Hemostasia com cateter bipolar

Paciente masculino, 78 anos, admitido por HDA. Após condutas para estabilização hemodinâmica, foi submetido à endoscopia digestiva alta. O exame demonstrou na pequena curvatura do corpo gástrico proximal uma grande úlcera com sinais de sangramento recente e coto vascular visível.

 

Nesta situação, quais métodos a serem usados para hemostasia?

A escleroterapia com adrenalina era uma escolha certa. Mas, tendo em vista os melhores resultados com terapia combinada, ficou a dúvida qual o segundo método a ser utilizado. Logo ficou claro que o clipe não seria a melhor opção pois a úlcera era muito grande, com bordas endurecidas e o clipe não iria conseguir aproximar as bordas. Se o clipe fosse usado diretamente no vaso, provavelmente, não ficaria bem aderido pois a base da úlcera estava muito friável e teria o risco de aumentar a ruptura do vaso.

A ideia foi usar algum método térmico, sendo as opções a coagulação com plasma de argônio ou a hemostasia com cateter bipolar. O argônio não funciona bem em superfície que tem líquido, forma muitos debris que aderem ao cateter. Além disso, a coagulação é superficial e seria insuficiente para a hemostasia mais profunda para um vaso como este.

O cateter bipolar (Injection Gold Probe – Boston Scientific) pareceu ser a melhor opção. Esse cateter combina a possibilidade de realizar a escleroteria e a hemostasia térmica com o mesmo acessório. Foi usado através de compressão no foco exato a ser hemostasiado e com potência de 30 W no modo coagulação. O efeito imediato foi muito bom, não precisando ser aplicado novamente.

O tratamento foi complementado com injeção de solução de adrenalina ao redor do vaso rompido. O aspecto foi satisfatório e, após a hemostasia, não houve ressangramento imediato nem tardio.

Eletrocoagulação bipolar

O cateter bipolar e o cateter multipolar geram energia térmica completando um circuito elétrico entre 2 eletrodos na ponta de uma sonda. Em contraste com o eletrocautério monopolar, o circuito é concluído localmente, por isso nenhuma base de aterramento é necessária. Como o tecido-alvo desidrata, há uma diminuição da condutividade elétrica, limitando a temperatura máxima (100 °C), profundidade e extensão da lesão do tecido. O pedal controla a entrega de energia, e a potência de saída é em watts (W). Configurações de potência máxima dependem do gerador usado, mas geralmente não excedem 50 W. A configuração padrão é 20 W.

A sonda bipolar consiste em bandas alternadas de eletrodos que produzem um campo elétrico que aquece a mucosa e o vaso. Os eletrodos são revestidos com ouro para reduzir a adesividade ao tecido. As sondas são rígidas a fim de permitir que uma pressão adequada seja aplicada para comprimir e selar as paredes do vaso sangrante (“coagulação coaptiva”) enquanto a energia do campo elétrico é transmitida. A sonda pode ser usada tangencialmente ou perpendicularmente na fonte de sangramento.

Como citar este artigo:

Salles FP. Hemostasia com cateter bipolar. Endoscopia Terapêutica; 2021. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/assuntosgerais/hemostasia-com-cateter-bipolar

Referência bibliográfica

  1. BIANCO, Maria Antonia; ROTONDANO, Gianluca; MARMO, Riccardo; PISCOPO, Roberto; ORSINI, Luigi; CIPOLLETTA, Livio. Combined epinephrine and bipolar probe coagulation vs. bipolar probe coagulation alone for bleeding peptic ulcer: a randomized, controlled trial. Gastrointestinal Endoscopy, [S.L.], v. 60, n. 6, p. 910-915, dez. 2004. Elsevier BV. http://dx.doi.org/10.1016/s0016-5107(04)02232-1.
  2. MORRIS, Marcia L; TUCKER, Robert D; BARON, Todd H; SONG, Louis M Wong Kee. Electrosurgery in Gastrointestinal Endoscopy: principles to practice. The American Journal Of Gastroenterology, [S.L.], v. 104, n. 6, p. 1563-1574, 21 abr. 2009. Ovid Technologies (Wolters Kluwer Health). http://dx.doi.org/10.1038/ajg.2009.1
  3. PARSI, Mansour A.; SCHULMAN, Allison R.; ASLANIAN, Harry R.; BHUTANI, Manoop S.; KRISHNAN, Kuman; LICHTENSTEIN, David R.; MELSON, Joshua; NAVANEETHAN, Udayakumar; PANNALA, Rahul; SETHI, Amrita. Devices for endoscopic hemostasis of nonvariceal GI bleeding (with videos). Videogie, [S.L.], v. 4, n. 7, p. 285-299, jul. 2019. Elsevier BV. http://dx.doi.org/10.1016/j.vgie.2019.02.004.
  4. CONWAY, Jason D.; ADLER, Douglas G.; DIEHL, David L.; FARRAYE, Francis A.; KANTSEVOY, Sergey V.; KAUL, Vivek; KETHU, Sripathi R.; KWON, Richard S.; MAMULA, Petar; RODRIGUEZ, Sarah A.. Endoscopic hemostatic devices. Gastrointestinal Endoscopy, [S.L.], v. 69, n. 6, p. 987-996, maio 2009. Elsevier BV. http://dx.doi.org/10.1016/j.gie.2008.12.251.

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Curiosidades sobre o Helicobacter pylori

Introdução

  • O Helicobacter pylori (HP) acomete aproximadamente metade da população mundial, sendo uma das principais infecções crônicas do ser humano.
  • Detentor de um vasto repertório genético, o HP é capaz de adaptar-se às mais diversas situações impostas pelo hostil ambiente gástrico.
  • Embora intimamente associado aos humanos há muitos séculos, foi descoberto apenas em 1982 por Warren e Marshall, rendendo a eles o prêmio Nobel. [2]
  • Identificado inicialmente como Campylobacter pyloridis, mais tarde fora reclassificado como Helicobacter pylori. [1]
  • A infecção é, geralmente, adquirida na primeira infância com forma de transmissão ainda não estabelecida, mas, provavelmente, fecal-oral e/ou oral-oral. [3]

Características

  • Definido como um bacilo microaerofílico, gram-negativo, de crescimento indolente, mede aproximadamente 3,5 x 0,5 μm.
  • Morfologicamente, apresentam-se sob duas formas, uma bacilar espiralada e outra cocóide. [2]
  • A microscopia eletrônica revela que o HP tem 2 a 7 flagelos munidos de bainha unipolar que aumentam a sua mobilidade por meio de soluções viscosas. Essa propriedade permite que se estabeleça nas porções mais profundas do gel mucoso que reveste a mucosa gástrica, onde as condições de pH são mais favoráveis. [2]
  • O HP coloniza exclusivamente o epitélio gástrico, com a capacidade de fixar-se ao epitélio, porém, em circunstâncias normais, parece não invadir essas células. [3]

Figura 1

Quando submetido a fatores estressores, como escassez de nutrientes, condições desfavoráveis de temperatura, pH e substâncias tóxicas, o HP muda sua conformação habitual bacilar para cocóide. Nesta forma de adaptação, o HP admite um estado viável, mas não cultivável. Essa transição de conformação é responsável, em parte, pela resistência aos antibióticos. [4]

Figura 2

 

  • A capacidade de produzir urease, uma enzima que catalisa a degradação da uréia em amônia e CO2, permite a alcalinização do pH circundante. (Para saber mais sobre o teste da urease confira este post.)
  • O repertório genético determina fatores patogênicos, capazes de facilitar a adesão ao epitélio gástrico, induzir lesão mucosa e evitar as defesas do hospedeiro. [5]

Relação entre HP e inibidor de bomba de próton (IBP)

  • O inibidor de bomba de prótons (IBP) tem potencial efeito bactericida, bacteriostático e reduz a atividade da urease do HP.
  • Os métodos dependentes da quantidade de bactérias (histológico, teste respiratório, antígeno fecal) e da atividade da urease (teste da urease) são negativamente influenciados após o uso do IBP.
  • Por isso, na prática clínica, recomendamos a suspensão dos IBP por 14 dias antes de qualquer teste diagnóstico, exceto sorologia.
  • Da mesma forma, orienta-se a suspensão dos antibióticos e sais de bismuto por 30 dias. [6]

Pesquisa do HP pelo método histológico

Em busca do melhor ambiente para desenvolver-se, o HP, normalmente, inicia seu ciclo de vida no antro, onde condições de pH e nutrientes são mais favoráveis, e, eventualmente, migra para o corpo. Essas formas de acometimento são, atualmente, atribuídas ao somatório de fatores ambientais, de virulência e do hospedeiro.

  1. Disposição predominante antral, hipergastrinemia, hipersecreção de ácido e predisposição a úlcera duodenal.
  2. Migração do antro para o corpo gástrico, redução da produção ácida, evolução com gastrite atrófica, metaplasia intestinal, úlcera gástrica e câncer.

A utilização do método histológico com apenas uma biópsia do antro é razoável para a maioria dos casos. Entretanto, nos pacientes com atrofia e metaplasia, devemos associar com biópsia do corpo gástrico. Por isso, de forma geral realizamos biópsias do corpo e do antro.

