Assuntos gerais – Reganho de peso em paciente pós cirurgia bariátrica.

A obesidade é uma doença universal de prevalência crescente e que vem adquirindo proporções epidêmicas, sendo um dos principais problemas de saúde pública moderna. A obesidade mórbida é definida como a presença de um IMC acima de 40. O tratamento cirúrgico para a obesidade mórbida está indicado para pacientes com IMC superior a 40 ou acima de 35 na presença de comorbidades.

Dentre da vasta gama de procedimentos bariátricos aceitos eticamente, o mais realizado atualmente é a gastroplastia laparoscópica tipo Bypass-Gástrico (Fobi-Capella ou Wittgrove e Clark) correspondendo a cerca de 65% a 70% dos procedimentos realizados. Esta técnica promove até 75% de perda do excesso de peso inicial no período de 18 a 24 meses (1) mas com um índice de falha a longo prazo variando de 10% a 35% (2). Em superobesos (IMC > 50), a impossibilidade em atingir um IMC inferior a 35  pode chegar até 60% dos casos (3).

Não existe consenso com relação aos critérios de sucesso ou falha da cirurgia. Poderiam ser utilizados critérios como perda de mais de 50% do excesso de peso e/ou IMC inferior a 35. Talvez os melhores indicativos de sucesso seriam a melhoria das comorbidades existentes antes da cirurgia ou até mesmo a melhoria na qualidade de vida relatada por cada paciente. Apesar dos excelentes resultados na perda de peso e resolução das comorbidades, cerca de 10% a 20% dos pacientes submetidos ao bypass gástrico apresentarão reganho de peso 5 a 10 após o procedimento (4).

Importante para o reganho de peso é o balanço entre as calorias ingeridas e as consumidas. Fatores como fome, capacidade do pouch, intolerância a certos alimentos e hábitos alimentares são os principais responsáveis pela ingesta calórica. Por outro lado, a atividade física, a taxa metabólica basal e massa corporal magra são responsáveis pelo gastos de calorias.

Após os procedimentos cirúrgicos bariátricos os pacientes apresentam redução de seu gasto energético basal, isto porque os pacientes perdem massa gorda, mas também muscular, levando à redução de sua taxa metabólica basal.

Nos casos de reganho de peso fica a dúvida se a falência na manutenção do peso foi devido ao paciente ou a cirurgia, sendo os principais fatores envolvidos:

  1. Cirurgião:
  • Escolha errada da técnica cirúrgica;
  • Preparo pré-operatório inadequado;
  • Procedimento cirúrgico com técnica inadequada.
  1. Paciente ou cirurgião:
  • Anatomia cirúrgica “desfeita”: dilatação do pouch e/ou da anastomose gastrojejunal, fístulas gastro-gástricas, perda da função do anel restritivo.
  1. Paciente:
  • Má adesão pós-operatória;
  • Problemas hormonais, neurológicos;
  • Maus hábitos alimentares;
  • Transtornos de humor;
  • Sedentarismo;

Com o passar dos anos muitos dos pouches dilatam e alongam. O intestino delgado também se “acomoda” e  através de hiperplasia e hipertrofia. A síndrome de dumping, que no início serve como uma espécie de freio aos hábitos de ingestão de carboidratos acaba se “resolvendo” com o passar dos anos. Além disto as intolerâncias alimentares melhoram, o apetite retorna, o volume alimentar aumenta e as pressões culturais e sociais permanecem.

A adesão do paciente no pós-operatório aos retornos com a equipe multidisciplinar é fundamental. No bypass gástrico, o reganho geralmente inicia após 18 meses, principalmente naqueles que não têm boa adesão ao tratamento, que não mudaram seus hábitos de vida e alimentares, que perderam o dumping e que tiveram a anatomia de sua cirurgia “desfeita” ou alterada com o passar dos meses e anos.

A monitorização da dieta, a realização de atividade física regular, a busca ativa dos pacientes pelo cirurgião e sua equipe, bem como a indicação cirúrgica adequada para o paciente em questão, podem reduzir a incidência da falência do procedimento (6)

O reganho de peso tem sido atribuído à combinação de fatores anatômicos, comportamentais e psicológicos. Dentre os fatores anatômicos, a dilatação do pouch gástrico e/ou da gastrojejunoanastomose são as mais evidentes, levando à perda da restrição, com consequente perda da saciedade devido ao rápido esvaziamento gástrico e aumento da ingesta calórica, o que causaria reganho de peso pós-operatório (7).

O primeiro e mais importante passo no tratamento do reganho de peso é a reintrodução do paciente na equipe multidisciplinar caso ele tenha perdido o seguimento. A avaliação psicológica e ou psiquiátrica é mandatória, bem como a terapia nutricional e o incentivo à atividade física.

Revisões cirúrgicas vêm sendo utilizados com resultados satisfatórios porém com elevados índices de morbidade (15%) e mortalidade duas vezes maior (1%) quando comparados ao procedimento de bypass gástrico inicial e aos procedimentos endoscópicos atuais.

A maioria dos estudos utiliza como critérios um diâmetro superior a 20 mm como definição de dilatação da anastomose (8). Com relação ao pouch gástrico, a anatomia anormal é considerada quando o seu comprimento é superior à 6 cm e o diâmetro à 5 cm  (9).

Dentre os procedimentos endoscópicos, com a finalidade de reduzir o diâmetro do pouch gástrico e/ou da anastomose gastrojejunal, com consequente aumento do tempo de esvaziamento gástrico e posterior saciedade mais precoce, destacam-se:

a) Injeção endoluminal de esclerosante na anastomose (Morruato de Sódio);

b) Redução endoluminal da anastomose gastrojejunal– Endocinch (Bard, Billerica, Massachusetts);

c) Procedimento ROSE– Restorative Obesity Surgery Endoluminal (USGI, San Clemente, CA);

d) Stomaphyx (Endogastric Solutions, Redmond, Washington);

e) OTSC Clip (Ovesco AG, Tubingen, Germany);

f)  Overstitch (Apollo Endosurgery, Inc Austin, TX);

g) Fulguração da anastomose gastrojejunal com argônio

 

O argônio vem sendo utilizado em cirurgias convencionais desde a década de 80 e, no campo da endoscopia, foi introduzido em 1991 (10).

A fulguração com gás argônio consiste em um método de eletrocoagulação sem contato, no qual a energia é aplicada ao tecido por meio do gás ionizado (corrente elétrica fluindo através de um gás é definida como plasma). A profundidade da penetração é de 1 a 3 mm (até a lâmina própria), embora alguns estudos evidenciem que quanto maior a intensidade, maior será a profundidade da lesão, chegando eventualmente à muscular da mucosa (11).

