Qual a melhor opção para sedação para procedimentos endoscópicos em pacientes com cirrose hepática?

 

A sedação é definida como uma depressão do nível de consciência induzida por medicamentos. Em endoscopia digestiva, destaca-se entre os objetivos da sedação a redução da ansiedade e do desconforto do paciente, permitindo a execução do procedimento de forma mais eficaz. Apesar de seus benefícios, a sedação é responsável pela maioria dos eventos adversos que ocorrem durante endoscopia digestiva, devendo-se ter conhecimento pleno sobre os fármacos mais utilizados, considerando suas características farmacocinéticas e farmacodinâmicas.

Pacientes portadores de cirrose hepática necessitam realizar exames endoscópicos com frequência, sejam eles procedimentos diagnósticos (avaliação das complicações da hipertensão portal, investigação de sintomas dispépticos, rastreamento de neoplasias) ou terapêuticos, destacando-se neste último grupo, o tratamento da hemorragia digestiva varicosa.

No entanto, além das complicações relacionadas à hipertensão portal, a cirrose hepática altera significativamente o metabolismo de drogas, o que pode interferir de maneira significativa no resultado da sedação aumentando o risco para complicações. Pacientes cirróticos parecem ser mais suscetíveis a complicações relacionadas à sedação, possivelmente por fatores relacionados ao metabolismo dos fármacos, resultando em níveis plasmáticos mais elevados e a um clearance reduzido dos sedativos. Apesar disso, não existem recomendações  específicas para orientação da sedação em pacientes cirróticos.

Vários estudos avaliaram as consequências de diversos esquemas de sedação nos pacientes com cirrose hepática. O propofol parece ser uma alternativa segura e eficaz para sedação destes pacientes, sendo sugerido como droga de escolha. É importante destacar que o médico que realiza a sedação com o propofol deve conhecer e compreender o metabolismo das drogas no contexto da insuficiência hepática e, neste grupo de pacientes, este fato pode indicar a necessidade de intervenção do anestesiologista.

O perfil farmacocinético do propofol não parece se alterar significativamente em pacientes cirróticos. Por outro lado, os benzodiazepínicos são eliminados quase que exclusivamente pelo fígado. É importante citar que um número considerável de pacientes cirróticos que se apresentam para realização de procedimentos endoscópicos demonstra sinais de encefalopatia mínima que pioram após o uso de midazolam. Este fato parece estar relacionado com pior grau de insuficiência hepática (maior risco nos pacientes com Child C) e com doses mais elevadas do midazolam. Por esse motivo, esquemas alternativos aos benzodiazepínicos para sedação devem ser considerados.

Outras vantagens do propofol neste grupo de pacientes são tempo de indução mais rápido, a meia vida mais curta e a ausência da necessidade de ajuste de dose na insuficiência hepática. No entanto, não possui antagonista e deve-se considerar a sua administração por profissional exclusivamente dedicado e treinado. É seguro e eficaz tanto para procedimentos diagnósticos ou terapêuticos, eletivos ou não, nestes pacientes.

Estudo randomizado realizado em São Paulo, incluindo 210 pacientes cirróticos, comparou esquemas de sedação utilizando midazolam ou propofol associados a fentanil em pacientes submetidos a procedimentos eletivos ambulatoriais. O propofol mostrou-se mais eficaz, permitindo um tempo de recuperação mais curto e sem diferenças com relação a complicações imediatas quanto comparados ao midazolam. Estes dados foram reforçados por uma metanálise publicada em 2015, envolvendo 433 pacientes cirróticos. Neste estudo, os eventos adversos foram semelhantes entre o propofol e o midazolam, com eficácia superior do propofol.

Em resumo, pacientes cirróticos são mais suscetíveis a complicações relacionadas à sedação em endoscopia digestiva. Não há consenso sobre a sedação ideal nestes pacientes. O propofol é uma alternativa segura e deve ser sempre considerada neste grupo de pacientes.

Referências

Agrawal A, Sharma BC, Sharma P, Uppal R, Sarin SK. Randomized controlled trial for endoscopy with propofol versus midazolam on psychometric tests and critical flicker frequency in people with cirrhosis. J Gastroenterol Hepatol. 2012 Nov;27(11):1726-32.

Ahmed SA, Selim A, Hawash N, Tawfik AK, Yousef M, et al. Randomized Controlled Study Comparing Use of Propofol Plus Fentanyl versus Midazolam Plus Fentanyl as Sedation in Diagnostic Endoscopy in Patients with Advanced Liver Disease.Int J Hepatol. 2017 https://doi.org/10.1155/2017/8462756.

Correia LM, Bonilha DQ, Gomes GF, Brito JR, Nakao FS, et al. Sedation during upper GI endoscopy in cirrhotic outpatients: a randomized, controlled trial comparing propofol and fentanyl with midazolam and fentanyl. Gastrointest Endosc 2011;73:45-51.

Early DS, Lightdale JR, Vargo JJ, Acosta RD, Chandrasekhara V, et al. Guidelines for sedation and anesthesia in GI endoscopy. Gastrointest Endosc. 2018 87(2):327-337.

Haq MM, Faisal N, Khalil A, Haqqi SA, Shaikh H, Arain N. Midazolam for sedation during diagnostic or therapeutic upper gastrointestinal endoscopy in cirrhotic patients. Eur J Gastroenterol Hepatol. 2012 Oct;24(10):1214-8.

Horsley-Silva JL, Vargas HE. Gastrointestinal endoscopy in the cirrhotic patient. Expert Rev Gastroenterol Hepatol. 2015 Jul;9(7):1005-13.

 

Dra Lucianna Correia

Residência médica em Gastroenterologia e Endoscopia digestiva (UNIFESP)
Doutora em Gastroenterologia (UNIFESP)
Professora da disciplina de gastroenterologia da UFRN
Médica endoscopista do Hospital Universitário Onofre Lopes e da Policlínica/ Liga Norte-rio-grandense contra o Câncer



Utilização de Agentes de Contraste Ultrassonográficos (microbolhas) no diagnóstico diferencial de lesões pancreáticas avaliadas por ecoendoscopia

O uso de contraste de microbolhas é uma ferramenta já bem estabelecida para estudo de lesões hepáticas por ultrassonografia transabdominal. Nos últimos anos os contrastes ultrassonográficos têm sido utilizados na caracterização de lesões avaliadas por ecoendoscopia, sendo que ja dispomos de estudos robustos que descrevem esta técnica auxiliando no diagnóstico diferencial de lesões pancreáticas, sejam elas sólidas ou císticas.
A técnica mais utilizada atualmente, combina contraste de microbolhas de segunda geração e software de Imagem Harmônica de Contraste Dinâmico que utiliza baixo índice mecânico (MI 0,08 – 0,3), o que garante melhor resolução de imagem, com maior estabilidade das microbolhas e portanto uma análise mais duradoura.
O agente de contraste de segunda geração mais amplamente utilizado na Europa tem sido o de nome comercial Sonovue produzido pela empresa italiana Bracco, que consiste em microbolhas encapsuladas por fosfolipídeos de hexafluoreto sulfúrico que passam através da circulação pulmonar sem serem destruídas. Tem ação exclusivamente vascular, sendo eliminado pelo ar expirado sem extravasar para os tecidos. A dose utilizada deste agente para avaliação de lesões não hepáticas é de 2,4-4,8ml.

 
O Sonovue ainda não está regulamentado para uso em lesões pancreáticas, necessitando para sua utilização o consentimento informado do paciente. O exame e a segurança do paciente são de responsabilidade do médico examinador.
O objetivo desta avaliação é a caracterização da lesão com base no seu padrão vascular, inclusive sendo possível estudar sua microvasculatura e vasos de baixo fluxo. Pode-se identificar a captação na fase arterial (10-30 segundos após infusão do contraste) e sua fase venosa (entre 30-120 segundos após a infusão do contraste).
Nas lesões focais do pâncreas o padrão de captação do contraste é comparado ao do parênquima pancreático adjacente, sendo então classificadas com hipercaptantes ou hipocaptantes. O parênquima pancreático geralmente apresenta forte captação na fase arterial, com diminuição da captação progressiva na fase venosa.
Um dos maiores estudos que avaliou o uso dos agentes de contraste de microbolhas para diagnóstico de lesões pancreáticas foi o “Pancreatic Multicenter Ultrasound Study” que incluiu 1439 pacientes, comparou os achados ecográficos com a análise histológica das lesões. Nas lesões sólidas a sensibilidade e a especificidade no diagnóstico de adenocarcinoma ductal foram ambas de 88%. A sensibilidade e especificidade no diagnóstico dos tumores neuroendócrinos foram 74% e 93% respectivamente. Nas lesões císticas este estudo demonstrou sensibilidade de 93% no diagnóstico de pseudocistos e especificidade de 99%. A sensibilidade do diagnóstico de neoplasias císticas foi de 78% e a especificidade próxima a 100%.
 

Lesões sólidas pancreáticas

O adenocarcinoma ductal é tipicamente hipocaptante de contraste na fase arterial e venosa, enquanto outros tumores sólidos do pâncreas geralmente são hipercaptantes já na fase arterial ( tumores neuroendócrinos, metástases pancreáticas, pancreatite focal, hamartomas, baço acessório e outras lesões raras) .
Adenocarcinoma Ductal – Por serem pouco vascularizadas estas lesões são hipocaptantes de contraste em todas as fases em mais de 90% dos casos, mesmo em lesões muito pequenas menores que 15mm.
Tumores Neuroendócrinos – Lesões bem delimitadas e de abundante vascularização arterial, por isso são hipercaptantes já na fase arterial. Na fase venosa sofrem “wash out” rápido. O padrão de captação é homogêneo nas lesões pequenas, enquanto nas lesões grandes pode ser mais intenso na periferia da lesão. Nos tumores maiores áreas de necrose avascular podem dar aspecto heterogêneo ao padrão de captação.