A realização de duas biópsias do corpo e duas do antro confere um aumento de positividade das biópsias entre 10–15%, entretanto, não há estudos comprovando se essa prática é custo-efetiva. [7]

Como citar este artigo:

Júnior EAA. Curiosidades sobre o Helicobacter pylori. Endoscopia Terapêutica; 2021. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/assuntosgerais/curiosidades-sobre-o-helicobacter-pylori

Referências

  1. Warren JR. Helicobacter: the ease and difficulty of a new discovery (Nobel lecture). ChemMedChem. 2006;1(7):672-85.
  2. Goodwin CS, Worsley BW. Microbiology of Helicobacter pylori. Gastroenterology clinics of North America. 1993;22(1):5-19
  3. Cover TL, Blaser MJ. Helicobacter pylori in health and disease. Gastroenterology. 2009;136(6):1863-73.
  4. Kadkhodaei, Sara; Siavoshi, Farideh; Akbari Noghabi, Kambiz (2019). Mucoid and coccoid <i>Helicobacter pylori</i> with fast growth and antibiotic resistance. Helicobacter, (), –. doi:10.1111/hel.12678 
  5. Amieva MR, El-Omar EM. Host-bacterial interactions in Helicobacter pylori infection. Gastroenterology. 2008;134(1):306-23.
  6. Coelho LGV, Marinho JR, Genta R, Ribeiro LT, Passos MCF, Zaterka S, Assumpção PP, Barbosa AJA, Barbuti R, Braga LL, Breyer H, Carvalhaes A, Chinzon D, Cury M, Domingues G, Jorge JL, Maguilnik I,
  7. Marinho FP, Moraes Filho JP, Parente JML, Paula-e-Silva CM, Pedrazzoli Júnior J, Ramos AFP, Seidler H, Spinelli JN, Zir JV. IVth Brazilian Consensus Conference on Helicobacter pylori infection
  8. Calvet, Xavier (2015). Diagnosis of Helicobacter pylori Infection in the Proton Pump Inhibitor Era. Gastroenterology Clinics of North America, (), S0889855315000473–. doi:10.1016/j.gtc.2015.05.001
  9. Ierardi, Enzo; Losurdo, Giuseppe; Mileti, Alessia; Paolillo, Rosa; Giorgio, Floriana; Principi, Mariabeatrice; Di Leo, Alfredo (2020). The Puzzle of Coccoid Forms of Helicobacter pylori: Beyond Basic Science. Antibiotics, 9(6), 293–. doi:10.3390/antibiotics9060293

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CORPO ESTRANHO IMPACTADO NA GARGANTA: VOCÊ SABE AVALIAR?

“Doutor, estava comendo peixe e engoli uma espinha! Estou sentindo ela presa aqui na minha garganta!”

Todo endoscopista que faz plantão de sobreaviso já passou por essa situação.

Espinha de peixe e espículas de frango são os mais terríveis, pois têm grande chance de ficar impactados em algum local do trajeto (hipofaringe, esôfago, etc).

Quando pensei em escrever sobre esse assunto, o principal objetivo era familiarizar o endoscopista com o exame e a anatomia das estruturas supraglóticas, visto que, para nós, essa é uma região apenas “de passagem”. Mas também vamos recapitular o que os guidelines orientam sobre o melhor momento de realizar esse exame.

Em alguns serviços existe uma discussão a respeito de quem deveria atender a esses pacientes: endoscopistas ou os otorrinos? Já deixo aqui a minha opinião:

  • Exame físico dedicado com o otorrinolaringologista deveria ser a conduta padrão, pois é simples de realizar, pode resolver o problema rapidinho e não exige sedação;
  • Caso o otorrino não encontre a espinha impactada em nenhum lugar acessível, o exame endoscópico estaria indicado;

Mas nem sempre temos o melhor dos mundos a nosso favor e, tendo a suspeita de corpo estranho impactado “na garganta”, não podemos omitir socorro ao paciente, ok?

Então, vamos lá!

O que diz o guideline da ASGE sobre ingestão de objetos pontiagudos?

Objetos pontiagudos (agulhas, ossos, palitos de dente)

  • Laringoscopia direta é uma opção para remover objetos acima do cricofaríngeo;
  • Objeto pontiagudo impactado no esôfago é uma emergência médica e deve ser retirado imediatamente;
  • A maioria dos objetos pontiagudos passam pelo TGI sem incidentes. No entanto, a chance de complicação pode chegar até 35%. Portanto, objetos pontiagudos no estômago ou duodeno proximal devem ser retirados por endoscopia.

Clique aqui para ver o guideline.

O guideline não fala a respeito de jejum em cada situação, mas deixo aqui a minha opinião:

  • Suspeita de impactação acima do cricofaríngeo: melhor esperar jejum (ou fazer com anestesia tópica, mas nem sempre o paciente colabora);
  • Suspeita de impactação no esôfago: emergência médica! Exame imediato!
  • Sem suspeita de impactação no esôfago: exame assim que completar o jejum.

Anatomia da laringe

Figura 1: visão endoscópica da laringe. Epiglote parcialmente visualizada.

Exame endoscópico

Paciente jovem, feminina, refere ingestão de corpo estranho (osso de frango) há 2 dias. Refere dor na garganta e suspeita que o osso de frango está impactado em algum lugar. 

Para ser honesto, com essa história arrastada de 2 dias e poucos sintomas, meu palpite era que eu não iria achar nada no local. Mesmo assim, procedemos com o exame cuidadoso.

 

Figura 2: exame do esôfago e coto gástrico normal.

Figura 3: laringe, seio piriforme esquerdo e direito.

Figura 4: epiglote, pilar amigdaliano direito e tonsila direita.

 

Até agora, nada. Porém, cumpre lembrar que a endoscopia digestiva alta não é o exame adequado para estudar essa região. O relaxamento da musculatura, devido à sedação e ao posicionamento do paciente, dificulta o exame adequado. Por isso, sempre recomendamos realizar um exame com auxílio de um cap acoplado à extremidade do aparelho antes de concluir que está tudo bem.

 

Figura 5: exame com auxílio de cap. Visualização da epiglote e da valécula (região atrás da epiglote).

Figura 6: exame da tonsila esquerda como auxílio de cap e identificação de corpo estranho.

Figura 7: vista ampliada do “danado”.

Figura 7: vista ampliada do “danado”.

Figura 8: retirada do corpo estranho com pinça de biópsia.

Figura 8: retirada do corpo estranho com pinça de biópsia.

 

Como viram, devemos procurar com muita atenção um possível corpo estranho nessa região, realizando exame da orofaringe e hipofaringe com muito cuidado e lembrar sempre do uso do cap. Cuidado com conclusões precipitadas!

Como citar este artigo:

Martins BC. CORPO ESTRANHO IMPACTADO NA GARGANTA: VOCÊ SABE AVALIAR?. Endoscopia Terapêutica; 2021. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/assuntosgerais/corpo-estranho-impactado-na-garganta-voce-sabe-avaliar

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Barrett, endoscopia e as inúmeras possibilidades de abordagem/manejo

1. Introdução

O esôfago de Barrett é a única lesão pré-maligna identificável do adenocarcinoma esofágico. Dados epidemiológicos dos EUA revelaram uma incidência de 18.174 casos de câncer de esôfago em 2014, sendo 60% por adenocarcinoma, com uma sobrevida em 5 anos de apenas 15–20%. [1,2]

A terapêutica endoscópica mudou o manejo dos pacientes com Barrett, possibilitando tratamento eficaz e minimamente invasivo.

2. Indicações de tratamento endoscópico

De uma forma geral, está indicado no paciente com Barrett com displasia ou com adenocarcinoma intramucoso.

Abaixo, a tabela expõe as últimas recomendações das principais sociedades americanas e europeias sobre as estratégias de vigilância e manejo dos pacientes com Barrett:

Antes de indicar o tratamento endoscópico nos pacientes com Barrett com displasia, recomenda-se confirmação do diagnóstico histológico por pelo menos 1 patologista especialista ou por um grupo de patologistas. Uma vez observado que a revisão histológica por 1 especialista acarretou mudança no resultado do AP em 55% (maior parte das vezes em downgrading). [3]

Estratégias de tratamento

As estratégias se dividem em 2, a depender da presença ou não de lesão endoscopicamente visível:

  • Barrett com displasia sem lesão visível: terapia ablativa;
  • Barrett com displasia e com lesão visível: ressecção endoscópica da lesão visível, seguida da terapia ablativa do Barrett remanescente.

A ressecção das lesões visíveis fornece um correto estadiamento histológico e, consequentemente, direciona o correto intervalo de vigilância, com mudança no AP inicial em 39% (maior parte das vezes em upgrading na displasia/neoplasia). [3]

Ressecção endoscópica da lesão visível, seguida da terapia ablativa do Barrett remanescente

Técnicas de ressecção endoscópica

As principais técnicas são a mucosectomia com multibandas (multiband mucosectomy) e a mucosectomia com auxílio do Cap (Cap technique). Ambas apresentam eficácia e segurança semelhantes. Estudo com 2.513 mucosectomias em pacientes com Barrett demonstrou taxa de sangramento de 1,2%, estenose 1%, e nenhuma perfuração. [4]

A seguir link com vídeo da técnica de ressecção com multibandas: CLIQUE AQUI

Papel da dissecção endoscópica da submucosa (ESD)

Para os casos específicos de Barrett, o estadiamento histológico e de profundidade parecem ser os parâmetros mais importantes para guiar o manejo dos pacientes. Diferentemente de outras condições neoplásicas, não há necessidade absoluta de obtenção de margens laterais livres no Barrett. Alguns estudos demonstraram a eficácia da técnica de mucosectomia no Barrett comparado à ESD [5]:

  • ESD vs EMR;
  • > taxas de R0 (ressecção com margens laterais livres);
  • Tempo de procedimento mais prolongado;
  • Maior taxa de eventos adversos;
  • Mesma taxa de remissão de neoplasia.

A ESD tem sido reservada para os casos de lesões com componente luminal significativo, o que dificulta a apreensão pelo sistema de bandas e pelo Cap, e para as lesões com suspeita de invasão da submucosa, uma vez que se tem observado uma boa evolução dos pacientes com Barrett com adenocarcinoma com invasão da submucosa até 500 µm, tumor bem ou moderadamente diferenciado, após ESD com margens livres e ausência de invasão angiolinfática. [5]

Terapia endoscópica ablativa

A ablação por radiofrequência é o método de eleição, por sua alta segurança, eficácia e por já ter sido extensivamente validado na literatura e prática médica. Outras opções são: terapia fotodinâmica, crioterapia e ablação com plasma de argônio.

A ablação com radiofrequência (Sistema Barrx® RFA; Medtronic) promove destruição do tecido-alvo pelo calor por meio de cateteres endoscópicos com uso de gerador elétrico conectado a matrizes de eletrodos bipolares (faixa de RF: 450-500 kHz). A ablação acomete profundamente até a muscularis mucosae (500–1000 µm), a submucosa não é atingida (↓risco de hemorragia, fibrose e estenose).