 

Baretta et al. (12) demonstraram redução de mais de 66% no diâmetro da anastomose gastrojejunal após 3 sessões endoscópicas de argônio com intensidade de 70W a 2 l/min, intervaladas entre si por 8 semanas e perda média de cerca de 15Kgs em uma série inicial de 30 pacientes. Isso demonstra a eficiência do procedimento, que além de ser seguro é facilmente realizável por endoscopista treinado e pode ser repetido sempre que necessário.

 

Confira também:  Anatomia endoscópica pós cirurgia bariátrica

 

 BIBLIOGRAFIA:

1- BARHOUCH et al.¸ 2010

2- CHRISTOU; LOOK; MACLEAN, 2006

3- PRACHAND; DAVEE; ALVERDY, 2006

4- CHRISTOU; LOOK; MACLEAN, 2006;

5- REINHOLD et al., 1982

6 – SARWER et al., 2010

7- FLANAGAN, 1996; MULLER et al., 2005

8- HERRON et al., 2008; THOMPSON et al., 2006

9- BRETHAUER et al., 2006

10- GRUND et al., 1994

11 – DOTTI et al., 2009

12 – Baretta et al. Obes Surg. (25): 72-79, 2015

 

Baretta




Tratamento de tumor neuroendócrino gástrico

INTRODUÇÃO

  • Os tumores neuroendócrinos são formados por hiperplasia das células enterocromoafins, responsáveis pela produção de serotonina
  • As células enterocromafins que situam-se na lâmina própria (entre epitélio e a muscular da mucosa)
  • São classificadas como lesões de padrão subepitelial e não submucoso
  • Os padrões histológicos são variados e confirmam-se pela imunohistoquímica (positividade para marcadores como cromogranina A)
  • Incidência vem aumentando, talvez pelo maior disponibilidade de acesso a endoscopia e aos exames de imunohistoquímica

 

CLASSIFICAÇÃO CLÍNICA

Tipo 1: mais comum (70%)

  • ocorre num contexto de gastrite atrófica
  • associado a hipergastrinemia
  • geralmente múltiplos

 

Tipo 2:  são raros (5%)

  • geralmente menores que 1,5 cm, multifocais no corpo
  • Associado a síndrome neuroendócrina múltipla (NEM tipo 1) e síndrome de Zollinger Ellison

 

Tipo 3:  segundo mais comum (25%)

  • esporádico  e  isolado
  • sem associação com gastrite atrófica e sem hipergastrinemia
  • ocorrem em qualquer local do estômago

 

O principal marcador para o diagnóstico dos tumores do tipo 1 é o aumento da gastrina sérica usualmente maior que 500 em pacientes que não estão usando inibidores de bomba de prótons. (2)

 

CLASSIFICAÇÃO HISTOLÓGICA

A  classificação histológica da OMS (2010) dos TNE gástricos é feita através:

Contagem mitótica em campos de grande aumento (10 cga)   e  índice de Ki67, sendo assim divididos em:

  • Grau I          (G1 – bem diferenciado, cerca de 90%):      Ki67 ≤ 2%       e     < 2 mitoses/10 cga
  • Grau II        (G2 – bem diferenciado):         Ki67 de 3 a 20%         e          2 a 20 mitoses/10 cga
  • Grau III       (G3 – pouco diferenciado):        Ki67 > 20%            e           > 20   mitoses/10 cga

O prognóstico deste tumores depende da junção da classificação clínica com a histológica, sendo que cerca de 80% dos tumores do tipo 1 apresentam grau histológico I  e  cerca de 90% dos tumores do tipo 3 apresentam grau histológico II ou III. (2).

 

DIAGNÓSTICO

  • Biópsia do pólipo para análise histológico e imunohistoquímica
  • Biópsia do corpo gástrico para verificar a presença de atrofia
  • Dosagem de gastrina sérica
  • Pesquisa de autoanticorpos para gastrite autoimune (anti-célula parietal e anti-fator intrínseco)
  • Ecoendoscopia nas lesões com suspeita de invasão da muscular própria (>10mm) para avaliar a possibilidade de ressecção endoscópica

biópsia de polipo

Na suspeita de tumor neuroendócrino, antes de ser realizada a ressecção, o ideal é a realização de uma simples biópsia da lesão para diagnóstico especifico do tipo de tumor e seu grau histológico

 

TRATAMENTO

Tumores de classificação clínica 1:

Tratamento endoscópico se:

–  número de lesões menor que 5

–  lesões menores que 1 cm

–  sem suspeita de invasão da camada muscular própria (ecoendoscopia  obrigatória apenas em lesões maiores que 10mm)

 

Tumores de classificação clínica 3:

  • Análise individualizada de cada caso
  • Pode-se considerar o tratamento endoscópico em tumores menores que 10mm
  • Desde que não possuam fatores de risco para metástase

 

Fatores de risco para metástase

  • Classificação histológica grau III (G3-pouco diferenciado – Ki67 > 20% e IM > 20)
  • Invasão da muscular própria
  • Invasão angiolinfática

 

Em estudo publicado na World Journal of Gastroenterology em 2013 (3), foram avaliados 119 casos de tumores neuroendócrinos do tipo 3 que foram tratados e acompanhados por 46 meses. Destes 39 foram para cirurgia, 50 foram ressecados endoscopicamente e 15 foram observados clinicamente.

Dos 39 pacientes operados, 33 seguiram o acompanhamento sendo que 29 não tiveram recidiva, 4 tiveram recidivas sendo dois casos evoluíram para óbito e outros dois foram reoperados.

Dos 15 pacientes que foram observados, 14 seguiram o acompanhamento, destes 11 não tiveram evolução da doença e 3 tiveram evolução sendo que um destes foi a óbito.

Dos 50 pacientes tratados endoscopicamente, 40 tiveram ressecção completa do tumor, destes 36 fizeram o acompanhamento e nenhum teve recidiva da doença.  Os 10 pacientes que tiveram a ressecção incompleta da lesão,  7 tiveram comprometimento vertical ou lateral da margem sendo apenas observados posteriormente com endoscopia.  Já 3 pacientes tiveram  invasão angiolinfática, sendo todos os três encaminhados para complementação cirúrgica. Todos os 10 pacientes que tiveram ressecção incompleta, inclusive o que tiveram que ser submetidos a complementação cirúrgica não tiveram recidiva da doença.

 

Este estudo mostra a efetividade do tratamento endoscópico mesmo nos tumores do tipo 3, desde que sigam as indicações e contra-indicações do procedimento e principalmente se os tumores forem ressecados completamente.

Por isto as técnicas ideais para a ressecção de tumores neuroendócrinos, são aquelas que tem o potencial de fazer ressecção profundas (mucosa e submucosa) tendo em vista que o tumor cresce na lâmina própria e o comprometimento da submucosa nestes casos é esperado.

