Bloqueio/neurólise ecoguiada através da injeção direta no gânglio celíaco

Chronic pancreatitis (CP) is a progressive inflammatory process that results in irreversible scarring of the pancreas. Abdominal pain is often the most debilitating symptom of CP and may be complicated by depression, social avoidance, and narcotic dependence.

In recent years, endoscopic ultrasound (EUS) has been used to perform celiac plexus block (EUS-CPB) and neuroloysis (EUS-CPN). EUS-CPB is generally done for painful benign diseases (most commonly chronic pancreatitis); whereas EUS-CPN has greater risk of tissue injury and is generally done as a palliative maneuver for malignant diseases.  The endoscopic technique may be safer than percutaneous methods, since it is performed under direct ultrasound visualization and uses color flow Doppler to prevent injury to blood vessels.

The initial approach to EUS-CPB/N was plexus injection. In this approach the needle is passed through the body of the stomach adjacent the celiac artery into the retroperitoneal space. The injectate (bupivacaine or alcohol) is injected and spreads through the retroperitoneal space, effectively “bathing” all the ganglia.

Direct ganglia injection is a newer technique (Video). The needle is inserted under EUS guidance directly into the ganglia. The solution is injected, producing an echogenic pattern within the ganglion.

From a retrospective study with EUS-guided celiac plexus neurolysis (EUS-CPN), direct injection in the ganglia was the best predictor of pain relief (1). Patients with visible ganglia were >15 times more likely to respond.

In a clinical trial, patients were randomized to undergoing either EUS-celiac ganglia neurolysis (EUS-CGN) or standard EUS-CPN reported higher treatment response rate and complete response rate in the EUS-CGN group (2).

  1. Ascunce G, Ribeiro A, Reis I et al. EUS visualization and direct celiac ganglia neurolysis predicts better pain relief in patients with pancreatic malignancy (with video). Gastrointest Endosc 2011; 73: 267–274
  2. Doi S, Yasuda I, Kawakami H, et al. Endoscopic ultrasound-guided celiac ganglia neurolysis vs. celiac plexus neurolysis: a randomized multicenter trial. Endoscopy 2013; 45: 362-369



Complicações do Balão Intragástrico

Desde o inicio de sua utilização na década de 80, ainda numa forma bastante rudimentar, o balão intragástrico proporciona bons resultados. Entretanto, no início da experiência, as complicações eram frequentes e preocupantes.

Com os constantes estudos realizados e o aperfeiçoamento do material do balão, o número e gravidade das complicações caíram significativamente ao longo dos anos. Entretanto, a difusão mundial e crescente utilização do método, trouxeram novas formas de complicações e aumentaram as antigas ocorrências.

Dessa forma é muito importante que os médicos endoscopistas e das demais áreas que acompanham estes pacientes, conheçam e saibam manejar suas complicações.

Faremos um breve tour pelas complicações mais comuns do BIG

Náuseas e vômitos: as complicações menores e também as mais comuns são as de ocorrência precoce, ou seja, nos primeiros 3 a 5 dias pós implante do acessório. Náuseas e vômitos, acompanhados ou não de dor abdominal e de graus variados ocorrem em cerca de 70% dos casos segundo meta-análise publicada em 2015 (Zheng, Wang et al. 2015). Importante ressaltar que os dados apresentados são semelhantes a experiência de nosso grupo com cerca de 1500 balões implantados.

Entre os pacientes que apresentam os sintomas descritos, cerca de 7 – 15% necessitarão de medicação e hidratação endovenosa. Apesar de muito comum, esses sintomas merecem atenção especial já que além de serem a maior causa de retirada precoce do acessório, pode acarretar complicações graves como desidratação, distúrbios hidroeletrolíticos e insuficiência renal aguda, potencialmente fatais. Alguns estudos mostram taxa de retirada precoce por esse tipo de sintomas de até 20% (De Castro, Morales et al. 2010).

Sangramento: Relatos de pequenos sangramentos durante os primeiros dias são corriqueiros entre médicos com algum volume de procedimentos, mas quando persistentes, os vômitos podem causar lesões como síndrome de Mallory-Weiss com sangramento maciço e necessidade de terapêutica endoscópica. Outra causa rara, mas que não podemos deixar de pensar em casos de HDA em pacientes com BIG é a lesão de Dieulafoy. Nos últimos 3 anos foram relatados 4 casos dessa patologia em pacientes em uso do balão intragástrico no estado de São Paulo.

Soluços: ainda com pouca descrição na literatura, mas de grande incomodo para o paciente, são os soluços. Raros pacientes apresentam crises de soluços que podem durar minutos até dias e nesses casos o manejo é bastante complicado, sendo usados medicações variadas inclusive benzodiazepínicos para debelar o sintoma.

Impactação no antro: mais comum nos primeiros meses após implante. Quando impactado, o balão ocasiona o represamento do conteúdo provocando distensão abdominal, dor , náuseas, vómitos até com pequenas quantidades de líquido, pirose retroesternal, podendo cursar até com broncoaspiração. Essa complicação é importante pois frequentemente causa a retirada precoce do acessório.

Balão impactado no antro com muito resíduos

Balão impactado no antro com muito resíduos

Hiperinsuflação espontânea:, complicação rara, que simula a impactação antral. A causa ainda não está bem determinada, mas a principal hipótese é a colonização fúngica e/ou bacteriana. Os sintomas são muito semelhantes aos descritos quando da impactação antral, entretanto a troca do acessório se faz necessária quando diagnosticado, e em muitos casos o mesmo paciente pode apresentar nova hiperinsuflação do balão.

Hiperinsuflação espontânea

Hiperinsuflação espontânea

Colonização fúngica: ainda não se sabe exatamente as razões que levam a formação de uma camada muitas vezes grosseira de fungos sobre o balão, a hipótese atualmente mais considerada é que o ambiente básico devido ao uso de IBPs possa ser a causa da presença dessa ocorrência. Observamos na prática diária, em concordância com a literatura a grande prevalência de candida albicans nos casos de fungos em BIG. (Kotzampassi, K., et al. 2013).

Colonização por fungos

Colonização por fungos

Vazamento do balão: nos EUA o balão intragástrico habitualmente não é preenchido com o marcador azul de metileno para identificação de eventual vazamento, já em nosso país a utilização desse marcador é amplamente difundida. Dessa forma a ocorrência da complicacão é amplamente documentada em terras brasileiras, e a incidência gira em torno de 0,35 a 1,5%, valores correspondentes com a literatura internacional.(Genco, Bruni et al. 2005). Quando do vazamento o medico responsavel deve estar atento pois casos de migração para o intestino causando obstrução aguda são relatados na literatura (Di Saverio, Bianchini Massoni et al. 2014, Daghfous, Baraket et al. 2015).

 

Pancreatite aguda: Nas condições de represamento de conteúdo e distensão da câmara gástrica como as referidas anteriormente, mas não só nelas, existem chances de uma intercorrência relativamente comum, a pancreatite leve. Trata-se de um quadro de dor abdominal seguida de elevação das enzimas pancreáticas e sinais tomográficos de pancreatite leve , principalmente caudal. Em alguns casos causando a retirada do BIG. Existem raros relatos de pancreatite aguda grave na literatura (Vongsuvanh, Pleass et al. 2012).

Úlceras: são eventos de ocorrência pouco frequente, entretanto podem ocasionar cenários catastróficos com HDA, exigindo retirada do BIG e terapêutica endoscópica imediata.

Úlcera pós-BIG

Úlcera pós-BIG

Perfurações gástricas: a causa ainda é desconhecida, sendo a principal hipótese a isquemia da parede do órgão por compressão do acessório, ou por abrasão, formando úlcera e evoluindo para perfuração. A incidência relatada de perfurações gástricas em pacientes usando balão intragástrico na literatura é de 0,2% (Genco, Bruni et al. 2005).

Complicações relacionadas ao procedimento: as complicações oriundas do implante e da retirada do acessório incluem eventos durante a sedação e/ou anestesia, além de lesões agudas do TGI. A necessidade de realizar o procedimento em ambiente controlado, com suporte avançado de vida, todo o arsenal de acessórios, como pinça, tesoura endoscópica, alça grande, cateter de perfuração, overtube, etc… é mandatório para fazer de um procedimento simples também um procedimento seguro.

Conclusão: A eficiência comprovada da abordagem (Moura, Oliveira et al. 2016) e a aparente simplicidade do método, despertou o interesse dos endoscopistas. O manejo do balão intragástrico enquanto não há complicações é bastante prático e tranquilo, entretanto a variedade de eventos e a gravidade dos mesmos, fazem com que os profissionais que trabalham com esse acessório, devam estar treinados e preparados para enfrentar as possíveis complicações .

Clique aqui e confira nossa galeria de imagens de complicações de balão intragástrico

Referências:

Daghfous, A., et al. (2015). “[Intestinal obstruction caused by migration of intragastric balloon. A case report].” Tunis Med 93(4): 272-274.