Ablação com radiofrequência do esôfago de Barrett.

Ablação com radiofrequência do esôfago de Barrett.

O sucesso da terapia ablativa é definido pela erradicação completa da displasia, bem como da metaplasia intestinal, no esôfago tubular. Com estudos demonstrando taxas de sucesso de 98% após 1 ano do tratamento de pacientes com Barrett com displasia e/ou adenocarcinoma intramucoso. [6]

Eventos adversos foram observados na literatura em 8,8% dos casos, sendo o principal estenose 5,6%, seguido por sangramento 1% e perfuração 0,6%. [7]

A ablação por radiofrequência (ARF) permite a destruição do tecido-alvo desejado pelo calor. É um tratamento amplamente utilizado para a arritmia cardíaca, câncer, varizes e sangramento uterino. Quando disponível, a ARF tornou-se o tratamento padrão para o esôfago de Barrett displásico.

3. Vigilância

A vigilância deve ser empregada pois observa-se taxa de recorrência de cerca de 20% em 2 a 3 anos após sucesso. Na recorrência, observou-se que 25% apresentaram displasia e que em > 95% dos casos o tratamento endoscópico pode ainda ser estabelecido.

O intervalo de vigilância depende do grau de displasia observado antes do tratamento.

  • Displasia de alto grau/adenocarcinoma: endoscopia com biópsias (nos 4 quadrantes a cada 1 cm) de 3 em 3 meses no primeiro ano, de 6 em 6 meses no segundo ano e, depois, anualmente. [8]
  • Displasia de baixo grau: endoscopia com biópsias (nos 4 quadrantes a cada 1 cm) de 6 em 6 meses no primeiro ano e anualmente após [8]; ou endoscopia com biópsias (nos 4 quadrantes a cada 1 cm) 1 vez no ano por 2 anos e, depois, a cada 3 anos. [9]

Referências

  1. Rubenstein JH. Gastroenterology 2015.
  2. Hur C. Cancer. 2013
  3. Wani S. GIE 2018.
  4. Tomizawa Y. Am J Gastroenterol 2013.
  5. Weusten B. Endoscopy 2017.
  6. Gondrie JJ. Endoscopy 2008.
  7. Qmseya BJ. Clin Gastroenterol Hepatol 2016.
  8. Shaheen NJ. Am J Gastroenterol 2016.
  9. Wani S. Gastroenterol 2016.

Como citar este artigo:

Franco M. Barrett, Endoscopia e as inúmeras possibilidades de abordagem/manejo. Endoscopia Terapêutica; 2021. Disponível em: endoscopiaterapeutica.net/pt/assuntosgerais/barrett-endoscopia-inumeras-possibilidades-de-abordagem-manejo

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Diagnóstico moderno da DRGE: o Consenso de Lyon

A Doença do Refluxo Gastroesofágico (DRGE) é uma doença complexa, de elevada prevalência mundial, que gera um alto custo na sua investigação diagnóstica e tratamento.

Com o objetivo de determinar a indicação dos testes esofágicos para avaliação da DRGE e rever seus critérios diagnósticos, especialistas em DRGE de vários países iniciaram, em 2014, um processo de discussão e revisão da literatura, cujas constatações foram adaptadas para a prática clínica do gastroenterologista, que culminaram na elaboração deste consenso recentemente publicado.

O Consenso de Lyon avaliou os testes diagnósticos da DRGE, categorizando seus resultados como conclusivos, contrários ou inconclusivos para confirmação de DRGE. Quando os testes diagnósticos são limítrofes ou inconclusivos, parâmetros adicionais de apoio são sugeridos para complementá-los.

Em seguida, serão apresentadas suas principais conclusões.

Nota: o Consenso de Lyon foi atualizado em 2023 e você pode conferir essa atualização neste post do Gastropedia: Atualizações no diagnóstico de DRGE: Consenso de Lyon 2.0. No entanto, encorajamos a continuar a leitura deste artigo, visto que fornece a base para entendimento da sua atualização. 

Diagnóstico da DRGE

História clínica:

Os sintomas típicos de refluxo não são sensíveis nem específicos, quando comparados à evidência objetiva de DRGE definida por pHmetria ou endoscopia (sensibilidade 70%; especificidade 67%), ainda que a história seja realizada por gastroenterologista ou por meio de questionários padronizados.

Teste com inibidor da bomba de prótons (IBP):

O teste empírico com IBP em pacientes com sintomas típicos tem sensibilidade de 71% e especificidade de 44%, em comparação com a combinação de endoscopia e pHmetria para o diagnóstico de DRGE. Com sintomas atípicos, as taxas de resposta do IBP são muito mais baixas do que com sintomas típicos, diminuindo assim a utilidade dessa abordagem para o diagnóstico.

Na prática clínica, apesar da baixa especificidade e alta resposta placebo, a abordagem diagnóstica da DRGE baseada na avaliação dos sintomas e no tratamento empírico com IBP é menos dispendiosa do que testes diagnósticos e é endossada por diretrizes das sociedades de gastroenterologia.

Testes diagnósticos:

As indicações para os testes incluem falha do tratamento, incerteza diagnóstica e tratamento ou prevenção de complicações da DRGE, e sua principal função é distinguir os pacientes com carga patológica de refluxo, de hipersensibilidade mediada por refluxo e síndromes funcionais.

Endoscopia e biópsia:

Os achados da endoscopia podem ser clinicamente importantes e específicos para a DRGE, mas a endoscopia tem baixa sensibilidade diagnóstica (apenas 30% dos pacientes com pirose não tratados têm esofagite erosiva).

Critérios endoscópicos conclusivos para DRGE:

  • Esofagite de grau C ou D;
  • Esôfago de Barrett comprovado por biópsia;
  • Estenose péptica.

O grau A de LA é considerado inespecífico sendo encontrado entre 5% a 7,5% dos controles assintomáticos. Esofagite grau B LA fornece evidência adequada para o início do tratamento da DRGE, entretanto, os problemas com a variabilidade interobservadora tornam necessária a evidência adicional com pHmetria antes da indicação de cirurgia antirrefluxo.

As biópsias podem ter valor na diferenciação de DRGE não erosiva (com pHmetria positiva), da hipersensibilidade ao refluxo e pirose funcional quando avaliadas usando um protocolo histopatológico adequado. Entretanto, a ampla adoção do exame histopatológico para lesão da DRGE é dificultada pelo protocolo trabalhoso e necessidade de um patologista experiente, tendo sua aplicabilidade clínica limitada.

Monitorização ambulatorial do refluxo:

A monitorização ambulatorial do refluxo pode fornecer evidências confirmatórias de DRGE em pacientes com endoscopia normal, sintomas atípicos e/ou quando se considera cirurgia antirrefluxo.

  • A monitorização da impedâncio-pH é o padrão ouro para detecção e caracterização dos episódios de refluxo, mas é dispendiosa, não está amplamente disponível e sua interpretação é demorada.
  • Recomenda-se a monitorização do refluxo sem IBP em casos de DRGE “não comprovada” e com IBP em casos de “DRGE comprovada” (esofagite anterior de grau C ou D, Esôfago de Barrett comprovado por biópsia, estenose péptica ou Tempo de exposição ácida –TEA > 6%).
  • Quando a monitoração de refluxo é indicada em uso de IBP, a impedâncio-pH deve ser realizada, pois a maioria dos refluxos nessa situação são não ácidos.
  • Quando a monitoração de refluxo é indicada sem uso IBP, a escolha entre o monitoramento de pH baseado em cateter, o monitoramento de pH sem fio e o monitoramento por impedâncio-pH depende do custo e da disponibilidade.
  • Um TEA <4% é normal e um TEA> 6% é anormal (independentemente do tipo de monitorização do refluxo e se o estudo foi realizado com ou sem IBP).
  • Os episódios de refluxo >80/24 horas são anormais e <40 são fisiológicos na impedâncio-pHmetria realizada com ou sem IBP. O número de episódios de refluxo é uma métrica adjunta a ser usada quando o TEA é limítrofe ou inconclusivo.
  • Associação do sintoma: a combinação de um IS positivo e uma PAS (probabilidade de associação de sintoma) positiva fornece a melhor evidência de associação clinicamente relevante entre episódios de refluxo e sintomas, e pode predizer uma melhor resposta ao tratamento quando presente.
  • A medição da impedância basal da mucosa, que reflete a permeabilidade da mucosa, (usando um dispositivo por endoscopia ou durante a monitoração ambulatorial da impedâncio-pH) é uma medida adjunta para o diagnóstico de DRGE.
  • O índice de PSPW (onda peristáltica induzida pela deglutição pós-refluxo) reflete a integridade do peristaltismo primário do esôfago e, assim como a impedância basal, é uma métrica que pode aumentar o valor diagnóstico da impedâncio-pHmetria, especialmente discriminando os pacientes com DRGE daqueles com pirose funcional.

Manometria esofágica de alta resolução:

A manometria de alta resolução (MAR) é comumente indicada para o adequado posicionamento dos cateteres de pH ou impedâncio-pHmetria. Também é usada para avaliar o peristaltismo e detectar distúrbios motores que contraindiquem a cirurgia antirrefluxo.

A MAR não é útil para o diagnóstico da DRGE, mas pode fornecer informações adicionais:

  • Avaliação da função de barreira da JEG incluindo sua morfologia (tipo I a III) e de seu vigor contrátil (CI –JEG: padronização a ser estabelecida) (Figura 1);
Figura 1. Morfologia da junção esofagogástrica como descrita na MAR. Com a morfologia do tipo 1, o componente do diafragma crural (CD) é completamente sobreposto ao componente do esfíncter esofágico inferior (LES). Com a morfologia tipo 2, há separação parcial dos constituintes do EEI e CD.

  • Avaliação da função motora do corpo esofágico (contratilidade normal, ineficaz, fragmentada ou ausente) que se correlaciona com a carga de refluxo esofágico;
  • Testes adjuntos devem ser incluídos no protocolo de MAR: para avaliar a resposta contrátil (múltiplas deglutições rápidas) em pacientes com motilidade esofagiana ineficaz; para avaliar a obstrução da JEG (teste ingestão rápida de água) (Figura 2).
Figura 2. Métricas de manometria de alta resolução utilizadas na classificação motora da DRGE após uma série de deglutições repetidas (múltiplas deglutições rápidas – MRS), o DCI (contração distal integrada) aumenta em relação ao DCI médio das deglutições isoladas quando há reserva de contração.

