Coloproctopatia actínica crônica – visão prática

  1. Antes de mais nada, qual o porquê do uso do termo coloproctopatia ao invés do popular retite?

Devido à fisiopatologia da doença no qual o processo inflamatório é mínimo (sufixo itis = inflamação). O principal mecanismo na doença é a endoarterite obliterante e consequente isquemia. Em resposta à isquemia ocorre uma substituição de vasos normais por vasos tortuosos e dilatados. Além disto, muitos pacientes têm acometimento também do cólon, não sendo a doença restrita ao reto.

  1. Como é feito o diagnóstico?

O diagnóstico é simples. História de radioterapia pélvica mais o achado endoscópico de telangiectasias (foto). Outros achados endoscópicos são: úlceras, estenoses e fístulas.

telangiectasias 1 telangiectasias 4 telangiectasias 5

  1. É preciso biopsiar?

Não. Anamnese e endoscopia são suficientes para o diagnóstico, sendo reservado o estudo anatomopatológico para diagnóstico diferencial entre etiologia actínica e neoplásica em úlceras refratárias. Lembrando que as biópsias devem ser superficiais pelo risco de fístulas; e que o patologista deve estar ciente do antecedente de radioterapia (semelhanças entre displasia e efeito actínico na histologia).

  1. Como classificar a doença?

O sangramento pode ser estratificado de acordo com Quadro 1 e no Quadro 2 está a classificação endoscópica proposta por Brian Saunders. Sendo Grau A com dois pontos, moderada com três e grave com quatro ou cinco pontos. Existe uma correlação entre a gravidade clínica e endoscópica; e entre a classificação endoscópica e o número de sessões necessárias para erradicar as telangiectasias.

  1. Quando tratar? (Ver Quadro 1)

A indicação clássica é a anemia (com ou sem necessidade de transfusões) e pacientes com sangramento persistente (dois ou mais episódios por semana). Pacientes com sangramentos intermitente (um ou menos de um episódio semanal) apesar de controverso podem ser curados com apenas uma sessão de tratamento endoscópico que pode ser realizada ao momento do diagnóstico. Lembrando que o tratamento só está indicado após pelo menos seis meses da radioterapia ( para evitar casos agudos e que podem ter resolução espontânea) e pacientes assintomáticos não devem ser tratados.

  1. Como tratar?

As estratégias terapêuticas para a CAC incluem: farmacoterapia, câmara hiperbárica, formalina, endoscopia e cirurgia

  1. Quais as modalidades de tratamento endoscópico?

– Coagulação com plasma de argônio (CPA)

– Eletrocoagulação bipolar (EB)

– Laser (Nd:YAG e KTP)

– Formalina

– Heater probe

– Ligadura elática

– Crioterapia (CRiO)

– Radiofrequência (RAF)

– Hemospray

Ressaltando que não existem estudos com a escleroterapia e portanto essa modalidade não deve ser utilizada. O laser e o heater probe são técnicas obsoletas. Existem apenas relatos de casos com o uso da ligadura e do hemospray.

  1. Entre essas modalidades qual é a melhor?

Pergunta de difícil resposta pois existem poucos estudos comparativos. E tivemos a felicidade de realizar um destes estudos entre CPA e EB. Não havendo diferença estatística entre o número de sessões e a eficácia entre os dois métodos. Entretanto a incidência de complicações foi estatisticamente significante menor com CPA do que com EB (p = 0.003). O CPA por ser preferível por ser uma técnica segura, efetiva e consagrada na literatura. Estudos futuros, especialmente comparando o CPA com a formalina e com as novas técnicas (CRIO e RAF), irão responder esta pergunta.

  1. Em quais situações você indicaria uma alternativa endoscópica para a CPA?

Em primeiro lugar se não disponível o CPA no serviço, uma outra técnica pode ser utilizada evitando muitas vezes postergar o tratamento do paciente e sobrecarregar os serviços terciários. E nesses casos por estar presente em quase todos os serviços de endoscopia, recomendo o EB. O EB está muito bem indicado também em pacientes com marca-passo e outros dispositivos implantados que sofrem interferência com a corrente monopolar (CPA, CRIO e RFA).

  1. Quais são os ajustes do CPA?

Na literatura, o fluxo descrita é de 0,6 – 2,5 l/min e a potência 25 – 80W. Sugiro 1,0 l/min e 40W. De acordo com o fabricante, o gerador de segunda geração (VIO/APC 2) teve uma melhora na eficácia de 30-50% em relação ao modelo anterior. Além disto, o VIO/APC 2 dispõe do modo “Precise APC” que possui um sistema de controle integrado de fluxo resultando num dano térmico mais superficial e desejável.

  1. Intervalo entre as sessões?

Não há consenso. Proponho quatro semanas.

  1. Técnica: em pontos (“single-shot”) ou listras (“trawl-back”)?

A técnica “single-shot” é preferida, pois alguns autores acreditam que a técnica “trawl-back” está associada a maior risco de desenvolvimento de úlceras e estenoses.

  1. E a polêmica em relação ao preparo e explosões intestinais?

No estudo de Ben-Soussan concluiu que mais que o tipo de preparo, a presença de fezes sobre as lesões constitui o principal risco para explosões. Portanto, independente do tipo de preparo retrógrado ou anterógrado, nunca trate se o cólon estiver sujo. Como muitos dos pacientes com coloproctopatia tem incontinência fecal, que compromete o preparo com enema, o preparo oral é preferivel. Também não tenho preocupação com o uso de manitol (sem relatos de preparos adequados com manitol e explosões com CPA).

  1. Antibioticoprofilaxia é recomendada?

No Guideline da ASGE não há menção sobre a o uso de antibióticos nem para esta condição (coloproctopatia actínica) e nem para este tipo de procedimento. Fizemos um trabalho para avaliar a incidência de bacteremia pós CPA. Em 30 sessões, a bacteremia ocorreu duas vezes. Uma vez foi isolado o S. hominis (provável contaminação) e em outro paciente foram isolados dois microorganismos (Rhodotorula sp. and Streptococcus bovis) Nenhum paciente teve sintomas infecciosos. Assim a administração de antibióticos profiláticos não está indicada.

  1. E como manejar anticoagulantes e antiagregantes nesses pacientes?

No nosso trabalho usuários de AAS necessitaram de mais sessões de CPA para a erradicação das telangiectasias (p = 0.047) O Guideline da ESGE recomenda que AAS e clopidrogrel podem ser continuados em pacientes em pacientes submetidos a CPA. E a ASGE recomenda a suspensão de varfarina três a cinco dias antes da coagulação endoscópica. Mas acredito que sempre deve-se pesar o risco/benefício do uso de drogas que predispõem ao sangramento em pacientes com hemorragia ativa.

  1. Quando considerar o paciente refratário e o que fazer nesses casos?

Se forem necessários mais do que sete sessões fica evidente que o tratamento endoscópico não está sendo eficiente. Tradicionalmente pacientes refratários eram encaminhados para a cirurgia. Entretanto discordo desta conduta pela alta morbimortalidade do tratamento cirúrgico nesta condição. Acho que trocar de modalidade endoscópica (“cross over”) e/ou adicionar a terapia medicamentosa (aconselho vitamina A por via oral e enemas de sucralfato) podem evitar a cirurgia em muitos desses casos.

Quadro 1 – Classificação clínica

Ausência de sangramento 0 ponto
Sangramento intermitente (um ou menos de um episódio semanal) 1 ponto
Sangramento persistente (duas ou mais vezes por semana) 2 pontos
Sangramento diário ou anemia 3 pontos
Sangramento com necessidade de transfusão 4 pontos

Quadro 2 – Classificação endoscópica de Brian P. Saunders

Aspecto Pontuação
Distribuição das telangiectasias
Reto distal (até 10 cm da borda anal) 1 ponto
Todo o reto com ou sem envolvimento do sigmóide

(mais de 10 cm da borda anal)

2 pontos
Superfície colorretal coberta por telangiectasias
Menos de 50% da luz 1 ponto
Mais de 50% da luz 2 pontos
Presença de sangue vivo
Sem sangue vivo 0 ponto
Com sangue vivo 1 ponto

Leitura recomendada:

  1. Lenz L, Tafarel J, Correia L, Bonilha D, Monaghan M, Santos M, et al. The incidence of bacteraemia after argon plasma coagulation in patients with chronic radiation proctocolitis. Colorectal Dis. 2011 Jul;13(7):823-5.
  2. Lenz L, Tafarel J, Correia L, Bonilha D, Santos M, Rodrigues R, et al. Comparative study of bipolar eletrocoagulation versus argon plasma coagulation for rectal bleeding due to chronic radiation coloproctopathy. Endoscopy. 2011 Aug;43(8):697-701.
  3. Lenz L,Rohr R, Nakao F, Libera E, Ferrari A. Chronic radiation proctopathy: A practical review of endoscopic treatment. World J Gastrointest Surg. 2016 Feb 27;8(2):151-60.



Drenagem Biliar Ecoguiada – Breve Revisão da Literatura

A ecoendoscopia intervencionista está cada vez ganhando mais espaço na literatura, e também em nosso meio, como opção para drenagem das vias biliares após falha da CPRE.

Sendo importante para todos os médicos endoscopistas, mesmo aqueles que não realizam ecoendoscopia, terem conhecimento sobre as técnicas e as indicações da drenagem biliar ecoguiada (EUS-BD).

Este post será dividido em tópicos, e terá enfoque principal na revisão das mais recentes evidências sobre a EUS-BD:

1- EUS-BD vs DBTP

Por um bom tempo a drenagem biliar transhepática percutânea (DBTP) constituiu a principal modalidade de resgate para drenagem biliar após falha da CPRE.

Entretanto, ensaio-clínico randomizado, com amostra de 25 pacientes com obstrução biliar maligna irresecável, comparando a EUS-BD com a DBTP, demonstrou taxas semelhantes de sucesso técnico, clínico e de complicações.(1)

Estudo retrospectivo mais recente demonstrou que, apesar de um sucesso técnico maior com a DBTP, a taxa de sucesso clínico foi semelhante entre os dois procedimentos. Sendo que a DBTP esteve associada com maior taxa de eventos adversos, de reintervenção não-programada e consequentemente com maiores custos.(2) Outros estudos também sugeriram que a combinação da CPRE e do EUS no mesmo procedimento parece ser uma estratégia de menor custo, comparada ao encaminhamento parar a drenagem percutânea.(3,4)

Dessa forma, na falha da CPRE para drenagem da via biliar, além da drenagem transparietal percutânea, a drenagem ecoguiada é boa opção. As evidências atuais apontam para eficácias semelhantes, sendo que a EUS-BD parece ser uma técnica com menores complicações.

2 – EUS-BD: extrahepático vs intrahepático

A drenagem biliar ecoendoscópica em pacientes com anatomia preservada, seja pela técnica de rendezvous ou transluminal, pode ser realizada através do acesso intra ou extra-hepático. Metanálise realizada com oito estudos, que incluíram pacientes com estenose biliar distal, comparou a drenagem biliar ecoguiada realizada pelo acesso intra-hepático com o acesso extra-hepático, e evidenciou eficácia semelhante entre ambos os métodos, porém o acesso extra-hepático apresentou menores taxas de complicações.(5)

As principais complicações relacionadas com o acesso intra-hepático são: pneumoperitônio, fístula biliar, dor pós-procedimento e migração da prótese. Sendo explicados pelo fato de que nessa forma de acesso: a agulha percorre a cavidade peritoneal; o estômago e o fígado se movimentam de forma independente durante a respiração; e o menor calibre dos ductos intra-hepáticos pode não acomodar adequadamente a prótese.(6) Também tem sido relatado na literatura menor tempo de procedimento e de internação com drenagem biliar por via extra-hepática.(7)

Dessa forma conclui-se que para a drenagem ecoguiada das vias biliares, seja pela técnica rendezvous ou transluminal, pode-se utilizar o acesso intra ou extra-hepático. As técnicas parecem apresentar eficácias semelhantes, porém com menores taxas de complicações com o acesso extra-hepático.