De Castro, M. L., et al. (2010). “Efficacy, safety, and tolerance of two types of intragastric balloons placed in obese subjects: a double-blind comparative study.” Obes Surg 20(12): 1642-1646.

Di Saverio, S., et al. (2014). “Complete small-bowel obstruction from a migrated intra-gastric balloon: emergency laparoscopy for retrieval via enterotomy and intra-corporeal repair.” Obes Surg 24(10): 1830-1832.

Genco, A., et al. (2005). “BioEnterics Intragastric Balloon: The Italian Experience with 2,515 Patients.” Obes Surg 15(8): 1161-1164.

Kotzampassi, K., et al. (2013) “Candida albicans colonization on an intragastric balloon.” Asian J Endosc Surg 6(3): 214-216.

Milone, M., et al. (2014). “An early onset of acute renal failure in a young woman with obesity and infertility who underwent gastric balloon positioning. A case report.” G Chir 35(3-4): 73-74.

Moura, D., et al. (2016). “Effectiveness of intragastric balloon for obesity: A systematic review and meta-analysis based on randomized control trials.” Surg Obes Relat Dis 12(2): 420-429.

Vongsuvanh, R., et al. (2012). “Acute necrotizing pancreatitis, gastric ischemia, and portal venous gas complicating intragastric balloon placement.” Endoscopy 44 Suppl 2 UCTN: E383-384.

Zheng, Y., et al. (2015). “Short-term effects of intragastric balloon in association with conservative therapy on weight loss: a meta-analysis.” J Transl Med 13: 246.

Autor

Dr. Sergio Barrichello




Tratamento endoscópico dos cálculos biliares difíceis

O tratamento da coledocolitíase evoluiu muitos nas ultimas 4 décadas graças ao avanço das técnicas endoscópicas. Hoje sabemos que entre 85 e 90 % dos casos de coledocolitíase são bem resolvidos pelas técnicas  habituais da Colangiopancreatografia Retrógrada Endoscópica (CPRE) : papiloesfincterotomia e extração com basket ou balão.
Alguns fatores de risco devem ser considerados como preditores de dificuldades na extração destes cálculos, sendo eles:

  •         Idade > 65 anos
  •         Cálculo > 15 mm de diâmetro
  •         Cálculo em posição peri-ampular ( <36 mm da papila)
  •         Múltiplos cálculos (>10)
  •         Cálculos em forma de barril ou muito longos
  •         Cálculos intra-hepáticos
  •         Vias viliares muito dilatadas
  •         Angulação das vias biliares < 135°
  •         Estenose biliar distal

As opções técnicas nestes casos são muitas, dependendo do arsenal de acessórios, bem como da experiência e preferência do endoscopista.
coledocolitiase multiplos calculos

Clique na imagem para ampliar. A)Paciente com múltiplos cálculos. B)Remoção iniciada pelos cálculos distais para evitar impactação. C) Remoção dos cálculos proximais. D) Colangiografia controle confirmando ausência de cálculos residuais.

Stents Biliares

Muito utilizados quando ocorre falha na retirada completa dos cálculos. O uso de stents, tanto plásticos como metálicos, são grandes aliados nestas situações. Para os stents plásticos, os modelos em pigtail apresentam menor risco de migração. Apesar do maior custo em nosso meio, os stents metálicos totalmente recobertos também podem ser usados e alguns estudos mostram melhores resultados, com menores complicações a longo prazo, provavelmente devido a maior força radial e por promoverem maior dilatação papilar.

Vantagens:

  •           Permite ampla drenagem biliar até a solução definitiva
  •           Sucesso de implantação em quase 100% dos casos
  •           Promove redução progressiva do tamanho dos cálculos
  •           Passagem espontânea dos cálculos em alguns casos
  •           Aumenta a taxa de extração em até 92 % na segunda tentativa

Desvantagens:

  •           Risco de oclusão e  colangite em até 40% dos casos
  •           Risco de migração
  •           Troca necessária a cada 3 meses

coledocolitiase colangite protese

Clique na imagem para ampliar. Paciente de 78 anos, múltiplas comorbidades e com quadro de sepse e colangite. A) Colangiografia mostrando múltiplos cálculos de colédoco e estenose na via biliar distal. B) Detalhe da redução de calibre no colédoco distal. C) Tentativa de remoção dos cálculos com papilotomia e balão extrator sem sucesso. D) Devido às condições clínicas ruins da paciente foi optado por passar uma prótese plástica e tratar a colangite com reabordagem endoscópica a ser programada após compensação clínica da paciente.

Dilatação Papilar com Balão de Grande Calibre

O uso de balões de grande calibre ( 12 a 20 mm) tem se mostrado efetivo em várias publicações. Esta técnica é indicada para a abordagem de cálculos maiores do que 13 ou 14 mm, diminuindo nestes casos a necessidade de litotripsia mecânica, bem como em casos de Síndrome de Mirizzi e impactação de basket. Outras  indicações incluem anatomia alterada, como gastrectomia B II,  by-pass gástrico e divertículo peri-ampular, sem aumento do risco de complicações. O uso do balão hidrostático, associado ao balão extrator ou basket, se torna mais econômico em nosso meio quando comparado ao uso das diversas opções de litotripsia.
Detalhes técnicos:

  • Realizar papilotomia entre 1/3 e ½ da distância até a primeira prega duodenal
  • Nos casos com papilotomia prévia a ampliação de papilotomia pode aumentar risco de sangramento
  • Acesso por infundibulotomia não aumenta risco de complicações
  • Dilatar até no máximo o calibre da via biliar, lenta e progressivamente, abaixo dos cálculos
  • Inflar o balão com água e contraste hidrossolúvel, sob controle fluoroscópico
  • Cinturas persistentes podem significar estenoses ocultas, com maior risco de perfuração

Coledocolitiase dilatacao balao grande calibre

Clique na imagem para ampliar. A) Grande cálculo na via biliar com desproporção entre o seu tamanho e a via biliar distal. B) Visão fluoroscópica da dilatação com balão – balão insuflado com contraste e soro para melhor visualização. C) Colangiografia após a remoção do cálculo. D) Visão endoscópica da dilatação com balão. E) Grande cálculo na luz duodenal. F) Optado por remoção endoscópica do cálculo devido ao risco de íleo biliar.

Litotripsia Mecânica

Tem como princípio fundamental a fratura do cálculo, através de sua apreensão por um basket e a pressão deste sobre uma bainha metálica, exercendo força suficiente para a fragmentação do cálculo. Apresenta taxas de sucesso de até 90% e baixo índice de complicações, sendo as mais comuns a fratura do sistema com retenção do cálculo e basket, pancreatite e sangramento.

Litotripsia Intraductal

Consiste na fragmentação dos cálculos através de contato direto com uma sonda, sob controle endoscópico ( colangioscópico), utilizando-se o sistema Eletrohidráulico ou o sistema a Laser. Ambos apresentam taxas de sucesso em torno de 90%, com complicações entre 10 e 18%, sendo a colangite e sangramento as mais comuns. Devido ao alto custo destes equipamentos, não apresentam grande disponibilidade em nosso meio.

Litotripsia Extra-Corpórea

Realizada através da emissão de ondas de choque, por um gerador externo. Necessita de localização radiológica ou ultrassonográfica dos cálculos, normalmente através de um dreno nasobiliar ou biliar externo. Após a fragmentação dos cálculos necessita de CPRE para limpeza das vias biliares e tem taxas de sucesso entre 70 e 90%. Complicações ocorrem entre 30 a 40% dos casos, mais frequentemente cólica biliar, hemobilia, colangite, hematoma perinefrético e hematúria.
Em recente revisão, foi proposto um algoritmo para estes casos difíceis.
algoritmo calculos dificeis

Clique para ampliar. Adaptado de Esler JJ et al. Gastrointest Endosc Clin N Am. 2015;25(4):657-75.

Nestes últimos anos tenho usado com muito mais frequência a dilatação com balão, seja de calibre normal ( 10 a12 mm), ou mesmo os de grande calibre, quando nestas situações de cálculos difíceis como descritas aqui, e muito raramente tenho necessitado de stents ou mesmo litotripsia mecânica. O uso destes balões é fácil, mais barato que a litotripsia, e muito seguro, quando respeitados os detalhes técnicos aqui discutidos.
Para finalizar, um último cuidado quando se trata de cálculos volumosos, é a fragmentação dos mesmos no duodeno, ou retirada per-oral, para se evitar o íleo biliar ou mesmo a Síndrome de Bouveret (obstrução duodenal pelo cálculo).

Clique para assistir o video.  Paciente com via biliar bastante dilatada e cálculo gigante. Após a remoção do cálculo foi realizada a fragmentação do mesmo no duodeno para prevenir o íleo biliar.