 
Neoplasias sólidas pseudopapilares (Tumor de Frantz) – Realce nítido dos contornos da lesão pelo contraste. No interior da lesão a captação é heterogênea, com padrão característico “ fast in e fast out” que ocorre devido à pontos não captantes que correspondem à áreas necróticas e hemorrágicas comumente presentes nestas lesões. O “wash out” lento na fase venosa pode ser avaliado na ecoendoscopia.

Lesões Císticas do Pâncreas

O diagnóstico diferencial dos cistos pancreáticos. Nódulos e septos são vascularizados e se realçam pelo contraste, enquanto debris e coágulos não captam contraste.
Cistoadenoma Seroso – Aparência lobulada com paredes finas e com septos fibróticos bem vascularizados com realce central na fase arterial. Lesões pequenas podem ser confundidas com lesões sólidas.
Cistoadenoma Mucinoso – Lesões macrocísticas de paredes espessadas captantes de contraste podendo conter nódulos murais e septos hipercaptantes sem acometimento de ducto pancreático.
Cistoadenocarcinoma Mucinoso – Cistos volumosos com componentes sólidos heterogêneos com áreas hipocaptantes de contraste.
Neoplasia Intraductal Mucinosa Pailífera (NIMP) – São divididas em dois subtipos de acordo com o acometimento ductal , podem ser de ducto pancreático principal (DPP) ou de ducto pancreático secundário. O contraste pode ser útil na avaliação de estruturas intracísticas, diferenciando plugs de muco de nódulos intracísticos. A NIMP de ducto principal tem alto potencial de malignização e aspecto endoscópico característico que evidencia dilatação importante do DPP e papila duodenal em “boca de peixe” drenando secreção mucóide. Quando o acometimento é de ducto secundário o potencial de malignização desta neoplasia é baixo.
 

 
 

Outras Aplicações

Tumores estromais do trato gastrointestinal (GISTs) – Geralmente exibem padrão de realce arterial homogêneo assim como os leimiomas e schwannomas. Porém em tumores maiores, malignizados podem demonstrar padrão heterogêneo de captação de contraste, devido à áreas de necrose avascular.

 
Refrerência Biliográfica

  1. Numata K, Ozawa Y, Kobayashi N, et al. Contrast-enhanced sonography of pancreatic carcinoma: correlations with pathological findings. J Gastroenterol 2005; 40:631.
  2. Dietrich CF, Braden B, Hocke M, et al. Improved characterisation of solitary solid pancreatic tumours using contrast enhanced transabdominal ultrasound. J Cancer Res Clin Oncol 2008; 134:635.
  3. D’Onofrio M, Barbi E, Dietrich CF, et al. Pancreatic multicenter ultrasound study (PAMUS). Eur J Radiol 2012; 81:630.
  4. Dietrich CF, Ignee A, Braden B, et al. Improved differentiation of pancreatic tumors using contrast-enhanced endoscopic ultrasound. Clin Gastroenterol Hepatol 2008; 6:590.
  5. Dietrich CF, Schreiber-Dietrich D, Hocke M. [Comments on the EFSUMB non-liver Guidelines 2011]. Praxis (Bern 1994) 2012; 101:1175
  1. Piscaglia F, Nolsøe C, Dietrich CF, et al. The EFSUMB Guidelines and Recommendations on the Clinical Practice of Contrast Enhanced Ultrasound (CEUS): update 2011 on non-hepatic applications. Ultraschall Med 2012; 33:33.
  2. Dietrich CF, Sahai AV, D’Onofrio M, et al. Differential diagnosis of small solid pancreatic lesions. Gastrointest Endosc 2016; 84:933.
  3. D’Onofrio M, Mansueto G, Falconi M, Procacci C. Neuroendocrine pancreatic tumor: value of contrast enhanced ultrasonography. Abdom Imaging 2004; 29:246.
  4. Ecoendoscopia: Núcleo de Ecoendoscopia da SOBED; Walton Albuquerque et al – Editora Revinter 2012
  5. Ecoendoscopia: Robert Hawes, Paul Fockens, Shian Varadarajulu, coordenação Fauze Maluf-Filho, Editora Elservier 2015



CPRE em mulheres grávidas é seguro ?

Já são muito bem reportados todos os benefícios que os procedimentos endoscópicos podem trazer atualmente aos nossos pacientes. Porém, para uma especial parcela destes pacientes, as gestantes, a eficácia clínica e segurança ainda suscitam dúvidas.

As gestantes estão sujeitas a vários riscos durante os procedimentos endoscópicos, como hipóxia e hipotensão, parto prematuro, trauma e teratogênese. Como regra, os procedimentos devem ser adiados para após o parto.

Porém, as gestantes também estão sujeitas à várias urgências, como : hemorragias digestivas, obstruções intestinais, neoplasias, dificuldade de alimentações e outras, que demandam a realização de procedimentos endoscópicos. Dentre estes, a coledocolitíase é umas das complicações que podem ocorrer durante a gestação e as vantagens de um procedimento menos invasivo, como a colangiografia retrógrada endoscópica (CPRE), são maiores em relação à procedimentos abertos. Outras situações que podem requerer uma CPRE durante a gestação e que dificilmente podem ser postergadas para depois do término da gravidez são: obstruções biliares malignas, colangite e  fístulas ou estenoses biliares.

A gravidez aumenta a chance de colelitíase pois o estrógeno produz aumento na síntese de colesterol, aumentando sua saturação na bile, associado a menor motilidade da vesícula, causada pela progesterona. Apesar da prevalência de 3 a 12% de colelitíase, a coledocolitíase é estimada em cerca de 1 em cada 1000 gestações.

Preparo:

A segurança do procedimento deve abranger todas as áreas. Deve-se sempre contar com a avaliação e sedação pela equipe de anestesia, que será responsável pela escolha das drogas, conforme o trimestre de gestação, manutenção de oxigenação e pressão arterial adequada. A equipe de ginecologia deve ser consultada, com avaliação do feto antes e depois do procedimento. Por fim, o procedimento obrigatoriamente deve ser realizado por profissional capacitado, e com larga experiência, sendo que médicos em treinamento ou profissionais com poucos procedimentos não devem realizar CPRE em gestantes, sem supervisão.

Indicação e tempo de realização:

A indicação adequada é fundamental. Apenas procedimentos com intuito terapêutico devem ser realizados, visto que as complicações habituais da CPRE, podem ser potencialmente mais graves em gestantes.  Colangite, pancreatites biliares graves, coledocolitíase ou lesões ductais são as indicações mais comuns. Vale citar, que adiar procedimentos com indicação formal, com frequência é uma conduta mais deletéria do que possíveis riscos da CPRE.

Em geral, há maior preocupação em indicar procedimentos endoscópicos no primeiro trimestre. Em estudo retrospectivo, CPREs realizadas no primeiro trimestre não diferiram em número de complicações em relação a população geral, porém, houve maior taxa de nascidos pré termo e de baixo peso. Entretanto, também se demonstrou em outro estudo, que a conduta conservadora em pacientes com coledocolitíase levou a maior número de complicações, reinternações , e por fim, maior número de cesarianas. Assim , o tempo ideal de indicação ainda não foi definido.

Precauções:

Radiação

A exposição à radiação é um fator de grande importância e o de maior preocupação. Esta pode ser extremamente deletéria, causando alterações que inclusive podem levar ao abortamento, ou acumulativas, causando danos após longos períodos, como a leucemia. Não há protocolos ou estudos que possam afirmar com certeza os níveis de radiação de segurança. Algumas sociedades de obstetrícia publicaram que um nível de radiação abaixo de 50 mGy estão associados a baixas taxas de aborto e má formações (14s de fluoroscopia em geral liberam cerca de 0,5 mGy de radiação).  Há grande variação pessoal na absorção de radiação, assim não se pode estabelecer padrões. Outros fatores como, tipo de equipamento, uso de proteção, posicionamento do paciente e técnica do endoscopista, parecem ser tão importantes quanto o tempo de fluoroscopia. Deve-se sempre ter em mente, que os efeitos são mais nocivos no primeiro trimestre (efeito tudo ou nada), e sugere-se que toda mulher em idade reprodutiva realize teste de gravidez antes de ser submetida a CPRE.

Várias medidas podem ser adotadas visando diminuir o tempo de exposição:

  • Usar o menor tempo possível para adquirir imagem necessária.
  • Intensificador de imagem o mais próximo possível do paciente
  • Usar colimadores
  • Evitar modos de zoom
  • Utilizar equipamentos modernos com modulação manual de potência (mínimo de 75 Kv)
  • Evitar fotografar procedimentos (há maior dose de radiação em equipamentos que guardam imagens)
  • Utilizar proteção – aventais de chumbo

Há várias publicações, com baixo número de pacientes, de CPRE sem uso de fluoroscopia. Em geral, são procedimentos onde após cateterização profunda (técnica americana, com introdução de cateter tipo “tandem”) onde há aspiração com saída de bile, seguida pela colocação do fio guia e papilotomia com remoção dos cálculos (nota do editor: aparentemente há a certeza do número de cálculos por exames de imagem anteriores). Há também descrição do procedimento em duas etapas, sendo a primeira etapa com colocação de prótese (com técnica semelhante a anterior), e a segunda, após nascimento, com terapia definitiva. Não há indicação formal de nenhum tipo de terapia sem radiação, por falta de estudos.

Bisturi elétrico

O líquido amniótico conduz corrente elétrica, assim a placa do bisturi elétrico deve ser posicionada acima do abdômen (tórax de preferência).