3 – EUS-BD: Rendezvous vs transluminal

Existem poucos trabalhos comparando as técnicas de drenagem biliar rendezvous guiada por ecoendoscopia (EUS-RV) com a drenagem biliar transluminal guiada por ecoendocopia (EUS-TL). Estudo retrospectivo, com amostra de 35 pacientes com obstrução biliar distal maligna, comparou essas duas técnicas e demonstrou eficácia e segurança semelhantes.(8)

Para muitos endoscopistas, a EUS-RV tem sido a técnica preferida pois evita a criação de uma fístula bilioentérica permanente, bem como evita também a necessidade de dilatação do trajeto fistuloso que é uma etapa do procedimento que pode provocar sangramento, pneumoperitônio e pneumomediastino.

Já as vantagens da EUS-TL são a possibilidade de ser realizada em pacientes com anatomia alterada ou com obstrução gastroduodenal, evitar o risco de perda do fio-guia na troca para o duodenoscópio, menor tempo de execução do procedimento, e diminuição do risco de pancreatite pós-procedimento.

Atualmente há uma tendência por boa parte dos ecoendoscopistas em ser inicialmente tentada a EUS-RV, e no caso de falha, seja por dificuldade de transpor a estenose ou a papila, ser posteriormente realizada a EUS-TL.

4 – EUS-TL: hepaticogastrostomia vs coledocoduodenostomia

Na opção por realização da EUS-TL, deve-se considerar a realização de hepaticogastrostomia ou coledocoduodenostomia.

Metanálise que incluiu 7 estudos, dos quais 6 retrospectivos, com pacientes com estenose biliar distal, comparou a drenagem biliar ecoguiada pelas técnicas de hepaticogastrosotomia vs coledocoduodenostomia, e evidenciou sucesso técnico semelhantes entre as duas modalidades. Entretanto, a análise comparativa favoreceu a coledocoduosdenostomia por ter apresentado menores taxas de complicações.(5)

5 – EUS-TL: prótese plástica vs metálica

Até o momento, não existem artigos que comparem o uso de próteses plásticas e metálicas na drenagem ecoguiada transluminal. Entretanto é consenso entre os ecoendoscopistas que deve-se favorecer o uso de próteses metálicas totalmente cobertas, para que haja uma minimização do risco de migração e formação de fístula.(6)

Para observação de caso clínico com imagens e vídeo ilustrando a drenagem biliar ecoguiada clicar na referência abaixo:

Ribeiro MSI, Franco MC, Maluf-Filho F. An easier option for endoscopic ultrasound-guided biliary drainage: cannulation using two antiparallel guidewires. Endoscopy 2016.

Referências:

  1. Artifon EL, Aparicio D, et al. Biliary Drainage in Patients With Unresectable, Malignant Obstruction Where ERCP Fails. J Clin Gastroenterol. 2012;46(9):768–74.
  2. Khashab MA, Valeshabad AK, et al. A Comparative Evaluation of EUS-Guided Biliary Drainage and Percutaneous Drainage in Patients with Distal Malignant Biliary Obstruction and Failed ERCP. Dig Dis Sci. 2015;60(2):557–65.
  3. Gornals JB, Moreno R, et al. Single-session endosonography and endoscopic retrograde cholangiopancreatography for biliopancreatic diseases is feasible, effective and cost beneficial. Dig Liver Dis. 2013;45(7):578–83.
  4. Fabbri C, Luigiano C, et al. Endoscopic ultrasound-guided treatments: Are we getting evidence based – A systematic review. World J Gastroenterol. 2014;20(26):8424–48.
  5. Khan MA, Akbar A, et al. Endoscopic Ultrasound-Guided Biliary Drainage: A Systematic Review and Meta-Analysis. Dig Dis Sci. 2015;61(3):684–703.
  6. Khashab MA, Levy MJ, et al. EUS-guided biliary drainage. Gastrointest Endosc. 2015;82(6):993–1001.
  7. Dhir V, Bhandari S, et al. Comparison of transhepatic and extrahepatic routes for EUS-guided rendezvous procedure for distal CBD obstruction. United Eur Gastroenterol J. 2013;1(2):103–8.
  8. Khashab MA, Valeshabad AK, et al. EUS-guided biliary drainage by using a standardized approach for malignant biliary obstruction: Rendezvous versus direct transluminal techniques (with videos). Gastrointest Endosc. 2013;78(5):734–41.

 




CPRE em pacientes pediátricos.

 

 

Imagem da radioscopia mostrando fístula biliar pós-colecistectomia, com identificação de extravazamento de contraste na região do hepatocolédoco médio-proximal.

A colangiopacreatografia retrógrada endoscópica – CPRE é um procedimento endoscópico avançado para diagnóstico e tratamento de diversas afecções biliopancreáticas. Apesar de ser realizado com mais frequencia em adultos, ela apresenta indicações em todas as idades. A realização de CPRE na população pediátrica é menos frequente que em adultos, resultando em protocolos e estratégias adaptados. Porém, nos últimos anos, vem crescendo relatos e estudos específicos para a realização desse procedimento em crianças, ajudando a criar um melhor entendimento das indicações e técnicas para esta faixa etária.

Indicações :

Deve-se ter em mente, que mesmo em pediatria, a CPRE possui perfil relativamente alto de eventos adversos (EA). Portanto, sua indicação deve ser criteriosa, devendo-se lançar mão de procedimentos menos invasivos quando apenas for necessário o diagnóstico. As principais indicações de CPRE em crianças são :

Patologias biliares :

  • Coledocolitíase
  • Manejo de estenoses (pós transplante ou colangite esclerosante)
  • Manejo de fístula biliar (pós colecistectomia)
  • Avaliação de cisto de colédoco ou sua obstrução
  • Avaliação pré-operatória de junção pancreatobiliar anômala
  • Investigação de colestase neonatal
  • Investigação de patologias biliares onde exames menos invasivos não foram conclusivos

Patologias pancreáticas:

  • Pancreatite crônica (melhora da drenagem)
  • Pâncreas divisum
  • Investigação de pancreatite recorrente
  • Manejo de fistula pancreática (pós trauma)
  • Manejo de pseudocisto pancreático
  • Investigação de patologias pancreáticas onde exames menos invasivos não foram conclusivos

 

Alguns estudos demonstram que houve diminuição no número de exames diagnósticos nos últimos 15 anos, porém uma indicação disgnóstica que ainda permanece, e que muitas vezes evita lapatomomias exploradoras é em pacientes neonatais com suspeita de atresia biliar.

Considerações técnicas :

  • Ambiente :

Na maioria das vezes a CPRE em paciente pediátricos é realizada por endoscopistas treinados e com experiência em adultos, sendo a única modificação o paciente.  Em grandes centros de referência pediátricos há endoscopistas habituados em CPRE infantil, onde realizam o procedimento em ambiente preparado para receber este tipo de paciente com equipe treinada para tal.

  • Sedação

Não há consenso sobre a melhor técnica para sedação, já que há estudos mostrando a segurança tanto da sedação feita por endoscopista quanto a sedação feita por anestesista ou mesmo quando esses pacientes são submetidos a anestesia geral.  Alguns trabalhos demonstram uma taxa aumentada de conversão de sedação para anestesia geral, o que pode dificultar a realização da CPRE.

Uma particularidade da população pediátrica é a fragilidade da traquéia, especialmente em paciente com baixo peso (10 a 15 kg), onde a passagem de duodenoscópios standard pode causar sua compressão gerando uma depressão respiratória de difícil controle.

  • Equipamentos específicos

Provavelmente o tópico de maior dúvida.  No artigo utilizado como referência (1), os autores relatam que equipamentos pediátricos são raramente necessários, mesmo em centros de grande volume de exames.  Descrevem que em termos gerais,  duodenoscópios pediátricos (com cerca de 7,5 a 8,6 mm de diâmetro) devem ser a escolha para pacientes com menos de 10 kg, e em crianças maiores o duodenoscópio padrão deve ser utilizado, apesar de não haver consenso na faixa de peso de 10 a 15kg.  A utilização de aparelhos standards na maioria dos pacientes acima de 10 kgs, leva em conta o diâmetro do canal de trabalho dos mesmos, os quais permitem a passagem de próteses maiores que 5 Fr e materiais de triplo lúmen. Ao utilizar duodenoscópios standard em crianças, deve-se ter cuidado redobrado na passagem do aparelho, principalmente no esfíncter superior do esôfago e no piloro.

  • Eventos adversos

Devido a frequência relativamente baixa de eventos adversos em CPRE na população pediátrica, e principalmente poucos estudos de grande impacto na literatura sobre esse tema, é difícil estabelecer fatores de risco ou estratégias para diminuir os EA.

Em trabalho retrospectivo (2), com idade média de 15 anos (±5), foram analisados 429 procedimentos, onde o perfil de EA foi : Pancreatite (6,3 %, sendo a maioria leve ou moderada), dor abdominal (sem perfuração ou pancreatite – 5,6%), colangite (2,5%), febre (sem colangite ou pancreatite – 1,6%) e sangramento (1,4%). Não houve casos de perfuração.

A pancreatite segue como o EA mais comum nas CPREs também em crianças. Os fatores de risco aparentemente são os mesmos dos adultos (manipulação ou injeção no ducto pancreático, canulação difícil, dilatação, precut ….) .  Infelizmente, não se dispõem de dados mostrando diminuição da incidência de pancreatite com uso de stents pancreáticos (com alguns trabalhos demonstrando maior índice de EA) ou AINES via retal, como observado em adultos.

Sangramentos podem ocorrer, principalmente após papilotomia, sendo que o tratamento segue  as mesmas indicações e técnicas de pacientes adultos. O mesmo para perfurações,  devendo-se apenas atentar para o tipo de aparelho escolhido (como discutido acima ).

Por fim, é notório o maior uso de CPRE em pacientes pediátricos, assim como novas tecnologias devem se juntar a ela, como por exemplo a ultrassonografia endoscópica. Assim, estudos voltados para este grupo de pacientes são necessários para protocolos e consensos possam ser estabelecidos.

Você realiza CPRE em crianças ? Divida conosco sua experiência, acessando e participando do fórum de discussões .

Bibliografia :

 

Veja também :

CPRE em Pacientes Cirróticos 

CPRE em pacientes com gastrectomia a Billroth II prévia: 30 anos de experiência

CPRE em pacientes com gastrectomia a Billroth II

 




Como realizar tatuagem endoscópica

 

A localização intraoperatória de lesões detectadas por métodos endoscópicos é sabidamente imprecisa quando se baseia somente em marcos anatômicos com até 14% dos tumores cólon, por exemplo, sendo identificados cirurgicamente em sítio diverso ao descrito na colonoscopia. Particularmente, a abordagem laparoscópica dificulta a identificação de lesões menores que poderiam ser palpadas em técnicas cirúrgicas abertas, levando em último caso, a não ressecção do segmento apropriado.

Uma outra situação que demanda adequada determinação do sítio de lesão, é o segmento endoscópico pós ressecção de lesões. Após a remoção, por exemplo, de uma lesão de cólon em mais de uma fragmento (“piecemeal”), para se assegurar da completa ressecção em exames de controle, se torna essencial saber a localização exata da lesão retirada.