Referências

Easler JJ et al. Endoscopic Retrograde Cholangiopancreatography for the management of common bile duct stones and gallstone pancreatitis.Gastrointest Endosc Clin N Am. 2015;25(4):657-75.
Yang J et al. Endoscopic biliary stenting for irretrievable common buli duct stones: Indications, advantages, disadvantages and follow up results. The sugeon. 2012;10:211-217.
Park JS et al. Endoscopic balloon dilation lithotripsy for difficult bile duct stones. Dig Dis Sci. 2014;59:1898-1901.
Kim JH et al. Endoscopic papillary large balloon dilation for the removal of bile duct stones. World J Gastroenterol. 2013;19(46).
Mangiavillano B et al. Outcome of stenting in biliary and pancreatic benign and malignant diseases. World J Gastroenterol 2015;21(30).
Orso I. Tratamento endoscópico da coledocolitíase. in: Paulo Sakai. Tratado de endoscopia digestiva – Vias biliares e pâncreas. 2015; Volume 3, Segunda edição.




Proposta de Algoritmo de Atendimento da HDA

A hemorragia digestiva alta (HDA) é a emergência mais comum na Gastroenterologia, e apresenta importantes repercussões clínicas e econômicas. Publicações demonstraram que o estabelecimento correto e sequencial das mais recentes terapêuticas para a HDA está associado à melhora nos desfechos, inclusive com redução na mortalidade intra-hospitalar.

Os algoritmos de atendimento em serviços de urgência e emergência são guias de condutas extensivamente utilizados, com objetivo de fornecer uma visão simplificada da abordagem diagnóstica e terapêutica de doenças frequentes e relevantes da prática diária. O uso de algoritmos para atendimento da HDA está associado com menor tempo de internação e menores custos hospitalares.

OBJETIVO

O objetivo principal desse pesquisa foi a criação de um protocolo de atendimento da HDA, para ser utilizado em hospital terciário.

MÉTODOS

Realizada extensa revisão da literatura sobre as condutas na HDA, contidas nas bases de dados primária e secundária.

Clique na referência abaixo para acessar todo o conteúdo do trabalho:

Franco MC, Nakao FS, Rodrigues R, Maluf-Filho F, Paulo GA, Libera ED. Proposal of a Clinical Care Pathway for the Management of Acute Upper Gastrointestinal Bleeding. Arq Gastroenterol. 2015 Dec;52(4):283-92.

RESULTADOS

O resultado foi um modelo de atendimento para os pacientes com HDA e com evidência de sangramento recente, dado por melena ou hematêmese nas ultimas 24h, que são atendidos nas salas de emergência e unidades de terapia intensiva de hospitais terciários.

Neste algoritmo de atendimento, desenhado de forma compacta e compreensível, fica bem evidenciado o manejo dos pacientes desde a admissão, com definição dos critérios de inclusão e exclusão, passando considerações acerca do atendimento clínico inicial, posterior direcionamento para a terapêutica endoscópica, e encaminhamento às terapias de resgate em casos de sangramento persistente ou recorrente.

Destacam-se também os cuidados que devem ser tomados antes da alta hospitalar para todos os pacientes que se recuperam de um episódio de sangramento (ver imagem abaixo).

Protocolo HDA

CONCLUSÕES

A introdução de um protocolo para atendimento e tratamento de pacientes com HDA pode contribuir para uniformização de condutas médicas, diminuição no tempo de espera por medicações e serviços, no tempo de internação e nos custos hospitalares.

Esse algoritmo trata-se de um retrato momentâneo da terapêutica na HDA. Aguardam-se novas publicações sobre os seguintes tópicos:

  • Aumento no ponto de corte nos escores de seleção dos pacientes de baixo risco;
  • Restrição na hemotransfusão;
  • Uso de doses mais baixas do IBP;
  • Novas terapêuticas como uso do pós hemostático, próteses metálicas.

 




Coloproctopatia actínica crônica – visão prática

  1. Antes de mais nada, qual o porquê do uso do termo coloproctopatia ao invés do popular retite?

Devido à fisiopatologia da doença no qual o processo inflamatório é mínimo (sufixo itis = inflamação). O principal mecanismo na doença é a endoarterite obliterante e consequente isquemia. Em resposta à isquemia ocorre uma substituição de vasos normais por vasos tortuosos e dilatados. Além disto, muitos pacientes têm acometimento também do cólon, não sendo a doença restrita ao reto.

  1. Como é feito o diagnóstico?

O diagnóstico é simples. História de radioterapia pélvica mais o achado endoscópico de telangiectasias (foto). Outros achados endoscópicos são: úlceras, estenoses e fístulas.

telangiectasias 1 telangiectasias 4 telangiectasias 5

  1. É preciso biopsiar?

Não. Anamnese e endoscopia são suficientes para o diagnóstico, sendo reservado o estudo anatomopatológico para diagnóstico diferencial entre etiologia actínica e neoplásica em úlceras refratárias. Lembrando que as biópsias devem ser superficiais pelo risco de fístulas; e que o patologista deve estar ciente do antecedente de radioterapia (semelhanças entre displasia e efeito actínico na histologia).

  1. Como classificar a doença?

O sangramento pode ser estratificado de acordo com Quadro 1 e no Quadro 2 está a classificação endoscópica proposta por Brian Saunders. Sendo Grau A com dois pontos, moderada com três e grave com quatro ou cinco pontos. Existe uma correlação entre a gravidade clínica e endoscópica; e entre a classificação endoscópica e o número de sessões necessárias para erradicar as telangiectasias.

  1. Quando tratar? (Ver Quadro 1)

A indicação clássica é a anemia (com ou sem necessidade de transfusões) e pacientes com sangramento persistente (dois ou mais episódios por semana). Pacientes com sangramentos intermitente (um ou menos de um episódio semanal) apesar de controverso podem ser curados com apenas uma sessão de tratamento endoscópico que pode ser realizada ao momento do diagnóstico. Lembrando que o tratamento só está indicado após pelo menos seis meses da radioterapia ( para evitar casos agudos e que podem ter resolução espontânea) e pacientes assintomáticos não devem ser tratados.

  1. Como tratar?

As estratégias terapêuticas para a CAC incluem: farmacoterapia, câmara hiperbárica, formalina, endoscopia e cirurgia

  1. Quais as modalidades de tratamento endoscópico?

– Coagulação com plasma de argônio (CPA)

– Eletrocoagulação bipolar (EB)

– Laser (Nd:YAG e KTP)

– Formalina

– Heater probe

– Ligadura elática

– Crioterapia (CRiO)

– Radiofrequência (RAF)

– Hemospray

Ressaltando que não existem estudos com a escleroterapia e portanto essa modalidade não deve ser utilizada. O laser e o heater probe são técnicas obsoletas. Existem apenas relatos de casos com o uso da ligadura e do hemospray.

  1. Entre essas modalidades qual é a melhor?

Pergunta de difícil resposta pois existem poucos estudos comparativos. E tivemos a felicidade de realizar um destes estudos entre CPA e EB. Não havendo diferença estatística entre o número de sessões e a eficácia entre os dois métodos. Entretanto a incidência de complicações foi estatisticamente significante menor com CPA do que com EB (p = 0.003). O CPA por ser preferível por ser uma técnica segura, efetiva e consagrada na literatura. Estudos futuros, especialmente comparando o CPA com a formalina e com as novas técnicas (CRIO e RAF), irão responder esta pergunta.

  1. Em quais situações você indicaria uma alternativa endoscópica para a CPA?

Em primeiro lugar se não disponível o CPA no serviço, uma outra técnica pode ser utilizada evitando muitas vezes postergar o tratamento do paciente e sobrecarregar os serviços terciários. E nesses casos por estar presente em quase todos os serviços de endoscopia, recomendo o EB. O EB está muito bem indicado também em pacientes com marca-passo e outros dispositivos implantados que sofrem interferência com a corrente monopolar (CPA, CRIO e RFA).

  1. Quais são os ajustes do CPA?

Na literatura, o fluxo descrita é de 0,6 – 2,5 l/min e a potência 25 – 80W. Sugiro 1,0 l/min e 40W. De acordo com o fabricante, o gerador de segunda geração (VIO/APC 2) teve uma melhora na eficácia de 30-50% em relação ao modelo anterior. Além disto, o VIO/APC 2 dispõe do modo “Precise APC” que possui um sistema de controle integrado de fluxo resultando num dano térmico mais superficial e desejável.

  1. Intervalo entre as sessões?

Não há consenso. Proponho quatro semanas.

  1. Técnica: em pontos (“single-shot”) ou listras (“trawl-back”)?

A técnica “single-shot” é preferida, pois alguns autores acreditam que a técnica “trawl-back” está associada a maior risco de desenvolvimento de úlceras e estenoses.

  1. E a polêmica em relação ao preparo e explosões intestinais?

No estudo de Ben-Soussan concluiu que mais que o tipo de preparo, a presença de fezes sobre as lesões constitui o principal risco para explosões. Portanto, independente do tipo de preparo retrógrado ou anterógrado, nunca trate se o cólon estiver sujo. Como muitos dos pacientes com coloproctopatia tem incontinência fecal, que compromete o preparo com enema, o preparo oral é preferivel. Também não tenho preocupação com o uso de manitol (sem relatos de preparos adequados com manitol e explosões com CPA).