O Consenso de Lyon sugere que todo estudo de MAR seja acompanhado por, pelo menos, um desses testes provocativos e que a classificação descrita seja destinada a ser usada em conjunto com a Classificação de Chicago.

Em resumo, uma vez que história clínica e a resposta à terapia antissecretora são insuficientes para estabelecer um diagnóstico conclusivo da DRGE isoladamente, o Consenso de Lyon propôs um modelo de análise dos testes esofágicos que serve como guia para o manejo da doença (Figura 3).

Figura 3. Interpretação dos resultados dos testes esofágicos no contexto da DRGE. Figura 3. Interpretação dos resultados dos testes esofágicos no contexto da DRGE. *EIC – espaço intercelular; MNBI – impedância basal noturna média.

Otimizando os testes de DRGE:

O Consenso de Lyon opina que o teste inicial ótimo para não respondedores ao IBP sem demonstração de DRGE por endoscopia ou pHmetria prévia é a monitorização do pH ou da impedâncio-pH realizada sem terapia antissecretora. O objetivo dessa estratégia é descartar a DRGE e redirecionar o tratamento para o desmame dos IBPs, usando neuromoduladores e/ou terapia comportamental cognitiva, conforme apropriado.

Por outro lado, o teste ideal em pacientes pouco responsivos com diagnóstico prévio da DRGE é a combinação de EDA, MAR e monitoramento de impedâncio-pH em uso de terapia com IBP duas vezes ao dia. Essa combinação de testes serve tanto para redirecionar a terapia para diagnósticos alternativos quanto para identificar os pacientes com baixa depuração esofágica, episódios excessivos de refluxo e hipersensibilidade, cada um dos quais podendo desencadear opções específicas de tratamento.

Considerações finais:

Por fim, o Consenso de Lyon constata que a DRGE tem um perfil de sintomas heterogêneo, com base patogênica multifacetada que desafia um simples algoritmo diagnóstico. E, apesar de reconhecer as limitações dos testes esofágicos atuais, propõe o modelo apresentado acima. Sugere ainda que o objetivo da avaliação na DRGE deva buscar a definição de fenótipos da doença para facilitar um tratamento individualizado.

Como citar este artigo:

Fernandes LDD. Diagnóstico moderno da DRGE: o Consenso de Lyon – o que o endoscopista precisa saber. Endoscopia Terapêutica; 2021. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/assuntosgerais/diagnostico-moderno-da-drge-o-consenso-de-lyon-o-que-o-endoscopista-precisa-saber/

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Confira também: DRGE é fácil de ser diagnosticada?




Síndrome pós-polipectomia

 

A realização de polipectomias faz parte do dia a dia do colonoscopista, como parte de procedimentos de rotina, exames diagnósticos etc. As principais complicações evidenciadas incluem ressecção incompleta da lesão, sangramento e perfuração. A síndrome pós-polipectomia é uma complicação pouco frequente e menos conhecida que as demais, no entanto, de extrema relevância. Sobre ela comentamos:

Confira mais sobre a síndrome pós-polipectomia

A síndrome de coagulação pós-polipectomia (post-polypectomy coagulation syndrome – PPCS) foi descrita por J. Waye ao observar pacientes que apresentaram quadro de dor abdominal de forte intensidade, sinais de peritonismo, taquicardia e febre após polipectomia com uso de corrente elétrica, porém, que não apresentavam evidência de perfuração colônica nos exames de imagem.

O diagnóstico dessa síndrome é de exclusão, sendo imprescindível avaliar e descartar a presença de pneumoperitôneo.

O principal sintoma é dor abdominal após colonoscopia, o que pode ocorrer nas primeiras 12h após o procedimento, porém são descritos casos tardios, após até 5–7 dias.

Considera-se que a síndrome decorre de lesão transmural secundária à corrente diatérmica, com preservação da serosa, não havendo, portanto, pneumoperitôneo.

A incidência é baixa, sendo estimada entre 0,5 e 1,2%, porém de grande relevância, pois faz diagnóstico diferencial com perfuração colônica pós-polipectomia.

Exames de imagem (tomografia computadorizada com contraste) evidenciam: ausência de pneumoperitôneo, espessamento da parede colônica com infiltrado inflamatório adjacente e presença de líquido na camada muscular do cólon.

O tratamento é conservador, baseado em internamento hospitalar, jejum, antibioticoterapia e vigilância. Não há necessidade de intervenção cirúrgica.

É importante ressaltar que a etiologia da lesão está associada à queimadura de camadas profundas do cólon. A evolução destes casos, via de regra, é satisfatória. Havendo intercorrências ou evolução insatisfatória, a possibilidade de perfuração tardia ou diagnóstico inicial equivocado (falha nos exames de imagem) deve ser suspeitado, sendo crucial a reavaliação do caso com o cirurgião.

Alguns autores usam o termo transmural burn syndrome ou simplesmente coagulation syndrome (CS) para incluir pacientes submetidos a ressecções endoscópicas por mucosectomia (EMR) ou dissecção endoscópica da submucosa (ESD), que apresentam quadro clínico semelhante a PPCS.

Embora não haja relato de perfuração tardia em PPCS, há descrição de perfuração tardia após CS (caso de ESD), indicando a importância de manter o paciente em internamento hospitalar e vigilância.

Bacteremia transitória pode ocorrer após procedimentos diagnósticos ou terapêuticos, correspondendo à translocação de bactérias da flora do próprio paciente para a corrente sanguínea. De acordo com a ASGE, a incidência após colonoscopia com ou sem polipectomia é de aproximadamente 4%, porém raramente associadas a casos de infecção propriamente dita, como endocardite ou peritonite.

Referências:

  1. CT findings of post-polypectomy coagulation syndrome and colonic perforation in patients who underwent colonoscopy polypectomy. Shin et al. Clinical Radiology 2016;e1-e7
  2. Features of electrocoagulation syndrome after endoscopic submucosal dissection for colorectal neoplasm. Yamashina et al Gastroenterology and Hepatology 2016; 31:615–620
  3. Coagulation syndrome: Delayed perforation after colorectal endoscopic treatments. Hirasawa et al. World J Gastrointest Endosc  2015: 7(12): 1055-1061
  4. What Is Different  between Postpolypectomy Fever and  Postpolypectomy Coagulation Syndrome? Hyung Wook Kim.  Clin Endosc  2014;47:205-206

Como citar este artigo:

Ferreira F. Síndrome pós-polipectomia. Endoscopia Terapêutica; 2021. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/assuntosgerais/sindrome-pos-polipectomia/

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Agora responda a esse QUIZ sobre Síndrome pós-polipectomia.




Duplicação cística de esôfago

INTRODUÇÃO

Em exames de endoscopia digestiva alta de rotina, o achado de lesão subepitelial em esôfago é ocasional, porém presente com certa frequência.

Geralmente, o paciente se apresenta assintomático quanto à lesão encontrada, e o exame endoscópico foi indicado por outras causas, tais como dispepsia, suspeita de refluxo gastroesofágico, empachamento, etc (Figura 1).

Lesão subepitelial em esôfago distal

Figura 1: lesão subepitelial em esôfago distal.

Apesar da sintomatologia não estar relacionada à lesão subepitelial encontrada, seu esclarecimento diagnóstico nos direciona à investigação mais específica por meio de outros métodos de imagem, como a tomografia computadorizada, a ressonância magnética nuclear e a ecoendoscopia.

Nas lesões subepiteliais, as biópsias da mucosa não esclarecem o seu diagnóstico, justamente por estarem recobertas por mucosa íntegra e não serem representativas da lesão subepitelial.

Porém, quando encontramos uma solução de continuidade da lesão subepitelial com a mucosa (por exemplo, em lesões com ulcerações ou erosões na mucosa que a recobre), as amostras teciduais nas áreas ulceradas ou erodidas, por meio de biópsias endoluminais (pinças tipo fórceps), merecem ser investidas para o diagnóstico histológico.

São várias as hipóteses diagnósticas das lesões subepiteliais em esôfago:

  • Cisto de retenção;
  • Lipoma submucoso;
  • Schwannoma;
  • Hemangioma;
  • Leiomioma;
  • GIST;
  • Duplicação cística.

Dentre as possibilidades diagnósticas, a duplicação cística de esôfago deve ser considerada.

DUPLICAÇÃO CÍSTICA ESOFÁGICA

A duplicação cística é decorrente de alterações da formação do tubo digestório. Na fase embrionária, a endoderme se divide em 3 segmentos distintos:

  • intestino primitivo cefálico (foregut);
  • intestino primitivo médio (midgut);
  • intestino primitivo caudal (hindgut).

Para a formação do segmento proximal do tubo digestivo (3ª a 8ª semana de gestação) [1], o intestino primitivo cefálico (foregut), que se constitui como um único tubo, divide-se em 2 tubos paralelos e origina 2 segmentos tubulares:

  • Segmento anterior: que forma a traqueia e seus ramos segmentares;
  • Segmento posterior: que origina o todo o esôfago.

Uma grande falha na junção da endoderme possibilita uma fusão anômala e, consequentemente, formam as atresias de esôfago e de traqueia (total ou parcial) associadas ou não à fistula esofagotraqueal.

Esporadicamente, pode haver uma junção irregular dos bordos de fusão, de maneira a resultar em um recesso intramural no esôfago, ou mesmo um recesso para-esofágico (extramural), o qual origina a duplicação cística do esôfago (Figura 2).

Figura 1a: intestino primitivo cefálico com formação de traqueia e esôfago.

Figura 1b: intestino primitivo cefálico com falha e formação de duplicação cística.

Figura 2: a) Intestino primitivo cefálico com formação de traqueia e esôfago. b) Intestino primitivo cefálico com falha e formação de duplicação cística.