Técnicas de polipectomia simples ou mucosectomia tem altos índices de ressecção incompleta, principalmente de comprometimendo vertical da margem pois geralmente não conseguem ressecar completamente a submucosa. (4)

 

Técnicas de ressecção endoscópica profunda (mucosa + submucosa):

  • Dissecção endoscópica da submucosa (ESD)

 

TRATAMENTO EM CASOS ESPECIAIS

  • Tumores neuroendócrinos que apresentam fator de risco para metástase, está indicada a gastrectomia com linfadenectomia.
  • Pacientes com TNE tipo 1, que não responderam ou tiveram recorrência após tratamento endoscópico, pode-se tentar terapia para supressão da gastrina sérica  com análagos da somastotastina (ex: octeotride)  ou  antrectomia
  • Nos casos de metástases, há opções como técnicas de radiologia intervencionista, radioterapia para disseminação óssea sintomática e quimioterapia em doença metastática irressecável.

 

CONCLUSÃO

  • Os tumores neuroendócrinos gástricos constituem um espectro de neoplasias com características clínico-patológicas, mecanismo patogênico e prognóstico diferentes do adenocarcinoma podendo ser mais indolentes ou se comportar como tal
  • O conhecimento deste complexo tema com suas classificações e apresentações é de fundamental importância para a condução adequada de tumores desta linhagem
  • Antes de ser realizado o tratamento endoscópico, deve ser feito o correto diagnóstico do tipo de tumor neuroendócrino em questão, com simples biópsia da lesão, exames laboratoriais e de imagem para estadiamento

 

 

VEJA AQUI ALGUNS CASOS CLÍNICOS SOBRE TUMOR NEUROENDÓCRINO GÁSTRICO

 

REFERÊNCIAS

Link dos artigos originais:

1- Pathology and Genetics of Tumours of the Digestive System. WHO Classification of Tumours 2010. p. 53-57

2 – Oldrich Louthan, Neuroendocrine neoplasms of the stomach. Biomed Pap Med Fac Univ Palacky Olomouc Czech Repub. 2014 Sep; 158(3):455-460

3- Kwon YH et al .Long-term follow up of endoscopic resection for type 3 gastric NET. World J Gastroenterol 2013 December 14; 19(46): 8703-8708

4- Beata Kos-Kudła et al.,  Diagnostic and therapeutic guidelines for gastro-entero-pancreatic neuroendocrine neoplasms   Endokrynologia Polska 2013; 64 (6)

5- David A. Crosby ,  Gastric Neuroendocrine Tumours ,  Dig Surg 2012;29:331–348




Novos Antiagregantes e Anticoagulantes Orais – Manejo na endoscopia

Um grande número de pacientes tem feito uso de antiagregação plaquetária e anticoagulação contínuas em situações clínicas como fibrilação atrial, implante de valvas mecânicas, trombose venosa profunda e tromboembolismo pulmonar. Além das drogas tradicionalmente usadas, nos últimos anos, tornaram-se disponíveis novas drogas antitrombóticas para manejo destas patologias, com mecanismos de ação específico e que ainda são pouco familiares aos gastroenterologistas e endoscopistas.

Visando redução do riscos e um uso adequado das drogas antitrombóticas periprocedimentos, incluindo aqueles com abordagens endoscópicas, se faz necessário um adequado entendimento dos processos de hemostasia, dos mecanismos de ação dessas medicações, sua indicações de uso, farmacocinética e abordagem em caso de sangramento.

É importante salientar também, que o manejo dos antitrombóticos tem relação estrita com o risco benefício inerente a situação clínica do paciente e ao potencial sangramento do procedimento a ser realizado. A tabela abaixo classifica os principais procedimentos endoscópicos segundo seu risco de sangramento.

Risco de sangramnentoendo

Tabela 1. Risco de sangramento em procedimentos endoscópicos

risco tromboembolico

Tabela 2. Risco de eventos tromboembólicos associado a patologias

Vias de coagulação

Para entender o sítio de atuação de cada droga, se faz fundamental uma breve revisão sobre hemostasia.

Sabe-se que interação entre o endotélio e a cascata de coagulação funciona como o ponto principal da hemostasia. Na hemostasia primária, o endotélio do vaso lesado libera difosfato de adenosina, serotonina e tromboxano A2. As plaquetas respondem a essas citocinas com a expressão de glicoproteína IIb/IIIa e a molécula de adesão celular plaqueta endotélio tipo 1 que levam a formação de um tampão plaquetário inicial. Após o lesão do endotélio também se desencadeiam as cascatas de coagulação em suas vias intrínseca e extrínseca que por fim resultam na formação de fibrina (Vide Figura 1)

vias Coagulação

Figura 1. Vias de coagulação intrínseca e extrínseca evidenciando os principais sítios de ações das novas drogas antitrombóticas

Novos Antitrombóticos

O termo antitrombóticos compila as drogas que possuem efeito ou anticoagulante, ou antiagregante plaquetário. Antes de abordarmos essas novas drogas vale lembrar que classicamente as principais drogas de uso antitrombótico são a Varfarina, que é um antagonista de vitamina K e funciona como anticoagulante, e o ácido acetil salicílico, que é um antiagregante plaquetário.

Apesar de possuir largo tempo de utilização e efetividade bem definida, a Varfarina possui alguns desvantagens frente as novas drogas anticoagulantes que são: sua estreita janela terapêutica e margem de segurança necessitando de monitorização laboratorial frequente, inicio lento de ação, com alcance de faixa terapêutica somente após alguns dias em muitos casos, e a potencial influência da dieta e outras medicações na sua atividade.   Por outro lado, é uma droga difusamente conhecida, com potencial de reversão dos seus efeitos de modo rápido e fácil com uso de vitamina K ou mesmo plasma.

Entre os novos antitrombóticos disponíveis existem drogas que podem ser administradas oralmente, por via subcutânea ou intravenosos. Diante do cenário clínico mais frequente de pacientes fazendo uso de drogas por via oral, essas drogas serão as preferencialmente abordadas no texto.

Anticoagulante – Inibidores Xa

Representando pelo Rivaroxaban (Xarelto), os inibidores do fator Xa inibem competitivamente o fator X ativado e atuam da cascata como um todo, já que o fator X unifica as vias intrínseca e extrínseca da coagulação. Ao se associar com o fator Va o fator X forma um complexo chamado protrombinase que atua na transformação da protrombina em trombina. O rivaroxaban atua portanto prevenindo a formação da protrombinase e consequentemente da trombina.

Principais indicações: Fibrilação atrial não valvular e trombose venosa profunda.