Complicações:

Há poucos estudos específicos com gestantes, mas os dados demonstram que as taxas de perfuração, sangramento e infecção não diferem da população normal submetida à CPRE. Porém, há maior taxa de pancreatite (12% vs 5%), provavelmente pela maior dificuldade do procedimento (uso de fluroroscopia, alterações anatômicas) e menor uso de stents pancreáticos.

Em suma, diante de uma indicação formal de terapêutica por CPRE, com equipe e materiais adequados, e com os cuidados acima, os procedimentos são seguros, e de pouco risco para o feto e para a mãe.

Particularmente tenho pouca experiência, tendo realizado apenas 3 CPREs em gestantes. Uma no primeiro trimestre, uma no segundo e uma no terceiro. Todas com coledocolitíase e icterícia. As três foram monitoradas com cardiotocografia e ultrassonografia fetal imediatamente antes e após o procedimento. Todas em posição supina, com avental duplo sob o dorso e sobre o abdômen. Em uma delas (primeiro trimestre), utilizei gadolínio como contraste, por orientação da equipe de ginecologia, para evitar possíveis má formações de tireoide (aparentemente este risco está restrito ao uso de iodo endovenoso). Os procedimentos não tiveram qualquer tipo de complicação. Foram resolutivos e com baixo tempo de uso total de radiação (menor que 1 minuto). Não houve acompanhamento pós exame.

Portanto, CPREs em gestante são raras, porém, podemos ser solicitados a avaliar e realizar o procedimento em gestantes.

Você tem experiência? Comente abaixo e divida seu conhecimento com a gente!

Veja mais sobre Endoscopia

Bibliografia :

  1. Savas N. Gastrointestinal endoscopy in pregnancy. World J Gastroenterol. 2014 Nov 7;20(41):15241-52. doi:10.3748/wjg.v20.i41.15241. – Open Acces
  2. Agcaoglu O, Ozcinar B, Gok AF, Yanar F, Yanar H, Ertekin C, Gunay K. ERCP without radiation during pregnancy in the minimal invasive world. Arch Gynecol Obstet. 2013 Dec;288(6):1275-8. doi: 10.1007/s00404-013-2890-0.
  3. Magno-Pereira V, Moutinho-Ribeiro P, Macedo G. Demystifying endoscopicretrograde cholangiopancreatography (ERCP) during pregnancy. Eur J Obstet Gynecol Reprod Biol. 2017 Dec;219:35-39. doi: 10.1016/j.ejogrb.2017.10.008.

Confira também: CPRE em pacientes com gastrectomia a Billroth II




Opções endoscópicas no tratamento das complicações do anel de restrição em pacientes pós by-pass gástrico. Série Endoscopia Bariátrica

O anel de contenção no by-pass gástrico (cirurgia de Fobi-Capella) foi muito utilizado no passado com o objetivo de evitar a dilatação da anastomose e perda do efeito restritivo da cirurgia, gerando assim, um melhor resultado na perda de peso a longo prazo.
Apesar das vantagens acima, as complicações do anel são relativamente frequentes. O seu uso está associado à intolerância alimentar (principalmente com carne), vômitos, e em casos mais severos,  desnutrição e deficiência de proteínas. Estas complicações costumam ocorrer tardiamente, e muitas vezes, vários anos após a cirurgia.
O tratamento destas complicações é realizado através da remoção do anel, procedimento que por muito tempo foi realizado cirurgicamente. Esta cirurgia costuma ser trabalhosa devido às aderências na região do coto gástrico e com risco de complicações como sangramento e perfuração.
Atualmente, uma opção menos invasiva tem se apresentado. Vários estudos demonstraram sucesso e segurança no tratamento endoscópico das complicações do anel.

Tratamento endoscópico da erosão do anel com extrusão parcial

 
A incidência da erosão do anel varia na literatura de 1 até 7% dos casos de pacientes operados pela técnica de by-pass com anel. A erosão pode ser assintomática ou estar associada a dor epigástrica, sangramento, náuseas e vômitos.
Após a ocorrência da erosão a remoção do anel deve ser considerada. O diagnóstico desta complicação é fácil, já que é realizado através da identificação de um segmento do anel visível na luz do coto gástrico durante a endoscopia digestiva alta.
 

Anel extruso na luz do coto gástrico


 
A remoção endoscópica costuma ser rápida e fácil, desde que pelo menos 50% do anel esteja visível na luz gástrica. O procedimento é realizado através da secção do anel com tesoura endoscópica e posterior tração com pinça de corpo estranho. Algumas vezes a secção do silicone com a tesoura pode ser difícil. A mobilização do anel até a exposição do nó e secção direta do fio muitas vezes facilita o procedimento.
 

Remoção endoscópica de anel erodindo para a luz do coto gástrico.
Tratamento endoscópico do deslizamento ou obstrução pelo anel sem erosão

 
Nos casos em que o anel está parcialmente erodido e visível na luz gástrica ele pode ser facilmente removido com a técnica descrita previamente. O grande desafio para o endoscopista intervencionista ocorre nos casos onde o anel está causando obstrução e não existe erosão da parede gástrica.
Os sintomas de vômitos frequentes, intolerância alimentar e desnutrição podem ocorrer tanto em pacientes com anéis estreitos ou nos casos de deslizamento do anel com angulação e obstrução da saída do coto gástrico.
 

Dilatação com balão de acalasia

 
Nestes pacientes uma das opções é a dilatação do anel com balão de acalásia de 30 mm. Este procedimento é realizado através da passagem de fio guia na alça eferente e posicionamento do balão sobre o anel seguido de dilatação progressiva sob controle radiológico até a ruptura do anel. A dilatação da anastomose deve ser evitada mas muitas vezes isso acaba sendo impossível devido ao pequeno tamanho do coto gástrico e o grande tamanho do balão (10 cm de extensão). Na maioria dos casos a transição esôfago gástrica ou a anastomose vão ser dilatados junto com o anel.
Um estudo publicado em 2010 incluindo 39 pacientes obteve 66% de sucesso na ruptura completa do anel. Os outros e 34% obtiveram alargamento com melhora dos sintomas mas sem ruptura. Nenhuma complicação grave foi relatada.
A ruptura do anel costuma ocorrer facilmente. Naqueles em que isso não ocorre, a pressão excessiva deve ser evitada. Outro cuidado muito importante é que anéis deslizados e localizados sobre a alça intestinal não devem ser dilatados. A alça de intestino delgado não é tão resistente quanto o coto gástrico, podendo levar nesses casos à perfuração.
 

Dilatação do anel com balão de acalásia.
Remoção do anel com uso de prótese endoscópica

 
As próteses endoscópicas também podem ser utilizadas como primeira opção para o tratamento da obstrução por anel não erodido ou como salvamento nos pacientes em que a ruptura do anel não foi possível através da dilatação com balão de acalásia.
Campos et al em 2016 publicaram um artigo com 41 pacientes onde obteve erosão completa em 21 casos e erosão incompleta permitindo a remoção em um segundo tempo em 17 casos. Em relação às complicações foram relatadas 3 migrações de prótese e 9 estenoses tratadas com dilatação. A melhora da disfagia ocorreu em 78% dos pacientes.
O estudo acima utilizou próteses plásticas (Polyflex 25X21X90 mm). Porém, estas próteses não existem mais no mercado. As próteses indicadas para esta técnica atualmente são as metálicas totalmente recobertas.
A prótese deve ser colocada 2 cm acima do anel e abaixo da transição esôfago-gástrica para evitar vômitos. Ela é mantida por 15 dias e então removida. Se a erosão for completa, o anel muitas vezes sai junto com a prótese. Nos casos de erosão incompleta onde o anel está extruso, mas aparente na luz gástrica, ele deve ser removido após 30 dias da retirada da prótese através de secção e tração com pinça de corpo estranho.

Imagem adaptada de Campos et al 2016. Remoção do anel com auxílio de protese endoscópica. Imagem radiológica da prótese posicionada. Imagens endoscópicas da remoção da prótese e do anel completamente liberado na luz do coto gástrico.

Conclusão

O tratamento das complicações do anel de restrição em paciente pós by pass gástrico através de técnicas endoscópicas aparenta ser seguro e efetivo. Na maioria das vezes é realizado ambulatorialmente e com baixo índice de complicações.

Confira também:  Anatomia endoscópica pós cirurgia bariátrica

 

Referências

Moon Kyung Joo. Endoscopic Approach for Major Complications of Bariatric Surgery. Clin Endosc  2017;50:31-41
Josember Martins Campos, Luis Fernando Evangelista, Alvaro Antonio Ferraz et al. Treatment of ring slippage after gastric by-pass: long-term results after endoscopic dilation with na acalasia balloon. Gastrointestinal Endoscopy 2010;72(1).
Josemberg Marins Campos, Rena C. Moon, Galeno E. J. Magalhães Neto, Andre F. Teixeira, Muhammad A. Jawad, Lyz Bezerra Silva, Manoel Galvão Neto, Álvaro Antônio B. Ferraz. Endoscopic treatment of food intolerance after a banded gastric bypass: inducing band erosion for removal using a plastic stent. Endoscopy DOI http://dx.doi.org/ 10.1055/s-0042-103418


Como citar este artigo: Orso IRB. Opções endoscópicas no tratamento das complicações do anel de restrição em pacientes pós by-pass gástrico; 2018. Disponível em www.endoscopiaterapeutica.net/pt


 




Hemorragia digestiva média

 

Definição

Hemorragia do trato gastrointestinal médio é definida pelo sangramento localizado entre a papila duodenal maior e a válvula ileocecal. Corresponde a cerca de 5% dos casos de hemorragia digestiva.