Histologicamente, o interior da duplicação cística de esôfago é revestido por epitélio escamoso ou entérico, os quais secretam secreção seromucosa. Externamente, é formada por dupla camada de musculatura lisa e, raramente, pode apresentar uma comunicação nítida com a luz esofágica.

Quanto à localização esofágica, a maior parte das duplicações císticas situam-se na região posterolateral direita do mediastino inferior e com maior predominância no terço distal (2/3) comparado ao terço proximal e médio (1/3) [2].

Por ser uma malformação congênita, o diagnóstico é mais frequente em crianças (80%) [3], as quais apresentam sintomas. No adulto, a sintomatologia geralmente é ausente, e, quando se apresenta algum sintoma (< 7%), está relacionado ao efeito compressivo da lesão em órgãos adjacentes [2]. Assim, a sintomatologia pode variar em função da localização da duplicação cística no esôfago (tabela 1).

Localização em esôfago Sintoma relacionado
1/3 proximal estridor, tosse
1/3 médio dor torácica, disfagia
1/3 distal disfagia, epigastralgia, vômitos, arritmia cardíaca [4]

 

INVESTIGAÇÃO DIAGNÓSTICA

Tomografia Computadorizada (CT): identifica-se uma imagem de massa homogênea, com íntimo contato com o esôfago, arredondada ou ovalada, bem delimitada, de contornos regulares, associada à densidade de fluido no seu interior e que não se altera à injeção de contraste.

Ressonância Magnética Nuclear (RMN): demonstra formação cística, localizada junto à parede esofágica, com hipossinal em T1, hipersinal em T2 e sem aspecto sólido em T1 com contraste.

Ecoendoscopia:

É indicada [5]:

  • Quando CT ou RMN não definem diagnóstico;
  • Em lesões suspeitas de malignidade;
  • Em formações atípicas.

A imagem ecográfica típica de duplicação cística de esôfago tem ecotextura anecoica ou hipoecoica, homogênea, alongada ou ovalada, de contornos regulares, limites precisos, com reforço hiperecoico no seu limite posterior. Situa-se inserida em camada submucosa, muscular própria ou até mesmo subserosa, com 3 a 5 camadas na parede [3] (Figura 3). Por vezes, podem ser múltiplas formações císticas intramurais com lobulações, e até mesmo, com septações em sua parede [6] (Figura 4). O conteúdo intracístico também pode ser heterogêneo, com imagens de debris ou pontos puntiformes de permeio (Figura 5).

Figura 3: ecoendoscopia setorial com imagem hipoecoica inserida em camada submucosa e muscular própria de esôfago distal.

Duplicação cística de esôfago

Figura 4: ecoendoscopia radial com imagem anecoica inserida em camada submucosa e muscular própria de esôfago com septos finos.

Duplicação cística de esôfago

Figura 5: ecoendoscopia setorial com imagem hipoecoica inserida em camada submucosa e muscular própria de esôfago distal com pontos hiperecoicos de permeio.

 

A princípio, a diferenciação quanto à natureza sólida ou cística da imagem pode ser definida pela ecoendoscopia. Porém mesmo ecoendoscopistas experientes podem ter dúvidas, uma vez que a secreção espessa da duplicação cística (muco) pode mimetizar uma imagem sólida ecográfica.

Nessas situações, a punção ecoguiada se faz necessária para possibilitar o diagnóstico diferencial entre duplicação cística de esôfago, leiomioma, GIST ou mesmo um conglomerado linfonodal paraesofágico. A amostra da punção ecoguiada pode revelar material mucoide com células epiteliais, semelhantes ao epitélio esofágico ou entérico. A grande preocupação em relação à punção ecoguiada é a infecção. Com taxas de 14% [4] [8], a infecção intracística pós-punção ecoguiada se demonstrou com morbidade e mortalidade temerárias pela potencial evolução para mediastinite, mesmo com uso de antibióticos em doses terapêuticas. Assim, há uma tendência dos ecoendoscopistas em reservar a punção ecoguiada somente em casos extremamente necessários [9].

O tratamento da duplicação cística de esôfago é indicado em pacientes sintomáticos. A remoção ou a enucleação cirúrgica estão sendo os tratamentos de eleição.

Nos pacientes assintomáticos, o tratamento conservador é predominante frente aos riscos inerentes da cirurgia esofágica (fístula, refluxo gastroesofágico) e mortalidade cirúrgica de 1% [10]. Outros advogam que a baixa taxa anual de crescimento da duplicação cística de esôfago não justifica a morbimortalidade da cirurgia [11]. Há relatos de indicações cirúrgicas em pacientes assintomáticos, justificadas pelo risco de ulceração ou perfuração da duplicação cística de esôfago, com sucesso no seguimento [12].

Saiba mais:

Guideline comentado da ASGE sobre lesões subepiteliais TGI

Tumor de células granulares no esôfago

QUIZ! – Lesão subepitelial de esôfago

Como citar este artigo:

Matuguma, SE. Duplicação cística de esôfago. Endoscopia Terapêutica; 2021. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/assuntosgerais/duplicacao-cistica-de-esofago

Referências

  1. Nobuhara KK, Gorski YC, La Quaglia MP, Shamberger RC. Bronchogenic cysts and esophageal duplications: common origins and treatment. J Pediatr Surg [Internet]. 1997 Oct;32(10):1408–13. Available from: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/9349757
  2. Pisello F, Geraci G, Arnone E, Sciutto A, Modica G, Sciumè C. Acute onset of esophageal duplication cyst in adult. Case report. G Chir [Internet]. 30(1–2):17–20. Available from: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/19272226
  3. Whitaker JA, Deffenbaugh LD, Cooke AR. Esophageal duplication cyst. Case report. Am J Gastroenterol [Internet]. 1980 Apr;73(4):329–32. Available from: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/7416128
  4. Bowton DL, Katz PO. Esophageal cyst as a cause of chronic cough. Chest [Internet]. 1984 Jul;86(1):150–2. Available from: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/6734280
  5. Adler D, Liu R. Duplication cysts: Diagnosis, management, and the role of endoscopic ultrasound. Endosc Ultrasound [Internet]. 2014;3(3):152. Available from: http://www.eusjournal.com/text.asp?2014/3/3/152/138783
  6. Bhatia V, Tajika M, Rastogi A. Upper gastrointestinal submucosal lesions–clinical and endosonographic evaluation and management. Trop Gastroenterol [Internet]. 31(1):5–29. Available from: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/20860221
  7. Wildi SM, Hoda RS, Fickling W, Schmulewitz N, Varadarajulu S, Roberts SS, et al. Diagnosis of benign cysts of the mediastinum: the role and risks of EUS and FNA. Gastrointest Endosc [Internet]. 2003 Sep;58(3):362–8. Available from: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/14528209
  8. Cevasco M, Menard MT, Bafford R, McNamee CJ. Acute Infectious Pseudoaneurysm of the Descending Thoracic Aorta and Review of Infectious Aortitis. Vasc Endovascular Surg [Internet]. 2010 Nov 30;44(8):697–700. Available from: http://journals.sagepub.com/doi/10.1177/1538574410376449
  9. Béchade D, Desramé J, Algayres JP. Gastritis cystica profunda in a patient with no history of gastric surgery. Endoscopy [Internet]. 2007 Dec;39(S 1):E80–1. Available from: http://www.thieme-connect.de/DOI/DOI?10.1055/s-2006-945070
  10. Salo JA, Ala-Kulju K V. Congenital esophageal cysts in adults. Ann Thorac Surg [Internet]. 1987 Aug;44(2):135–8. Available from: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/3619537
  11. Versleijen MW, Drenth JP, Nagengast FM. A Case of Esophageal Duplication Cyst with a 13-year Follow-up Period. Endoscopy [Internet]. 2005 Sep;37(9):870–2. Available from: http://www.thieme-connect.de/DOI/DOI?10.1055/s-2005-870219
  12. Noguchi T, Hashimoto T, Takeno S, Wada S, Tohara K, Uchida Y. Laparoscopic resection of esophageal duplication cyst in an adult. Dis esophagus Off J Int Soc Dis Esophagus [Internet]. 2003;16(2):148–50. Available from: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/12823217

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Lesões Sésseis Serrilhadas

Introdução

No Brasil, o câncer colorretal (CCR) é o terceiro mais comum. Estimavam-se, para o ano de 2020, 17.760 novos casos em homens (7,9%) e 20.470 em mulheres (9,2%)(INCA, 2020). Considerando esses números, o CCR é o segundo tipo de câncer mais frequente nas mulheres e o terceiro na população masculina, excluindo-se os casos de tumores de pele não melanoma.

No passado, as lesões serrilhadas eram classificadas como pólipos hiperplásicos e sem potencial de malignização (Rex et al., 2012). Atualmente, estima-se que a via serrilhada de carcinogênese é responsável por cerca de 20 a 30% dos casos de CCR. Este dado nos mostra a importância de conhecermos melhor tais lesões, pois, em números absolutos, representa um impacto maior que outros tumores do aparelho digestivo, como as neoplasias de estômago e pâncreas (Rex et al., 2012; Crockett et al., 2015; Siegel et al., 2017).

Características das lesões sésseis serrilhada

As lesões sésseis serrilhadas (LSS) apresentam características clínicas, genéticas e histológicas distintas dos adenomas. Por tal motivo, a Organização Mundial de Saúde (OMS) alterou a nomenclatura da classificação dos pólipos e lesões serrilhadas. Atualmente, são aceitas as seguintes nomenclaturas: Pólipo hiperplásico (PH); Pólipo hiperplásico tipo microvesicular; Pólipo hiperplásico tipo rico em células caliciformes; Lesões sésseis serrilhadas (LSS); Lesões sésseis serrilhadas com displasia (LLSD); Adenoma serrilhado tradicional (AST) e Adenomas serrilhados não classificáveis, estes incluem os adenomas tubulovilosos serrilhados, recentemente descritos (WHO, 2019).

Epidemiologia

  • As LSSs representam cerca de 10% dos pólipos cólicos;
  • São mais comuns em idosos, mas a idade não parece ser um fator tão influenciador quanto nos adenomas convencionais;
  • São mais prevalentes em caucasianos e, discretamente, mais comuns em mulheres;
  • Tabaco, álcool e IMC alto foram relacionados com aumento do risco para LSSs;
  • Já o uso de anti-inflamatório não esteroidal, dieta rica em folato, cálcio e fibras foram relacionados como fatores de proteção (Crockett 2014; O’Connell e Crockett, 2017).