Farmacodinâmica: Tomado oralmente uma ou duas vezes ao dia, com pico de concentração entre 2,5-4h e meia vida de 5-9h. Requer uso cauteloso em doentes renais crônicos e hepatopatas. Pode interagir com outras drogas que atuam no complexo do citocromo p450 e nos transportadores da glicoproteína P.

 

Anticoagulante – Inibidores diretos da trombina

Os inibidores diretos da trombina são representados pelas drogas Bivalirudina (Angiomax) e Dabigatran (Pradaxa). A Bivalirudina é um droga utilizada principalmente em procedimentos de intervenção coronariana percutânea. Já o Dabigatran é uma droga aprovada na prevenção de isquemia cerebral em casos de fibrilação atrial não valvular e no tromboembolismo venoso. Devido a sua maior importância clínica, será abordado preferencialmente o Dabigatran nesse texto

– Dabigatran

Farmacodinâmica : Dose oral, duas vezes ao dia, alcança um pico plasmático após 1-2 h e tem meia vida de 12- 17h. Possui eliminação renal principalmente, devendo ter dose reduzida em pacientes com ClCr 30–50 ml/min e evitado em pacientes com ClCr < 30 ml/min

Agentes reversores: Não há agente reversor disponível atualmente. Pode ser utilizado, se necessário, plasma fresco congelado.

Manejo em procedimentos endoscópicos: Em pacientes com função renal normal e submetidos a procedimentos com maior risco de sangramento, recomenda-se suspensão nos dois dias anteriores. Em procedimentos de baixo risco a suspensão 24 h antes é aceita.

Antiagregante plaquetários

As Tienopiridinas atuam bloqueando a agregação plaquetária dependente da adenosina difosfato que é liberada após a lesão endotelial, durante a hemostasia primária.

As principais drogas desse grupos são Clopidogrel (Plavix), Prasugrel (Effient) e Ticagrelor (Brillinta)

– Clopidogrel

Principais indicações: Síndrome coronariana aguda, prevenção de novo infarto miocárdico ou isquemia cerebral.

Farmacodinâmica: Via oral, uma vez ao dia, com pico plasmático após 1h e meia vida de 7-8h. Deve ser evitado em uso combinado com Omeprazol e Esomeprazol (metabolismo associado ao CYP2C19).

Agentes reversores: Não há agente reversor especifico disponível. Recomenda-se transfusão de plasma fresco congelado ou crioprecipitado.

Manejo em procedimentos endoscópicos: Clopidogrel deve ser descontinuado 5-7 dias antes de qualquer procedimento em que haja necessidade de terapêutica.

– Ticagrelor

Principais indicações: Usado na prevenção e tratamento de eventos isquêmicos cardiovasculares.

Farmacodinâmica : Dose única ou duas vezes ao dia, oral, com pico plasmático em 1,5 h e meia vida de 7 – 8,5h. Excreção hepática.

Agentes reversores: Não há agente reversor específico.Recomenda-se o uso de plasma fresco congelado e crioprecipitado;

Manejo em procedimentos endoscópicos: Ticagrelor deve ser descontinuado por pelo menos 5 dias antes de qualquer procedimento endoscópico terapêutico

– Prasugrel

Principais indicações: Usado na prevenção de eventos cardiovasculares trombóticos, em angina instável e infartos miocárdicos sem elevação do segmento ST

Farmacodinâmica: Indicado por via oral, em dose única diária, com pico de concentração plasmática de 0,5 h e meia vida de 2 – 15 h. Excretado principalmente na urina, contudo sem necessidade de modificação de doses em casos de disfunçãoo renal e hepática.

Agentes reversores: Não há agente reversor específico que possa ser usado em casos de sangramento em uso do Prasugrel. Recomenda-se uso de plasma fresco congelado ou crioprecipitados.

Manejo em procedimentos endoscópicos: Deve ser descontinuado pelo menos 7 dias antes de qualquer procedimento endoscópicos que envolva terapêutica.

Agentes antitromboticos

Tabela 2. Principais características das drogas antitrombóticas antigas e novas

Reintrodução dos Antitrombóticos

O tempo ideal de reintrodução do antitrombóticos, principalmente em procedimentos de alto risco de sangramento ou mesmo após hemostasia endoscópica não é bem determinado. É necessário sempre balancear os risco de trombose e sangramento precoce e tardio frente ao quadro clínico apresentando. Pacientes com menor risco de sangramento tardio, podem ser manejados com reintrodução das drogas após 12-24 h. Já nos pacientes com maior risco de sangramento tardio o ideal seria aguardar ao menos 48 h para reinicio de anticoagulação.

Referências:

1. Boustiere C, Veitch A, Vanbiervliet G, et al. Endoscopy and antiplatelet agents: European Society of Gastrointestinal Endoscopy (ESGE) Guideline. Endoscopy 2011;43:445-461

2. Anderson MA, Ben-Menachem T, Gan SI, et al. Management of antithrombotic agents for endoscopic procedures. Gastrointest Endosc 2009;70:1060-1070

3. Todd H. Baron, Patrick S. Kamath, and Robert D. McBane. Management of Antithrombotic Therapy in Patients Undergoing Invasive Procedures. N Engl J Med 2013; 368:2113-2124

4. Parekh PJ, Merrell J, Clary M, et al. New anticoagulants and antiplatelet agents: a primer for the clinical gastroenterologist. Am J Gastroenterol 2014; 109:9–19.

 




Assuntos Gerais : Terceiro Consenso Brasileiro em H. pylori

O Helicobacter pylori, é uma bactéria gram negativa, em formato de espiral, adaptado a sobrevivência no estômago humano.  É a infecção bacteriana crônica mais comum do ser humano, sendo sugerido que cerca de 50% da população esteja colonizada. É adquirida durante a infância, principalmente em ambientes de baixas condições sócio econômicas (higiênicas), acúmulo de pessoas ou saneamento básico. ¹

A infecção por H. pylori e reconhecida como potencial causa para gastrites (cônicas e agudas), doença ulcerosa e neoplasias gástricas (carcinógeno Tipo I pela Agência Internacional de Pesquisa em Câncer).¹

Assim, reveste-se de importância a pesquisa e tratamento do H. pylori. Para tanto, em 2013, foi publicado o Terceiro Consenso Brasileiro em Helicobacter pylori. ² .

Realizado pelo Núcleo Brasileiro de H. pylori (braço da Federação Brasileira de Gastroenterologia), em Bento Gonçalves (abril – 2011) contou com presença de 31 especialista no assunto, criando-se o consenso atual. Assim, as orientações seguem os Graus de recomendação e Níveis de evidência, conforme convenção estabelecida pela medicina baseada em evidência.