Portanto, com intuito principal de localizar pré-operatoriamente uma lesão do trato gastrointestinal, ou mesmo definir uma área a ser acompanhada endoscopicamente, algumas técnicas foram desenvolvidas. Entre elas, a tatuagem endoscópica é a mais comumente utilizada e mais facilmente reprodutível e será detalhada no texto. Outras técnicas disponíveis podem ser citadas como:

  • Medida de inserção: consiste na definição de quantos centímetros foram introduzidos do aparelho em tal órgão com base em algum ponto de referência (ex: arcada dentária superior, borda anal) com a finalidade de localizar melhor uma lesão. Pode ser utilizada em lesões de esôfago e de reto mas se mostra inadequada em lesões de outros órgãos pela formação de alças e imprecisão na medida.
  • Referências anatômicas: pode ser útil em algumas situações específicas, como lesões de cárdia, ceco, válvula ileocecal. Em outros segmentos, principalmente quando consideramos o cólon, a determinação de lesões acaba apresentando-se bastante errática.
  • Marcação com clipes metálicos: a aplicação de clipes metálicos na mucosa de qualquer localização do trato pode direcionar a localização intraoperatória com uso de radiografia e ultrassonografia. Uma grande desvantagem dessa técnica, é a imprecisão em relação ao período de fixação do clipe a mucosa, tendo o mesmo uma média de 10 dias, mas podendo variar de horas a anos. Caso ocorra uma queda precoce do clipe, o mesmo pode migrar para uma outra localização, causando transtorno da determinação do sítio de lesão.
  • Localização intraoperatória: a utilização de endoscopia ou colonoscopia intraoperatória é uma boa forma de determinar o sítio da lesão, contudo a utilização de ar corrente pode levar a insuflação exagerada dos órgãos do trato gastrointestinal, levando a dificuldade técnica cirúrgica.

 

TATUAGEM ENDOSCÓPICA

Dentre todos os métodos, a tatuagem endoscópica se demonstra claramente como a principal técnica de marcação endoscópica de lesões. Cita-se como vantagens principais a facilidade de execução e a produção de uma marca que habitualmente é acessível ao cirurgião tanto em procedimentos laparoscópicos, quanto em técnicas cirúrgicas abertas. Para a realização da mesma, devem ser utilizados:

  • Solução corante

Múltiplos corantes podem ser utilizados em endoscopia, contudo, em sua maioria, possuem altas taxas de absorção. Azul de metileno e índigo cármin, por exemplo, costumam ser absorvidas em até 24 h, não deixando marcas residuais. Dentre os corantes com maior durabilidade cita-se a tinta da India e a indocianina verde, sendo a tinta da India a mais comumente utilizada. A tinta da India consiste de uma solução de partículas de carbono e pode permanecer no tecido corado por tempo estimado de até 10 anos, permitindo a visualização de tumores marcados endoscopicamente em até 97% dos casos. Usualmente utilizada em soluções 1:50 – 1:100.

  • Cateter injetor

Produto tradicionalmente disponível para a injeção de outras soluções como de adrenalina ou ethamolin. Introduzido pelo canal de trabalho do aparelho, tem calibre ideal entre 23 – 25 G, com ponta de 3 – 5 mm.

 

TÉCNICA DE TATUAGEM ENDOSCÓPICA

Após localização da área a ser tatuada, a agulha do cateter injetor é exposta e penetra a mucosa de forma angulada, de modo que a aplicação do conteúdo injetado acesse a submucosa. Quando da penetração de forma perpendicular, há maior chance da agulha atravessar completamente a parede do órgão e dispensar a solução injetada no peritônio.

Em relação ao modo de injeção, duas variações técnicas principais são propostas:

  • Injeção direta

A tinta da índia é injetada diretamente no tecido em alíquotas de 0,5 – 1 ml

  • Teste com solução salina

A técnica de teste com solução salina consiste da formação de uma bolha submucosa com 1 – 3 ml de solução salina previamente a injeção da tinta da índia, evitando assim, a penetração transmural da tinta. Após a injeção de cerca de 1 ml da tinta, 2 ml de solução salina é usada para dispensar o resíduo de tinta possivelmente retido no cateter. Quando comparada a técnica tradicional, o teste com solução salina parece ser mais efetiva, permitindo maior número de identificações intraoperatórias de lesões.

 

Cateter posicionado injetando tinta da índia

Cateter posicionado injetando tinta da índia

 

ONDE TATUAR

A realização da tatuagem, principalmente quando de fins pré-operatório, como comentado anteriormente, deve ser realizada em locais de difícil identificação cirúrgica. Lesões em válvula ileocecal, ceco, cólon ascendente proximal e em reto, de modo geral, não necessitam ser tatuadas.

Diversas são as técnicas propostas na literatura em relação ao número de tatuagens e sobre a marcação proximal, distal ou ambas em relação a lesão, principalmente no que se refere ao cólon. Como princípios essenciais utilizados na decisão da melhor forma de tatuar é importante salientar:

  • Quanto mais circunferencial for a marcação, maior a chance de que se evite que a tatuagem se localize exclusivamente na borda mesentérica do órgão, o que portanto poderia levar a um difícil acesso cirúrgico.
  • É essencial que o ponto de injeção se localize 2-3 cm distante a lesão para uma melhor definição de suas margens e evitando que a tatuagem junto ou abaixo da lesão provoque uma reação fibrótica, dificultando por exemplo, uma adequada remoção endoscópica posterior.
  • Caso seja decidida pela tatuagem exclusivamente proximal ou distal ao sítio de lesão, é fundamental que isso fique bem claro na comunicação entre o endoscopista e equipe cirúrgica, evitando ressecções de segmentos inadequados.

 

Como sugerimos:

  • Optar pela técnica com teste de solução salina e formação de bolha submucosa anterior a injeção da tinta
  • Realizar a tatuagem em 2 – 3 pontos, atentando-se para a injeção de forma contra-lateral ou a cada 1/3 quando de tatuagens no cólon
  • Tatuar cerca de 2 – 3 cm proximalmente e distalmente a lesão. Quando houver perspectiva de ressecção endoscópica, uma distância de até 5 cm da lesão deve ser respeitada.
  • Evitar tatuagens muito próximas ou logo abaixo da lesão

 

copia de tatuagem

Tatuagem proximal e distal ao sítio de lesão

Tatuagem proximal e distal ao sítio de lesão

 

SEGURANÇA DA TÉCNICA

Raras são as complicações descritas com a tatuagem endoscópica pela técnica de teste com solução salina. Entre as complicações descritas, principalmente com uso da técnica de injeção direta, cita-se:

  • Formação de úlcera no sítio de injeção
  • Abscessos
  • Perfurações
  • Necrose perivisceral e formação de pseudotumor inflamatório

 

É possível evitar boa parte das potenciais complicações utilizando-se sempre de tinta da índia estéril, realizando injeções em pequenas alíquotas e evitando injeções profundas.

 

Veja também:  Vídeo sobre tatuagem endoscópica

 

Ressecções endoscópicas

 

Referências:

Pohl, J. Endoscopic Tattooing.Video Journal and Encyclopedia of GI Endoscopy , Volume 1 , Issue 2 , 355 – 356

ASGE Technology Committee, Kethu SR, Banerjee S, Desilets D, Diehl DL, Farraye FA, Kaul V, Kwon RS, Mamula P, Pedrosa MC, Rodriguez SA, Wong Kee Song LM, Tierney WM. Gastrointest Endosc. 2010 Oct;72(4):681-5.

Fu KI, Fujii T, Kato S, Sano Y, Koba I, Mera K, Saito H, Yoshino T, Sugito M, Yoshida S. A new endoscopic tattooing technique for identifying the location of colonic lesions during laparoscopic surgery: a comparison with the conventional technique. Endoscopy. 2001;33:687–691




Conceitos em Carcinogênese Colorretal

 

O câncer colorretal (CCR) é o quarto tumor mais frequente e a segunda causa de morte por câncer nos EUA. Estima-se para o ano de 2016 mais de 140 mil novos casos de câncer de cólon e reto nos EUA com aproximadamente 50 mil mortes, correspondendo a aproximadamente 9% das causas de morte por câncer. No Brasil, segundo os dados do INCA, estima-se mais de 34 mil novos casos de CCR para 2016. Apesar dos elevados números a incidência e a mortalidade nos pacientes acima de 50 anos vem diminuindo desde a década de 90 devido aos programas de rastreamento e melhora da assistência oncológica clínica e cirúrgica.

Entretanto, o diagnóstico de CCR nos pacientes abaixo de 50 anos tem aumentado por fatores ainda não esclarecidos. Segundo a OMS, estima-se que nos pacientes abaixo de 34 anos a incidência deve aumentar em até 125% até 2030.

O câncer colorretal é uma doença heterogênea no que se refere ao desenvolvimento e ao comportamento biológico e causada pela interação entre fatores genéticos herdados ou não e ambientais. A doença pode se apresentar de forma esporádica, herdada ou familiar.

 

Forma esporádica: a apresentação esporádica, sem história familiar, corresponde a aproximadamente 70% dos casos. A idade acima de 50 anos é o fator de risco mais importante além da dieta e de outros fatores ambientais.

Herdada: uma pequena proporção dos casos se deve às formas herdadas, relacionadas à mutações germinativas específicas, divididas pela presença ou não de polipose associada.

  • O CCR com polipose inclui a Polipose Adenomatosa Familiar (PAF) em 1% dos casos, a Polipose associada ao gene MYH em menos de 1% e as síndromes de poliposes hamartomatosas como Peutz-Jeghers e a Polipose Juvenil.
  • As formas não relacionadas à polipose correspondem a 2 a 5% dos casos e se referem ao HNPCC e a Síndrome de Lynch. Todas estas condições apresentam um risco muito significativo de transformação maligna e na maioria das vezes a mutação genética pode ser identificada.

 

Familiar: Aproximadamente 20 a 25% dos casos se relacionam a um componente hereditário não tão bem estabelecido como as formas descritas acima e são denominados “câncer colorretal familiar”. As alterações genéticas são até o momento menos conhecidas que as das formas herdadas e o risco de desenvolvimento de câncer em um indivíduo deste grupo é 1,7 vezes maior que o da população geral quando existe um parente de primeiro com CCR.

 

A carcinogênese pode ser entendida como um desequilíbrio entre o desenvolvimento de mutações e os mecanismos de controle do ciclo celular. As vias mais estabelecidas para o câncer colorretal são a via supressora ou instabilidade cromossômica (CIN), a via de instabilidade de microssatélites (MSI) e a via do fenótipo metilador da ilhas CPG (CIMP). A figura 1 demonstra de forma esquemática a sobreposição das vias de carcinogênese colorretal.

 

Captura de Tela 2016-03-31 às 16.50.44

Figura 1. Representação esquemática e interação entre as diferentes vias de carcinogênese colorretal. 

Referência: Snover DC. Human Pathology 2011;42:1-10.

