ingestão de pacotes de narcóticos a remoção endoscópica é contraindicada, pois a manipulação dos pacotes pode levar a perfuração do mesmo, com liberação da droga no estômago do paciente, e consequente overdose. Em geral se aguarda a eliminação espontânea da droga, e quando esta não ocorre, indica-se a cirurgia.

Por fim a impactação de C.E., em intestino médio, pode ser removido por endoscopia, quando presentes enteroscópios e acessórios adequados para tal.

Sumarizando:

‘Timing” da endoscopia:

  • Emergência :
    • Obstrução de esôfago (risco de aspiração)
    • Baterias no esôfago
    • Objetos pontiagudos no esôfago
  • Urgência (dentro das primeiras 24h) :
    • Corpos estranhos em esôfago não pontiagudos
    • Impactação alimentar sem obstrução total
    • Objetos pontiagudos em estômago e duodeno
    • Objetos maiores que 6 cm de comprimento em duodeno
    • Imãs ao alcance endoscópico
  • Não urgente :
    • Moedas no estômago em pacientes assintomáticos
    • Objetos rombos maiores de 25 mm no estômago
    • Baterias no estômago podem ser observadas até 48 horas (maiores de 20mm dificilmente irão migrar e necessitam ser retiradas)
    • Objetos rombos que continuam no estômago após 4 semanas
    • Objetos rombos impactados em duodeno por mais de 1 semana.

 

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Bibliografia :

1: Sugawa C, Ono H, Taleb M, Lucas CE. Endoscopic management of foreign bodies in the upper gastrointestinal tract: A review. World J Gastrointest Endosc. 2014 Oct16;6(10):475-81. doi: 10.4253/wjge.v6.i10.475. (free article)

 

2: Wright CC, Closson FT. Updates in pediatric gastrointestinal foreign bodies.Pediatr Clin North Am. 2013 Oct;60(5):1221-39. doi: 10.1016/j.pcl.2013.06.007.

 

3 :Eisen GM, Baron TH, Dominitz JA, Faigel DO, Goldstein JL, Johanson JF, Mallery JS, Raddawi HM, Vargo JJ 2nd, Waring JP, Fanelli RD, Wheeler-Harbough J; American Society for Gastrointestinal Endoscopy. Guideline for the management of ingested  foreign bodies. Gastrointest Endosc. 2002 Jun;55(7):802-6.




Assuntos gerais – Reganho de peso em paciente pós cirurgia bariátrica.

A obesidade é uma doença universal de prevalência crescente e que vem adquirindo proporções epidêmicas, sendo um dos principais problemas de saúde pública moderna. A obesidade mórbida é definida como a presença de um IMC acima de 40. O tratamento cirúrgico para a obesidade mórbida está indicado para pacientes com IMC superior a 40 ou acima de 35 na presença de comorbidades.

Dentre da vasta gama de procedimentos bariátricos aceitos eticamente, o mais realizado atualmente é a gastroplastia laparoscópica tipo Bypass-Gástrico (Fobi-Capella ou Wittgrove e Clark) correspondendo a cerca de 65% a 70% dos procedimentos realizados. Esta técnica promove até 75% de perda do excesso de peso inicial no período de 18 a 24 meses (1) mas com um índice de falha a longo prazo variando de 10% a 35% (2). Em superobesos (IMC > 50), a impossibilidade em atingir um IMC inferior a 35  pode chegar até 60% dos casos (3).

Não existe consenso com relação aos critérios de sucesso ou falha da cirurgia. Poderiam ser utilizados critérios como perda de mais de 50% do excesso de peso e/ou IMC inferior a 35. Talvez os melhores indicativos de sucesso seriam a melhoria das comorbidades existentes antes da cirurgia ou até mesmo a melhoria na qualidade de vida relatada por cada paciente. Apesar dos excelentes resultados na perda de peso e resolução das comorbidades, cerca de 10% a 20% dos pacientes submetidos ao bypass gástrico apresentarão reganho de peso 5 a 10 após o procedimento (4).

Importante para o reganho de peso é o balanço entre as calorias ingeridas e as consumidas. Fatores como fome, capacidade do pouch, intolerância a certos alimentos e hábitos alimentares são os principais responsáveis pela ingesta calórica. Por outro lado, a atividade física, a taxa metabólica basal e massa corporal magra são responsáveis pelo gastos de calorias.

Após os procedimentos cirúrgicos bariátricos os pacientes apresentam redução de seu gasto energético basal, isto porque os pacientes perdem massa gorda, mas também muscular, levando à redução de sua taxa metabólica basal.