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Para a realização do atual Consenso, durante as reuniões, foram criados vários grupos, que debateram determinado assunto (tratamento, retratamento, relação com câncer, etc), criando a recomendação do subgrupo de especialistas, e esta recomendação então era levada em plenário, onde a concordância de mais de 70% dos presentes levava a criação da então, a recomendação consensual.

Abaixo, reproduzimos de forma sintética as recomendações, facilitando então a leitura e futura procura pela informação.

 

GRUPO 1 – H. pylori : Dispepsia e diagnóstico :

Declaração 1 : O diagnóstico de dispepsia funcional em nosso meio dever seguir os critérios do III Consenso de Roma, além de pesquisa de parasitas nas fezes ou uso empírico de antiparasitários :  Concordância : 100%, Recomendação : D, Nível de evidência : C

Declaração 2 : Quando disponível, o teste respiratório com carbono marcado é o método não invasivo de escolha para diagnóstico e controle de erradicação :  Concordância : 100%, Recomendação : A, Nível de evidência :1A

No Brasil o teste ainda não está totalmente difundido, e devido aos baixos custos da Endoscopia Digestiva, acaba sendo a escolha em nosso país.

Declaração 3 : Para realizar o teste respiratório, o uso de antibióticos e de inibidores de bomba protrônica – IBP), deve ser descontinuado por cerca de 2 a 4 semanas antes do exame. Concordância : 100%, Recomendação : A, Nível de evidência : 1A

Declaração  4 : Se o teste respiratório não é disponível, a pesquisa do antígeno nas fezes é o método de escolha para diagnóstico e controle de tratamento do H. pylori, quando usado um anticorpo monoclonal.  Concordância : 100%, Recomendação : A, Nível de evidência : 1A

Declaração 5: Testes sorológicos devem ser reservados para estudos epidemiológicos, sempre com validação local : Concordância : 100%, Recomendação : A, Nível de evidência : 2

Declaração 6 : Endoscopia digestiva alta em pacientes dispépticos, quando indicada, deve ser acompanhada de coleta de pelo menos um fragmento de antro e corpo, para urease ou avaliação histológica para identificação do H. pylori. Se possível, IBP e antimicrobianos devem ser suspensos por 2 a 4 semanas , respectivamente, antes do exame : Concordância : 93 a 100%, Recomendação : A, Nível de evidência :1A-1B

Declaração 7 : Erradicação do H. pylori está indicado para pacientes com dispepsia : Concordância : 100%, Recomendação : A, Nível de evidência : 1A

Declaração 8: Erradicação do H. pylori é a primeira alternativa terapêutica na dispepsia funcional : Concordância : 86,2 %, Recomendação : A, Nível de evidência :1 A

Declaração 9 : A estratégia de avaliação-tratamento, utilizando testes não invasivos, e tratando infectados, pode ser indicada em indivíduos com idade menor de 35 anos, sem sinais de alarme ou antecedentes familiares de câncer gástrico : Concordância : 100%, Recomendação : A, Nível de evidência : 1B

Declaração 10 : O controle de erradicação deve ser feito com pelo menos após quatro semanas do tratamento: Concordância : 100%, Recomendação : B, Nível de evidência : 2B

Declaração 11: O controle de erradicação deve ser realizado em paciente com úlcera gastroduodenal, linfoma MALT, após ressecção de câncer gástrico precoce e em pacientes com sintomas persistentes após tratamento baseado em teste não invasivo : Concordância : 100%, Recomendação : D, Nível de evidência : 5

 

GRUPO 2 : H. pylori : Adenocarcinoma gástrico e Linfoma MALT

Declaração 12 : H. pylori é o fator de risco mais relevante para adenocarcinoma gástrico e linfoma MALT.  Concordância : 100%, Recomendação : A, Nível de evidência : 1ª

Declaração 13 : A erradicação do H. pylori reduz o risco de  desenvolvimento de lesões precursoras do câncer gástrico. Gastrite crônica ativa é revertida pela erradicação do H. pylori, ao passo que paralisa a cascata carcinogênica de Pelayo Correa: Concordância : 100%, Recomendação : A, Nível de evidência : 1 A

Declaração 14 : A erradicação do H. pylori reduz/regride lesões precursoras de câncer gástrico ? SIM, para gastrite atrófica do corpo : Concordância : 100%, Recomendação : B, Nível de evidência : 2A

Declaração 15 : A erradicação do H. pylori reduz/regride lesões precursoras de câncer gástrico ? NÃO, para gastrite atrófica do antro : Concordância : 100%, Recomendação : B, Nível de evidência : 2B

Declaração 16 : A erradicação do H. pylori reduz/regride lesões precursoras de câncer gástrico ? NÃO, para metaplasia intestinal. Concordância : 100%, Recomendação : B, Nível de evidência : 2A

Declaração 17 : O tempo ideal de erradicação do H. pylori, é antes do aparecimento de lesões pré neoplásicas (gastrite atrófica e metaplasia intestinal). Concordância : 100%, Recomendação : A, Nível de evidência : 1ª

Declaração 18 : Na presença de lesões pré neoplásicas, a erradicação do H. pylori reduz o risco de câncer gástrico : Concordância : 100%, Recomendação : A, Nível de evidência : 1C

Declaração 19: No Brasil, vigilância e tratamento da população, como medida de prevenção do câncer gástrico não é recomendada. Concordância : 100%, Recomendação : D, Nível de evidência : 4

Declaração 20 : Indicações de erradicação de H. pylori:

Parentes em primeiro grau de portadores de câncer gástrico : Concordância : 100%, Recomendação : A, Nível de evidência : 1B

Após ressecção gástrica , ou endoscópica de câncer gástrico : Concordância : 100%, Recomendação : A, Nível de evidência : 1B

Pacientes com pangastrite intensa, gastrite atrófica/metaplasia intestinal : Concordância : 100%, Recomendação : B, Nível de evidência : 1B

Declaração 21 : Após a erradicação do H. pylori, o acompanhamento de portadores de condições pré malignas deve ser :

Exame endoscópico com coleta de dois fragmentos do antro e corpo : Concordância : 100%, Recomendação : C, Nível de evidência : 2B

Intervalo de 3 anos entre as endoscopias para pacientes com atrofia e/ou metaplasia intestinal extensa no antro e corpo : Concordância : 100%, Recomendação : D, Nível de evidência : 4

 

GRUPO 3 : H. pylori e outras alterações associadas

Declaração 22 : Estudos epidemiológicos e animais sugerem relação negativa entre a infecção por H. pylori e asma brônquica ou atopias : Concordância : 100%, Recomendação : B, Nível de evidência : 2B

Declaração 23 : No sangramento gastrointestinal alto secundária a úlcera péptica, a erradicação do H. pylori é mais efetiva que apenas o tratamento com IBP (com ou sem manutenção) na prevenção da úlcera : Concordância : 100%, Recomendação : A, Nível de evidência : 1 A

Declaração 24 : Sobre a relação do H. pylori e sangramento gastrointestinal em usuários de antinflamatórios  não horminais (AINES) OU ASPIRINA (AAS):

Erradicação de H. pylori reduz o risco de úlceras e sangramentos em usuários crônicos de AINES OU AAS : Concordância : 100%, Recomendação : A, Nível de evidência : 2 A.