 

1. CIN – Via Supressora ou Instabilidade Cromossômica.

A via denominada supressora contempla a via adenoma-carcinoma descrita em 1990 por Fearon e Vogelstein e se caracteriza por um acumulo gradual de mutações que levam a ativação de oncogenes (KRAS) e inativação de genes supressores de tumor (DCC, APC, SMAD4 e TP53). CIN se refere a alterações das estruturas cromossômicas com ganhos e perdas parciais ou totais que resultam em variabilidade do cariótipo, aneuploidia e perda da heterozigoze (LOH). Trata-se da via mais bem estudada de carcinogênese colorretal e se relaciona à PAF e aos tumores esporádicos, correspondendo a aproximadamente 70% dos casos de CCR. As lesões precursoras da via supressora (CIN) são os adenomas. Os tumores são mais frequentemente encontrados no cólon distal e são sensíveis ao 5-FU, droga chave no tratamento sistêmico, quando indicado antes ou depois do tratamento cirúrgico.  A figura 2 ilustra de uma forma simplificada os passos principais do desenvolvimento do carcinoma colorretal de acordo com a via CIN.

Captura de Tela 2016-03-31 às 16.53.26

Figura 2. Via adenoma carcinoma (CIN).

Referência: Fearon ER. Annu. Rev. Pathol. Mech. Dis 2011; 6:479-507.

 

2. MSI – Instabilidade de Microssatélites.

A segunda via de carcinogênese colorretal é denominada Instabilidade de Microssatélites ou MSI. Descrita inicialmente em 1993, envolve o acumulo de erros durante a replicação do DNA devido a presença de mutações herdadas ou adquiridas em genes responsáveis pelo seu reparo (MMR). Estes erros se acumulam predominantemente em fragmentos de DNA com padrão de repetições de 1 a 5 nucleotídeos denominados Microssatélites. Os cinco genes que têm particular interesse por sua relação com o câncer hereditário não polipóide (HNPCC/Síndrome de Lynch) e suas respectivas frequências de mutação são: MLH1 (49%), MSH2 (38%), MSH6 (9%), PSM2 (2%) e PMS1 (0,3%). Os tumores colorretais podem ser divididos em MSI alto se dois ou mais genes MMR estiverem mutados, MSI baixo se apenas uma mutação for encontrada ou MSS (estáveis). MSI é encontrado na Síndrome de Lynch (MSI alto) e em aproximadamente 15% dos CCR esporádicos.

Pelo menos dois mecanismos resultam num defeito das proteínas de reparo (MMR). Uma mutação germinativa de um gene MMR (MLH1, MSH2, MSH6 e PMS2) resultando no funcionamento inadequado da proteína de reparo como acontece no HNPCC/Síndrome de Lynch ou um silenciamento do gene MMR por hipermetilação, usualmente MLH1, mais frequentemente observado no câncer esporádico (evento epigenético).

A lesão precursora da via MSI também é o adenoma e velocidade de transformação para o cancer invasivo é mais rápida quando comparada à via CIN e estimada em aproximadamente 5 anos. Os tumores esporádicos relacionados à Instabilidade de Microssatélites são mais frequentemente encontrados em mulheres, localizados no cólon proximal, com padrão mucinoso pouco diferenciado e acentuada infiltração linfocítica. Apesar da resistência ao 5-FU, os tumores MSI altos têm melhor prognóstico, menor probabilidade de metástases à distância e maior sobrevida quando comparados aos tumores MSI estáveis.

 

 3. CIMP – Fenótipo Metilador das Ilhas CPGs.

Historicamente os pólipos do cólon eram classificados em adenomas neoplásicos e pólipos hiperplásicos não neoplásicos. Em 1990, Longacre e Fenoglio-Preiser descreveram o primeiro caso de “serrated adenoma”. Em 1996, Torlakovic e Snover publicaram uma série de casos de polipose hiperplásica sugerindo que os até então benignos pólipos hiperplásicos poderiam se transformar. Outras estudos vieram até que na edição de 2010 a OMS publicou a nova classificação das lesões serrilhadas que foram divididas em pólipos hiperplásicos (PH, 75%), com seus subtipos microvesicular (PHMV), pobre em mucina (PHPM) e células caliciformes (PHCC), pólipo ou adenoma sessil serrilhado (ASS, 15-25%) com ou sem displasia e pólipo ou adenoma serrilhado tradicional (AST, 1%) com ou sem displasia.

A chamada via alternativa de carcinogênese colorretal ou via serrilhada, responsável por aproximadamente 20 a 30% dos casos de CCR, foi descrita há pouco mais de 15 anos e é caracterizada pela hipermetilação das chamadas ilhas CpG (regiões do genoma ricas em CpG ou Citosina – Phosfato – Guanina) nas regiões promotoras de genes supressores de tumor (CIMP) com consequente silenciamento dos genes envolvidos e mutação do oncogene BRAF. CIMP pode ser expresso em alto, baixo ou ausente. O fenótipo de CIMP alto pode ser encontrado em até 25% dos PH, 65% dos ASS e menos de 1% dos adenomas. Assim, a via serrilhada é também conhecida como via CIMP. O tempo de progressão das lesões serrilhadas para o cancer invasivo é controverso e parece ser de aproximadamente 15 anos, podendo se tornar significativamente mais rápido quando a lesão exibe displasia e fenômenos de metilação. As lesões serrilhadas possuem uma íntima relação com o câncer de intervalo. Os tumores desta via se encontram mais frequentemente no cólon proximal e em geral apresentam um prognóstico ruim com exceção dos MSI altos. As características moleculares dos pólipos e do CCR e as outras variações moleculares da via serrilhada são descritas respectivamente na tabela 1 e na figura 3 abaixo.

 

Tabela 1. Características moleculares dos pólipos e do câncer colorretal. 

Referência: Rex et al. Am J Gastroenterol 2012; 107:1315-1329.

Captura de Tela 2016-03-31 às 16.49.55

 

 

Captura de Tela 2016-03-31 às 16.54.36

Figura 3: Via de carcinogênese serrilhada.

Referência: Szylberg L et al. Gastroenterol Res Pract 2015; 2015:573814.

 

Implicações clínicas e considerações finais

  • O CCR é uma doença comum e heterogênea envolvendo diversos aspectos moleculares e manifestações clinicopatológicas.
  • A colonoscopia associada à polipectomia se relaciona à uma redução significativa da incidência e da mortalidade do CCR. O aperfeiçoamento no diagnostico endoscópico, o melhor tratamento e o adequado seguimento dos pacientes portadores de lesões precursoras do CCR deve ser o objetivo do endoscopista nos programas de rastreamento.
  • Recomenda-se a ressecção de todos os adenomas e pólipos serrilhados proximais ao sigmoide além daqueles maiores que 5 mm no cólon distal e no reto.
  • Os avanços na biologia molecular e na classificação genética do CCR são essenciais para o tratamento sistêmico mais personalizado e efetivo dos pacientes com doença metastática.

 

 

Referências Bibliográficas

  • IJspeert JEG, Medema JP, Dekker E. Colorectal Neoplasia Pathways: State of the Art. Gastrointest Endoscopy Clin N AM. 2015; 25: 169-182.
  • Kanthan R, Senger JL, Kanthan SC. Molecular Events in Primary and Metastatic Colorectal Carcinoma: A Review. Patholog Res Int. 2012; 2012:597497.
  • Snover DC. Update on the serrated pathway to colorectal carcinoma. Human Pathology 2011;42:1-10.
  • Bettington M, Walker N, Clouston A, Brown I, Leggett B, Whitehall V. The serrated pathway to colorectal carcinoma: current concepts and challenges. Histopathology 2013; 62: 67-386.
  • Rex DK, Ahnen DJ, Baron JA, Batts KP, Burke CA, Burt RW, Goldblum JR, Guillem JG, Kahi CJ, Kalady MF, O’Brien MJ, Odze RD, Ogino S, Parry S, Snover DC, Torlakovic EE, Wise PE, Young J, Church J. Serrated lesions of the colorectum: review and recommendations from an expert panel. Am J Gastroenterol 2012; 107:1315-1329.
  • Szylberg L, Janiczek M, Popiel A, Marszalek A. Serrated polyps and Their Alternative Pathway to the Colorectal Cancer: A Systematic Review. Gastroenterol Res Pract 2015; 2015:573814.
  • Raskov H, Pommergaard HC, Burcharth J, Rosenberg J. Colorectal carcinogenesis-update and perspectives. World J Gastroenterol. 2014; 48: 18151-18164.

 




Ressecções endoscópicas

O plano terapêutico, a técnica a ser utilizada, os materiais a serem usados e a forma de realização das ressecções endoscópicas estão diretamente ligados ao tipo de lesão a ser ressecada.
 
Definições das lesões do trato gastrointestinal

  • Pólipos (séssil, subpediculado, pediculado)
  • Lesões planas (plano-elevadas, planas, plano-deprimidas)
  • Lesão plana maior que 10 mm de circunferência = Lesão de crescimento lateral (LST)

 
Ver mais em: Classificação de Yamada e Classificação Japonesa das lesões do trato gastrointestinal
 
O primeiro aspecto a ser avaliado antes de uma ressecção é o tamanho da lesão, sendo que quando menores que 5 mm podem ser ressecadas com pinça de biópsia. Lesões de até 7 mm, em casos selecionados, podem ser ressecadas com alça sem corrente de coagulação (“a frio”). Clique aqui para ver mais sobre o assunto
 
Lesões maiores que 7 mm geralmente são tratadas com corrente de coagualação e conforme a característica de cada lesão:
 
Pólipos pediculados
Do ponto de vista terapêutico, os pólipos pediculados são tratados com ressecção com alça diatérmica. Geralmente usa-se corrente mais de coagulação do que de corte, solicitando que o auxiliar feche a alça com calma e algumas vezes deixando esta fechada por um bom tempo para estrangular o pedículo e assim prevenir sangramento pós-polipectomia.
Quanto maior e mais grosso o pedículo maior a chance de sangramento e por isto algumas medidas podem ser realizadas, como a utilização somente de corrente de coagulação, colocação de endoloop previamente, clipagem com endoclipe antes ou depois da polipectomia e até mesmo a injeção de solução de adrenalina no pedículo. Todas estas técnicas tem suas vantagens e desvantagens sendo a decisão tomada conforme cada situação.
A colocação de endoloop às vezes é inviável em pólipo muito grande principalmente pelo fato do laço ser muito maleável o que dificulta a laçada. Nestes casos pode-se optar por clipar o pedículo, antes ou após a polipectomia. Se for optado pela clipagem prévia deve-se ter cuidado para que alça não entre em contato com o clipe e assim transmita corrente podendo causar danos ao tecido normal.  Se a opção for a clipagem após ressecção, o clipe já deve estar montado e rapidamente acessível pra uso caso ocorra um sangramento imediatamente após a ressecção. Uma opção para evitar, ou ao menos diminuir, o sagramento pós-polipectomia é a injeção solução de adrenalina no pedículo, e após a ressecção pode-se ou não realizar a colocação do clipe. Alguns autores argumentam que o efeito da adrenalina na contenção do sangramento é efêmero, podendo resultar em sangramento tardio e contra-indicam o seu uso isolado como método de prevenção de sangramento.
 
Pólipos subpediculados
Nos pólipos subpediculados a base da lesão deve ser avaliada.  Se o componente que forma o “subpediculo” tiver a mesma característica que a lesão, sugere-se a realização de injeção submucosa antes da ressecção. Isto garante que todo o componente adenomatoso ou anormal seja ressecado. Se a base da lesão tiver a mesma caracterísca do cólon normal a polipectomia simples sem injeção na submucosa pode ser realizada.
 
Lesões planas
As lesões planas devem ser ressecadas sempre após a injeção submucosa de alguma solução (mucosectomia), para afastar a lesão da muscular própria do órgão e assim evitar uma perfuração. Como nas lesões planas o risco de perfuração é maior do que o de sangramento, geralmente usa-se mais corrente de corte do que de coagulação. Deve-se sempre que possível tentar a ressecção da peça em monobloco. Lesões até 2 cm podem ser ressecadas em fragmentos (piecemeal). Segundo a classificação de Gotoda, lesões planas maiores que 2 cm não devem ser ressecadas com alça, sendo estes casos reservados para dissecção endoscópica da submucosa (ESD).
 