  1. Antibioticoprofilaxia é recomendada?

No Guideline da ASGE não há menção sobre a o uso de antibióticos nem para esta condição (coloproctopatia actínica) e nem para este tipo de procedimento. Fizemos um trabalho para avaliar a incidência de bacteremia pós CPA. Em 30 sessões, a bacteremia ocorreu duas vezes. Uma vez foi isolado o S. hominis (provável contaminação) e em outro paciente foram isolados dois microorganismos (Rhodotorula sp. and Streptococcus bovis) Nenhum paciente teve sintomas infecciosos. Assim a administração de antibióticos profiláticos não está indicada.

  1. E como manejar anticoagulantes e antiagregantes nesses pacientes?

No nosso trabalho usuários de AAS necessitaram de mais sessões de CPA para a erradicação das telangiectasias (p = 0.047) O Guideline da ESGE recomenda que AAS e clopidrogrel podem ser continuados em pacientes em pacientes submetidos a CPA. E a ASGE recomenda a suspensão de varfarina três a cinco dias antes da coagulação endoscópica. Mas acredito que sempre deve-se pesar o risco/benefício do uso de drogas que predispõem ao sangramento em pacientes com hemorragia ativa.

  1. Quando considerar o paciente refratário e o que fazer nesses casos?

Se forem necessários mais do que sete sessões fica evidente que o tratamento endoscópico não está sendo eficiente. Tradicionalmente pacientes refratários eram encaminhados para a cirurgia. Entretanto discordo desta conduta pela alta morbimortalidade do tratamento cirúrgico nesta condição. Acho que trocar de modalidade endoscópica (“cross over”) e/ou adicionar a terapia medicamentosa (aconselho vitamina A por via oral e enemas de sucralfato) podem evitar a cirurgia em muitos desses casos.

Quadro 1 – Classificação clínica

Ausência de sangramento 0 ponto
Sangramento intermitente (um ou menos de um episódio semanal) 1 ponto
Sangramento persistente (duas ou mais vezes por semana) 2 pontos
Sangramento diário ou anemia 3 pontos
Sangramento com necessidade de transfusão 4 pontos

Quadro 2 – Classificação endoscópica de Brian P. Saunders

Aspecto Pontuação
Distribuição das telangiectasias
Reto distal (até 10 cm da borda anal) 1 ponto
Todo o reto com ou sem envolvimento do sigmóide

(mais de 10 cm da borda anal)

2 pontos
Superfície colorretal coberta por telangiectasias
Menos de 50% da luz 1 ponto
Mais de 50% da luz 2 pontos
Presença de sangue vivo
Sem sangue vivo 0 ponto
Com sangue vivo 1 ponto

Leitura recomendada:

  1. Lenz L, Tafarel J, Correia L, Bonilha D, Monaghan M, Santos M, et al. The incidence of bacteraemia after argon plasma coagulation in patients with chronic radiation proctocolitis. Colorectal Dis. 2011 Jul;13(7):823-5.
  2. Lenz L, Tafarel J, Correia L, Bonilha D, Santos M, Rodrigues R, et al. Comparative study of bipolar eletrocoagulation versus argon plasma coagulation for rectal bleeding due to chronic radiation coloproctopathy. Endoscopy. 2011 Aug;43(8):697-701.
  3. Lenz L,Rohr R, Nakao F, Libera E, Ferrari A. Chronic radiation proctopathy: A practical review of endoscopic treatment. World J Gastrointest Surg. 2016 Feb 27;8(2):151-60.



Drenagem Biliar Ecoguiada – Breve Revisão da Literatura

A ecoendoscopia intervencionista está cada vez ganhando mais espaço na literatura, e também em nosso meio, como opção para drenagem das vias biliares após falha da CPRE.

Sendo importante para todos os médicos endoscopistas, mesmo aqueles que não realizam ecoendoscopia, terem conhecimento sobre as técnicas e as indicações da drenagem biliar ecoguiada (EUS-BD).

Este post será dividido em tópicos, e terá enfoque principal na revisão das mais recentes evidências sobre a EUS-BD:

1- EUS-BD vs DBTP

Por um bom tempo a drenagem biliar transhepática percutânea (DBTP) constituiu a principal modalidade de resgate para drenagem biliar após falha da CPRE.

Entretanto, ensaio-clínico randomizado, com amostra de 25 pacientes com obstrução biliar maligna irresecável, comparando a EUS-BD com a DBTP, demonstrou taxas semelhantes de sucesso técnico, clínico e de complicações.(1)

Estudo retrospectivo mais recente demonstrou que, apesar de um sucesso técnico maior com a DBTP, a taxa de sucesso clínico foi semelhante entre os dois procedimentos. Sendo que a DBTP esteve associada com maior taxa de eventos adversos, de reintervenção não-programada e consequentemente com maiores custos.(2) Outros estudos também sugeriram que a combinação da CPRE e do EUS no mesmo procedimento parece ser uma estratégia de menor custo, comparada ao encaminhamento parar a drenagem percutânea.(3,4)

Dessa forma, na falha da CPRE para drenagem da via biliar, além da drenagem transparietal percutânea, a drenagem ecoguiada é boa opção. As evidências atuais apontam para eficácias semelhantes, sendo que a EUS-BD parece ser uma técnica com menores complicações.

2 – EUS-BD: extrahepático vs intrahepático

A drenagem biliar ecoendoscópica em pacientes com anatomia preservada, seja pela técnica de rendezvous ou transluminal, pode ser realizada através do acesso intra ou extra-hepático. Metanálise realizada com oito estudos, que incluíram pacientes com estenose biliar distal, comparou a drenagem biliar ecoguiada realizada pelo acesso intra-hepático com o acesso extra-hepático, e evidenciou eficácia semelhante entre ambos os métodos, porém o acesso extra-hepático apresentou menores taxas de complicações.(5)

As principais complicações relacionadas com o acesso intra-hepático são: pneumoperitônio, fístula biliar, dor pós-procedimento e migração da prótese. Sendo explicados pelo fato de que nessa forma de acesso: a agulha percorre a cavidade peritoneal; o estômago e o fígado se movimentam de forma independente durante a respiração; e o menor calibre dos ductos intra-hepáticos pode não acomodar adequadamente a prótese.(6) Também tem sido relatado na literatura menor tempo de procedimento e de internação com drenagem biliar por via extra-hepática.(7)

Dessa forma conclui-se que para a drenagem ecoguiada das vias biliares, seja pela técnica rendezvous ou transluminal, pode-se utilizar o acesso intra ou extra-hepático. As técnicas parecem apresentar eficácias semelhantes, porém com menores taxas de complicações com o acesso extra-hepático.

3 – EUS-BD: Rendezvous vs transluminal

Existem poucos trabalhos comparando as técnicas de drenagem biliar rendezvous guiada por ecoendoscopia (EUS-RV) com a drenagem biliar transluminal guiada por ecoendocopia (EUS-TL). Estudo retrospectivo, com amostra de 35 pacientes com obstrução biliar distal maligna, comparou essas duas técnicas e demonstrou eficácia e segurança semelhantes.(8)

Para muitos endoscopistas, a EUS-RV tem sido a técnica preferida pois evita a criação de uma fístula bilioentérica permanente, bem como evita também a necessidade de dilatação do trajeto fistuloso que é uma etapa do procedimento que pode provocar sangramento, pneumoperitônio e pneumomediastino.

Já as vantagens da EUS-TL são a possibilidade de ser realizada em pacientes com anatomia alterada ou com obstrução gastroduodenal, evitar o risco de perda do fio-guia na troca para o duodenoscópio, menor tempo de execução do procedimento, e diminuição do risco de pancreatite pós-procedimento.

Atualmente há uma tendência por boa parte dos ecoendoscopistas em ser inicialmente tentada a EUS-RV, e no caso de falha, seja por dificuldade de transpor a estenose ou a papila, ser posteriormente realizada a EUS-TL.

4 – EUS-TL: hepaticogastrostomia vs coledocoduodenostomia

Na opção por realização da EUS-TL, deve-se considerar a realização de hepaticogastrostomia ou coledocoduodenostomia.

Metanálise que incluiu 7 estudos, dos quais 6 retrospectivos, com pacientes com estenose biliar distal, comparou a drenagem biliar ecoguiada pelas técnicas de hepaticogastrosotomia vs coledocoduodenostomia, e evidenciou sucesso técnico semelhantes entre as duas modalidades. Entretanto, a análise comparativa favoreceu a coledocoduosdenostomia por ter apresentado menores taxas de complicações.(5)

5 – EUS-TL: prótese plástica vs metálica

Até o momento, não existem artigos que comparem o uso de próteses plásticas e metálicas na drenagem ecoguiada transluminal. Entretanto é consenso entre os ecoendoscopistas que deve-se favorecer o uso de próteses metálicas totalmente cobertas, para que haja uma minimização do risco de migração e formação de fístula.(6)

Para observação de caso clínico com imagens e vídeo ilustrando a drenagem biliar ecoguiada clicar na referência abaixo:

Ribeiro MSI, Franco MC, Maluf-Filho F. An easier option for endoscopic ultrasound-guided biliary drainage: cannulation using two antiparallel guidewires. Endoscopy 2016.