Em usuários crônicos de AINES, a simples erradicação do H. pylori é suficiente para prevenir a recorrência de úlceras ou sangramentos : Concordância : 100%, Recomendação : A, Nível de evidência : 1B

Testes para H. pylori e tratamento são indicados antes do tratamento crônico com AAS em pacientes de risco para doenças ulcerosas: Concordância : 100%, Recomendação : A, Nível de evidência : 2B

Erradicação do H. pylori reduz o risco de recorrência de sangramento em pacientes em uso de AAS, com antecedente de sangramento em úlcera gastrointestinal : Concordância : 100%, Recomendação : B, Nível de evidência : 1B

Declaração 25: H. pylori deve ser erradicado em pacientes com púrpura trombocitopênica idiopática : Concordância : 100%, Recomendação : B, Nível de evidência : 3 A

Declaração 26: Infecção por H. pylori pode ser fator de risco anemia, baixo nível de ferritina e anemia por deficiência de ferro : Concordância : 100%, Recomendação : b, Nível de evidência : 2 A

Declaração 27: Erradicação do H. pylori não favorece o aparecimento de DRGE : Concordância : 100%, Recomendação : B, Nível de evidência : 1B

Declaração 28: A terapia tripla convencional (IBP em dose standard, 1 grama de amoxacilina, 500mg de claritromicina, duas vezes ao dia por 7 dias) é a primeira opção de tratamento. : Concordância : 100%, Recomendação : A, Nível de evidência : 1 A

Declaração 29 : Devido a falta de validação nacional, esquemas alternativos de primeira opção para erradicação do H. pylori, como as terapias sequenciais, esquema concomitante sem bismuto, ou aqueles com sias de bismuto ou levofloxacino não são recomendados para uso rotineiro no Brasil. Em situações especiais, esquema com furazolidona pode ser usado.: Concordância : 86-89%, Recomendação : D, Nível de evidência : 5

Declaração 30 : Esquemas triplos com IBP, levofloxacino e amoxacilina por 10 dias, ou IBP, furazolidona e levofloxacino por 7 a 10 dias, ou esquema quádruplo com IBP, bismuto, tetraciclina e furazolidona por 10 a 14 dias, são recomendados como terapias de secunda e terceira linhas. Concordância : 89%, Recomendação : A/B, Nível de evidência : 1 A/2C.

 

Basicamente as orientações seguem as mesmas premissas do consenso anterior, porém,  alguns pontos importantes foram modificados nesta edição, e o principal, e mais controverso, é a orientação de tratamento do Helicobacter pylori em todos os pacientes com dispepsia funcional, orientação que não é consenso nos guidelines de associações internacionais. Outro ponto interessante, é a orientação de pesquisa da bactéria em todos os pacientes que realizam endoscopia (afinal , a maioria tem algum sintoma dispéptico que justifica o exame).  Por fim, a declaração de que erradicação não favorece o aparecimento de Doença do Refluxo.

 

Bibliografia:

1- UpToDate online (2015)

2- COELHO, Luiz Gonzaga et al . 3rd BRAZILIAN CONSENSUS ON Helicobacter pylori. Arq.Gastroenterol.,  São Paulo ,  v. 50, n. 2, p. 81-96, June  2013 .   Available from  http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0004-28032013000200081&lng=en&nrm=iso>. access on  24  Apr.  2015. Epub Apr 19, 2013.  http://dx.doi.org/10.1590/S0004-28032013005000001.

link : http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0004-28032013005000113

Saiba mais: Pangastrite enantematosa leve




Quadro Clínico e Diagnóstico Diferencial da Diverticulose

A diverticulose do cólon atinge menos de 20% das pessoas abaixo dos 40 anos, e mais da metade das pessoas acima dos 50 anos. A maioria das pessoas com divertículos do cólon permanece assintomática. Sintomas atribuídos a diverticulose aparecem em menos de 30% dos indivíduos afetados. O amplo espectro de apresentações clínicas dos divertículos colônicos é denominado doença di­verticular. O espectro de sintomas inclui desde dor abdominal localizada e hábito intestinal irregular sem evidência de inflamação (doença diverticular sintomática não complicada), como também diverticulite, colite segmentar e hemorragia diverti­cular. O diagnóstico e tratamento de cada apresentação são bem diferentes apesar da sua origem em comum.

Diverticulose:

presença de divertículos no cólon. Pode ser assintomática ou sintomática.

Doença diverticular:

diverticulose sintomática

  • Doença diverticular sintomática não complicada: dor abdominal atribuída a doença diverticular, sem associação com processo inflamatório (colite ou diverticulite). A dor geralmente dura mais de 24h e os sintomas são semelhantes a síndrome do intestino irritável. Os níveis de calprotectina permanecem normais na SII e estão aumentados na DDSNC.
  • Colite diverticular: colite segmentar caracterizada pelo processo inflamatório nas áreas interdiverticulares, poupando os óstios divertículares.
  • Diverticulite aguda: processo inflamatório causado pela microperfuração de um divertículo. Pode ser não complicada ou complicada por abscesso, obstrução intestinal, fístulas ou perfuração.
  • Hemorragia diverticular: enterorragia indolor oriunda da ruptura de uma artéria intradiverticular (vasa recta).

Diagnóstico Diferencial

O diagnóstico diferencial de diverticulose inclui to­das condições que podem causar dor na metade inferior abdominal incluindo síndrome do intestino irritável, apendicite, colite, câncer colorre­tal, endometriose e doença inflamatória pélvica.

A síndrome do intestino irritável é particularmente difícil de distinguir da diverticulose sintomática baseado apenas na apresentação clínica. Na verdade, as duas afecções podem coexistir no mesmo paciente. Diferentemente da síndrome do intestino irritável que geralmente causa dor abdominal generalizada, a doença diverticular sintomática não complicada costuma provocar dor limitada ao quadrante inferior esquerdo, mas que persiste por mais de 24h. Na SII a dor costuma durar menos que 24h. A calprotectina fecal ajuda a diferenciar as duas condições, permanecendo normal na SII e elevando-se na doença diverticular.

A diferenciação entre diverticulose sintomática e diverticulite aguda leve pode ser difícil. A diverticulite aguda costuma cursar com febre e leucocitose, mas sua ausência não exclui diverticulite. Os níveis de proteína C reativa (PCR) elevam-se na diverticulite aguda e a TC evidencia inflamação pericólica.