Características endoscópicas

Localizam-se mais comumente no cólon proximal (70-80%), apresentam morfologia plana, principalmente durante a insuflação do cólon, e coloração semelhante à da mucosa normal, dificultando o seu diagnóstico e tratamento endoscópico (Pohl et al., 2013; Crockett et al., 2015).

Lesões Sésseis Serrilhadas

Exame com luz branca.

Lesões Sésseis Serrilhadas

Exame com LCI.

Cromoscopia com índigo.

Lesões Sésseis Serrilhadas

Ressecção endoscópica por ESD.

Pós-ressecção por ESD.

Etiopatogenia

As LSSs estão relacionadas a uma via alternativa de carcinogênese, descrita há pouco mais de 15 anos.

A LSS pathway se caracteriza pela mutação do oncogene BRAF como evento inicial (70-80%) que pode ocorrer na mucosa normal ou em um pólipo hiperplásico tipo microvesicular.

Posteriormente, ocorre hipermetilação das ilhas CpG (regiões do genoma ricas em CpG ou Citosina – Phosfato – Guanina) nas regiões promotoras de genes supressores de tumor (CIMP). Consequentemente, ocorre o silenciamento desses genes (MGMT, MLH1, p16, MINT1, MINT2 ou MINT31) em 70-76% das lesões. CIMP pode ser alto (quando mais de dois genes são metilados), baixo ou ausente.

A progressão para displasia e câncer invasivo acontece por metilação dos genes de reparo do DNA (MLH1, MSH2, MSH6 e PMS2), levando à instabilidade de microssatélites (MSI), normalmente numa velocidade mais rápida que a via adenoma-carcinoma. (WHO, 2019; Patai et al., 2013) (Figura 1).

Diferentemente das LSSs, os ASTs se apresentam predominantemente na forma polipóide e localizados no cólon distal e reto em 70% dos casos. A carcinogênese também difere, ocorrendo a mutação KRAS, primariamente, a partir da mucosa normal ou de pólipo hiperplásico rico em células caliciformes, seguida de supressão do p53 nas lesões que evoluem para displasia de alto grau e/ou carcinoma (WHO, 2019).

Figura 1. Carcinogênese das lesões serrilhadas. Fonte: WHO, 2019

Diagnóstico

A colonoscopia é considerada menos efetiva na prevenção do CCR no cólon proximal quando comparada ao cólon distal (Nishihara et al., 2013). Fato que pode ser constatado observando os tumores denominados de intervalo, diagnosticados após um exame de rastreamento negativo. Eles, na sua maioria, apresentam características moleculares semelhantes às LSSs (Le Clercq e Sanduleanu, 2014).

Com os avanços tecnológicos, a qualidade da imagem dos exames endoscópicos permite um maior número de lesões diagnosticadas e um melhor estudo da superfície das mesmas, principalmente quando é possível utilizar magnificação de imagem e cromoscopia eletrônica e/ou convencional. Foi estudando a superfície das lesões que surgiu a classificação de Kudo. Ela prevê cinco tipos de abertura de criptas, sendo um deles, o tipo II, característico dos pólipos hiperplásicos, mas este não os difere das LSSs.

Em 2012, Kimura et al. publicaram um novo padrão de cripta para identificar as lesões precursoras originárias de LSSs e o subclassificaram como tipo II-O (Figura 2). O estudo mostrou que o padrão tipo II-O é altamente preditivo para lesões sésseis serrilhadas com sensibilidade de 65.5% e especificidade de 97.3%. A identificação do tipo II-O também mostrou significante relação com a presença de mutação BRAF e CIMP positivo [OR (IC 95 %) 39.3 (9.9 – 155.7); 32.1 (9.1 – 113.1)], mostrando-se ser um importante achado de lesões com risco de malignização e que precisam ser tratadas (Kimura et al., 2012).

Figura 1. Carcinogênese das lesões serrilhadas. Fonte: WHO, 2019

A taxa de detecção de lesões neoplásicas é um índice de qualidade da colonoscopia, para as LSSs os números ainda são bem variáveis, mas a sociedade britânica de gastroenterologia recomenda que essa taxa seja de pelo menos 5% em paciente com indicação de realização do exame para rastreamento (East et al., 2017).

Os guidelines ocidentais recomendam que qualquer lesão serrilhada proximal ao ângulo esplênico deve ser ressecada, diferentemente de lesões com características hiperplásicas no sigmoide e reto. No Japão, a conduta nas lesões serrilhadas é variável de acordo com a instituição, mas a indicação de ressecção é baseada no exame minucioso da superfície com cromoscopia e magnificação (Tanaka et al., 2020).

Tratamento endoscópico

As LSSs menores que 10 mm devem ser tratadas sem eletrocautério, realizando-se ressecção a frio (RAF). A RAF é superior à ressecção com pinça para o tratamento de pequenos pólipos, pois é possível garantir margens, devendo-se incluir na apreensão 1 a 2 mm de mucosa normal (Ma et al., 2017).

As LSSs maiores que 10 mm devem ser tratadas como primeira opção por meio da mucosectomia (endoscopic mucosal resection – EMR) em fragmento único ou piecemeal, apesar de, nos últimos anos, alguns trabalhos mostrarem a mucosectomia a frio como uma boa opção (Ma et al., 2017; Kaltenbach et al., 2020).

Em lesões ≥ 20 mm, a EMR possui baixo risco de complicação (1%) e recorrência local (14%), como Hassan et al. evidenciaram em revisão sistemática (Hassan et al. 2016). A desvantagem da EMR piecemeal está na limitação da avaliação histológica, pois não é possível a avaliação de margens laterais, além de uma maior taxa de recidiva local em relação às ressecções em monobloco. (Okamoto et al., 2016).

Pohl et al. mostraram que a taxa de ressecção incompleta das LSSs foi quatro vezes maior que os adenomas (31.0% vs 7.2%; P ≤ 0.001), e lesões que mediam entre 10 e 20 mm foram tratadas de forma incompleta em 47,6%, possivelmente devido à localização, morfologia e dificuldade de avaliação de sua bordas (Pohl et al., 2013).

No entanto, os trabalhos mais recentes mostram uma baixa taxa recorrência de 3.6% (95% CI, 0.5%– 6.7%) para lesões ≥ 10 mm e de 7-8.7% para ≥ 20 mm com a utilização da técnica clássica de EMR (Kaltenbach et al., 2020).

Lesões neoplásicas com características de alto grau e/ou presença de fibrose são indicações de ressecção em monobloco por dissecção endoscópica da submucosa (endoscopic submucosal dissection – ESD) (Tanaka et al., 2020). Uma alternativa à ESD, nesses casos, pode ser a EMR underwater, visto que aumenta as chances de ressecção em fragmento único (Binmoeller et al., 2015). No entanto, tais técnicas apresentam um maior potencial de complicações, como perfuração e sangramento, quando comparados à EMR clássica e devem ser executadas em centros de referência (Saito et al., 2010; Tanaka et al., 2015b; Binmoeller et al., 2015).

Vigilância

O acompanhamento após ressecção de LSSs ainda possui divergências e pouca evidência científica, mas a orientação das sociedades americanas, US Society Task Force, publicada em 2020, está resumida na tabela abaixo (Tabela 1).

Tabela 1. Recomendação para seguimento com colonoscopia após polipectomia de PHs, LSSs e ASTs. Fonte: Gupta et al. 2020.

Como citar esse artigo:

Mello, BB. Lesões Sésseis Serrilhadas. Endoscopia Terapêutica; 2021. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/assuntosgerais/lesoes-sesseis-serrilhadas

Referências

  1. INCA Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva (INCA). Estatísticas do câncer. 2020. Disponível: https://www.inca.gov.br/numeros-de-cancer
  2. Crockett SD, Snover DC, Ahnen DJ, Baron JA. Sessile Serrated Adenomas: An Evidence-Based Guide to Management. Clin Gastroenterol Hepatol 2015;13:11-26.
  3. East JE, Atkin WS, Bateman AC, Clark SK, Dolwani S, Ket SN, Leedham SJ, Phull PS, Rutter MD, Shepherd NA, Tomlinson I, Rees CJ. British Society of Gastroenterology position statement on serrated polyps in the colon and rectum. Gut. 2017 Jul;66(7):1181-1196.
  4. Gupta S, Lieberman D, Anderson JC, Burke CA, Dominitz JA et al. Recommendations for Follow-Up After Colonoscopy and Polypectomy: A Consensus Update by the US Multi-Society Task Force on Colorectal Cancer. Gastrointestinal Endoscopy 2020;91: 463-485.
  5. Hassan C, Repici A, Sharma P, et al. Efficacy and safety of endoscopic resection of large colorectal polyps: a systematic review and meta- analysis. Gut 2016;65:806-20.
  6. Kaltenbach T, Anderson JC, Burke CA, Dominitz JA, Gupta S, Lieberman D, Robertson DJ, Shaukat A, Syngal S, Rex DK. Endoscopic Removal of Colorectal Lesions Recommendations by the US Multi-Society Task Force on Colorectal Cancer. American Society for Gastrointestinal Endoscopy, AGA Institute, and the American College of Gastroenterology. Gastrointestinal Endoscopy 2020;91: 486-519.
  7. Kimura T , Yamamoto E , Yamano HO et al. A novel pit pattern identifies the precursor of colorectal cancer derived from sessile serrated adenoma. Am J Gastroenterol 2012 ; 107 : 460 – 9.
  8. Le Clercq CMC, Sanduleanu S. Interval colorectal cancers: What and why. Curr Gastroenterol Rep. 2014;16(3):375.
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  11. O’Connell BM, Crockett SD. The clinical impact of serrated colorectal polyps. Clin Epidemiol. 2017, 22;9:113-125.
  12. Okamoto K, Kitamura S, Kimura T, Nakagawa T, Sogabe M, Miyamoto H, et al. Clinicopathological Characteristics of Serrated Polyps as Precursors to Colorectal Cancer: Current Status and Management. J Gastroenterol Hepatol 2016.
  13. Patai A V, Molnár B, Tulassay Z, Sipos F. Serrated pathway: alternative route to colorectal cancer. World J Gastroenterol 2013;19(5):607–15.
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  15. Rex DK, Ahnen DJ, Baron JA, Batts KP, Burke CA, Burt RW, Goldblum JR, Guillem JG, Kahi CJ, Kalady MF, O’Brien MJ, Odze RD, Ogino S, Parry S, Snover DC, Torlakovic EE, Wise PE, Young J, Church J. Serrated lesions of the colorectum: review and recommendations from an expert panel. Am J Gastroenterol 2012; 107:1315-1329.
  16. Siegel RL, Miller KD, Jemal A. Cancer Statistics, 2017. CA Cancer J Clin. 2017; 67:7
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  18. WHO Classification of Tumors Editorial Board. Digestive system tumours. Lyon (France): Internacional Agency for Reseach on Cancer; 2019. (WHO classification of tumor series, 5th ed.; vol 1).