O sangramento gastrointestinal obscuro é aquele persistente ou recidivante, não esclarecido após o exame de esofagogastroduodenoscopia e ileocolonoscopia. O sangramento obscuro pode ser classificado em:

  • oculto: quando há persistência ou recorrência de anemia ferropriva e/ou da positividade da pesquisa de sangue oculto nas fezes (PSOF), sem alterações visíveis nas fezes
  • evidente: quando há persistência ou recorrência de sangramento visível, após resultados negativos dos estudos endoscópicos.

 

Com os avanços dos exames de imagem do intestino delgado, como a cápsula endoscópica, os exames angiográficos e a enteroscopia assistida, foi possível observar o aumento dos casos diagnosticados de hemorragia obscura do trato gastrintestinal e, como resultado disso, foi proposto a mudança do termo sangramento obscuro do trato gastrointestinal para sangramento do intestino delgado.

O termo sangramento obscuro gastrointestinal, dessa forma, deve ser empregado para pacientes nos quais a causa do sangramento não pôde ser identificada em nenhum local do trato gastrointestinal após uma avaliação completa do mesmo, incluindo o estudo do intestino delgado.

Etiologia

As causas mais comuns de sangramento do trato gastrointestinal médio são: lesões vasculares, neoplasias primárias e metastáticas, síndromes polipoides, divertículo de Meckel, lesões da mucosa por medicações, doença de Crohn e enteropatia portal hipertensiva.

A incidência de cada etiologia está relacionada com a idade, sendo mais comum nos pacientes com menos de 40 anos a seguinte ordem:

  1. tumores do intestino delgado,
  2. doença de Crohn,
  3. divertículo de Meckel,
  4. síndromes polipoides e
  5. angioectasias.

 

Já nos indivíduos com mais de 40 anos, a ordem que predomina é a seguinte:

  1. angioectasias,
  2. ectasia vascular antral,
  3. tumores do intestino delgado,
  4. lesões de mucosa induzidas por medicamentos e
  5. dieulafoy.

Intervenção diagnóstica

Pacientes apresentando sangramento oculto ou evidente devem repetir a endoscopia e/ou colonoscopia a depender da suspeita da origem do sangramento (trato gastrointestinal alto ou baixo). Caso o paciente tenha realizado exame de endoscopia digestiva alta (EDA) recente, uma push enteroscopia poderá ser considerada para afastar lesões no intestino delgado proximal.

Nos pacientes hemodinamicamente estáveis e com endoscopia alta e baixa normais, a cápsula endoscópica é o próximo exame a ser indicado.

Naqueles com suspeita de obstrução ou com anatomia alterada cirurgicamente, a enterotomografia ou enterorressonância deverá ser realizada antes.

A enteroscopia assistida é recomendada como próximo passo no seguimento dos pacientes com resultados positivos da cápsula endoscópica ou dos exames radiológicos.

Pacientes hemodinamicamente instáveis e com sangramento ativo, devem ser encaminhados à angiografia para embolização ou estabilizados para realização de angiotomografia ou cintilografia com hemácias marcadas.

Em pacientes com exames negativos e sangramento recorrente, deve-se considerar a repetição dos exames endoscópicos e/ou radiológicos.

 

A terapia para o sangramento do intestino delgado vai depender da etiologia do mesmo. Lesões proximais podem ser tratadas com o endoscópio convencional. Lesões mais distais, como as angioectasias, podem ser tratadas por enteroscopia assistida ou push enteroscopia.

 

Hemorragia digestiva média

Bibliografia:

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Como citar esse artigo:

Sakai CM. Hemorragia Digestiva Média. Endoscopia Terapêutica; 2018. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/assuntosgerais/hemorragia-digestiva-media/

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Pseudolipomatose de cólon

Introdução e etiopatologia

A pseudolipomatose do cólon foi descrita pela primeira vez em 1985(1) e desde então, diferentes patogenias foram postuladas para esta condição, incluindo penetração intramucosa do ar durante insuflação (barotrauma), biópsias ou outros procedimentos.

No entanto, evidências mostraram sua associação com colite química causada pelo peróxido de hidrogênio (H2O2) após desinfecção com ácido peracético. Quando o ácido peracético se dissolve em água, ele se decompõe em peróxido de hidrogênio e ácido acético, que, por sua vez, se transforma em água, oxigênio e dióxido de carbono. Assim, o peróxido de hidrogênio resultante induz colite química causada pela irritação direta da mucosa(2).

Entretanto, há dois relatos na literatura que descreveram seu aparecimento após desinfecção de alto nível com água ácida eletrolisada(3) e Sterilox (água super oxidada)(4); sua patogênese é incerta, pois sabe-se, que, em ambos, não há produção do peróxido de hidrogênio.

Endoscopia

Endoscopicamente, caracterizam-se por placas elevadas, tipicamente esbranquiçadas ou branco-amareladas, aderentes, múltiplas e isoladas, também denominadas de “snow white sign” ou “frozen sign”. Seus tamanhos variam de milímetros a centímetros e são encontradas tanto no cólon esquerdo quanto no direito.

Mecanismos de contato

Há dois mecanismos possíveis de contato da substância com a mucosa, ambos em decorrência da utilização de aparelhos não enxaguados adequadamente:

  1. após irrigação de água pelos canais de água/ar, de trabalho, de corantes (colonoscópios Fujinon) ou pelo canal acessório (colonoscópios Olympus);
  2. em decorrência da insuflação de ar durante a inserção do aparelho no paciente, na qual ocorre pulverização do vapor de peróxido de hidrogênio.

Na primeira situação, as lesões aparecem imediatamente sob visão direta e tem aspecto efervescente; na segunda, elas podem ser desencadeadas à distância, antes mesmo do aparelho chegar ao local, simulando lesões pré-existentes e confundindo o colonoscopista.

Histologia

A histologia mostra criptas aparentemente preservadas, porém espaçadas por numerosos vacúolos vazios, que correspondem a gases sequestrados (setas), semelhantes a adipócitos. A imuno-histoquímica e análise ultraestrutural confirmam ausência de conteúdo lipídico, o que originou o termo “pseudolipomatose”. Estes achados foram reproduzidos em laboratório após instilação de H2O2 em cólon de cobaias(5).

Evolução clínica

Os pacientes geralmente evoluem sem sintomas, mas podem apresentar, em raras exceções, dor abdominal leve e sangramento retal. As lesões regridem espontaneamente, não havendo necessidade de tratamento específico ou hospitalização. Não é achado exclusivo do cólon; pode ocorrer em qualquer mucosa do trato digestório. Portanto, todo cuidado deve ser dado durante o enxague dos aparelhos, para que o ácido peracético e o peróxido de hidrogênio sejam completamente eliminados da superfície e dos canais dos aparelhos, especialmente o dos corantes dos colonoscópios da Fujinon(6,7).

Aspecto histológico de pseudolipomatose do cólon (A- HE, 40x e B- HE, 250 x), com glândulas cólicas aparentemente preservadas, espaçadas pela presença de numerosos vacúolos vazios, que correspondem a gases sequestrados (setas), simulando “adipócitos”.

Conclusão:

A pseudolipomatose do cólon é condição iatrogênica rara, benigna e autolimitada, que, geralmente, se apresenta de forma assintomática, com raros quadros de dor abdominal leve e sangramento retal. Não é achado exclusivo do cólon; pode ocorrer em qualquer mucosa do trato digestório. O aspecto endoscópico e os achados histopatológicos são característicos e as lesões regridem espontaneamente, não havendo necessidade de tratamento específico ou hospitalização.

Referências:

(1)  Snover DC, Sandstad J, Hutton S. Mucosal pseudolipomatosis of the colon. Am J Clin Pathol 1985; 84:575-580.

(2)  Kara M, Turan I, Polat Z, Dogru T, Bagci S. Chemical colitis caused by peracetic acid or hydrogen peroxide: a challenging dilemma. Endoscopy 2010;42 Suppl 2:E3-4.

(3)  Souza JLS, Ribeiro TM, Borges LV, da Silva JGN. Electrolyzed acid water can cause colitis? Endoscopy 2008;40(7):620.

(4)  Suzuki N, Talbot IC, Saunders BP. The “frost sign”: an inadvertent minor complication of endoscopic mucosal resection. Endoscopy 2004;36(9):835.

(5)  Zullo A., Hassan C., Guarini A., Lorenzetti R., Campo S., Morini S. Chemical Colitis due to Peracetic Acid: a case report and review of Literature. Journal of Digestive Endoscopy 2011; 2(1):15-17.

(6)  Cammarota G, Cesaro P, Cazzato A, Fedeli P, Riccioni ME, Sparano L, Vitale G, Costamagna G, Gasbarrini G, Larocca LM. Hydrogen peroxide-related colitis (previously known as “pseudolipomatosis”): a series of cases occurring in an epidemic pattern. Endoscopy 2007; 39:916-919.

(7)  Coriat R, Chaput U, Ismaili Z, Chaussade S. What induces colitis? Hydrogen peroxide or peracetic acid. Endoscopy 2008;40(3):231.




Manejo e Tratamento da Hemorragia Digestiva Baixa Aguda

Hemorragia digestiva é a principal causa de hospitalização devido a doenças do trato gastrointestinal nos Estados Unidos, sendo 30 a 40% dos casos devido a hemorragia digestiva baixa (HDB). Na maioria dos pacientes, a HDB aguda é resolvida de forma espontânea, sem necessidade de intervenção e sem complicações. Entretanto, a idade avançada e a presença de múltiplas comorbidades estão relacionadas com o aumento da morbi-mortalidade neste grupo de pacientes.

Classicamente, a HDB aguda manifesta-se com hematoquezia (sangue vermelho vivo ou marrom pelo reto). Porém, raramente, pode manifestar-se também com melena.

Anteriormente, a HDB era definida como hemorragia originada distalmente ao ângulo de Treitz. Atualmente, com a definição de hemorragia digestiva média, a HDB é definida como sangramento originado do cólon e do reto.