 

Para a realização de ressecções com sucesso, além do conhecimento teórico e habilidade técnica deve-se possuir e conhecer os instrumentos de trabalho.

 
Eletrocautério

  • Dispositivo que usa alta frequência (300-1000Hz) para não estimular os tecidos neuromusculares do organismo.
  • Voltagem é a força de “empurrar” a corrente. Corrente pode ser contínua ou oscilar.
  • Potência (watts) é o trabalho realizado pela corrente elétrica em um determinado intervalo de tempo. Fixada pelo operador e constante no cautérios tradicionais.
  • Corte puro: alta temperatura em curto espaço de tempo, com corrente contínua, o que leva a explosão celular e “efeito corte”.
  • Coagulação: a corrente oscila, com tempo para o tecido não esquentar tão rapidamente, assim desidrata as células, produz dano tecidual mais profundo e “efeito coagulação”.

 
A passagem da corrente depende:

  • Área de tecido a ser seccionada (maior área = maior voltagem ou maior tempo necessário)
  • Impedância do tecido (maior impedância = maior voltagem ou maior tempo necessário)

 
Eletrocautérios que oscilam sua potência conforme a impedância do tecido são conhecidos como tendo a função endocut:

  • Ajuste é feito da potência máxima do ciclo que oscila, por isto recomenda-se usar o dobro da potência usada nos eletrocautérios de potência fixa
  • Deve-se manter o pedal pisado constantemente durante todo o procedimento para que o aparelho consiga ir ajustando a potência ideal

 
Ver mais em:  Corte ou Coagulação? Que corrente utilizar?
 
Alças de polipectomia

  • Multifilamentar: alça padrão, com tamanho e formatos diferentes para cada caso específico.
  • Monofilamentar: alça de um único filamento rígido que por isto tem mais força pra pressionar a mucosa e realizar ressecções mais profundas. Possui também um corte muito rápido, tipo “navalha”, dessa forma o auxiliar deve fechá-la mais lentamente. Usa-se geralmente apenas corrente de coaugulação tendo em vista que o efeito de corte da-se pela própria alça.

 
Técnicas de ressecção profunda
Usadas em casos específicos onde é necessária a ressecção da mucosa e da submucosa, geralmente em lesões que se originam da mucosa profunda, que são denominadas subepiteliais, porém não submucosas (ex: tumores neuroendócrinos, tumor de células granulares).
As três principais técnicas de ressecção endoscópica profunda são:

 
 
Ressecção underwater

  • Estudos com ecoendoscopia comprovam que após preencher o órgão com água ocorre um afastamento da mucosa em relação a muscular própria. Assim através deste método algumas lesões podem ser ressecadas com segurança sem a necessidade de injeção submucosa.

 

ASSISTA ALGUNS VÍDEOS DE RESSECÇÕES ENDOSCÓPICAS

 
Polipectomia com profilaxia primária com endoloop

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Mucosectomia

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Ressecção em piecemeal e profilaxia secundária com endoclipe

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Ressecção underwater

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Ressecção profunda com alça monofilamentar

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Ressecção profunda com ligadura

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Ressecção profunda com alça monofilamentar underwater

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“BURIED BUMPER SYNDROME” : Diagnóstico e manejo.

INTRODUÇÃO

A buried bumper syndrome (BBS) é uma complicação decorrente da gastrostomia endoscópica percutânea, e consiste no crescimento de mucosa gástrica sobre o anteparo interno da gastrostomia com alojamento do mesmo em qualquer local no trajeto formado pela sonda, desde as camadas da parede gástrica até as da parede abdominal. Com incidência variando de  0,9 a > 8,8%, é tipicamente tardia (após 3 a 6 meses), mas também foram descritos casos precoces, após 15 a 30 dias da gastrostomia. (1,2)

BBS

Clinicamente se caracteriza pela progressiva oclusão do orifício interno do anteparo pela mucosa gástrica, com consequente dificuldade/parada completa na infusão da dieta, dor abdominal durante a infusão, sinais flogísticos no orifício da pele e dificuldade na mobilização manual do anteparo na tentativa de empurrá-lo para a cavidade gástrica ou realizar movimento rotacional.

Tração excessiva é o principal fator causal, mas outros também devem ser considerados, como ganho de peso em resposta à alimentação enteral, tosse severa, etc. Na presença dos sinais e sintomas sugestivos, a endoscopia deve ser realizada para diagnóstico e planejamento terapêutico.

Na maioria dos casos o anteparo interno sepultado é retirado através de uma incisão externa no local da entrada da sonda na pele sob anestesia local ou laparotomia. Essa abordagem pode resultar em dor local, infecção de ferida ou fístula gastrocutânea.

Tendo em vista um tratamento menos invasivo nestes pacientes, foram propostas uma série de alternativas endoscópicas.

TÉCNICAS 

As técnicas já descritas consistem em:

  • Passagem de fio guia através da sonda até o orifício do anteparo interno servindo de guia para dilatadores de Savary-Gilliard introduzidos pelo tubo já previamente cortado próximo à pele para aplicar pressão externa no anteparo e empurrá-lo pra a câmara gástrica (3,4).
  • Incisões radiais da mucosa gástrica com needle-knife para exposição do anteparo quando este está pouco visível (utilizando-se fio guia, azul de metileno, pinça de biópsia, etc para identificação do orifício interno como referência), e posterior apreensão do mesmo. Se necessário o orifício feito através das incisões pode ser ampliado com dilatação por balão (5,6,10).

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  • “Push-pull T technique“ – uma alça de polipectomia é passada através do orifício interno do anteparo (com ou sem ajuda de um fio guia) e se exterioriza pelo tubo na parede abdominal previamente cortado. A alça captura um pedaço do tubo removido e é realizada uma tração do conjunto para dentro do estômago e ele é retirado pela boca (7)

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  • Uso de novo kit de gastrostomia para retirada do anteparo e troca no mesmo tempo. Realiza-se corte da sonda de gastrostomia a 3 cm da pele e introdução por ela da agulha disponível no kit para passagem do fio guia pelo orifício do anteparo interno para a cavidade gástrica. Captura do fio com alça, retirada do mesmo pela boca e introdução de nova sonda guiada para o estômago, cuja extremidade afilada se encaixa na sonda antiga e é realizada a tração do fio guia ao nível da pele (podendo ser realizada incisão na pele para saída do anteparo se necessário) (8,9).

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  • Uso de balão dilatador. Corte da sonda de gastrostomia 3 cm acima da pele e introdução de fio guia. Passagem de balão dilatador de 18 mm por sobre o guia, através do endoscópio, com insuflação do mesmo dentro do orifício do anteparo interno até sua retenção total dentro da sonda. Tração do conjunto endoscópio + balão permite a tração do anteparo para dentro do estômago, posterior retirada pela boca, com introdução de nova sonda de gastrostomia com o mesmo fio guia durante o mesmo procedimento (11,12).

 

 

  • Uso de papilótomo. Introdução do papilótomo via sonda de gastrostomia cortada para realizar incisões radiais na mucosa recobrindo o anteparo para expô-lo (13,14).
  • ESD (endoscopic submucosal dissection). Dissecção submucosa até exposição do anteparo (16).

 

Foram propostas formas de avaliação do grau de migração do anteparo para planejamento  terapêutico pelo possível risco de perfuração dependendo de sua localização. Branden et al. e Tanaka et al. (6,17) sugeriram avaliação por ultrassom endoscópico para determinação de posição intramural (profundamente na mucosa hipertrofiada ou dentro das camadas musculares) ou extramural (entre as paredes gástrica e abdominal), para decisão de tratamento endoscópico ou cirúrgico respectivamente.

Publicação recente (15) sugere uma classificação (Richter-Schrag) baseada nos achados endoscópicos para planejamento terapêutico:

IA – Extracorporal parcial, localizada no subcutâneo / IB – Extracorporal total : Incisão para retirada, com cicatrização e conduta dependendo da presença ou não de fístula gastrocutânea.

II – Localizada na submucosa gástrica, anteparo parcialmente visível pela EDA, bom grau de mobilização por pressão externa. Tratamento endoscópico – geralmente a retirada é possível com enrijecimento da sonda (guia ou balão) e pressão para lúmen gástrico.

III – Localizado na submucosa gástrica podendo envolver parcialmente muscular, anteparo não visível, com ou sem fistula interna, boa mobilização. Tratamento endoscópico – dissecção da mucosa/submucosa para exposição do anteparo e realização de manobra descrita na classificação anterior.

IV – Localização fora da parede gástrica, anteparo não visível, com ou sem fístula interna (que pode ser tangencial ao óstio do anteparo), mobilização ruim ou inexistente. Tratamento – devido à sua localização profunda e muitas vezes imprecisa, tem alto risco de complicações no tratamento endoscópico (perfuração, sangramento de difícil controle, etc). Geralmente optado por tratamento cirúrgico.

A: Sonda de GTT com posicionamento adequado. B: Sonda localizada na submucosa gástrica, anteparo parcialmente visível, classificação II de Richter-Schrag. C: Sonda localizada na submucosa gástrica, anteparo não visível, classificação III de Richter-Schrag.

A: Sonda de GTT com posicionamento adequado. B: Sonda localizada na submucosa gástrica, anteparo parcialmente visível, classificação II de Richter-Schrag. C: Sonda localizada na submucosa gástrica, anteparo não visível, classificação III de Richter-Schrag.

 

PREVENÇÃO

Para prevenir tal complicação, são recomendadas as seguintes medidas (5,6):

  • No momento da confecção da PEG, o anteparo externo deve ser fixado justo à pele (mas o suficiente para ainda ser possível realizar movimento de rotação com o anteparo interno na visão endoscópica) para boa aposição da parede gástrica na abdominal. Nos próximos dias o anteparo deve ser afastado aproximadamente 0,5 a 1 cm da pele para evitar isquemia e necrose por pressão.
  • Os cuidadores devem ser orientados a, no momento da limpeza do local, se assegurar que a sonda se move para dentro e para fora por no mínimo 1 cm e que realiza movimentos rotacionais com um mínimo de resistência.
  • Quando a sonda não está em uso ela deve ser coberta para prevenir tração inadvertida por parte do paciente.
  • Qualquer restrição de movimento da sonda, dificuldade de passagem da dieta, vazamento ou dor local devem ser prontamente avaliados.