Endoscopia

A colonoscopia permite visualizar os divertículos, a sua localização, tamanho, quantidade e sua situação no có­lon. O exame pode se tornar difícil em pacientes com diverticulose importante, pois pode ocorrer deformidades e estreitamento luminal, exigindo um cuidado especial do endoscopista para não confundir um dos vários divertículos com o verdadeiro lúmen intestinal e causar perfuração colônica. A mudança de decúbito e o uso de antiespasmósdicos pode auxiliar nestes casos.

Em geral, os divertículos do cólon sigmoide são melhor visualizados durante a introdução do aparelho. Um cuidado a ser tomado pelo endoscopista é o de não confundir um divertículo invertido com um pólipo na luz intestinal, pois a polipectomia nesta situação causaria perfuração da pare­de do cólon.

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Achados endoscópicos que devem ser observados para caracterização da doença diverticular

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Tumor Neuroendócrino Gástrico

Os tumores neuroendócrinos gástricos são lesões compostas por hiperplasia das células enterocromafin-like. Os padrões histológicos são variados e confirmam-se pela imunohistoquímica, tendo positividade para marcadores como cromogranina A.

Os tumores neuroendócrinos (TNE) gástricos são divididos clinicamente em três tipos:
Tipo 1: mais comum (80%), ocorre num contexto de gastrite atrófica associado a hipergastrinemia, geralmente múltiplos. Apresentam-se como pequenos nódulos no corpo e limitados à submucosa e mucosa. Geralmente benignos, podendo regredir. As metástases linfonodais são raras, podendo ocorrer em lesões maiores de 2 cm.
Tipo 2: são raros (5%), geralmente menores que 1,5 cm, multifocais no corpo e associado a síndrome neuroendócrina múltipla (MEN tipo 1) e síndrome de Zollinger Ellison. Há metástase em 30% dos casos, preferencialmente quando lesões maiores de 2 cm e com invasão da muscular própria.
Tipo 3: segundo mais comum (15%), é esporádico, solitário e sem associação com gastrite atrófica e sem hipergastrinemia. Ocorrem em qualquer local do estômago e, como os demais, as metástases estão relacionadas com o tamanho, presença de invasão angiolinfática e invasão da muscular própria.

tabela ne 1

A nova classificação histológica dos TNE gástricos, da Organização Mundial de Saúde, é feita através da contagem mitótica em campos de grande aumento (10 HPF) e pelo índice de Ki67, sendo assim divididos em:
Grau I (bem diferenciado, cerca de 90%): Ki67 ≤ 2% e < 2 mitoses/10 campos de maior aumento;
Grau II (bem diferenciado): Ki67 de 3 a 20% e 2 a 20 mitoses/10 cma;
Grau III (pouco diferenciado): Ki67 > 20% e mitose > 20/10 cma.

Quanto a conduta, deve-se considerar a classificação clínica, o grau histológico, o grau de invasão, o número de lesões, o tamanho do tumor e a presença de invasão angiolinfática ou de metástases.

Nos tumores do tipo 1 e 2, nos casos em que há menos de 5 pólipos e o maior deles for inferior a 1 cm é recomendado ressecção endoscópica, se não houver invasão da camada muscular própria (quando diagnosticado por ecoendoscopia antes da ressecção). O acompanhamento é feito com endoscopia digestiva alta anualmente. Quando houver margens comprometidas da ressecção endoscópica, a ressecção cirúrgica local está indicada (gastrectomia subtotal).

Fatores de risco para doença metastática:
– Invasão da muscular própria
– Invasão angiolinfática
– Classificação histológica grau III (pouco diferenciado)

Tumores neuroendócrinos que apresentam qualquer fator de risco para metástase ou classificados clinicamente como tipo 3, está indicada a gastrectomia com linfadenectomia.

Nos casos de metástases, há opções como técnicas de radiologia intervencionista, radioterapia para disseminação óssea sintomática e quimioterapia em doença metastática irressecável.

CASOS CLÍNICOS
Caso 1: feminina, 32 anos, com hipotireoidismo e depressão, refere pirose e epigastralgia diariamente, sem sinais de alarme. Na EDA, evidenciaram-se pólipos em corpo gástrico e gastrite antral erosiva plana moderada, foram feitas polipectomias. À biópsia e imunohistoquímica, constatou-se tumor neuroendócrino (cromogranina positivo) , Grau I (Ki67 < 2%) , apresentando também atrofia, metaplasia intestinal e padrão morfológico sugerindo gastrite autoimune. Exame laboratorial demonstrou hipergastrinemia, anti- célula parietal positivo e deficiência de vitamina B12. A conduta feita foi reposição de vitamina B12 e orientações quanto ao quadro e seguimento endoscópico.

IMAGEM NE 1
CLASSIFICAÇÃO CLÍNICA: Tipo 1 CLASSIFICAÇÃO HISTOLÓGICA: Grau I

Caso 2: masculino, 33 anos, com queixa de dispepsia intermitente há 10 meses, tem hipotireoidismo. É irmão da paciente do caso 1. EDA evidenciou pangastrite enantematosa leve e pólipos gástricos. À biópsia e imunohistoquímica, constatou-se tumor neuroendócrino (cromogranina positivo), Grau II (Ki67 7 %) , invadindo submucosa e com margem profunda comprometida. Apresentando também atrofia, metaplasia intestinal e padrão morfológico sugerindo gastrite autoimune. Devido as margens de ressecção comprometidas e grau histológico um pouco mais agressivo foi indicado o tratamento cirúrgico do qual o paciente se recusou em fazer e perdeu o acompanhamento.

tabela ne 2
CLASSIFICAÇÃO CLÍNICA: Tipo 1 CLASSIFICAÇÃO HISTOLÓGICA: Grau II

Caso 3: feminina, 37 anos., com queixa de epigastralgia,. Endoscopia evidenciando pólipos em corpo gástrico sendo um com cerda de 10mm, sendo este ressecado por mucosectomia. Diagnóstico histológico e imunohistoquímico compatível com tumor neuroendócrino, invasor da submucosa e margens cirúrgicas comprometidas, associado a gastrite atrófica. Laboratório com hipergastrimenia e investigação de metástase a distância negativa. Paciente submetida a gastrectomia parcial devido margens cirúrgicas comprometidas.

IMAGEM NE 3
CLASSIFICAÇÃO CLÍNICA: Tipo 1 CLASSIFICAÇÃO HISTOLÓGICA: Grau I

Caso 4: feminina, 60 anos, HAS prévia, tendo como queixa principal pirose. EDA apresentando 2 pólipos gástricos na grande curvatura sendo o maior com cerca de 8mm. À biópsia e imunohistoquímica, constatou-se pólipo hiperplásico e o outro como tumor neuroendócrino (cromogranina positivo), Grau I (Ki67 <2%), sem invasão angiolinfática, com margem profunda comprometida, sem atrofia associada. Solicitado tomografia de abdome e gastrina sérica. Paciente não retornou e o seguimento do caso foi perdido.