  • Hemorragia Digestiva Alta: Sangramento que ocorre até o ângulo de Treitz
  • Hemorragia Digestiva Média: Sangramento originado entre o ângulo de Treitz e a válvula ileocecal
  • Hemorragia Digestiva Baixa: Sangramento originado do cólon e do reto

Etiologia:

As causas de HDB incluem: doença diverticular (30-65%), colite isquêmica (5-20%); doença hemorroidária (5-20%), pólipos ou neoplasias colorretais (2-15%), angiectasias (5-10%), sangramento pós-polipectomia (2-7%), doença inflamatória intestinal (3-5%), colite infecciosa (2-5%), úlcera retal solitária (0-5%), varizes colorretais (0-3%), proctopatia actínica (0-2%), colopatia induzida por AINEs (0-2%), lesão de Dieulafoy (raro);

É importante atentar para situações em que o paciente apresenta hematoquezia com instabilidade hemodinâmica: pode representar um sangramento digestivo alto. Nestes casos, deve-se considerar a realização de endoscopia digestiva alta e esta deve ser realizada imediatamente antes da colonoscopia;

Manejo inicial:

O manejo não é distinto da hemorragia digestiva de qualquer topografia e/ou etiologia: anamnese direcionada à investigação da etiologia, exame físico detalhado (inclusive com toque retal) e avaliação laboratorial devem ser realizados assim que o paciente se apresentar. A ressuscitação hemodinâmica também deve ser efetuada de imediato.

Deve-se atentar para presença de comorbidades (que podem mudar o desfecho) e uso de medicações como AINEs, antiagregantes e anticoagulantes. Entre os fatores de risco para desfechos adversos (ressangramento, necessidade de intervenção e óbito) incluem: hipotensão, taquicardia, vigência de sangramento ativo, idade maior que 60 anos, creatinina maior que 1,7 mg/dl e instabilidade ou presença de várias dessas condições;

Atentar para a necessidade de transfusão sanguínea: os guidelines recentes recomendam transfusão com o intuito de manter a hemoglobina acima de 7g/dl na maioria dos pacientes e, em pacientes com comorbidades clinicamente significantes (especialmente isquemia miocárdica), em torno de 9 g/dl.


Investigação diagnóstica:

1. Colonoscopia

  • A colonoscopia é o procedimento inicial para quase todos os pacientes que se apresentam com HDB aguda – é diagnóstica e também terapêutica, se houver necessidade;
  • O guideline do Colégio Americano de Gastroenterologia sugere que a colonoscopia deve ser a modalidade diagnóstica de primeira linha para avaliação e tratamento da HDB;
  • Estudos indicam que a colonoscopia identifica de forma definitiva o sítio de sangramento em 45 – 90% dos pacientes.

A colonoscopia deve ser realizada nas primeiras 24 horas da chegada do paciente, após estabilização hemodinâmica e preparo adequado do cólon;

Estudos observacionais têm demonstrado uma alta frequência de definição diagnóstica e baixo tempo de internação em pacientes com HDB submetidos a colonoscopia precoce (entre 12 e 24 horas após a entrada) em comparação com pacientes submetidos a colonoscopia tardia, embora dois estudos randomizados pequenos comparando colonoscopia precoce com tardia não tenham mostrado diferença significativa no tempo de internação, ressangramento ou necessidade de cirurgia;

  • O preparo do cólon é essencial para a adequada visualização endoscópica, diagnóstico e tratamento. Colonoscopia ou retossigmoidoscopia sem preparo adequado geralmente não são realizadas, entretanto podem ser consideradas em casos selecionados (por exemplo, suspeita de sangramento do cólon esquerdo distal) com limpeza e inspeção cuidadosas do cólon durante do procedimento;
  • Em pacientes com preparo do cólon inadequado, a sensibilidade cai significativamente e o sucesso do tratamento é obtido em menos de 21% dos pacientes;
  • Em pacientes em vigência de sangramento sem condições de ingesta oral do preparo, a passagem de sonda nasogástrica deve ser considerada se o risco de aspiração for baixo.  Os pacientes devem evitar alimentos sólidos pelo menos 8 horas antes do procedimento. Líquidos claros, inclusive o preparo para colonoscopia, são permitidos até 2 horas antes do procedimento;

2. Exames de imagem

2.1. Cintilografia com hemácias marcadas

  • Pode identificar sangramento com o fluxo muito baixo (0,1 ml/ minuto),
  • Sua utilidade é controversa: um estudo retrospectivo sugere que a realização da cintilografia antes da angiografia está associada a um alto rendimento diagnóstico da angiografia quando comparado a angiografia sem cintilografia e permite o uso do contraste de forma mais seletiva.
  • Entretanto outros estudos não confirmaram estes achados e tem sugerido maior utilidade da angioTC.

2.2. AngioTC

  • Detecta sangramentos com fluxo de 0,3 ml/minuto,
  • Alta acurácia na localização do sítio de sangramento (próximo a 100%)
  • Pode ser usada imediatamente antes da angiografia para guiar a injeção de contraste de forma seletiva ou superseletiva.
  • Seu principal problema é a necessidade de injeção de contraste intravenoso, com seu risco associado de nefrotoxicidade;

2.3 Angiografia

  • Deve ser realizada assim que possível para realizar com precisão a localização do sangramento, seguida de sua terapêutica, visto que a HDB aguda é intermitente por natureza;
  • De acordo com o Colégio Americano de Radiologia, a colonoscopia deve ser realizada nos pacientes estáveis hemodinamicamente que fizeram o preparo adequado e a angiografia em pacientes instáveis hemodinamicamente, em vigência de sangramento ativo.

Terapêutica

Endoscópica

Métodos endoscópicos de hemostasia incluem métodos de injeção, métodos térmicos (eletrocoagulação bipolar, heater probe e coagulação com plasma de argônio) e terapia mecânica (clipes e ligadura elástica);

O uso do método de injeção (solução de adrenalina 1:10.000 ou 1:20.000) facilita a hemostasia primária em sangramento agudo, mas deve ser realizada sempre em combinação com um segundo método (mecânico ou térmico) para alcançar a hemostasia definitiva;

A escolha do método é geralmente guiada pela causa e localização do sangramento, a habilidade para acessar o sítio e a experiência do endoscopista;

Diverticulose, angiectasia e sangramento pós-polipectomia são as fontes de sangramento que provavelmente mais se beneficiam da terapêutica endoscópica;

Os guidelines recomendam que o sangramento diverticular deve ser tratado endoscopicamente se houver estigmas de sangramento recente (sangramento ativo, vaso visível ou coágulo aderido). A terapia mecânica com uso de clipes é o método de escolha por teoricamente diminuir o risco de lesão transmural;

  • Angiectasias colônicas, inclusive a proctopatia actínica, são comuns em idosos e embora manifestem-se com sangramento leve, pode ocorrer hematoquezia grave especialmente em pacientes em uso de antitrombóticos. O tratamento de escolha para essas lesões é a coagulação com plasma de argônio;
  • A abordagem endoscópica para tratamento de sangramento pós-polipectomia inclui o uso de métodos mecânicos e térmicos, com ou sem injeção de solução de adrenalina prévia;
  • Sangramentos secundários a colite isquêmica, doença inflamatória intestinal ou neoplasias colorretais geralmente não são passíveis de tratamento endoscópico e são normalmente tratados com suporte clínico, cirurgia ou ambos;

Em pacientes com recorrência do sangramento, deve-se repetir a colonoscopia, com hemostasia endoscópica se houver necessidade;

Endovascular

A angiografia permite tanto identificar o sítio de sangramento quanto a intervenção terapêutica. Entretanto, ela pode ser negativa quando o sangramento tem fluxo baixo (menor que 0,5ml/minuto) ou intermitente;

Série de casos mostra alto índice de sucesso em embolização (ausência de extravasamento de contraste) na HDB (73 a 100%). O índice de sucesso clínico (cessação do sangramento) varia de 63 a 96%, com taxa de ressangramento de 11 a 50%.

Cirurgia

A avaliação cirúrgica é indicada em caso de falha do tratamento endoscópico e vascular;

A localização do sítio de sangramento é essencial antes da ressecção cirúrgica para evitar a necessidade de colectomia subtotal e prevenir o ressangramento após a cirurgia, o que indica que a localização da lesão foi incorreta;


HDB e agentes antiplaquetários

O uso de agentes antiplaquetários aumentam o risco de sangramento gastrointestinal inferior, sendo o risco de sangramento baixo três vezes maior que o alto;

  • Uma coorte retrospectiva envolvendo pacientes com HDB mostrou que aqueles que continuaram o uso de aspirina após o sangramento tiveram significativo aumento da recorrência de sangramento em 5 anos que aqueles que descontinuaram o uso (19,9% x 6,9%), entretanto tiveram baixo risco de eventos cardiovasculares sérios e morte. Para minimizar o risco de eventos cardiovasculares, a aspirina como profilaxia secundária não deve ser interrompida em pacientes com HDB. Entretanto, tem sido mostrado que baixas doses de aspirina como profilaxia primária oferece uma redução limitada no risco absoluto de eventos cardiovasculares sérios e morte e, em geral, devem ser evitadas em pessoas com HDB;
  • Há falta de dados para guiar o cuidado com os pacientes que têm HDB em vigência de dupla antiagregação plaquetária. Pacientes submetidos a angioplastia com stent nos últimos 30 dias ou que tenham tido síndrome coronariana aguda (SCA) nos últimos 90 dias têm alto risco para infarto agudo do miocárdio e morte após descontinuarem o uso da dupla antiagregação e portanto são normalmente orientados a manter o uso das medicações;
  • Naqueles pacientes em uso de stent ou com SCA há mais tempo, a descontinuação do segundo agente antiplaquetário é recomendada de 1 a 7 dias, pois a descontinuação desse segundo agente parece estar associada com um relativo baixo risco se o uso da aspirina for mantido.