 

 

REFERÊNCIAS

 

  1. Lee TH, Lin JT. Clinical manifestations and management of buried bumper syndrome in patients with percutaneous endoscopic gastrostomy. Gastrointest Endosc. 2008;68:580–584
  1. Ma MM, Semlacher EA, Fedorak RN et al. The buried gastrostomy bumper syndrome: prevention and endoscopic approaches to removal. Gastrointest Endosc 1995;41:505–508
  1. Klein S, Heare BR, Soloway RD. The “buried bumper syndrome”: a complication of percutaneous endoscopic gastrostomy. Am J Gastroenterol 1990;85:448–450
  1. Gumaste VV, Krachman M, Pottipati A, Dave P. Removal of an embedded PEG bumper. Gastrointest Endosc 1993;93:598-9.
  1. Ma MM, Semlacher EA, Fedorak RN et al. The buried gastrostomy bumper syndrome: prevention and endoscopic approaches to removal. Gastrointest Endosc 1995;41:505–508
  1. Braden B, Brandstaetter M, Caspary WF et al. Buried bumper syndrome: treatment guided by catheter probe US. Gastrointest Endosc 2003;57:747–751
  1. Boyd JW, DeLegge MH, Shamburek RD et al. The buried bumper syndrome: a new technique for safe, endoscopic PEG removal. Gastrointest Endosc 1995;41:508–511
  1. Venu RP, Brown RD, Pastika BJ, Erikson LW (2002) The buried bumper syndrome: a simple management approach in two patients. Gastrointest Endosc 56:582–584
  1. Fay DE, Luther R, Gruber M. A single procedure endoscopictechnique for replacing partially extruded percutaneousendoscopic gastrostomy tubes. Gastrointest Endosc 1990;36:298-300.
  1. Sauer B, Staritz M. Buried bumper: a new method of non-surgical removal. Z Gastroenterol 2004;42:227–232
  1. Strock P, Weber J (2005) Buried bumper syndrome: endoscopic management using a balloon dilator. Endoscopy 2005;37:279
  1. Christiaens P, Bossuyt P, Cuyle P-J et al (2014) Buried bumper syndrome: single-step endoscopic management and replacement. Gastrointest Endosc 2014;80:336
  1. Müller-Gerbes D, Aymaz S, Dormann AJ. Management of the buried bumper syndrome: a new minimally invasive technique – the push method. Z Gastroenterol 2009;47:1145–1148
  1. Cyrany R, Repak T, Douda T et al. Cannulotome introduced via a percutaneous endoscopic gastrostomy (PEG) tube. Endoscopy 2012;44:E422–E423
  1. Richter-Schrag H J, Fischer A. Buried bumper syndrome: a new classification and therapy algorithm. Chirurg 2015;86(10):963-9
  1. Curcio G, Granata A, Ligresti D, Tarantino I, Barresi L, Traina M. Buried bumper syndrome treated with HybridKnife endoscopic submucosal dissection. Gastrointest Endosc 2014; 80: 916-7
  1. Tanaka Y, Akahoshi K, Motomura Y et al. Pretherapeutic evaluation of buried bumper syndrome by endoscopic ultrasonography. Endoscopy 2012;44:E162

 

Postado por

Thienes Maria da Costa Lima

Médica do Serviço de Endoscopia Digestiva do Hospital Nossa Senhora das Graças – Curitiba/PR

Especialização em Endoscopia Digestiva pelo Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo (USP)




Qual o melhor forma de ressecção para os pólipos subcentimétricos do cólon e reto?

A polipectomia é o procedimento terapêutico endoscópico mais comum e todos os colonoscopistas devem estar aptos à realizar este procedimento de forma segura e efetiva. A prática evoluiu consideravelmente nos últimos anos e atualmente dispomos de várias técnicas e equipamentos para diferentes cenários clínicos.

O endoscopista deve considerar o tamanho, características morfológicas e localização do pólipo no cólon antes de escolher a técnica apropriada. Para pólipos pequenos existem várias técnicas que podem ser utilizadas, mas são poucos os estudos disponíveis para nos guiarem entre qual a mais indicada para cada caso.

Os  pólipos devem ser divididos entre  sésseis ou pediculados, e também de acordo com o  tamanho da lesão (até 3 mm, 3-7 mm e 7-9 mm). Em relação à localização, a maioria dos estudos considera cólon direito do ceco ao ângulo esplênico, e esquerdo os segmentos distais à esta região.

 

PÓLIPOS PEDICULADOS

  • Melhor tratamento sugerido pela maioria dos estudos e guias é a polipectomia com alça diatérmica, não importando se é no cólon direito ou esquerdo.
  • Pólipos com pedículos maiores do que 1 cm sugere-se o uso de clipe ou endoloop para prevenção do sangramento.

 

PÓLIPOS SÉSSEIS

O tratamento varia de acordo com o tamanho e localização.

 

Existe um certo consenso no tratamento das seguintes lesões:

  • Lesões sésseis com 1 cm ou mais, em qualquer lugar do cólon, devem ser sempre tratadas por mucosectomia.
  • Lesões planas ou deprimidas maiores do que 3-4 mm (que não podem ser ressecadas adequadamente por pinça fria/hot/jumbo) são tratadas por mucosectomia.

 

Lesões de tamanho intermediário

Para as lesões de 3-7 mm e 7-9 mm  as condutas variam bastante.

 

  • Lesões de 3-7 mm: Boa parte dos estudos considera segura a ressecção das lesões de 3-7 mm com alça fria. Não se recomenda ressecção com pinça de biópsia devido à alta frequência de ressecção incompleta. Hot biopsy pode ser usada no cólon esquerdo mas é contra indicada no cólon direito devido ao risco de perfuração (cada vez menos usada). Alça diatérmica pode ser usada com relativa segurança no cólon esquerdo mas tem um risco de perfuração maior quando utilizada no cólon direito.  A mucosectomia se mostra segura, efetiva, com baixo risco de perfuração e maiores taxas de ressecções completas destas lesões.  Estudos demonstram que a aplicação da mucosectomia nas ressecções de lesões maiores do que 5 mm no cólon direito tem aumentado e é sugerida como a melhor opção por alguns autores.

 

pinça lesão residual

(Clique para aumentar) Lesão plana de 6 mm no ceco.  Tentativa de ressecção com pinça de biópsia fria.  Após a primeira mordida foi observada lesão residual com necessidade de ressecção adicional. Este tipo de tratamento deve ser evitado pois quanto maior o número de fragmentos em que a lesão for ressecada, maior a incidência de recidiva.

 

  • Lesões de 7-9 mm: Não se deve usar pinça de biópsia fria. Hot biopsy é contra indicada no cólon direito e tem grande taxa de ressecção incompleta em lesões maiores do que 5 mm. A alça fria é uma opção possível, porém, as técnicas mais utilizadas e sugeridas nos artigos para este tipo de lesão são a ressecção com alça diatérmica e a mucosectomia.  O uso de terapia térmica (alça) sem injeção submucosa no cólon direito tem uma maior incidência de perfuração e síndrome pós polipectomia, levando à uma tendência em se indicar mucosectomia para estas lesões quando localizadas nesta região. No cólon esquerdo a ressecção com alça diatérmica é mais segura do que no cólon direito mas a mucosectomia também é uma opção que deve ser considerada. Em um estudo multicêntrico prospectivo (6) realizado em 11 instituições japonesas incluindo 624 pacientes,  foi avaliado a aplicação da mucosectomia em lesões menores do que 2 cm.  O tamanho médio das lesões era de 8,3 mm + 3,2 (5-20 mm). A ressecção em bloco foi obtida em 93,3% dos pacientes com 78,3% de ressecções completas. A taxa de perfuração foi  0 (zero) e a taxa de sangramento 1,1%.   Este estudo demonstra que a mucosectomia é uma técnica simples, rápida, segura e com altas taxas de ressecção completa de lesões menores do que 1 cm.

 

Como medir as lesões?

Outra dificuldade na decisão terapêutica dos pólipos subcentimétricos é como estimar o tamanho da lesão. Infelizmente não exite um método 100% preciso. O tamanho é estimado, na maioria das vezes, comparando-se a lesão com algum dos instrumentos endoscópicos, geralmente uma pinça. Para isso o endoscopista deve conhecer o material que utiliza. A concha da pinça de colonoscopia padrão mede em torno de 5 mm de comprimento e quando aberta tem aproximadamente 8 mm.

 

tamanho da pinça

(Clique para aumentar). A) Comparação da pinça aberta (visão endoscópica) com área arredondada de 5 mm. B) Medida da pinça aberta (aproximadamente 8 mm).

 

pinça polipo 5 mm

(Clique para aumentar). A) Pólipo pequeno no cólon descendente. B) Comparação do pólipo com uma das conchas da pinça de colonoscopia que mede 5 mm de comprimento.

 

Referências

  1. Riley SA. Colonoscopic polypectomy and endoscopic mucosal resection: A pratical Guide. Britihs Society of Gastroenterology. 2008. Disponível no endereço: http://www.bsg.org.uk/pdf_word_docs/polypectomy_08.pdf
  2. Saunders B. “HOW I DO IT” Removing large or sessile colonic polyps. World Endoscopy Organization. Disponível no endereço: http://www.worldendo.org/assets/downloads/pdf/publications/how_i_doit/2007/omed_hid_removing_large_or_sessile_colonic_polyps.pdf
  3.  Lee TJ, Rutter MD, Blanks RG, Moss SM, Goddard AF, Chilton A, Nickerson C, McNally RJ, Patnick J, Rees CJ.Colonoscopy quality measures: experience from the NHS Bowel Cancer Screening Programme. Gut 2012;61:1050e1057. doi:10.1136/gutjnl-2011-300651
  4.  Ross WA, Thirumurthi S, Lynch PM, Rashid A, Pande M, Shafi MA,
    Lee JH, Raju GS. Detection rates of premalignant polyps during screening colonoscopy: time to
    revise quality standards? GASTROINTESTINAL ENDOSCOPY Volume 81, No. 3 : 2015
  5.  Lee TJ, Blanks RG, Rees CJ, Wright KC, Nickerson C, Moss SM, Chilton A, Goddard AF, Patnick J, McNally RJ, Rutter MD.  Longer mean colonoscopy withdrawal time is associated with increased adenoma detection: evidence from the Bowel Cancer Screening Programme in England. Endoscopy 2013; 45: 20–26
  6.  Yoshida N(1), Naito Y, Inada Y, Kugai M, Yagi N, Inoue K, Okuda T, Hasegawa D, Kanemasa K, Kyoichi K, Matsuyama K, Ando T, Takemura T, Shimizu S, Wakabayashi N, Yanagisawa A, Yoshikawa T. Multicenter study of endoscopic mucosal resection using 0.13% hyaluronic acid solution of colorectal polyps less than 20 mm in size. Int J Colorectal Dis (2013) 28:985–991.

Confira também: Lesões sésseis serrilhadas | vídeo sobre: Ressecção de pólipo pediculado gástrico com auxílio de endoloop




Como aumentar sua taxa de detecção de adenomas?

 

A Taxa de Detecção de Adenoma (TDA) atualmente é o principal indicador de qualidade de colonoscopia.  Dentre os vários indicadores propostos, este é o único que comprovadamente se correlaciona com a incidência de câncer de intervalo. Quanto maior a TDA de um colonoscopista (ou de um serviço de colonoscopia), menor a chance do paciente apresentar um câncer de intervalo.

Na população assintomática acima de 50 anos submetida a screening, a TDA deve ser

  • ≥ 30% nos homens
  • ≥ 20% nas mulheres

 

Portanto, medidas que possam melhorar nossa TDA são bem-vindas e benéficas para os pacientes. Nesse artigo vamos discorrer sobre as principais medidas estudadas, variando desde medidas simples e sem custos, até modernas tecnologias desenvolvidas para este fim.

 

Qualidade do preparo: este é um indicador de qualidade ressaltado por quase todas as sociedades internacionais. A qualidade do preparo está diretamente relacionada com o tempo de chegada ao ceco e com a detecção de pólipos. É importante cada serviço estar habituado com a solução de preparo de cólon padrão, bem como saber individualizar o preparo de cólon para situares especiais.