Referências:

  1. Artifon EL, Aparicio D, et al. Biliary Drainage in Patients With Unresectable, Malignant Obstruction Where ERCP Fails. J Clin Gastroenterol. 2012;46(9):768–74.
  2. Khashab MA, Valeshabad AK, et al. A Comparative Evaluation of EUS-Guided Biliary Drainage and Percutaneous Drainage in Patients with Distal Malignant Biliary Obstruction and Failed ERCP. Dig Dis Sci. 2015;60(2):557–65.
  3. Gornals JB, Moreno R, et al. Single-session endosonography and endoscopic retrograde cholangiopancreatography for biliopancreatic diseases is feasible, effective and cost beneficial. Dig Liver Dis. 2013;45(7):578–83.
  4. Fabbri C, Luigiano C, et al. Endoscopic ultrasound-guided treatments: Are we getting evidence based – A systematic review. World J Gastroenterol. 2014;20(26):8424–48.
  5. Khan MA, Akbar A, et al. Endoscopic Ultrasound-Guided Biliary Drainage: A Systematic Review and Meta-Analysis. Dig Dis Sci. 2015;61(3):684–703.
  6. Khashab MA, Levy MJ, et al. EUS-guided biliary drainage. Gastrointest Endosc. 2015;82(6):993–1001.
  7. Dhir V, Bhandari S, et al. Comparison of transhepatic and extrahepatic routes for EUS-guided rendezvous procedure for distal CBD obstruction. United Eur Gastroenterol J. 2013;1(2):103–8.
  8. Khashab MA, Valeshabad AK, et al. EUS-guided biliary drainage by using a standardized approach for malignant biliary obstruction: Rendezvous versus direct transluminal techniques (with videos). Gastrointest Endosc. 2013;78(5):734–41.

 




CPRE em pacientes pediátricos.

 

 

Imagem da radioscopia mostrando fístula biliar pós-colecistectomia, com identificação de extravazamento de contraste na região do hepatocolédoco médio-proximal.

A colangiopacreatografia retrógrada endoscópica – CPRE é um procedimento endoscópico avançado para diagnóstico e tratamento de diversas afecções biliopancreáticas. Apesar de ser realizado com mais frequencia em adultos, ela apresenta indicações em todas as idades. A realização de CPRE na população pediátrica é menos frequente que em adultos, resultando em protocolos e estratégias adaptados. Porém, nos últimos anos, vem crescendo relatos e estudos específicos para a realização desse procedimento em crianças, ajudando a criar um melhor entendimento das indicações e técnicas para esta faixa etária.

Indicações :

Deve-se ter em mente, que mesmo em pediatria, a CPRE possui perfil relativamente alto de eventos adversos (EA). Portanto, sua indicação deve ser criteriosa, devendo-se lançar mão de procedimentos menos invasivos quando apenas for necessário o diagnóstico. As principais indicações de CPRE em crianças são :

Patologias biliares :

  • Coledocolitíase
  • Manejo de estenoses (pós transplante ou colangite esclerosante)
  • Manejo de fístula biliar (pós colecistectomia)
  • Avaliação de cisto de colédoco ou sua obstrução
  • Avaliação pré-operatória de junção pancreatobiliar anômala
  • Investigação de colestase neonatal
  • Investigação de patologias biliares onde exames menos invasivos não foram conclusivos

Patologias pancreáticas:

  • Pancreatite crônica (melhora da drenagem)
  • Pâncreas divisum
  • Investigação de pancreatite recorrente
  • Manejo de fistula pancreática (pós trauma)
  • Manejo de pseudocisto pancreático
  • Investigação de patologias pancreáticas onde exames menos invasivos não foram conclusivos

 

Alguns estudos demonstram que houve diminuição no número de exames diagnósticos nos últimos 15 anos, porém uma indicação disgnóstica que ainda permanece, e que muitas vezes evita lapatomomias exploradoras é em pacientes neonatais com suspeita de atresia biliar.

Considerações técnicas :

  • Ambiente :

Na maioria das vezes a CPRE em paciente pediátricos é realizada por endoscopistas treinados e com experiência em adultos, sendo a única modificação o paciente.  Em grandes centros de referência pediátricos há endoscopistas habituados em CPRE infantil, onde realizam o procedimento em ambiente preparado para receber este tipo de paciente com equipe treinada para tal.

  • Sedação

Não há consenso sobre a melhor técnica para sedação, já que há estudos mostrando a segurança tanto da sedação feita por endoscopista quanto a sedação feita por anestesista ou mesmo quando esses pacientes são submetidos a anestesia geral.  Alguns trabalhos demonstram uma taxa aumentada de conversão de sedação para anestesia geral, o que pode dificultar a realização da CPRE.

Uma particularidade da população pediátrica é a fragilidade da traquéia, especialmente em paciente com baixo peso (10 a 15 kg), onde a passagem de duodenoscópios standard pode causar sua compressão gerando uma depressão respiratória de difícil controle.

  • Equipamentos específicos

Provavelmente o tópico de maior dúvida.  No artigo utilizado como referência (1), os autores relatam que equipamentos pediátricos são raramente necessários, mesmo em centros de grande volume de exames.  Descrevem que em termos gerais,  duodenoscópios pediátricos (com cerca de 7,5 a 8,6 mm de diâmetro) devem ser a escolha para pacientes com menos de 10 kg, e em crianças maiores o duodenoscópio padrão deve ser utilizado, apesar de não haver consenso na faixa de peso de 10 a 15kg.  A utilização de aparelhos standards na maioria dos pacientes acima de 10 kgs, leva em conta o diâmetro do canal de trabalho dos mesmos, os quais permitem a passagem de próteses maiores que 5 Fr e materiais de triplo lúmen. Ao utilizar duodenoscópios standard em crianças, deve-se ter cuidado redobrado na passagem do aparelho, principalmente no esfíncter superior do esôfago e no piloro.

  • Eventos adversos

Devido a frequência relativamente baixa de eventos adversos em CPRE na população pediátrica, e principalmente poucos estudos de grande impacto na literatura sobre esse tema, é difícil estabelecer fatores de risco ou estratégias para diminuir os EA.

Em trabalho retrospectivo (2), com idade média de 15 anos (±5), foram analisados 429 procedimentos, onde o perfil de EA foi : Pancreatite (6,3 %, sendo a maioria leve ou moderada), dor abdominal (sem perfuração ou pancreatite – 5,6%), colangite (2,5%), febre (sem colangite ou pancreatite – 1,6%) e sangramento (1,4%). Não houve casos de perfuração.

A pancreatite segue como o EA mais comum nas CPREs também em crianças. Os fatores de risco aparentemente são os mesmos dos adultos (manipulação ou injeção no ducto pancreático, canulação difícil, dilatação, precut ….) .  Infelizmente, não se dispõem de dados mostrando diminuição da incidência de pancreatite com uso de stents pancreáticos (com alguns trabalhos demonstrando maior índice de EA) ou AINES via retal, como observado em adultos.

Sangramentos podem ocorrer, principalmente após papilotomia, sendo que o tratamento segue  as mesmas indicações e técnicas de pacientes adultos. O mesmo para perfurações,  devendo-se apenas atentar para o tipo de aparelho escolhido (como discutido acima ).

Por fim, é notório o maior uso de CPRE em pacientes pediátricos, assim como novas tecnologias devem se juntar a ela, como por exemplo a ultrassonografia endoscópica. Assim, estudos voltados para este grupo de pacientes são necessários para protocolos e consensos possam ser estabelecidos.

Você realiza CPRE em crianças ? Divida conosco sua experiência, acessando e participando do fórum de discussões .

Bibliografia :

 

Veja também :

CPRE em Pacientes Cirróticos 

CPRE em pacientes com gastrectomia a Billroth II prévia: 30 anos de experiência

CPRE em pacientes com gastrectomia a Billroth II

 




Como realizar tatuagem endoscópica

 

A localização intraoperatória de lesões detectadas por métodos endoscópicos é sabidamente imprecisa quando se baseia somente em marcos anatômicos com até 14% dos tumores cólon, por exemplo, sendo identificados cirurgicamente em sítio diverso ao descrito na colonoscopia. Particularmente, a abordagem laparoscópica dificulta a identificação de lesões menores que poderiam ser palpadas em técnicas cirúrgicas abertas, levando em último caso, a não ressecção do segmento apropriado.