Conclusão e recomendações

  • Os pacientes que apresentam HDB devem ser submetidos a colonoscopia dentro das primeiras 24 horas, após estabilidade hemodinâmica e preparo adequado do cólon;
  • Se sangramento volumoso e/ou instabilidade hemodinâmica, endoscopia digestiva alta deve ser realizada imediatamente antes da colonoscopia;
  • A causa mais comum de HDB é a diverticulose (30-65%);
  • A HDB tem resolução espontânea na maioria das vezes (70 a 80% em doença diverticular);
  • Hemostasia endoscópica deve ser realizada quando a lesão for identificada com sangramento ativo ou sinais de sangramento recente (vaso visível e coágulo aderido);
  • Em pacientes em vigência de sangramento ou sem resposta à ressuscitação hemodinâmica e que não podem ser submetidos à colonoscopia, deve ser realizada angioTC seguida de angiografia com embolização se houver indicação;
  • A interrupção do uso de antiagregantes plaquetarios deve ser individualizada.

Referências:

  • Acute Lower Gastrointestinal Bleeding. N Engl J Med 2017; 376: 1054-63;
  • Diagnosis of Gastrointestinal Bleeding: A practical guide for clinicians. World J Gastrointest Pathophysiol. Nov 15, 2014; 5(4): 467-478

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Como citar esse artigo:

Arraes L. Manejo e Tratamento da Hemorragia Digestiva Baixa Aguda. Endoscopia Terapêutica; 2018. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/assuntosgerais/hemorragia-digestiva-baixa-aguda ‎

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Leia mais sobre Hemorragia Digestiva Baixa:

– DIRETRIZES – ACG Clinical Guideline: Diagnosis and Management of Small Bowel Bleeding  https://endoscopiaterapeutica.net/pt/diretriz/diretrizes-acg-clinical-guideline-diagnosis-and-management-of-small-bowel-bleeding/

– DIRETRIZES – Papel da endoscopia no paciente com sangramento gastrointestinal baixo https://endoscopiaterapeutica.net/pt/diretriz/diretrizes-papel-da-endoscopia-no-paciente-com-sangramento-gastrointestinal-baixo/

Aproveite e acesse  o site Gastropedia clicando aqui para saber mais sobre este tema!

Confira também: Hemorragia digestiva média




Esôfago negro

Esôfago proximal

Esôfago proximal/médio

Esôfago médio

Esôfago distal

Esôfago distal

INTRODUÇÃO

A necrose esofágica aguda (NEA), também conhecida como esôfago negro ou esofagite necrotizante, é uma síndrome rara caracterizada por uma aparência escurecida da mucosa, com comprometimento circunferencial difuso, que afeta principalmente os dois terços distais interrompendo-se abruptamente na junção gastroesofágica (a mucosa gástrica mantém-se normal).

EPIDEMIOLOGIA

A necrose esofágica aguda é uma condição rara com uma prevalência estimada de até 0,2 % em séries de autópsia. Em algumas séries de endoscopia, a prevalência da NEA variou de 0,001 a 0,2% dos casos. A incidência parece ser mais do que quatro vezes maior nos homens em comparação com as mulheres e os pacientes têm uma idade média de 68 anos no diagnóstico.

ETIOLOGIA E PATOGÊNESE

A etiologia da necrose esofágica aguda não é clara, mas a isquemia e a obstrução da saída gástrica podem ser eventos desencadeantes. Em alguns relatos tem sido associada ao uso de antibióticos de amplo espectro, infecções (por exemplo, candida albicans, citomegalovírus, vírus do herpes e klebsiella pneumoniae), volvo gástrico, hérnia paraesofágica, hiperglicemia, cetoacidose diabética, síndrome de Stevens-Johnson, vômitos intensos e prolongados, hepatite alcoólica, acidose lática e até dissecção aórtica. Ou seja, em geral são pacientes com quadro clínico bastante debilitado e com risco de comprometimento circulatório.

Outra hipótese para sua etiologia seria a presença de dois eventos associados, onde o inicial, um estado vascular de baixo fluxo, predisporia a mucosa à uma lesão intensa e o segundo causaria uma obstrução da saída gástrica levando à um acúmulo de líquido no estômago, o que promoveria um refluxo gastresofágico, resultando em lesão direta, e por fim, necrose. O que fortalece tal hipótese é que a redução temporária do fluxo sanguíneo esofágico pode resultar em necrose esofágica extensa que se resolve rapidamente quando o fluxo é reestabelecido. Além disso, a necrose esofágica aguda tende a ocorrer no terço distal do esôfago, que é relativamente hipovascularizado em comparação com outros segmentos esofágicos. A necrose da mucosa esofágica e submucosa, com trombose microscópica e recuperação rápida após o reestabelecimento do fluxo são eventos semelhantes aos ocorridos na colite isquêmica.

MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS

Aproximadamente 70% dos pacientes com necrose esofágica aguda apresentam hemorragia digestiva alta com hematêmese e melena. Os sintomas podem aparecer rapidamente após um evento desencadeante. Outros sintomas gastrointestinais incluem: disfagia, dor epigástrica e dor torácica. Os pacientes também podem ter sintomas relacionados à  patologia subjacente a qual predispôs ao evento desencadeante inicial e apresentarem-se com sinais de sepse, incluindo taquicardia e hipotensão.

ACHADOS LABORATORIAIS

Os achados laboratoriais não são específicos e frequentemente são devidos à doença subjacente. Eles incluem: acidose lática, hipoalbuminemia, anemia, insuficiência renal e hiperglicemia.

DIAGNÓTICO

A necrose esofágica aguda é habitualmente diagnosticada incidentalmente em pacientes submetidos à endoscopia digestiva alta para avaliação de sangramento gastrointestinal. Embora a aparência endoscópica seja sugestiva, são necessárias biópsias esofágicas para excluir outras etiologias e estabelecer o diagnóstico.

Endoscopia e biópsia – Na endoscopia, é caracterizada por descoloração periférica circunferencial com tecido hemorrágico friável subjacente associado a diminutos pontos enegrecidos, e também por uma delimitação precisa entre a mucosa esofágica e a gástrica, a qual tem aparência normal distalmente à junção gastroesofágica.

Geralmente envolve o terço distal do esôfago, embora o envolvimento proximal tenha sido descrito. À medida que a doença progride, o esôfago pode ficar parcialmente coberto com exsudatos brancos espessos que são descolados facilmente revelando um tecido de granulação rosa. Esses exsudatos provavelmente representam células mucosas espalhadas.

As biópsias servem para diferenciar a necrose de outras condições nas quais a mucosa também pode estar escurecida e também para descartar causas infecciosas, como por exemplo, candida albicans, citomegalovírus, vírus herpes simples e klebsiella pneumoniae.

Na histologia, há necrose extensa comprometendo a mucosa e a submucosa. Inflamação e destruição parcial de fibras musculares adjacentes podem ocasionalmente ser observadas, e os vasos sanguíneos às vezes são trombosados e/ou ocluídos.

DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL

O diagnóstico diferencial inclui outras condições em que a mucosa esofágica também pode estar escurecida. A necrose esofágica aguda pode ser diferenciada destas condições pela história clínica e pela biópsia.

  • Melanose – melanose esofágica tem sido descrita em pacientes com esofagite crônica subjacente. É mais comumente observada no esôfago distal. Em contraste com a necrose esofágica aguda, a descoloração é frequentemente focal. As biópsias revelam melanócitos com características de coloração de pigmento semelhantes à melanina.
  • Pseudomelanose – A pseudomelanose é devida à deposição de tecido de pseudomelanina, um pigmento derivado da degradação lisossômica. Na histologia, um pigmento marrom composto por lipofuscina e melanina pode ser visualizado dentro dos macrófagos.
  • Melanoma – O melanoma primário do esôfago é raro. Geralmente se origina no esôfago médio e distal e tem uma aparência polipoide. O diagnóstico é feito pela presença de atividade melanocítica juncional na avaliação histológica da mucosa esofágica.
  • Acantose nigricans – é caracterizada por placas de aspecto aveludado, verrucoso e hiperpigmentado. Embora possa ser benigno, também pode ser um fenômeno paraneoplásico comumente associado a neoplasias malignas intra-abdominais.
  • Resíduo de carvão – O pó de carvão ou o carbono é o pigmento exógeno mais comum a ser depositado nos tecidos do corpo humano. O mecanismo pelo qual o pó de carvão é depositado no esôfago não está claro.
  • Ingestão cáustica – O dano esofágico grave causado pela ingestão de agentes corrosivos pode provocar desprendimento da mucosa e uma pigmentação preta da parede esofágica. Tais pacientes podem apresentar um histórico de ingestão cáustica e podem ter queimaduras orofaríngeas associadas.
  • Esofagite Pseudomembranosa – geralmente é relatada em associação com graves doenças sistêmicas. Uma membrana concêntrica, fina, amarela ou preta, recobre os terços distais e, menos comumente, o esôfago inteiro. Pode ser desalojada da parede, revelando uma mucosa subjacente friável. Na histologia, a pseudomembrana não tem membrana basal e é composta por exsudato fibrinoso e células inflamatórias misturadas.

TRATAMENTO

Existem dados limitados para orientar o manejo da necrose esofágica aguda, e o gerenciamento de tal condição é amplamente baseado na experiência clínica.

A terapêutica inicial consiste em expansão de volume com fluidos intravenosos e tratamento da doença de base. A supressão do acidez gástrica com inibidores de bomba de prótons deve ser adotada para reduzir a lesão péptica adicional. A ingestão oral deve ser evitada por pelo menos 24 horas. O uso da suspensão de sucralfato deve ser considerado pelo seu papel na prevenção de lesão esofágica péptica associada.