 

Mudança de posição: visam melhorar a distensão dos segmentos do cólon, melhorando sua inspeção. O cólon direito pode ser melhor inspecionado no DLE, o transverso em DDH e o cólon esquerdo em DLD. Em dezembro de 2015 tivemos um artigo comentado estudando essa técnica que demonstrou aumento na detecção de pólipos apenas no cólon direito. Dois outros estudos também foram favoráveis à mudança de decúbito. No entanto, devido ao desenho destes estudos (examinava uma vez numa posição, depois examinava uma segunda vez em outra posição), o aumento da TDA pode ser explicados pelo simples second-look, ou seja, não seria necessário mudar o decúbito, apenas examinar pela segunda vez.1 De fato, um RCT publicado em 2014 em que a mudança de decúbito programada e proposital foi comparada com mudança apenas quando encontrava-se uma dificuldade, falhou em demonstrar aumento na TDA.2

 

Segundo observador: a participação da enfermagem como um segundo observador durante a retirada do aparelho mostrou aumento na detecção de pólipos e adenomas em ao menos dois estudos. Uma medida simples e sem custo.3

 

Horário do exame: a fadiga do endoscopista vai aumentando ao longo do dia e pode afetar a TDA. Sanaka et al foram os primeiros a mostrar que a TDA foi significativamente maior nas colonoscopias agendadas pela manhã do que nas agendadas a tarde.  Vários outros estudos também chegaram a mesma conclusão. Gurudu et al4 mostraram que quando os exames eram divididos em blocos de meio-dia, não havia diferença entre a TDA dos exames realizados pela manhã ou à tarde.

 

Water-imersion/ Water-exchange: a colono sob imersão foi idealizada para facilitar a chegada ao ceco. A colono com troca de água almeja a aspiração de todo o resíduo líquido do cólon e instilação de grandes volumes de água que é mantida durante a retirada do aparelho. Seus defensores relatam melhor visualização dos pólipos devido um efeito de lente de aumento da água e visto que os pólipos tendem a boiar na água em vez de permanecerem achatados. Um estudo demonstrou aumento na TDA (25% vs 19%) e outro demonstrou tendência a maior detecção, porém sem poder estatístico (56.7% vs 43.3%).5,6

 

Visualização do cólon direito: a maioria dos adenomas não detectados (missed adenomas) ocorrem no cólon direito. Vários fatores contribuem para esse fato, como o preparo de cólon que tende a ser um pouco pior no cólon direito, a maior taxa de adenomas sésseis serrilhados, que por sua natureza plana são mais difíceis de detectar, as haustrações pronunciadas, etc. Portanto, vários autores advogam a necessidade de se examinar com maiores detalhes o cólon direito, utilizando-se manobras como retroflexão, direita e esquerda, mudança de decúbito, etc. Hewett e Rex 7 mostraram uma taxa adicional de 10% de adenomas detectados com a manobra de retrovisão, mas esta taxa também pode ser obtida com uma segunda inspeção com visão frontal.  A retrovisão, portanto, não é imperativa.

 

Tempo de retirada do aparelho: esse é um assunto polêmico e que talvez mereça outro post. Embora vários estudos tenham demonstrado uma correlação entre tempo de retirada e detecção de pólipos, os achados não são unânimes. Um estudo da Universidade John Hopkins 8, por exemplo, falhou em demonstrar aumento da TDA com a política de obrigar os endoscopistas a gastarem 7 min ou mais para retirar o aparelho. Outro estudo ressaltou a importância da qualidade técnica do exame em detrimento ao tempo de retirada 9. Controvérsias a parte, fazer o exame com calma, “gastando” o tempo necessário, é importante, e o guideline da ASGE 2015 recomenda no mínimo 6 minutos dedicados à retirada do aparelho. 10

 

Antiespasmódicos: hioscina, escopolamina e outros agentes antiespasmódicos já foram testados em ensaios randomizados, mas os resultados não foram satisfatórios. Apesar de um RCT demonstrar uma tendência a maior detecção de pólipos com uso de hioscina (sem significância estatística), uma meta-análise destes estudos mostrou que não há benefício. Recentemente, Inoue e col demonstraram aumento da TDA com uso de L-mentol, também um agente antiespasmódico (60.2% vs 42.6%). Este achado ainda precisa ser confirmado com futuros estudos. 11-13

 

Cromoendoscopia: vários estudos avaliaram o impacto da cromoendoscopia com índigo-carmin na TDA. Os resultados não são unânimes. Um estudo prospectivo randomizado mostrou aumento da TDA com índigo (46% vs 36%). Uma metanálise que compilou 42 estudos comparando diferentes métodos (autofluorescência, FICE, NBI, i-Scan, cap e cromoendoscopia) mostrou que apenas a cromoendoscopia esteve relacionada com maior TDA. Por outro lado, um estudo prospectivo não evidenciou diferença. Neste estudo, os pacientes realizavam um primeiro exame sem cromoscopia e um segundo exame era realizado imediatamente após. Os pacientes foram então randomizados: 60 com índigo vs 70 convencional (luz branca). Adenomas adicionais foram detectados em 27 vs 33%, respectivamente. O segundo exame era limitado aos segmentos distais à flexura esplênica, o que pode ter limitado o impacto da cromoendoscopia na detecção de lesões planas serrilhadas do cólon direito.

 

Uso de cap (cap-assisted colonoscopy): o uso de um cap transparente na extremidade do aparelho é advogado por alguns autores pois facilita a inspeção atrás das haustrações. No entanto, em uma meta-análise incluindo 8991 pacientes, o uso de cap teve um impacto muito pequeno na TDA (RR 1.08 – IC 1.00-1.17). O tempo de inserção foi significativamente menor com o uso de cap, tanto para experts quanto para os trainees. 14

 

Aparelhos de alta resolução: esse é um tema ainda polêmico. Não há dúvidas que os aparelhos de alta resolução (HD-WL) ofereçam melhor qualidade de imagem do que os aparelhos convencionais (SD-WL), mas as evidências em relação a TDA não são tão contundentes quanto se esperava. Um RCT mostrou que os aparelho HD-WL aumentaram o número total de adenomas detectados e aumentaram a detecção de lesões planas no cólon direito. No entanto, não houve diferença estatística na quantidade de paciente com ao menos 1 adenoma  (38.6% vs 45.7%, P = 0.17). Em uma meta-análise de 5 estudos (2 RCTs e 3 não-RCTs) o uso da alta resolução aumentou em apenas 3,5% a TDA (NNT de 28) e não houve impacto na taxa de detecção de adenomas de alto risco (maiores que 10 mm, componente viloso ou displasia de alto grau). Os autores alertam para a interpretação cuidados desses dados devido a heterogeneidade dos estudos (estudos não RCTs e TDA variando de 23-65%). 15 Atualmente, a ESGE recomenda o uso de aparelhos de alta resolução no screening da população de médio risco.

 

Cromoscopia óptica ou virtual: o uso de tecnologias como FICE, NBI e i-Scan foi testado por diversos estudos, sendo que a maioria não mostrou benefício na detecção de adenomas. Existem inclusive duas meta-análises mostrando que seu uso não melhor a TDA. Estes estudos compararam estas tecnologias com a luz branca de alta definição. 16, 17

 

 

NOVAS TECNOLOGIAS

 

Third-eye Retroscope: consiste em um fino cateter que é passado pelo canal do colonoscópio convencional e faz retrovisão de 180, permitindo melhor visualização atrás das pregas. Um estudo randomizado multicêntrico mostrou aumento de 29.8% na detecção de pólipos e 23.2% na detecção de adenomas, comparado com a colonoscopia convencional 18. No entanto, o cateter ocupa o canal de trabalho e necessita ser retirado para fazer biópsia ou polipectomia, além de ser descartável, agregando um custo considerável ao exame. Sua produção foi descontinuada e a segunda geração deste aparelho vem sendo testada: Third-eye panoramic device, que consiste em um cateter acoplado externamente ao aparelho, provido de uma luz de LED e uma microcâmera de cada lado do cateter, fornecendo visão de 330°, e com proposta de ser reutilizável.

 

Full Spectrum Endoscopy (FUSE): os colonoscópios convencionais permitem uma visão de 140-170°. O FUSE possui câmeras laterais na extremidade do aparelho, permitindo uma visão de 330°. No entanto, esta visão não é contínua, mas separada em 3 telas, exigindo um novo treinamento visual do endoscopista. Em um estudo com 185 pacientes, a taxa de adenomas que passaram despercebidos com o FUSE foi de 7% contra 41% com o uso dos aparelhos convencionais 19. O que chama a atenção neste estudo é a alta taxa de adenomas perdidos no grupo convencional (41%!). Não há dúvidas que novos estudos são necessários para comprovar o benefício desta tecnologia.

 

Endocuff: consiste em uma especie de borracha acoplada à extremidade do aparelho, com asas flexíveis que ajudam a esticar a mucosa, reduzindo as haustrações. O endocuff foi aprovado pelo FDA em 2012. Em um estudo com 498 pacientes, a taxa de detecção pólipos e de adenoma foi significativamente maior com o uso do Endocuff vs sem Endocuff: 56% vs 42% e 36% vs 28%, respectivamente. 20

 

G-Eye: consiste em um balão inflável alguns centímetros antes da extremidade do aparelho. Durante a fase de retirada do aparelho o balão é inflado com o acionamento de um pedal. Sua pressão é controlada pelo sistema, permitindo que o balão se acople ao diâmetro da luz do cólon. Conforme o aparelho vai sendo retirado, o balão estica as haustrações, permitindo uma excelente visualização de toda a mucosa. RCT multicêntrico demonstrou TDA de 59% vs 39% com aparelho convencional 21. Tive a oportunidade de assistir o uso deste aparelho e sem dúvida aparenta ser uma tecnologia promissora.

 

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Colonoscópio FUSE

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Colonoscópio FUSE projeta imagens em 3 monitores, ampliando o campo de visão

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Endocuff

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Colonoscópio G-Eye

SUMÁRIO

 

Técnicas com melhores evidências para aumentar a TDA:

  • Preparo adequado
  • Tempo de retirada
  • Repetir o exame do cólon direito (com retrovisão ou não)
  • Segundo observador
  • Endoscopia de alta definição
  • AM procedures
  • Water-Exchange

 

Técnicas com evidências limitadas que favorecem maior TDA

  • G-eye
  • Endocuff
  • FUSE
  • L-Menthol
  • Indigo-carmin
  • Mudanças de decúbito

 

Técnicas que parecem não aumentar a TDA

  • NBI, FICE e i-Scan
  • Hioscina, escopolamina
  • Cap

 

Referências:

  1. Dynamic patient position changes during colonoscope withdrawal increase adenoma detection: a randomized, crossover trial. Gastrointest Endosc 2011; 73: 456-463
  2. Ou G, et al. A randomized controlled trial assessing the effect of prescribed patient position changes during colonoscope withdrawal on adenoma detection. Gastrointest Endosc 2014; 80: 277-283
  3. Pullens and Siersema. Quality indicators for colonoscopy: Current insights and Caveats. World J Gastrointest Endosc 2014 December 16; 6(12): 571-583
  4. Gurudu SR, et al. Adenoma detection rate is not influenced by the timing of colonoscopy when performed in half-day blocks. Am J Gastroenterol 2011
  5. Cadoni S, et al. A two-center randomized controlled trial of water-aided colonoscopy versus air insufflation colonoscopy. Endoscopy 2014; 46: 212-218
  6. Hsieh YH, Koo M, Leung FW. A patient-blinded randomized, controlled trial comparing air insufflation, water immersion, and water exchange during minimally sedated colonoscopy. Am J Gastroenterol 2014; 109: 1390-1400
  7. Hewett DG, Rex DK. Miss rate of right-sided colon examination during colonoscopy defined by retroflexion: an observational study. Gastrointest Endosc 2011; 74: 246-252
  8. SAWHNEY MS, et al. GASTROENTEROLOGY 2008;135:1892–1898
  9. Lee RH. Quality of colonoscopy withdrawal technique. Gastrointest Endosc 2011.
  10. Quality indicators for colonoscopy. Gastrointest Endosc 2015; 81:1
  11. Corte C, et al. Hyoscine butylbromide administered at the cecum increases polyp detection: a randomized double-blind placebo controlled trial. Endoscopy 2012; 44: 917-922
  12. Rondonotti E, et al. The impact of hyoscine-N-butylbromide on adenoma detection during colonoscopy: meta-analysis of randomized, controlled studies. Gastrointest Endosc 2014;
  13. Inoue K, et al. L-menthol improves adenoma detection rate during colonoscopy: a randomized trial. Endoscopy 2014; 46: 196-202
  14. Ng SC, et al. The efficacy of cap-assisted colonoscopy in polyp detection and cecal intubation: a meta-analysis of randomized controlled trials. Am J Gastroenterol 2012
  15. Subramanian V, Mannath J, Hawkey CJ, Ragunath K. High definition colonoscopy vs. standard video endoscopy for the detection of colonic polyps: a meta-analysis. Endoscopy 2011; 43: 499-505
  16. Pasha SF, et al. Comparison of the yield and miss rate of narrow band imaging and white light endoscopy in patients undergoing screening or surveillance colonoscopy: a meta-analysis. Am J Gastroenterol 2012
  17. Chung SJ, et al. Comparison of detection and miss rates of narrow band imaging, flexible spectral imaging chromoendoscopy and white light at screening colonoscopy:a randomised controlled back-to-back study. Gut 2014; 63:785-791
  18. Leufkens AM, et al. Effect of a retrograde-viewing device on adenoma detection rate during colonoscopy: the TERRACE study. Gastrointest Endosc 2011; 73: 480-489
  19. Gralnek IM, et al. Standard forward viewing colonoscopy versus full-spectrum endoscopy: an international, multicentre, randomised, tandem colonoscopy trial. Lancet Oncol 2014; 15: 353-360
  20. Biecker E, et al. Novel endocuff-assisted colonoscopy significantly increases the polyp detection rate: a randomized controlled trial. J Clin Gastroenterol 2015; 49: 413-418
  21. Hendel J, et al. 435 Prospective Randomized Multicenter Trial to Compare Adenoma Detection Rate of HD Colonoscopy With Standard HD Colonoscopy – Intermediate Results. Gastrointest Endosc 2015; 81: AB145-AB146

Artigos de cromoendoscopia

  1. Hashimoto K, et al. Hepatogastroenterology. 2010 Nov-Dec;57(104):1399-404.
  2. Omata F, et al. Scand J Gastroenterol. 2014 Feb;49(2):222-37.
  3. Pohl J, et al. Gut. 2011 Apr;60(4):485-90.

 

 

 




Dissecção Endoscópica Submucosa (ESD): dicas para iniciar e aprimorar a técnica

 

A ESD é uma das técnicas de ressecções endoscópicas desenvolvida na década de 90 no Japão e se diferencia dos demais métodos pela possibilidade de ressecção extensa, em monobloco, ampliando as possibilidades do tratamento endoscópico e com melhores resultados curativos.

Embora seja uma técnica bastante eficaz, está associada a taxas superiores de complicações devido à dificuldade técnica inerente ao procedimento.

É constituída basicamente pelas seguintes etapas: delimitação, incisão e dissecção.

 

A seguir vamos enumerar pontos fundamentais para iniciar e aprimorar a técnica, com objetivo de aumentar a eficiência e reduzir as complicações

 

1. Identificar e avaliar de forma precisa as lesões quanto aos limites e ao nível de invasão, sendo fundamental o uso da cromoscopia convencional com corante. Em determinados casos são necessários a cromoscopia digital com magnificação e eventualmente a ecoendoscopia.

2. Ter conhecimento das indicações precisas do tratamento endoscópico e quais métodos são apropriados para cada caso considerando tamanho, localização e presença de fibrose

3. Antes de iniciar a técnica da ESD é necessário ter proficiência nos procedimentos terapêuticos como ligadura, hemostasia, polipectomia, mucosectomia e familiaridade com acessórios como cateter injetor, endoloop e clipador.

4. Uma etapa fundamental é assistir a vários procedimentos em cursos ou vídeos com diferentes knifes e técnicas, e também realizar leitura específica

5. Ter contato direto com a técnica auxiliando nos procedimentos e participando de Workshops de ESD em modelos animais.

6. Realizar primeiros procedimentos em conjunto com colega com mais experiência. Iniciar por lesões menores, em localização mais favorável e sem componente cicatricial, em pacientes sem comorbidades.

7. Preparo da sala: necessário sistema de videoendoscopia, unidade eletrocirúrgica com recursos de corte pulsado, coagulação soft e forced. Insuflador de CO2 é desejável para intervenções no esôfago, cólon e reto, e particularmente na ocorrência de perfuração.

8. Aparelhos e acessórios:

A. Os endoscópios devem estar com iluminação, comandos e angulações em perfeitas condições. Desejável ter aparelhos com diferentes características como terapêutico, duplo canal, pediátrico e multibanding scope para serem utilizados diante de alguma dificuldade nas manobras ou no posicionamento.

B. Caps ou attachment, que são adaptados na ponta do endoscópio para manter distância e campo visual entre o aparelho e a estrutura, facilitam acesso à camada submucosa para dissecção.

C. Cateter injetor para injeção de solução na camada submucosa para criar coxim de segurança para incisão e dissecção. O cateter ideal é de fino calibre, alto fluxo e bisel curto.

D. Pinça de coagulação para pré-coagulação mecânica do vaso identificado e isolado, ou para hemostasia do foco hemorrágico (soft coagulação 80W Effect 5);

E. Clipador para oclusão de perfuração, hemostasia de vaso de maior calibre ou sangramento refratário à coagulação com pinça, e para aproximação das bordas ao final do procedimento.

F. Knifes são os acessórios para realizar a demarcação, incisão e a própria dissecção, sendo que atualmente existem diversos tipos disponíveis. Em geral optamos pela utilização de apenas um tipo de knife no qual temos melhor adaptação e segurança no seu manejo.

9. Solução para cromoscopia: a avaliação das lesões esofágicas com a solução de lugol  (1% a 1,5%) é melhor que a cromoscopia digital para a definição das bordas. O índigo-carmin é utilizado para a avaliação das lesões gástricas e colorretais. As lesões gástricas, por vezes, são de difícil identificação das bordas à luz branca ou com índigo-carmin e nestes casos a cromoscopia digital com magnificação é muito útil. No cólon e no esôfago estes recursos são úteis para estimar o nível de invasão da lesão.

 

Avaliação com luz branca.

Avaliação com luz branca.

Cromoscopia com índigo-carmin.

Cromoscopia com índigo-carmin.

 

10. Soluções para injeção: podemos utilizar solução fisiológica, Manitol, Voluven, Ácido Hialurônico, entre outras. É necessário que a solução seja eletrolítica para que ocorra a transmissão da corrente elétrica. Soluções com maior osmolaridade apresentam menor absorção e portanto maior tempo de permanência na camada submucosa.

11. Delimitação: é a etapa inicial e de extrema importância para garantir a radicalidade da ressecção. A delimitação das lesões esofagogástricas é realizada com o próprio knife,  distando 5 mm da lesão, e com uso da corrente de coagulação modo soft ou forced

 

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Delimitação da lesão.

Delimitação da lesão.

 

12. Infiltração da solução escolhida, com cateter injetor, deve ser realizada na margem externa da demarcação. Necessário optar por cateter adequado, puncionar obliquamente e sem força excessiva para atingir a camada submucosa, evitando a injeção inadvertida na camada muscular própria ou transfixação da parede. Cuidados adicionais são evitar a punção de vasos visíveis e a insuflação exagerada do órgão.

 

Injeção de solução na submucosa.

Injeção de solução na submucosa.

 

13. Incisão

  • deve ser iniciada em geral pelo local de maior dificuldade de abordagem e pela porção inferior em relação à ação gravitacional.
  • A técnica para evitar sangramento e perfuração nesta etapa é o ajuste adequado do bisturi no modo endo cut:
    • VIO 300: Efeito 2 a 4; duração 2 ou 3; intervalo 2 ou 3 (*)
    • ICC 200: endo cut 80 a 100 W; efeito 3 ou 4 (*)
  • avançar o knife lentamente e realizar incisão superficial, sem atingir planos profundos, evitando-se a secção dos vasos calibrosos e da muscular própria.

(*) os ajustes do bisturi elétrico apresentados são apenas como referência. Dependendo da estratégia e do tipo de knife a incisão pode ser inicialmente parcial, seguida de dissecção também parcial antes de se completar toda a circunferência.

 

Incisão da mucosa.

Incisão da mucosa.

 

14. Dissecção:

  • é a etapa mais trabalhosa do procedimento
  • é realizada com o knife utilizando corrente de coagulação forced ou swift
    • VIO 300: 40W; efeito 3 ou 4
    • ICC 200: 40W; efeito 3
  • Os fatores importantes para uma dissecção de qualidade e segura são trabalhar sempre com boa visão, utilizar o cap de forma adequada, bom posicionamento do aparelho, trabalhar com coxim submucoso adequado e dissecar junto à camada muscular própria.

 

Dissecção da camada submucosa.

Dissecção da camada submucosa.

 

15. Pré-coagulação e Hemostasia: os vasos devem ser previamente identificados e seccionados diretamente com o knife quando de fino calibre, porém os mais calibrosos devem ser pré-coagulados previamente à secção com o knife, utilizando-se a pinça de coagulação (ICC 200: soft 80 W; efeito 5 / VIO 300: soft 80W; efeito 5). Caso ocorra sangramento durante a dissecção, o tratamento depende da natureza venosa ou arterial e da intensidade: sangramento em babação pode ser tratado com próprio knife com a corrente de coagulação, porém sangramento arterial ou volumoso deve ser controlado imediatamente com pinça de coagulação (coagrasper).

 

Vaso calibroso identificado durante ESD.

Vaso calibroso identificado durante ESD.

Pré-coagulação.

Pré-coagulação.

Aspecto após dissecção de vaso calibroso.

Aspecto após dissecção de vaso calibroso.

 

16. Revisão cuidadosa é obrigatória ao final do procedimento para identificar vasos que requeiram coagulação complementar, pontos de perfuração ou áreas com lesão da camada muscular própria com risco de perfuração tardia. Nestes casos são mandatórios o uso de clipes que devem ser aplicados de forma cuidadosa para evitar laceração e mais danos à camada muscular.

 

Realizar revisão do leito de ressecção.

Realizar revisão do leito de ressecção.

 

17. Cuidados com a peça ressecada são:

  1. Recuperar em bloco, evitando a fragmentação
  2. Fixar sobre uma base utilizando alfinetes, com a devida orientação
  3. Medir e examinar a peça quanto ao comprometimento das margens
  4. Documentação fotográfica
  5. Imergir em solução de formol.

 

Peça pós-ESD.

Peça pós-ESD.

 

Considerações finais:

As ressecções endoscópicas trazem grandes benefícios aos pacientes por oferecerem tratamento minimamente invasivo, preservando a qualidade de vida.

A ESD é uma técnica que possibilita amplas ressecções curativas, porém, associada à dificuldade técnica e complicações, tais como sangramento e perfuração. A sua execução com segurança requer tempo, equipamentos, acessórios e treinamento específico.

 

Abaixo vídeos com casos de ESD de estômago e cólon ascendente.