Uma outra situação que demanda adequada determinação do sítio de lesão, é o segmento endoscópico pós ressecção de lesões. Após a remoção, por exemplo, de uma lesão de cólon em mais de uma fragmento (“piecemeal”), para se assegurar da completa ressecção em exames de controle, se torna essencial saber a localização exata da lesão retirada.

Portanto, com intuito principal de localizar pré-operatoriamente uma lesão do trato gastrointestinal, ou mesmo definir uma área a ser acompanhada endoscopicamente, algumas técnicas foram desenvolvidas. Entre elas, a tatuagem endoscópica é a mais comumente utilizada e mais facilmente reprodutível e será detalhada no texto. Outras técnicas disponíveis podem ser citadas como:

  • Medida de inserção: consiste na definição de quantos centímetros foram introduzidos do aparelho em tal órgão com base em algum ponto de referência (ex: arcada dentária superior, borda anal) com a finalidade de localizar melhor uma lesão. Pode ser utilizada em lesões de esôfago e de reto mas se mostra inadequada em lesões de outros órgãos pela formação de alças e imprecisão na medida.
  • Referências anatômicas: pode ser útil em algumas situações específicas, como lesões de cárdia, ceco, válvula ileocecal. Em outros segmentos, principalmente quando consideramos o cólon, a determinação de lesões acaba apresentando-se bastante errática.
  • Marcação com clipes metálicos: a aplicação de clipes metálicos na mucosa de qualquer localização do trato pode direcionar a localização intraoperatória com uso de radiografia e ultrassonografia. Uma grande desvantagem dessa técnica, é a imprecisão em relação ao período de fixação do clipe a mucosa, tendo o mesmo uma média de 10 dias, mas podendo variar de horas a anos. Caso ocorra uma queda precoce do clipe, o mesmo pode migrar para uma outra localização, causando transtorno da determinação do sítio de lesão.
  • Localização intraoperatória: a utilização de endoscopia ou colonoscopia intraoperatória é uma boa forma de determinar o sítio da lesão, contudo a utilização de ar corrente pode levar a insuflação exagerada dos órgãos do trato gastrointestinal, levando a dificuldade técnica cirúrgica.

 

TATUAGEM ENDOSCÓPICA

Dentre todos os métodos, a tatuagem endoscópica se demonstra claramente como a principal técnica de marcação endoscópica de lesões. Cita-se como vantagens principais a facilidade de execução e a produção de uma marca que habitualmente é acessível ao cirurgião tanto em procedimentos laparoscópicos, quanto em técnicas cirúrgicas abertas. Para a realização da mesma, devem ser utilizados:

  • Solução corante

Múltiplos corantes podem ser utilizados em endoscopia, contudo, em sua maioria, possuem altas taxas de absorção. Azul de metileno e índigo cármin, por exemplo, costumam ser absorvidas em até 24 h, não deixando marcas residuais. Dentre os corantes com maior durabilidade cita-se a tinta da India e a indocianina verde, sendo a tinta da India a mais comumente utilizada. A tinta da India consiste de uma solução de partículas de carbono e pode permanecer no tecido corado por tempo estimado de até 10 anos, permitindo a visualização de tumores marcados endoscopicamente em até 97% dos casos. Usualmente utilizada em soluções 1:50 – 1:100.

  • Cateter injetor

Produto tradicionalmente disponível para a injeção de outras soluções como de adrenalina ou ethamolin. Introduzido pelo canal de trabalho do aparelho, tem calibre ideal entre 23 – 25 G, com ponta de 3 – 5 mm.

 

TÉCNICA DE TATUAGEM ENDOSCÓPICA

Após localização da área a ser tatuada, a agulha do cateter injetor é exposta e penetra a mucosa de forma angulada, de modo que a aplicação do conteúdo injetado acesse a submucosa. Quando da penetração de forma perpendicular, há maior chance da agulha atravessar completamente a parede do órgão e dispensar a solução injetada no peritônio.

Em relação ao modo de injeção, duas variações técnicas principais são propostas:

  • Injeção direta

A tinta da índia é injetada diretamente no tecido em alíquotas de 0,5 – 1 ml

  • Teste com solução salina

A técnica de teste com solução salina consiste da formação de uma bolha submucosa com 1 – 3 ml de solução salina previamente a injeção da tinta da índia, evitando assim, a penetração transmural da tinta. Após a injeção de cerca de 1 ml da tinta, 2 ml de solução salina é usada para dispensar o resíduo de tinta possivelmente retido no cateter. Quando comparada a técnica tradicional, o teste com solução salina parece ser mais efetiva, permitindo maior número de identificações intraoperatórias de lesões.

 

Cateter posicionado injetando tinta da índia

Cateter posicionado injetando tinta da índia

 

ONDE TATUAR

A realização da tatuagem, principalmente quando de fins pré-operatório, como comentado anteriormente, deve ser realizada em locais de difícil identificação cirúrgica. Lesões em válvula ileocecal, ceco, cólon ascendente proximal e em reto, de modo geral, não necessitam ser tatuadas.

Diversas são as técnicas propostas na literatura em relação ao número de tatuagens e sobre a marcação proximal, distal ou ambas em relação a lesão, principalmente no que se refere ao cólon. Como princípios essenciais utilizados na decisão da melhor forma de tatuar é importante salientar:

  • Quanto mais circunferencial for a marcação, maior a chance de que se evite que a tatuagem se localize exclusivamente na borda mesentérica do órgão, o que portanto poderia levar a um difícil acesso cirúrgico.
  • É essencial que o ponto de injeção se localize 2-3 cm distante a lesão para uma melhor definição de suas margens e evitando que a tatuagem junto ou abaixo da lesão provoque uma reação fibrótica, dificultando por exemplo, uma adequada remoção endoscópica posterior.
  • Caso seja decidida pela tatuagem exclusivamente proximal ou distal ao sítio de lesão, é fundamental que isso fique bem claro na comunicação entre o endoscopista e equipe cirúrgica, evitando ressecções de segmentos inadequados.

 

Como sugerimos:

  • Optar pela técnica com teste de solução salina e formação de bolha submucosa anterior a injeção da tinta
  • Realizar a tatuagem em 2 – 3 pontos, atentando-se para a injeção de forma contra-lateral ou a cada 1/3 quando de tatuagens no cólon
  • Tatuar cerca de 2 – 3 cm proximalmente e distalmente a lesão. Quando houver perspectiva de ressecção endoscópica, uma distância de até 5 cm da lesão deve ser respeitada.
  • Evitar tatuagens muito próximas ou logo abaixo da lesão

 

copia de tatuagem

Tatuagem proximal e distal ao sítio de lesão

Tatuagem proximal e distal ao sítio de lesão

 

SEGURANÇA DA TÉCNICA

Raras são as complicações descritas com a tatuagem endoscópica pela técnica de teste com solução salina. Entre as complicações descritas, principalmente com uso da técnica de injeção direta, cita-se:

  • Formação de úlcera no sítio de injeção
  • Abscessos
  • Perfurações
  • Necrose perivisceral e formação de pseudotumor inflamatório

 

É possível evitar boa parte das potenciais complicações utilizando-se sempre de tinta da índia estéril, realizando injeções em pequenas alíquotas e evitando injeções profundas.

 

Veja também:  Vídeo sobre tatuagem endoscópica

 

Ressecções endoscópicas

 

Referências:

Pohl, J. Endoscopic Tattooing.Video Journal and Encyclopedia of GI Endoscopy , Volume 1 , Issue 2 , 355 – 356

ASGE Technology Committee, Kethu SR, Banerjee S, Desilets D, Diehl DL, Farraye FA, Kaul V, Kwon RS, Mamula P, Pedrosa MC, Rodriguez SA, Wong Kee Song LM, Tierney WM. Gastrointest Endosc. 2010 Oct;72(4):681-5.

Fu KI, Fujii T, Kato S, Sano Y, Koba I, Mera K, Saito H, Yoshino T, Sugito M, Yoshida S. A new endoscopic tattooing technique for identifying the location of colonic lesions during laparoscopic surgery: a comparison with the conventional technique. Endoscopy. 2001;33:687–691




Conceitos em Carcinogênese Colorretal

 

O câncer colorretal (CCR) é o quarto tumor mais frequente e a segunda causa de morte por câncer nos EUA. Estima-se para o ano de 2016 mais de 140 mil novos casos de câncer de cólon e reto nos EUA com aproximadamente 50 mil mortes, correspondendo a aproximadamente 9% das causas de morte por câncer. No Brasil, segundo os dados do INCA, estima-se mais de 34 mil novos casos de CCR para 2016. Apesar dos elevados números a incidência e a mortalidade nos pacientes acima de 50 anos vem diminuindo desde a década de 90 devido aos programas de rastreamento e melhora da assistência oncológica clínica e cirúrgica.

Entretanto, o diagnóstico de CCR nos pacientes abaixo de 50 anos tem aumentado por fatores ainda não esclarecidos. Segundo a OMS, estima-se que nos pacientes abaixo de 34 anos a incidência deve aumentar em até 125% até 2030.