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As principais lesões musculoesqueléticas que acometem os médicos endoscopistas e a importância da correta ergonomia em seu ambiente de trabalho

ergonomia na endoscopia

 

As doenças ocupacionais estão ligadas às mais variadas profissões, tendo evoluído ao longo dos anos e ocorrendo silenciosamente nos ambientes de trabalho.

Esse termo se originou a partir do grego ergon, que significa “trabalho”, e nomos, que quer dizer “leis ou normas”.

A escolha pela realização de uma revisão da literatura se fez necessária para comprovar a necessidade de se conhecer melhor a realidade do ambiente de trabalho do médico endoscopista devido ao aumento constante do volume e tempo dos procedimentos endoscópicos nos últimos anos.

Devido à escassez de estudos recentes sobre esse tema, foram escolhidos artigos publicados entre os anos 1994 a 2018, sendo encontrados 17 artigos específicos sobre o tema.

No Brasil, a norma regulamentadora NR-17, publicada em 1978 pelo Ministério de Trabalho e Emprego, dispõe sobre os “parâmetros que permitam a adaptação das condições de trabalho às características psicofisiológicas dos trabalhadores, de modo a proporcionar um máximo de conforto, segurança e desempenho eficiente” (Brasil, 1978).

As atividades ocupacionais desenvolvidas nos setores médico-hospitalares, clínicas e ambulatórios merecem maior atenção devido à importante demanda ergonômica.

Estudos recentes mostram que os médicos endoscopistas gastam pelo menos 43% do seu tempo realizando procedimentos endoscópicos, sendo a necessidade da avaliação ergonômica, primordial, devido às altas taxas de sintomas musculoesqueléticos e lesões por esforço repetitivo nesses profissionais.

Os artigos concordam em informar que as lesões e dores nos polegares, nas mãos, pescoço, costas, polegares (principalmente o esquerdo), ombro e punho são as mais comumente relatadas e, não surpreendentemente, os riscos parecem estar relacionados principalmente a fatores como: tempo de profissão, constante aumento do volume de exames e aumento da dificuldade para execução de novos procedimentos, que antigamente eram exclusivo de cirurgiões, postura e tempo prolongado do exame em que o profissional precisa se manter em pé, manipulação do aparelho e execução de força e torque com a mão direita.

Os estudos mostraram a prevalência de cerca de 37% a 89% de queixas musculoesqueléticas entre os endoscopistas, sendo que cerca de 67% desses profissionais trabalham em locais com péssima ergonomia e/ou possuem hábitos ergonômicos ruins.

Estudos mais recentes estimam que, após 10 anos de exposição ao trabalho, aproximadamente 10% dos endoscopistas teriam uma doença musculoesquelética, portanto, princípios ergonômicos claros e básicos deveriam ser incorporados à prática da endoscopia.

A aplicação de princípios ergonômicos básicos, como manter posturas neutras do punho, pescoço e ombros durante a endoscopia, não exagerar na força com as mãos e otimizar o design do aparelho usado, pode reduzir as queixas de dores e risco de lesões, além de tornar os procedimentos mais confortáveis para o médico.

Para que os endoscopistas consigam se manter em posturas neutras, o local de trabalho deve ser planejado para se adequar à maioria da população de endoscopista, de ambos os sexos, pois nem todos endoscopistas estão cientes dos riscos físicos aos quais estão expostos a cada dia como resultado do esforço repetitivo que aumenta o risco de sofrer lesões musculoesqueléticas agudas, podendo resultar em lesões permanentes e incapacidade.

O ambiente em que se trabalha e a rotina adquirida pode influenciar diretamente na saúde desses profissionais, como as superfícies do piso, macas, assentos, alturas de monitores de vídeo, qualidade dos aparelhos, falta de pausas entre longos procedimentos, entre outros.

Os sintomas podem variar desde dores leves até lombalgias mais graves, dormência, formigamento, atrofia e fraqueza e, inevitavelmente, a carreira profissional pode ser seriamente afetada por essas lesões permanentes decorrentes dos seus hábitos de trabalho.

Portanto, percebe-se que a maior parte dos médicos endoscopistas não está ciente dos perigos físicos a que estão expostos durante o trabalho e como preveni-los.

Principais lesões que acometem os endoscopistas

Síndromes do pescoço e do ombro

Com a introdução da videoendoscopia no lugar da fibroendoscopia, seria de esperar que as lesões no pescoço e ombros ocorressem com menos frequência, porém, as queixas de dores em pescoço e ombro foram umas das mais frequentes entre os endoscopistas, sendo necessário que a altura dos monitores seja ajustável ao nível dos olhos dos profissionais, evitando a hiperextensão cervical.

Lesões ulnar e radial

Alguns endoscopistas apresentaram parestesias em seu braço dominante, que emana de seus cotovelos e pode ser secundário ao aprisionamento do nervo ulnar ou radial.

Com o esforço repetitivo ocorrido durante os exames, ocorreu inflamação aumentando a compressão, comprimindo o nervo e produzindo parestesias e inibindo toda a amplitude de movimento.

Lombalgia e doenças da coluna lombar e sacral

A maior parte dos endoscopistas queixava-se de moderada ou forte dor nas costas após um dia de realização de procedimentos, pelo resultado de trauma contínuo ou repetitivo na coluna lombo-sacral, especialmente pelo longo período em pé.

A maioria dos endoscopistas contorce seus corpos e costas de acordo com as exigências de se levantar e trabalhar em posições inadequadas, sendo que em alguns exames, como a colangiopancreatografia retrógrada endoscópica, por exemplo, é obrigatório o uso de um pesado e desconfortável avental de chumbo.

Essas ações resultaram em algumas complicações, como a hérnia de disco em uma pequena porcentagem dos endoscopistas estudados.

Síndrome do polegar do endoscopista

A lesão conhecida como “polegar do endoscopista” – ou Síndrome de De Quervain (tenossinovite ou um espessamento inflamatório da bainha tendínea do extensor curto e abdutor longo do polegar) – foi relatada por muitos desses profissionais como uma das lesões mais comuns que os acometem, pois resulta do uso repetitivo do polegar esquerdo, que é essencial para girar as manoplas que controlam a angulação da ponta distal do endoscópio. É possível usar a técnica de duas mãos para evitar essa lesão, mas não é tão eficiente quanto a técnica de um polegar.

Ferimento do punho e mão

A lesão mais comum que afeta o punho ou a mão é a síndrome do túnel do carpo, a qual foi relatada por acometer médicos endoscopistas devido ao resultado de rotação repetitiva e torque do punho e da mão durante os procedimentos.

Lesões nos quadris, joelhos, pernas e pés

Devido ao longo tempo em pé gasto pelos endoscopistas durante os procedimentos, os mesmos relataram contorcer seus corpos, correndo o risco de ferir o sistema musculoesquelético de suporte.

Ao ferir as costas, os profissionais tentam mudar a posição para aliviar o desconforto e, ao fazê-lo, pode ocorrer inflamação, transferindo a lesão para quadris, joelhos, pernas e pés.

Dor nas pernas e nos pés

A maior parte das dores nas pernas apresentada pelos endoscopistas é transferida da dor nas costas ou quadris, sendo que a permanência por longos períodos em pé pode predispor à flebite e à fasceíte plantar.

O que fazer para evitar essas lesões?

Para otimizar a ergonomia na endoscopia, os artigos estudados recomendam:

  • Os principais determinantes das posturas da parte superior do corpo são a localização do paciente, colocação do equipamento que vai ser utilizado e localização do monitor;
  • Em todos exames endoscópicos, o posicionamento do monitor é um importante determinante da postura do tronco e cabeça. Os monitores devem ser colocados em frente ao endoscopista, para evitar rotação e flexão da coluna cervical e devem ser ajustáveis ao nível dos olhos. Com isto, percebeu que a colocação do monitor diretamente em frente ao endoscopista atinge uma postura neutra do pescoço e minimiza a rotação cervical;

O conjunto de endoscopia deve ser configurado com o monitor posicionado diretamente em frente ao endoscopista enquanto a endoscopia é realizada. A altura do monitor deve estar logo abaixo do nível dos olhos, com um ângulo de visão ideal de 15 a 25 graus abaixo do horizonte dos olhos, com uma distância de visualização de 52 cm a 182 cm, dependendo do tamanho do monitor e da preferência do endoscopista. Para acomodar o quinto percentil feminino à altura do 95º percentil do olho masculino, a altura do monitor deve ser ajustável de 93 cm a 162 cm.

Altura ideal do leito

A mesa de exame deve estar na altura do cotovelo ou abaixo dele (0-10 cm abaixo do cotovelo). Para acomodar o 5º percentil feminino ao percentil 95º da altura do cotovelo masculino, a altura da mesa de exame deve ser ajustável de 85 cm a 120 cm.

Os aparelhos utilizados pelos médicos endoscopistas devem ser feitos para facilitar o direcionamento e serem mais confortáveis para esses profissionais, devido a uma seção de controle mais leve, ao torque de angulação reduzido e ao melhor controle da ergonomia corporal. Devem integrar os avanços ergonômicos e tecnológicos de imagem para que os médicos tenham um melhor manuseio e operação por meio de um sistema completamente reprojetado, bem como uma tela de imagem para visualização de alta qualidade.