Nos casos de reganho de peso fica a dúvida se a falência na manutenção do peso foi devido ao paciente ou a cirurgia, sendo os principais fatores envolvidos:

  1. Cirurgião:
  • Escolha errada da técnica cirúrgica;
  • Preparo pré-operatório inadequado;
  • Procedimento cirúrgico com técnica inadequada.
  1. Paciente ou cirurgião:
  • Anatomia cirúrgica “desfeita”: dilatação do pouch e/ou da anastomose gastrojejunal, fístulas gastro-gástricas, perda da função do anel restritivo.
  1. Paciente:
  • Má adesão pós-operatória;
  • Problemas hormonais, neurológicos;
  • Maus hábitos alimentares;
  • Transtornos de humor;
  • Sedentarismo;

Com o passar dos anos muitos dos pouches dilatam e alongam. O intestino delgado também se “acomoda” e  através de hiperplasia e hipertrofia. A síndrome de dumping, que no início serve como uma espécie de freio aos hábitos de ingestão de carboidratos acaba se “resolvendo” com o passar dos anos. Além disto as intolerâncias alimentares melhoram, o apetite retorna, o volume alimentar aumenta e as pressões culturais e sociais permanecem.

A adesão do paciente no pós-operatório aos retornos com a equipe multidisciplinar é fundamental. No bypass gástrico, o reganho geralmente inicia após 18 meses, principalmente naqueles que não têm boa adesão ao tratamento, que não mudaram seus hábitos de vida e alimentares, que perderam o dumping e que tiveram a anatomia de sua cirurgia “desfeita” ou alterada com o passar dos meses e anos.

A monitorização da dieta, a realização de atividade física regular, a busca ativa dos pacientes pelo cirurgião e sua equipe, bem como a indicação cirúrgica adequada para o paciente em questão, podem reduzir a incidência da falência do procedimento (6)

O reganho de peso tem sido atribuído à combinação de fatores anatômicos, comportamentais e psicológicos. Dentre os fatores anatômicos, a dilatação do pouch gástrico e/ou da gastrojejunoanastomose são as mais evidentes, levando à perda da restrição, com consequente perda da saciedade devido ao rápido esvaziamento gástrico e aumento da ingesta calórica, o que causaria reganho de peso pós-operatório (7).

O primeiro e mais importante passo no tratamento do reganho de peso é a reintrodução do paciente na equipe multidisciplinar caso ele tenha perdido o seguimento. A avaliação psicológica e ou psiquiátrica é mandatória, bem como a terapia nutricional e o incentivo à atividade física.

Revisões cirúrgicas vêm sendo utilizados com resultados satisfatórios porém com elevados índices de morbidade (15%) e mortalidade duas vezes maior (1%) quando comparados ao procedimento de bypass gástrico inicial e aos procedimentos endoscópicos atuais.

A maioria dos estudos utiliza como critérios um diâmetro superior a 20 mm como definição de dilatação da anastomose (8). Com relação ao pouch gástrico, a anatomia anormal é considerada quando o seu comprimento é superior à 6 cm e o diâmetro à 5 cm  (9).

Dentre os procedimentos endoscópicos, com a finalidade de reduzir o diâmetro do pouch gástrico e/ou da anastomose gastrojejunal, com consequente aumento do tempo de esvaziamento gástrico e posterior saciedade mais precoce, destacam-se:

a) Injeção endoluminal de esclerosante na anastomose (Morruato de Sódio);

b) Redução endoluminal da anastomose gastrojejunal– Endocinch (Bard, Billerica, Massachusetts);

c) Procedimento ROSE– Restorative Obesity Surgery Endoluminal (USGI, San Clemente, CA);

d) Stomaphyx (Endogastric Solutions, Redmond, Washington);

e) OTSC Clip (Ovesco AG, Tubingen, Germany);

f)  Overstitch (Apollo Endosurgery, Inc Austin, TX);

g) Fulguração da anastomose gastrojejunal com argônio

 

O argônio vem sendo utilizado em cirurgias convencionais desde a década de 80 e, no campo da endoscopia, foi introduzido em 1991 (10).

A fulguração com gás argônio consiste em um método de eletrocoagulação sem contato, no qual a energia é aplicada ao tecido por meio do gás ionizado (corrente elétrica fluindo através de um gás é definida como plasma). A profundidade da penetração é de 1 a 3 mm (até a lâmina própria), embora alguns estudos evidenciem que quanto maior a intensidade, maior será a profundidade da lesão, chegando eventualmente à muscular da mucosa (11).