As sondas nasogástricas ou nasoenterais devem ser evitadas, a menos que sejam usadas afim de descomprimir uma obstrução da saída gástrica ou se houver vômito persistente. Uma decisão sobre o uso de antimicrobiano e/ou antifúngico deve ser feita individualmente, especialmente na configuração de pacientes que estão criticamente doentes ou parecem estar sépticos.

HISTÓRIA NATURAL

Com cuidados de suporte, a resolução dos achados endoscópicos ocorre na maioria dos pacientes. No entanto, as taxas de mortalidade em pacientes com necrose esofágica aguda variam de 13 a 35%. A mortalidade é em grande parte devido à doença de base, sendo que apenas 6% das mortes são diretamente atribuíveis à complicações da NEA.

COMPLICAÇÕES

  • Perfuração esofágica – A perfuração esofágica é uma complicação aguda da necrose esofágica que ocorre em menos de 7% dos pacientes, mas requer intervenção urgente dada a alta mortalidade associada. A presença de dor retroesternal ou lombar severa persistente pode indicar seu aparecimento. Pacientes com perfuração esofágica podem ter crepitação à palpação da parede torácica devido à presença de enfisema subcutâneo.
  • Estenose esofágica – As estenoses esofágicas são complicações à longo prazo da necrose esofágica aguda e ocorrem em 25 a 40 % dos pacientes. Os pacientes com estenoses geralmente apresentam disfagia gradualmente progressiva e habitualmente requerem dilatação endoscópica.

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Confira também: Esofagite por cândida – Kodsi

Bibliografia

1. Worrell SG, Oh DS, Greene CL, et al. Acute esophageal necrosis: A cases series and long term follow-upAnn Thorac Surg. 2014;98(1):341–2. [PubMed]
2. Kimura Y, Seno H, Yamashita Y. A case of acute necrotizing esophagitisGastrointestinal Endosc. 2014;80(3):525–526. [PubMed]
3. Gurvitis GE, Cherian K, Shami MN, et al. Black esophagus: New insights and multicenter international experience in 2014Dig Dis Sci. 2015;60(2):444–453. [PubMed]
4. Altenburger DL, Wagner AS, Li S, Garavaglia J. A case of black esophagus with histopathologic description and characterizationArch Pathol Lab Med. 2011;135(6):797–8. [PubMed]
5. Grudell AB, Mueller PS, Viggiano TR. Black esophagus: Report of six cases and review of the literature, 1963–2003Dis Esophagus. 2006;19(2):105–110. [PubMed]
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7. Garas G, Wou C, Sawyer J, et al. Acute oesophageal necrosis syndromeBMJ Case Reports. 2011:bcr1020103423. [PMC free article] [PubMed]
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Quando devemos associar betabloqueador à nossa ligadura elástica?

 

Hemorragia digestiva alta (HDA) por varizes esofágicas (VE) é uma grave complicação da hipertensão portal, sobretudo em pacientes com cirrose hepática e outra descompensação da doença, como ascite, encefalopatia ou icterícia (1).

O risco de sangramento em pacientes com cirrose em seguimento por 1 ano é estimado em cerca de 12%, com mortalidade de até 30%. Por outro lado, a chance de ressangramento nos pacientes sem tratamento pode atingir 70%, com mortalidade semelhante à do primeiro episódio (1,2). Dessa forma, a prevenção adequada da HDA varicosa constitui um dos principais objetivos na abordagem da hipertensão portal desde o surgimento das primeiras estratégias de tratamento (2).

Os betabloqueadores não seletivos (BBNS) são muito eficazes nos diferentes estágios da cirrose hepática. Dados recentes sugerem que, em pacientes com cirrose compensada, podem reduzir a incidência de complicações clínicas (3). Em pacientes com VE de alto risco para sangramento (médio ou grosso calibre ou finas com sinais da cor vermelha e/ou Child B ou C), reduzem significativamente a incidência do primeiro sangramento. Naqueles com HDA varicosa prévia, previnem a recorrência do sangramento, em associação à ligadura elástica (LE), sendo que o mais importante componente dessa associação é a terapia farmacológica (3).

Com relação à profilaxia primária, as recomendações mais recentes mantem o uso de BBNS ou ligadura elástica (LE) como primeira opção. A escolha, nesse caso, baseia-se nos recursos disponíveis, na experiência do centro de tratamento e na preferência e características do paciente (4,5,6). Por outro lado, alguns estudos avaliaram o benefício da associação de BBNS à ligadura elástica na prevenção do primeiro sangramento em comparação à ligadura elástica isolada.

  • O primeiro, publicado por Sarin e col. em 2005, incluiu 144 pacientes, sendo 72 para LE e 72 para LE associada ao propranolol. Não houve diferença na redução do sangramento ou da mortalidade entre os grupos, porém a recidiva das VE foi menor entre os pacientes que receberam a terapia combinada (7).
  • Outro estudo, mais recente, incluiu 66 pacientes, 32 para LE e 34 para LE associada ao propranolol, com resultados semelhantes (8).
  • Apesar desses e outros trabalhos mostrarem algum benefício, não está indicada, até o momento, a associação de BBNS à LE para os pacientes que nunca apresentaram HDA varicosa.

 

No que diz respeito à profilaxia secundária, não há dúvidas quanto à recomendação de associar-se BBNS à LE (4,5,6). A pergunta é: devemos fazê-lo em todos os pacientes?

  • Reconhecidamente, alguns pacientes (cerca de 15% dos cirróticos) apresentam contraindicação ao uso da medicação.
  • São consideradas contraindicações: Asma ou DPOC, doença vascular periférica, bloqueios cardíacos, insuficiência cardíaca descompensada, diabetes insulinodependente (com episódios de hipoglicemia) e alergia.
  • Além disso, outros 15% dos pacientes com cirrose apresentam intolerância até mesmo a doses mínimas da medicação devido eventos adversos, tais como: broncoespasmo, fadiga, disfunção sexual e dispneia (3).

 

A grande discussão nos últimos anos, envolve o risco do uso de BBNS em pacientes com cirrose e doença hepática avançada. O racional seria o fato dos BBNS reduzirem o débito cardíaco. Pacientes com cirrose e ascite refratária são muito dependentes do débito cardíaco para manter uma pressão arterial média (PAM) adequada. Dessa forma, BBNS poderiam ocasionar piora da perfusão renal e síndrome hepatorrenal, uma condição de alta mortalidade (3).

Inicialmente, Sersté e col. observaram aumento da mortalidade associada ao uso de BBNS em pacientes com ascite refratária, o que levantou essa discussão (9). Um estudo subsequente não confirmou esses resultados, mas mostrou maior mortalidade associada ao uso de BBNS em pacientes com peritonite bacteriana espontânea (PBE) (10). Notadamente, em ambos, os pacientes em uso de BBNS apresentavam PAM significativamente mais baixa que os demais.

Contudo, diversos outros estudos desde então não repetiram esses resultados.  Uma metanálise concluiu que o uso de BBNS não está associado ao aumento na mortalidade de pacientes com cirrose e ascite ou ascite refratária. Além disso, observou-se que, nos trabalhos que apresentaram efeitos deletérios significativos dos BBNS, havia diferença relevante na PAM entre os que usavam ou não a medicação (3, 11).

Portanto, a tendência é evitar associação de BBNS à LE em pacientes com cirrose hepática e pressão arterial baixa (PAS < 90 mmHg), principalmente na presença de ascite volumosa, ascite refratária ou PBE prévia. Esses achados refletem-se nas últimas recomendações quanto às doses da medicação:

  • pacientes sem ascite – dose máxima de propranolol 320 mg/dia e de nadolol 160 mg/dia;
  • pacientes com ascite – dose máxima de propranolol 160 mg/dia e de nadolol 80 mg/dia (4,5,6).

 

Em resumo:

  • não devemos associar BBNS à LE em pacientes com cirrose para profilaxia primária do sangramento varicoso.
  • No caso da profilaxia secundária, a medicação é fundamental e aparece como o mais importante componente dessa associação, porém não deve ser usada em pacientes com contraindicação ou intolerância.
  • Atenção deve ser dada à monitorização dos parâmetros hemodinâmicos do paciente, em especial, aqueles com ascite volumosa, ascite refratária ou PBE prévia. Nesses pacientes, o uso da medicação deve ser visto com cautela e em doses mais baixas.
  • Pressão arterial baixa (PAS < 90 mmHg) está associada a complicações, como síndrome hepatorrenal e, nesse caso, a medicação deve ser descontinuada.

 

REFERÊNCIAS:

  1. Garcia-Tsao G, Bosch J. Management of varices and variceal hemorrhage in cirrhosis. N Engl J Med 2010;362:823-32.
  2. Baiges A et al. Pharmacologic prevention of variceal bleeding and rebleeding. Hepatol Int. 2017.
  3. Garcia-Tsao G. The Use of nonselective betablockers for treatment of portal hypertension. Gastroenterol Hepatol. 2017;13(10):617-619.
  4. de Franchis R; Baveno V Faculty. Expanding consensus in portal hypertension. Report of the Baveno VI Consensus Workshop: stratifying risk and individualizing care for portal hypertension. J Hepatol. 2015;63:743-52.
  5. Garcia-Tsao G, Abraldes JG, Berzigotti A, Bosch J. Portal hypertensive bleeding in cirrhosis: Risk stratification, diagnosis, and management: 2016 practice guidance by the American Association for the study of liver diseases. 2017;65:310-35.
  6. Bittencourt PL et al. Variceal Bleeding: Update of Recomendations from the Brazilian Association of Hepatology. Arq Gastroenterol 2017;54(4):349-355.
  7. Sarin et al. Endoscopic variceal ligation plus propranolol versus endoscopic variceal ligation alone in primary prophylaxis of varicela bleeding. Am J Gastroenterol 2005;100:797-804.
  8. Bonilha DQ et al. Propranolol associated with endoscopic band ligation reduces recurrence of esophageal varices for primary prophylaxis of variceal bleeding: a randomized-controlled trial. Eur J Gastroenterol Hepatol 2015;27(1):84-90.
  9. Sersté et al. Deleterious effects of beta-blockers on survival in patients with cirrhosis and refractory ascites. Hepatology 2010;52(3):1017-22.
  10. Mandorfer M et al. Nonselective β blockers increase risk for hepatorenal syndrome and death in patients with cirrhosis and spontaneous bacterial peritonitis. Gastroenterology 2014; 146(7):1680-90.
  11. Chirapongsathorn, S. et al. Nonselective β-Blockers and Survival in Patients With Cirrhosis and Ascites: A Systematic Review and Meta-analysis. Clin Gastroenterol Hepatol 2016;14(8):1096-1104.