O câncer colorretal é uma doença heterogênea no que se refere ao desenvolvimento e ao comportamento biológico e causada pela interação entre fatores genéticos herdados ou não e ambientais. A doença pode se apresentar de forma esporádica, herdada ou familiar.

 

Forma esporádica: a apresentação esporádica, sem história familiar, corresponde a aproximadamente 70% dos casos. A idade acima de 50 anos é o fator de risco mais importante além da dieta e de outros fatores ambientais.

Herdada: uma pequena proporção dos casos se deve às formas herdadas, relacionadas à mutações germinativas específicas, divididas pela presença ou não de polipose associada.

  • O CCR com polipose inclui a Polipose Adenomatosa Familiar (PAF) em 1% dos casos, a Polipose associada ao gene MYH em menos de 1% e as síndromes de poliposes hamartomatosas como Peutz-Jeghers e a Polipose Juvenil.
  • As formas não relacionadas à polipose correspondem a 2 a 5% dos casos e se referem ao HNPCC e a Síndrome de Lynch. Todas estas condições apresentam um risco muito significativo de transformação maligna e na maioria das vezes a mutação genética pode ser identificada.

 

Familiar: Aproximadamente 20 a 25% dos casos se relacionam a um componente hereditário não tão bem estabelecido como as formas descritas acima e são denominados “câncer colorretal familiar”. As alterações genéticas são até o momento menos conhecidas que as das formas herdadas e o risco de desenvolvimento de câncer em um indivíduo deste grupo é 1,7 vezes maior que o da população geral quando existe um parente de primeiro com CCR.

 

A carcinogênese pode ser entendida como um desequilíbrio entre o desenvolvimento de mutações e os mecanismos de controle do ciclo celular. As vias mais estabelecidas para o câncer colorretal são a via supressora ou instabilidade cromossômica (CIN), a via de instabilidade de microssatélites (MSI) e a via do fenótipo metilador da ilhas CPG (CIMP). A figura 1 demonstra de forma esquemática a sobreposição das vias de carcinogênese colorretal.

 

Captura de Tela 2016-03-31 às 16.50.44

Figura 1. Representação esquemática e interação entre as diferentes vias de carcinogênese colorretal. 

Referência: Snover DC. Human Pathology 2011;42:1-10.

 

1. CIN – Via Supressora ou Instabilidade Cromossômica.

A via denominada supressora contempla a via adenoma-carcinoma descrita em 1990 por Fearon e Vogelstein e se caracteriza por um acumulo gradual de mutações que levam a ativação de oncogenes (KRAS) e inativação de genes supressores de tumor (DCC, APC, SMAD4 e TP53). CIN se refere a alterações das estruturas cromossômicas com ganhos e perdas parciais ou totais que resultam em variabilidade do cariótipo, aneuploidia e perda da heterozigoze (LOH). Trata-se da via mais bem estudada de carcinogênese colorretal e se relaciona à PAF e aos tumores esporádicos, correspondendo a aproximadamente 70% dos casos de CCR. As lesões precursoras da via supressora (CIN) são os adenomas. Os tumores são mais frequentemente encontrados no cólon distal e são sensíveis ao 5-FU, droga chave no tratamento sistêmico, quando indicado antes ou depois do tratamento cirúrgico.  A figura 2 ilustra de uma forma simplificada os passos principais do desenvolvimento do carcinoma colorretal de acordo com a via CIN.

Captura de Tela 2016-03-31 às 16.53.26

Figura 2. Via adenoma carcinoma (CIN).

Referência: Fearon ER. Annu. Rev. Pathol. Mech. Dis 2011; 6:479-507.

 

2. MSI – Instabilidade de Microssatélites.

A segunda via de carcinogênese colorretal é denominada Instabilidade de Microssatélites ou MSI. Descrita inicialmente em 1993, envolve o acumulo de erros durante a replicação do DNA devido a presença de mutações herdadas ou adquiridas em genes responsáveis pelo seu reparo (MMR). Estes erros se acumulam predominantemente em fragmentos de DNA com padrão de repetições de 1 a 5 nucleotídeos denominados Microssatélites. Os cinco genes que têm particular interesse por sua relação com o câncer hereditário não polipóide (HNPCC/Síndrome de Lynch) e suas respectivas frequências de mutação são: MLH1 (49%), MSH2 (38%), MSH6 (9%), PSM2 (2%) e PMS1 (0,3%). Os tumores colorretais podem ser divididos em MSI alto se dois ou mais genes MMR estiverem mutados, MSI baixo se apenas uma mutação for encontrada ou MSS (estáveis). MSI é encontrado na Síndrome de Lynch (MSI alto) e em aproximadamente 15% dos CCR esporádicos.

Pelo menos dois mecanismos resultam num defeito das proteínas de reparo (MMR). Uma mutação germinativa de um gene MMR (MLH1, MSH2, MSH6 e PMS2) resultando no funcionamento inadequado da proteína de reparo como acontece no HNPCC/Síndrome de Lynch ou um silenciamento do gene MMR por hipermetilação, usualmente MLH1, mais frequentemente observado no câncer esporádico (evento epigenético).

A lesão precursora da via MSI também é o adenoma e velocidade de transformação para o cancer invasivo é mais rápida quando comparada à via CIN e estimada em aproximadamente 5 anos. Os tumores esporádicos relacionados à Instabilidade de Microssatélites são mais frequentemente encontrados em mulheres, localizados no cólon proximal, com padrão mucinoso pouco diferenciado e acentuada infiltração linfocítica. Apesar da resistência ao 5-FU, os tumores MSI altos têm melhor prognóstico, menor probabilidade de metástases à distância e maior sobrevida quando comparados aos tumores MSI estáveis.

 

 3. CIMP – Fenótipo Metilador das Ilhas CPGs.

Historicamente os pólipos do cólon eram classificados em adenomas neoplásicos e pólipos hiperplásicos não neoplásicos. Em 1990, Longacre e Fenoglio-Preiser descreveram o primeiro caso de “serrated adenoma”. Em 1996, Torlakovic e Snover publicaram uma série de casos de polipose hiperplásica sugerindo que os até então benignos pólipos hiperplásicos poderiam se transformar. Outras estudos vieram até que na edição de 2010 a OMS publicou a nova classificação das lesões serrilhadas que foram divididas em pólipos hiperplásicos (PH, 75%), com seus subtipos microvesicular (PHMV), pobre em mucina (PHPM) e células caliciformes (PHCC), pólipo ou adenoma sessil serrilhado (ASS, 15-25%) com ou sem displasia e pólipo ou adenoma serrilhado tradicional (AST, 1%) com ou sem displasia.

A chamada via alternativa de carcinogênese colorretal ou via serrilhada, responsável por aproximadamente 20 a 30% dos casos de CCR, foi descrita há pouco mais de 15 anos e é caracterizada pela hipermetilação das chamadas ilhas CpG (regiões do genoma ricas em CpG ou Citosina – Phosfato – Guanina) nas regiões promotoras de genes supressores de tumor (CIMP) com consequente silenciamento dos genes envolvidos e mutação do oncogene BRAF. CIMP pode ser expresso em alto, baixo ou ausente. O fenótipo de CIMP alto pode ser encontrado em até 25% dos PH, 65% dos ASS e menos de 1% dos adenomas. Assim, a via serrilhada é também conhecida como via CIMP. O tempo de progressão das lesões serrilhadas para o cancer invasivo é controverso e parece ser de aproximadamente 15 anos, podendo se tornar significativamente mais rápido quando a lesão exibe displasia e fenômenos de metilação. As lesões serrilhadas possuem uma íntima relação com o câncer de intervalo. Os tumores desta via se encontram mais frequentemente no cólon proximal e em geral apresentam um prognóstico ruim com exceção dos MSI altos. As características moleculares dos pólipos e do CCR e as outras variações moleculares da via serrilhada são descritas respectivamente na tabela 1 e na figura 3 abaixo.

 

Tabela 1. Características moleculares dos pólipos e do câncer colorretal. 

Referência: Rex et al. Am J Gastroenterol 2012; 107:1315-1329.

Captura de Tela 2016-03-31 às 16.49.55

 

 

Captura de Tela 2016-03-31 às 16.54.36

Figura 3: Via de carcinogênese serrilhada.

Referência: Szylberg L et al. Gastroenterol Res Pract 2015; 2015:573814.

 

Implicações clínicas e considerações finais

  • O CCR é uma doença comum e heterogênea envolvendo diversos aspectos moleculares e manifestações clinicopatológicas.
  • A colonoscopia associada à polipectomia se relaciona à uma redução significativa da incidência e da mortalidade do CCR. O aperfeiçoamento no diagnostico endoscópico, o melhor tratamento e o adequado seguimento dos pacientes portadores de lesões precursoras do CCR deve ser o objetivo do endoscopista nos programas de rastreamento.
  • Recomenda-se a ressecção de todos os adenomas e pólipos serrilhados proximais ao sigmoide além daqueles maiores que 5 mm no cólon distal e no reto.
  • Os avanços na biologia molecular e na classificação genética do CCR são essenciais para o tratamento sistêmico mais personalizado e efetivo dos pacientes com doença metastática.