 

Baretta et al. (12) demonstraram redução de mais de 66% no diâmetro da anastomose gastrojejunal após 3 sessões endoscópicas de argônio com intensidade de 70W a 2 l/min, intervaladas entre si por 8 semanas e perda média de cerca de 15Kgs em uma série inicial de 30 pacientes. Isso demonstra a eficiência do procedimento, que além de ser seguro é facilmente realizável por endoscopista treinado e pode ser repetido sempre que necessário.

 

Confira também:  Anatomia endoscópica pós cirurgia bariátrica

 

 BIBLIOGRAFIA:

1- BARHOUCH et al.¸ 2010

2- CHRISTOU; LOOK; MACLEAN, 2006

3- PRACHAND; DAVEE; ALVERDY, 2006

4- CHRISTOU; LOOK; MACLEAN, 2006;

5- REINHOLD et al., 1982

6 – SARWER et al., 2010

7- FLANAGAN, 1996; MULLER et al., 2005

8- HERRON et al., 2008; THOMPSON et al., 2006

9- BRETHAUER et al., 2006

10- GRUND et al., 1994

11 – DOTTI et al., 2009

12 – Baretta et al. Obes Surg. (25): 72-79, 2015

 

Baretta




Tratamento de tumor neuroendócrino gástrico

INTRODUÇÃO

  • Os tumores neuroendócrinos são formados por hiperplasia das células enterocromoafins, responsáveis pela produção de serotonina
  • As células enterocromafins que situam-se na lâmina própria (entre epitélio e a muscular da mucosa)
  • São classificadas como lesões de padrão subepitelial e não submucoso
  • Os padrões histológicos são variados e confirmam-se pela imunohistoquímica (positividade para marcadores como cromogranina A)
  • Incidência vem aumentando, talvez pelo maior disponibilidade de acesso a endoscopia e aos exames de imunohistoquímica

 

CLASSIFICAÇÃO CLÍNICA

Tipo 1: mais comum (70%)

  • ocorre num contexto de gastrite atrófica
  • associado a hipergastrinemia
  • geralmente múltiplos

 

Tipo 2:  são raros (5%)

  • geralmente menores que 1,5 cm, multifocais no corpo
  • Associado a síndrome neuroendócrina múltipla (NEM tipo 1) e síndrome de Zollinger Ellison

 

Tipo 3:  segundo mais comum (25%)

  • esporádico  e  isolado
  • sem associação com gastrite atrófica e sem hipergastrinemia
  • ocorrem em qualquer local do estômago

 

O principal marcador para o diagnóstico dos tumores do tipo 1 é o aumento da gastrina sérica usualmente maior que 500 em pacientes que não estão usando inibidores de bomba de prótons. (2)

 

CLASSIFICAÇÃO HISTOLÓGICA

A  classificação histológica da OMS (2010) dos TNE gástricos é feita através:

Contagem mitótica em campos de grande aumento (10 cga)   e  índice de Ki67, sendo assim divididos em:

  • Grau I          (G1 – bem diferenciado, cerca de 90%):      Ki67 ≤ 2%       e     < 2 mitoses/10 cga
  • Grau II        (G2 – bem diferenciado):         Ki67 de 3 a 20%         e          2 a 20 mitoses/10 cga
  • Grau III       (G3 – pouco diferenciado):        Ki67 > 20%            e           > 20   mitoses/10 cga

O prognóstico deste tumores depende da junção da classificação clínica com a histológica, sendo que cerca de 80% dos tumores do tipo 1 apresentam grau histológico I  e  cerca de 90% dos tumores do tipo 3 apresentam grau histológico II ou III. (2).

 

DIAGNÓSTICO

  • Biópsia do pólipo para análise histológico e imunohistoquímica
  • Biópsia do corpo gástrico para verificar a presença de atrofia
  • Dosagem de gastrina sérica
  • Pesquisa de autoanticorpos para gastrite autoimune (anti-célula parietal e anti-fator intrínseco)
  • Ecoendoscopia nas lesões com suspeita de invasão da muscular própria (>10mm) para avaliar a possibilidade de ressecção endoscópica

biópsia de polipo

Na suspeita de tumor neuroendócrino, antes de ser realizada a ressecção, o ideal é a realização de uma simples biópsia da lesão para diagnóstico especifico do tipo de tumor e seu grau histológico

 

TRATAMENTO

Tumores de classificação clínica 1:

Tratamento endoscópico se:

–  número de lesões menor que 5

–  lesões menores que 1 cm

–  sem suspeita de invasão da camada muscular própria (ecoendoscopia  obrigatória apenas em lesões maiores que 10mm)

 

Tumores de classificação clínica 3:

  • Análise individualizada de cada caso
  • Pode-se considerar o tratamento endoscópico em tumores menores que 10mm
  • Desde que não possuam fatores de risco para metástase

 

Fatores de risco para metástase

  • Classificação histológica grau III (G3-pouco diferenciado – Ki67 > 20% e IM > 20)
  • Invasão da muscular própria
  • Invasão angiolinfática

 

Em estudo publicado na World Journal of Gastroenterology em 2013 (3), foram avaliados 119 casos de tumores neuroendócrinos do tipo 3 que foram tratados e acompanhados por 46 meses. Destes 39 foram para cirurgia, 50 foram ressecados endoscopicamente e 15 foram observados clinicamente.