Estenose biliar pós transplante hepático

  

As complicações biliares pós-transplante hepático podem ocorrer em 6-40% dos pacientes, sendo mais frequentes após o transplante intervivos.

Elas podem ser precoces, ocorrendo nas primeiras 4 a 6 semanas (fístulas, biloma, estenoses  e deiscência por necrose da anastomose biliar); ou tardias (fístulas, estenoses, colangite, coledocolitíase, cálculos, cast syndrome, disfunção do esfíncter de Oddi, mucocele, doença biliar recidivante).

As estenoses biliares pós-transplante hepático podem ainda ser classificadas em anastomóticas (Figura 1) e não anastomóticas (Figura 2). Suas características estão descritas na Tabela 1.

Figura 1 – Aspecto colangiográfico de estenose anastomótica após transplante hepático de doador cadáver.

Figura 2 – Aspecto fluoroscópico de estenose não anastomótica (doador cadáver), acometendo o hilo hepático, associada à fístula biliar

Tabela 1: Características das estenoses biliares anastomóticas e não anastomóticas pós transplante hepático.

Estenoses anastomóticas Estenoses não anastomóticas
Incidência

 

Doador cadáver: 5 – 15%

Intervivos (Figura 3): 19 – 40%

5 -15%
Característica Isoladas

Curtas em extensão

Múltiplas, longas

Ductos intra-hepáticos

Ducto do doador

Apresentação 1o ano após transplante

(5 a 8 meses)

Etiologia isquêmica: 3-6 meses

Etiologia imunológica: > 1 ano

Fatores de risco Questões técnicas

 

Fístula biliar

Lesões isquêmicas: trombose da artéria hepática, parada cardíaca, isquemia (quente ou fria), condições de preservação ou lesão de reperfusão

 

Lesões imunológicas: rejeição ductopênica, incompatibilidade ABO, polimorfismo de genes, doenças imunomediadas pré-existentes no receptor

 

Outros: infecção CMV e recidiva viral (HBV ou HCV)

Quadro clínico Assintomáticos (alterações laboratoriais)

 

Sintomas inespecíficos: prurido, anorexia, icterícia e febre

 

Dor ausente (imunossupressão e denervação hepática)

Assintomáticos (alterações laboratoriais)

 

Sintomas inespecíficos: prurido, anorexia, icterícia e febre

 

Dor ausente

 

Maior acúmulo de barro biliar: episódios recorrentes de colangite e formação de casts*

Diagnóstico Exames laboratoriais: AST, ALT, bilirrubinas, FAL e  δGT Exames laboratoriais: AST, ALT, bilirrubinas, FAL e  δGT
USG abdominal com Doppler: exame inicial (sensibilidade 38 a 66%) USG abdominal com Doppler: exame inicial (sensibilidade 38 a 66%)
CPRM: acurácia de 95% CPRM: acurácia de 95%

Aspecto radiológico remete à colangite esclerosante primária devido à presença de estenoses múltiplas e extensas

Biópsia hepática Excluir rejeição se alterações dos exames de bioquímica, sem dilatação comprovada da via biliar

* casts: descamação epitelial em molde, CPRM: colangiopancreato ressonância magnética

 

Figura 3 – Paciente transplantado hepático (doador vivo), com estenose complexa, anastomótica e não anastomótica, com lesões acometendo difusamente a via biliar intra-hepática.

 

A estenose biliar também é descrita no doador vivo, com incidência de 0,4% e 6%. É mais frequente quando o lobo hepático direito é utilizado. Os fatores de risco incluem a fístula biliar, idade avançada e o calibre do ducto biliar (< 4 mm). O quadro clínico é inespecífico, podendo haver colestase.

 

TRATAMENTO

Na última década, medidas não operatórias se tornaram a opção terapêutica de primeira linha para as complicações biliares pós transplante hepático. Nos pacientes com anastomose ducto-ducto a colangiografia retrógrada endoscópica (CRE) é a escolha inicial.

O tratamento endoscópico pode ser realizado por meio da dilatação com balão hidrostático ou dilatadores de passagem, seguida da colocação de uma ou mais próteses plásticas, ou ainda, mais recentemente, da prótese metálica autoexpansível totalmente coberta (PMAEC). Na presença de lesões da artéria hepática (insuficiência ou obstrução), estas devem ser abordadas durante o curso do tratamento.

A terapêutica com próteses plásticas múltiplas consiste na dilatação hidrostática da estenose seguida da colocação do maior número de próteses plásticas possível. Os pacientes devem ser submetidos à sessões repetidas, no prazo médio de três meses, para prevenção da oclusão, colangite e formação de cálculos. Todas as próteses devem ser retiradas, a estenose deve ser dilatada e um número progressivamente maior de próteses (Figura 4A e B) deve ser utilizado a cada troca, com objetivo de alcançar o maior diâmetro possível. O tratamento é completado em um ano e a maioria dos pacientes deve precisar de quatro a cinco procedimentos nesse período.

A terapia com prótese metálica totalmente coberta consiste na colocação de uma única PMAEC (Figura 5) após esfincterotomia biliar, sem necessidade de dilatação na maioria das vezes. O tempo de permanência ideal da prótese metálica ainda não está completamente definido. Os resultados do tratamento são favoráveis quando ela é mantida por período superior à 3 meses, não havendo comprovação à respeito do benefício da sua permanência por mais de 6 meses.

Figura 4 – Aspecto radiológico (A) e endoscópico (B) da estenose anastomótica (doador cadáver) tratada com dilatação hidrostática e colocação de próteses plásticas múltiplas.

Figura 5 – Aspecto colangiográfico da PMAE totalmente coberta liberada evidenciando discreta compressão (seta), que corresponde ao ponto da estenose anastomótica.

 

Tabela 2: Comparação do tratamento com próteses plásticas múltiplas e prótese metálica auto-expansível totalmente coberta no tratamento das estenoses biliares pós transplante hepático.

  Próteses plásticas múltiplas PMAEC
Tempo de tratamento 12 meses ± 6 meses
Número de procedimentos 4 a 5 2
Taxa de sucesso

Estenose anastomótica

 

 

Doador cadáver: 82 a 98%

 

Doador vivo: 60 a 75%

 

87,5 a 100%
Taxa de sucesso

Estenose não anastomótica

 

Doador cadáver: 50 a 75%

 

Doador vivo: 25 a 33%

 

Não está indicada.
Taxa de complicações 4 a 16% 14,5 a 18%
Migração 5 a 33,3% 4 a 46,7%
Recidiva 0 a 34% 4,5 47,4%
Custo (6) US$ 16.095 US$ 6.903

PMAEC: prótese metálica auto-expansível totalmente coberta

 

Nos pacientes com estenose grave da anastomose direta ducto-ducto e falha no acesso profundo retrógrado à via biliar é possível a realização do procedimento combinado, com punção biliar percutânea ou guiada por EUS, seguida da terapia endoscópica rendez-vous. A colangioscopia direta também é uma ferramenta disponível para a transposição da estenose em caso de insucesso, com custo inferior ao das duas opções citadas anteriormente (Figura 6).

O tratamento cirúrgico fica reservado para os casos de insucesso da intervenção endoscópica ou radiológica e consiste na conversão da reconstrução para derivação biliar ou em casos extremos, o re-transplante.

Figura 6 – Aspecto colangioscópico da passagem do fio guia pelo orifício da estenose da anastomose biliar.

 

Referências Bibliográficas

  1. Costamagna G, Tringali A, Mutignani M, Perri V, Spada C, Pandolfi M et al. Endotherapy of postoperative biliary strictures with multiple stents: results after more than 10 years of follow-up. Gastrointest Endosc. 2010;72:551-557.10.1016/j.gie.2010.04.052.20630514.
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  4. Coté GA, Slivka A, Tarnasky P, Mullady DK, Elmunzer BJ, Elta G et al. Effect of Covered Metallic Stents Compared With Plastic Stents on Benign Biliary Stricture Resolution: A Randomized Clinical Trial. JAMA. 2016;315:1250-1257.10.1001/jama.2016.2619.27002446.
  5. Martins FP, Ferrari AP. Cholangioscopy-assisted guidewire placement in post-liver transplant anastomotic biliary stricture. Endoscopy 2018;49:E283-E284. 10.1055/s-0043-117940
  6. Martins FP, De Paulo GA, Contini MLC, Ferrari AP. Metal versus plastic stents for anastomotic biliary strictures after liver transplantation: a randomized controlled trial. Gastrointest Endosc. 2018;87:131e1-131e13. 10.1016/j.gie.2017.04.013.
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Como citar esse artigo:

Martins FP. Estenose biliar pós transplante hepático. Endoscopia Terapêutica; 2018. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/assuntosgerais/estenose-biliar-transplante-hepatico/