IMAGEM NE 4
CLASSIFICAÇÃO CLÍNICA: Tipo 3  CLASSIFICAÇÃO HISTOLÓGICA: Grau I

Discussão
Os pacientes dos casos 1 e 2 possuem hipotireoidismo e atrofia gástrica, sendo por um com gastrite autoimune confirmada, mostrando a relação que pode existir entre as doenças autominues

Os pacientes dos casos 1 e 2 são irmãos sugerindo a associados do tumor neuroendócrino com fatores genéticos ou com doenças autoimunes que levam a atrofia da mucosa gástrica

Os pacientes dos caso 2 e 3 apresentaram margem cirúrgica comprometida após a ressecção endoscópica tendo sido indicada complementação cirúrgica das lesões.

O paciente do caso 4 apresentava lesão única não associada a gastrite atrófica o que poderia sugerir a classificação clinica como tipo 3. Fala contra este hipótese o pequeno tamanho da lesão.

Conclusão
Apesar de ser uma neoplasia rara, tem-se demonstrado um aumento progressivo da incidência dos tumores neuroendócrinos gástricos e representam atualmente cerca de 10% de todos os TNE gastrointestinais

Constituem um espectro de neoplasias com características clínico-patológicas, mecanismo patogênico e prognóstico diferentes do adenocarcinoma

O conhecimento deste complexo tema com suas classificações e apresentações é de fundamental importância para a condução adequada de tumores desta linhagem

Bibliografia
Dal Pizzol AC, Linhares E, Gonçalves R, Ramos C. Tumores Neuroendócrinos do Estômago: Série de Casos. Revista Brasileira de Cancerologia 2010; 56(4):453-461, Outubro 2010.

Pathology and Genetics of Tumours of the Digestive System. World Health Organization Classification of Tumours 2010. p. 53-57.

College of American Pathologists .Protocol for the Examination of Specimens From Patients With Neuroendocrine Tumors (Carcinoid Tumors) of the Stomach. Based on AJCC/UICC TNM, 7th Edition.

Ruszniewski P, Delle Fave G, Cadiot G, et al. Frascati Consensus Conference; European neuroendocrine Tumor Society. Well-differentiated gastric tumors/ carcinomas. Neuroendocrinology 2006;84:158–64.




Divertículo de Zenker vs Divertículo de Killian-Jamieson

 

O divertículo de Killian-Jamieson é raro e frequentemente diagnosticado como divertículo de Zenker. O divertículo de Killian-Jamieson se origina por um espaço no músculo na parede anterolateral do esôfago cervical, inferior ao músculo cricofaríngeo e superior ao músculo longitudinal do esôfago.

Por outro lado, o divertículo de Zenker é formado em uma área de fragilidade, denominada triângulo de Killian, localizado na parede posterior, inferior ao músculo constritor inferior da faringe e acima do músculo cricofaríngeo.

Apesar destas diferenças anatômicas, o tratamento endoscópico é semelhante, consistindo na secção da musculatura hipertônica que constitui o “tabique” do divertículo.

 

Exame radiológico contrastado revelando divertículo de Zenker (A) e divertículo anterolateral de Killian –Jamieson (B).

Exame radiológico contrastado revelando divertículo de Zenker (A) e divertículo anterolateral de Killian –Jamieson (B).

 

Aspecto endoscópico do divertículo de zenker (A) e do divertículo de Killian-Jamieson (B). Note que o colo do divertículo é estreito, ao contrário do D. Zenker, no qual o colo é largo.

Aspecto endoscópico do divertículo de zenker (A) e do divertículo de Killian-Jamieson (B). Note que o colo do divertículo é estreito, ao contrário do D. Zenker, no qual o colo é largo.

 

Sequência endoscópica do tratamento endoscópico flexível com cap

Sequência endoscópica do tratamento endoscópico flexível com cap

 

 

 

Bibliografia recomendada:

  • Lee CK, Chung IK, Park JY, Lee TH, Lee SH, Park SH, Kim HS, Kim SJ. Endoscopic diverticulotomy with an isolated-tip needle-knife papillotome (Iso-Tome) and a fitted overtube for the treatment of a Killian-Jamieson diverticulum. World J Gastroenterol. 2008 Nov 14;14(42):6589-92.
  • Rubesin SE, Levine MS. Killian-Jamieson diverticula: radiographic findings in 16 patients. AJR Am J Roentgenol. 2001 Jul;177(1):85-9.

 




Corte ou Coagulação? Que corrente utilizar?    

Primeiro vamos entender a diferença entre corrente de corte e coagulação. Na corrente de corte, ocorre passagem de energia de alta voltagem de forma contínua. Isso causa um aumento instantâneo da temperatura nas células, causando vaporização da água intracelular e o rompimento da célula. Já a corrente de coagulação é obtida pela passagem de corrente interrompida (6% on; 94% off), o que leva a desidratação da célula sem sua ruptura.

A corrente mista (blend) apresenta variações do ciclo que oscilam entre 80% on; 20% off (blend 1) até 12% on; 88% off (blend 3). Cumpre ressaltar que a corrente blend é obtida através do acionamento do pedal de corte (geralmente amarelo). O pedal azul da coagulação é sempre coagulação.

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Existem poucos estudos comparando as correntes de corte e coagulação em polipectomias. O maior estudo publicado, é a o mesmo tempo muito antigo e compara dois períodos do serviço de Bruxelas, o primeiro de 1982-1986 em que se utilizou corrente mista e o segundo de 1986-1989 em que se utilizou corrente de coagulação.

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Com a corrente de corte observou-se mais sangramentos imediatos e com a corrente de coagulação observou-se mais sangramentos tardios. Cumpre salientar que 12 dos 14 casos de sangramento ocorreram em pólipos maiores de 10 mm.

As diretrizes das sociedades endoscópicas não fazem recomendações sobre qual corrente utilizar.

Já o modo EndoCut alterna os dois tipo de corrente, maximizando o efeito do corte, mas dando tempo suficiente para que ocorra a coagulação. Além disso, a potencia da corrente de corte é variável de acordo com a resistência tecidual. Infelizmente não existem estudos comparando o modo EndoCut com os métodos tradicionais em polipectomias (existem estudos demonstrando menor sangramento e maior eficácia na esfincterotomia).

 

Bibliografia

http://www.asge.org/assets/0/71312/71314/a287d885-e2ad-4c3b-ae7c-12e035d3061f.pdf