 

 

Referências Bibliográficas

  • IJspeert JEG, Medema JP, Dekker E. Colorectal Neoplasia Pathways: State of the Art. Gastrointest Endoscopy Clin N AM. 2015; 25: 169-182.
  • Kanthan R, Senger JL, Kanthan SC. Molecular Events in Primary and Metastatic Colorectal Carcinoma: A Review. Patholog Res Int. 2012; 2012:597497.
  • Snover DC. Update on the serrated pathway to colorectal carcinoma. Human Pathology 2011;42:1-10.
  • Bettington M, Walker N, Clouston A, Brown I, Leggett B, Whitehall V. The serrated pathway to colorectal carcinoma: current concepts and challenges. Histopathology 2013; 62: 67-386.
  • Rex DK, Ahnen DJ, Baron JA, Batts KP, Burke CA, Burt RW, Goldblum JR, Guillem JG, Kahi CJ, Kalady MF, O’Brien MJ, Odze RD, Ogino S, Parry S, Snover DC, Torlakovic EE, Wise PE, Young J, Church J. Serrated lesions of the colorectum: review and recommendations from an expert panel. Am J Gastroenterol 2012; 107:1315-1329.
  • Szylberg L, Janiczek M, Popiel A, Marszalek A. Serrated polyps and Their Alternative Pathway to the Colorectal Cancer: A Systematic Review. Gastroenterol Res Pract 2015; 2015:573814.
  • Raskov H, Pommergaard HC, Burcharth J, Rosenberg J. Colorectal carcinogenesis-update and perspectives. World J Gastroenterol. 2014; 48: 18151-18164.

 




Ressecções endoscópicas

O plano terapêutico, a técnica a ser utilizada, os materiais a serem usados e a forma de realização das ressecções endoscópicas estão diretamente ligados ao tipo de lesão a ser ressecada.
 
Definições das lesões do trato gastrointestinal

  • Pólipos (séssil, subpediculado, pediculado)
  • Lesões planas (plano-elevadas, planas, plano-deprimidas)
  • Lesão plana maior que 10 mm de circunferência = Lesão de crescimento lateral (LST)

 
Ver mais em: Classificação de Yamada e Classificação Japonesa das lesões do trato gastrointestinal
 
O primeiro aspecto a ser avaliado antes de uma ressecção é o tamanho da lesão, sendo que quando menores que 5 mm podem ser ressecadas com pinça de biópsia. Lesões de até 7 mm, em casos selecionados, podem ser ressecadas com alça sem corrente de coagulação (“a frio”). Clique aqui para ver mais sobre o assunto
 
Lesões maiores que 7 mm geralmente são tratadas com corrente de coagualação e conforme a característica de cada lesão:
 
Pólipos pediculados
Do ponto de vista terapêutico, os pólipos pediculados são tratados com ressecção com alça diatérmica. Geralmente usa-se corrente mais de coagulação do que de corte, solicitando que o auxiliar feche a alça com calma e algumas vezes deixando esta fechada por um bom tempo para estrangular o pedículo e assim prevenir sangramento pós-polipectomia.
Quanto maior e mais grosso o pedículo maior a chance de sangramento e por isto algumas medidas podem ser realizadas, como a utilização somente de corrente de coagulação, colocação de endoloop previamente, clipagem com endoclipe antes ou depois da polipectomia e até mesmo a injeção de solução de adrenalina no pedículo. Todas estas técnicas tem suas vantagens e desvantagens sendo a decisão tomada conforme cada situação.
A colocação de endoloop às vezes é inviável em pólipo muito grande principalmente pelo fato do laço ser muito maleável o que dificulta a laçada. Nestes casos pode-se optar por clipar o pedículo, antes ou após a polipectomia. Se for optado pela clipagem prévia deve-se ter cuidado para que alça não entre em contato com o clipe e assim transmita corrente podendo causar danos ao tecido normal.  Se a opção for a clipagem após ressecção, o clipe já deve estar montado e rapidamente acessível pra uso caso ocorra um sangramento imediatamente após a ressecção. Uma opção para evitar, ou ao menos diminuir, o sagramento pós-polipectomia é a injeção solução de adrenalina no pedículo, e após a ressecção pode-se ou não realizar a colocação do clipe. Alguns autores argumentam que o efeito da adrenalina na contenção do sangramento é efêmero, podendo resultar em sangramento tardio e contra-indicam o seu uso isolado como método de prevenção de sangramento.
 
Pólipos subpediculados
Nos pólipos subpediculados a base da lesão deve ser avaliada.  Se o componente que forma o “subpediculo” tiver a mesma característica que a lesão, sugere-se a realização de injeção submucosa antes da ressecção. Isto garante que todo o componente adenomatoso ou anormal seja ressecado. Se a base da lesão tiver a mesma caracterísca do cólon normal a polipectomia simples sem injeção na submucosa pode ser realizada.
 
Lesões planas
As lesões planas devem ser ressecadas sempre após a injeção submucosa de alguma solução (mucosectomia), para afastar a lesão da muscular própria do órgão e assim evitar uma perfuração. Como nas lesões planas o risco de perfuração é maior do que o de sangramento, geralmente usa-se mais corrente de corte do que de coagulação. Deve-se sempre que possível tentar a ressecção da peça em monobloco. Lesões até 2 cm podem ser ressecadas em fragmentos (piecemeal). Segundo a classificação de Gotoda, lesões planas maiores que 2 cm não devem ser ressecadas com alça, sendo estes casos reservados para dissecção endoscópica da submucosa (ESD).
 
 

Para a realização de ressecções com sucesso, além do conhecimento teórico e habilidade técnica deve-se possuir e conhecer os instrumentos de trabalho.

 
Eletrocautério

  • Dispositivo que usa alta frequência (300-1000Hz) para não estimular os tecidos neuromusculares do organismo.
  • Voltagem é a força de “empurrar” a corrente. Corrente pode ser contínua ou oscilar.
  • Potência (watts) é o trabalho realizado pela corrente elétrica em um determinado intervalo de tempo. Fixada pelo operador e constante no cautérios tradicionais.
  • Corte puro: alta temperatura em curto espaço de tempo, com corrente contínua, o que leva a explosão celular e “efeito corte”.
  • Coagulação: a corrente oscila, com tempo para o tecido não esquentar tão rapidamente, assim desidrata as células, produz dano tecidual mais profundo e “efeito coagulação”.

 
A passagem da corrente depende:

  • Área de tecido a ser seccionada (maior área = maior voltagem ou maior tempo necessário)
  • Impedância do tecido (maior impedância = maior voltagem ou maior tempo necessário)

 
Eletrocautérios que oscilam sua potência conforme a impedância do tecido são conhecidos como tendo a função endocut:

  • Ajuste é feito da potência máxima do ciclo que oscila, por isto recomenda-se usar o dobro da potência usada nos eletrocautérios de potência fixa
  • Deve-se manter o pedal pisado constantemente durante todo o procedimento para que o aparelho consiga ir ajustando a potência ideal

 
Ver mais em:  Corte ou Coagulação? Que corrente utilizar?
 
Alças de polipectomia

  • Multifilamentar: alça padrão, com tamanho e formatos diferentes para cada caso específico.
  • Monofilamentar: alça de um único filamento rígido que por isto tem mais força pra pressionar a mucosa e realizar ressecções mais profundas. Possui também um corte muito rápido, tipo “navalha”, dessa forma o auxiliar deve fechá-la mais lentamente. Usa-se geralmente apenas corrente de coaugulação tendo em vista que o efeito de corte da-se pela própria alça.

 
Técnicas de ressecção profunda
Usadas em casos específicos onde é necessária a ressecção da mucosa e da submucosa, geralmente em lesões que se originam da mucosa profunda, que são denominadas subepiteliais, porém não submucosas (ex: tumores neuroendócrinos, tumor de células granulares).
As três principais técnicas de ressecção endoscópica profunda são:

 
 
Ressecção underwater

  • Estudos com ecoendoscopia comprovam que após preencher o órgão com água ocorre um afastamento da mucosa em relação a muscular própria. Assim através deste método algumas lesões podem ser ressecadas com segurança sem a necessidade de injeção submucosa.

 

ASSISTA ALGUNS VÍDEOS DE RESSECÇÕES ENDOSCÓPICAS

 
Polipectomia com profilaxia primária com endoloop

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Mucosectomia

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Ressecção em piecemeal e profilaxia secundária com endoclipe

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Ressecção underwater

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Ressecção profunda com alça monofilamentar

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Ressecção profunda com ligadura

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Ressecção profunda com alça monofilamentar underwater

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