Sala ergonomicamente correta

Sala ergonomicamente correta. Fonte: Singa et al., 2018

 Medidas gerais

  • Fazer pequenas pausas e alongamentos simples após término de procedimentos prolongados;
  • Existem algumas técnicas para otimizar a ergonomia após e entre os exames endoscópicos, como: exercícios das mãos, punho, cotovelo, ombros, costas e pescoço com objetivo de prevenir lesões relacionadas a longos e/ou difíceis procedimentos;
  • Usar sapatos confortáveis;
  • Fazer exercícios físicos regularmente;
  • Ter alimentação saudável;
  • Se comportar como um “Endo atleta”, segundo o mais recente artigo sobre o tema (Singla M, Kwok RM, Deriban G, Young PE. Training the endo-athlete: an update in ergonomics in endoscopy. Clin Gastroenterol Hepatol. 2018;16(7):1003-6.).

Alongamento - ergonomia na endoscopia

A: alongamento de pulso. B: exercícios de fortalecimento para os músculos extensores dos dedos. C: alongamento do ombro. D: alongamento de costas.Fonte: Chang et al., 2017

Embora tenha havido avanços substanciais na tecnologia de imagem endoscópica, o processo de rotação do endoscópio e a deflexão da ponta pouco mudaram desde o desenvolvimento da endoscopia flexível.

Numerosas pesquisas estão em processo sobre novos dispositivos projetados para examinar e administrar novos tratamentos ao trato digestivo. Esses dispositivos podem diminuir o risco de lesão em um endoscopista por meio do uso de melhores princípios ergonômicos.

Uma solução proposta é o uso de um sistema com plataforma de controle do tipo joystick, usando assistência eletromecânica – em oposição à força mecânica pura – para transmitir energia ao eixo do instrumento. Tais tecnologias têm o potencial de diminuir as lesões pela diminuição da carga. Embora interessante e potencialmente útil, nenhum dos produtos está atualmente disponível para uso, nem mesmo nos Estados Unidos.

O artigo mais recente, de 2018, informa que devemos tratar nossos corpos como os atletas profissionais fazem: manter boa forma, incentivar os colegas a observar e fornecer feedback sobre nossas ações, otimizar nossas instalações de prática e alongar nossos músculos.

No futuro, as inovações tecnológicas prometem reduzir os estresses físicos inerentes ao trabalho do médico endoscopista, podendo preservar nossa própria saúde e continuar a melhorar a saúde dos nossos pacientes.

Resumo das medidas essenciais para melhoria do local de trabalho do médico endoscopista e prevenção das lesões:

  1. O monitor de vídeo deve estar posicionado preferencialmente em frente ao endoscopista durante a realização do exame;
  2. A altura do monitor deve estar logo abaixo do nível do olho, com um ângulo de visão ideal de 15 a 25 graus abaixo do horizonte dos olhos, com uma distância de visão de 52 cm a 182 cm. Para acomodar o percentil feminino à altura do percentil do olho masculino, a altura do monitor deve ser ajustável entre 93 cm a 162 cm. A mesa de exame deve estar abaixo da altura do cotovelo;
  3. Durante o CPRE, um avental mais adequado deve ser usado para reduzir as cargas na parte superior das costas e na coluna cervical;
  4. O tempo de recuperação do profissional entre os exames é muito importante;
  5. Uma pausa na endoscopia, preferencialmente com alongamento, é muito importante, pois permite que os grupos musculares descansem durante um ciclo de trabalho de endoscopia.

É necessária a realização de novos estudos que proporcionem um ambiente seguro, tanto no projeto da estação de trabalho como na melhoria dos aparelhos endoscópicos com objetivo de minimizar e evitar dores e lesões ocupacionais, o que pode ter um efeito prejudicial à saúde, à produtividade e à carreira desses profissionais.

Portanto, para um médico endoscopista que espera trabalhar por muitos anos, a compreensão sobre ergonomia e a prevenção de lesões são essenciais e devem ser integradas nessa profissão desde a residência e praticadas diariamente.

Como citar este artigo:

Dragojevic PR. As principais lesões musculoesqueléticas que acometem os médicos endoscopistas e a importância da correta ergonomia em seu ambiente de trabalho. Endoscopia Terapêutica; 2021. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/assuntosgerais/as-principais-lesoes-musculoesqueleticas-que-acometem-os-medicos-endoscopistas-e-importancia-da-correta-ergonomia-em-seu-ambiente-de-trabalho/

Para saber mais:

  1. ASGE Technology Committee, Pedrosa MC, Farraye FA, Shergill AK, Banerjee S, Desilets D, Diehl DL, Kaul V, Kwon RS, Mamula P, Rodriguez SA, Varadarajulu S, Song LM, Tierney WM. Minimizing occupational hazards in endoscopy: personal protective equipment, radiation safety, and ergonomics. Gastrointest Endosc. 2010;72(2):227-35.

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*Post editado pelo Dr Gerson Brasil




Melanose cólica – Melanosis coli

Melanose cólica (Melanosis coli ou Lipofuscinose) consiste na presença de pigmento marrom em macrófagos na mucosa do intestino grosso [1],[2]. A condição, descrita pela primeira vez por Cruveilhier em 1829 [3] e chamada de Melanosis coli por Virchow em 1857 [4], foi inicialmente pensada como sendo devido à presença de melanina. No entanto, estudos mostraram a presença de grânulos de lipofuscina ao invés de melanina em macrófagos do cólon [2],[5]. Desse modo, muitos sugerem o uso dos termos “pseudomelanosis coli” ou “lipofuscinose” do cólon para descrição dessa alteração.

Existe uma forte associação entre Melanosis coli e o uso excessivo de laxantes, em particular derivados de antraquinona [6], embora também possa ser visto em pacientes com doença inflamatória intestinal [5], diarreia crônica [7] ou com o uso de anti-inflamatórios não esteroidais [8]. É causada pela apoptose de células epiteliais do cólon induzida pela antraquinona, seguida de fagocitose dos restos celulares por macrófagos [9].

A Melanosis coli é mais frequentemente detectada durante a investigação da constipação de longa data e associação com uso crônico de catárticos de antraquinona (incluindo cáscara sagrada, senna, aloe vera e ruibarbo). Essa pigmentação ocorre, em geral, de forma mais pronunciada em cólon direito e raramente acomete o íleo, no entanto sua localização e intensidade podem ser variáveis [6]. Vide figuras 1 e 2.

Clique nas imagens para ampliá-las!

Figura 1: Melanosis coli em ceco
melanosis coli em ceco

Figura 2: Melanosis coli em sigmoide
melanosis coli em sigmoide

A presença de Melanosis coli tem associação com um aumento significativo na detecção de adenomas, em especial ≤ 5 mm e isolados. Isso se deve à maior facilidade de visualização dos adenomas mais claros em um fundo pigmentado (vide figuras 3, 4 e 5) [10]. Os adenomas raramente são pigmentados, embora haja relatos de melanosis neles [11].

Figura 3: adenoma em paciente com Melanosis coli
 adenoma em paciente com melanosis coli

 

Figura 4: aspecto com cromoscopia óptica (NBI)

aspecto com cromoscopia óptica (NBI)

 

Figura 5: fotomicrografia de polipectomia. Área central (não pigmentada) correspondente a adenoma.

fotomicrografia de polipectomia

 

Como mostrado nas figuras 6 e 7, uma biópsia submetida à coloração de hematoxilina eosina mostra macrófagos em lâmina própria preenchidos com grânulos de pigmento de cor marrom.

Figura 6: fotomicrografia mostrando macrófagos com grânulos de pigmento na lâmina própria

fotomicrografia

Figura 7: fotomicrografia mostrando macrófagos com grânulos de pigmento (maior aumento)

fotomicrografia

A pigmentação pode ocorrer após o curto prazo de uso do laxativo, sendo encontrados relatos após 6 meses de uso. Além disso, esta é uma condição reversível, podendo regredir após 1 ano de interrupção [12].

Apesar da ausência de relação definida entre Melanosis coli e neoplasia [10], [11], esta pode não ser uma condição inofensiva, visto que demonstra um sinal de agressão crônica da mucosa, necessitando de mais estudos para uma conclusão definitiva.

Agradecimentos à patologista Dra. Rafaela Pinheiro pelo fornecimento das figuras das lâminas.

Como citar este artigo:

Oliveira JF. Melanose cólica – Melanosis coli. Endoscopia Terapêutica; 2020. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/assuntosgerais/melanosis-coli/

Referências:

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  3. Cruveilhier J. Anatomie pathologique du corps humain, ou Descriptions, avec figures lithographie 301es et colorie301es, des diverses alte301rations morbides dont le corps humain est susceptible: Paris, 1829±1835; 1835.
  4. Virchow R. Die pathologischen Pigmente. Arch. Pathol. Ant, 1847; 1(2): 379±404. https://doi.org/10. 1007/BF01975874
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  6. 6. Freeman HJ. “Melanosis” in the small and large intestine. World J Gastroenterol. 2008;14:4296–4299.
  7. 7. Marshall JB, Singh R, Diaz-Arias AA. Chronic, unexplained diarrhea: are biopsies necessary if colonoscopy is normal? Am J Gastroenterol. 1995; 90(3):372±6. PMID: 7872272.
  8. 8. Lee FD. Importance of apoptosis in the histopathology of drug related lesions in the large intestine. J Clin Pathol. 1993; 46(2):118±22. PMID: 8459031.
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  10. 10. Blackett JW, Rosenberg R, Mahadev S, Green PHR, Lebwohl B. Adenoma Detection is Increased in the Setting of Melanosis Coli. J Clin Gastroenterol. 2018 Apr;52(4):313-318. doi: 10.1097/MCG.0000000000000756. PubMed PMID: 27820223.
  11. 11. Coyne JD. Melanosis coli in hyperplastic polyps and adenomas. Int J Surg Pathol. 2013;21:261–263.
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