Dos 39 pacientes operados, 33 seguiram o acompanhamento sendo que 29 não tiveram recidiva, 4 tiveram recidivas sendo dois casos evoluíram para óbito e outros dois foram reoperados.

Dos 15 pacientes que foram observados, 14 seguiram o acompanhamento, destes 11 não tiveram evolução da doença e 3 tiveram evolução sendo que um destes foi a óbito.

Dos 50 pacientes tratados endoscopicamente, 40 tiveram ressecção completa do tumor, destes 36 fizeram o acompanhamento e nenhum teve recidiva da doença.  Os 10 pacientes que tiveram a ressecção incompleta da lesão,  7 tiveram comprometimento vertical ou lateral da margem sendo apenas observados posteriormente com endoscopia.  Já 3 pacientes tiveram  invasão angiolinfática, sendo todos os três encaminhados para complementação cirúrgica. Todos os 10 pacientes que tiveram ressecção incompleta, inclusive o que tiveram que ser submetidos a complementação cirúrgica não tiveram recidiva da doença.

 

Este estudo mostra a efetividade do tratamento endoscópico mesmo nos tumores do tipo 3, desde que sigam as indicações e contra-indicações do procedimento e principalmente se os tumores forem ressecados completamente.

Por isto as técnicas ideais para a ressecção de tumores neuroendócrinos, são aquelas que tem o potencial de fazer ressecção profundas (mucosa e submucosa) tendo em vista que o tumor cresce na lâmina própria e o comprometimento da submucosa nestes casos é esperado.

Técnicas de polipectomia simples ou mucosectomia tem altos índices de ressecção incompleta, principalmente de comprometimendo vertical da margem pois geralmente não conseguem ressecar completamente a submucosa. (4)

 

Técnicas de ressecção endoscópica profunda (mucosa + submucosa):

  • Dissecção endoscópica da submucosa (ESD)

 

TRATAMENTO EM CASOS ESPECIAIS

  • Tumores neuroendócrinos que apresentam fator de risco para metástase, está indicada a gastrectomia com linfadenectomia.
  • Pacientes com TNE tipo 1, que não responderam ou tiveram recorrência após tratamento endoscópico, pode-se tentar terapia para supressão da gastrina sérica  com análagos da somastotastina (ex: octeotride)  ou  antrectomia
  • Nos casos de metástases, há opções como técnicas de radiologia intervencionista, radioterapia para disseminação óssea sintomática e quimioterapia em doença metastática irressecável.

 

CONCLUSÃO

  • Os tumores neuroendócrinos gástricos constituem um espectro de neoplasias com características clínico-patológicas, mecanismo patogênico e prognóstico diferentes do adenocarcinoma podendo ser mais indolentes ou se comportar como tal
  • O conhecimento deste complexo tema com suas classificações e apresentações é de fundamental importância para a condução adequada de tumores desta linhagem
  • Antes de ser realizado o tratamento endoscópico, deve ser feito o correto diagnóstico do tipo de tumor neuroendócrino em questão, com simples biópsia da lesão, exames laboratoriais e de imagem para estadiamento

 

 

VEJA AQUI ALGUNS CASOS CLÍNICOS SOBRE TUMOR NEUROENDÓCRINO GÁSTRICO

 

REFERÊNCIAS

Link dos artigos originais:

1- Pathology and Genetics of Tumours of the Digestive System. WHO Classification of Tumours 2010. p. 53-57

2 – Oldrich Louthan, Neuroendocrine neoplasms of the stomach. Biomed Pap Med Fac Univ Palacky Olomouc Czech Repub. 2014 Sep; 158(3):455-460

3- Kwon YH et al .Long-term follow up of endoscopic resection for type 3 gastric NET. World J Gastroenterol 2013 December 14; 19(46): 8703-8708

4- Beata Kos-Kudła et al.,  Diagnostic and therapeutic guidelines for gastro-entero-pancreatic neuroendocrine neoplasms   Endokrynologia Polska 2013; 64 (6)

5- David A. Crosby ,  Gastric Neuroendocrine Tumours ,  Dig Surg 2012;29:331–348