Gastroparesia

A gastroparesia é uma desordem motora caracterizada clinicamente por saciedade precoce, distensão abdominal, náusea, regurgitação e vômito. Seu diagnóstico costuma ser dado por sintomas típicos e confirmado por cintilografia do esvaziamento gástrico.

Existem alguns escores para mensurar o impacto clínico da gastroparesia. O mais validado é o Gastroparesis Cardinal Symptom Index (GCSI). Uma somatória maior ou igual a 20 é indicativa de sintomas importantes com sério comprometimento da qualidade de vida (tabela 1).

Tabela 1

PATOGÊNESE

A patogênese do retardo do esvaziamento gástrico ainda não é inteiramente compreendida, mas possui dois pilares: a hipomotilidade gástrica e o aumento da pressão pilórica sem evidência de obstrução mecânica.

As causas mais frequentes são a diabetes mellitus e a lesão cirúrgica do nervo vago. Outras etiologias como doenças de depósito, neurológicas e infecciosas também podem estar relacionadas.

 

MANEJO

Clínico

O manejo clínico é baseado no controle glicêmico associado a agentes procinéticos, antieméticos e analgésicos. Contudo, esta abordagem possui eficácia limitada e efeitos colaterais indesejáveis(2).

Cirúrgico

Nos pacientes refratários ao tratamento clínico, a piloroplastia é uma opção terapêutica eficaz. O racional de atuar sobre o piloro foi clinicamente comprovado em estudo envolvendo 177 pacientes submetidos a piloroplastia laparoscópica. O seguimento por cinco anos identificou a normalização da cintilografia de esvaziamento gástrico em 77% dos pacientes. Apesar dos bons resultados, há um risco cirúrgico relevante de eventos adversos como vazamento, sangramento e infecção de ferida operatória(3).

Endoscópico

Abordagens endoscópicas como gastrostomia descompressiva, gastrojejunostomia (Figura 1), injeção pilórica de toxina botulínica e até colocação de stent transpilórico são alternativas com eficácia. Contudo os resultados ainda são insatisfatórios e a evidência é limitada(4).

Figura 1 : PEG- jejuno

G-POEM

Com a escalada da endoscopia do terceiro espaço , Kashab transportou o racional da piloroplastia cirúrgica para a esfera da endoscopia terapêutica, realizando a primeira piloromiotomia endoscópica (genericamente chamada de G-POEM) em 2013(5). A técnica vem ganhando espaço na literatura com seus baixíssimos índices de complicação e resultados clínicos similares à piloroplastia videolaparoscópica(6).

A técnica consiste em uma incisão na mucosa do antro (mucosotomia) para acesso e confecção de um túnel submucoso rente à muscular própria até transpor o canal pilórico. Após a dissecção do esfíncter, ele é seccionado sob visão direta. Com esta intervenção, observamos uma clara ampliação do canal pilórico à visão endoscópica no antro. O tempo final do procedimento é o fechamento da mucosotomia com clipes ou sutura endoscópica(7).

 

Figura 2: Piloro cerrado + injeção submucosa no trajeto do túnel

 

Figura 3: Cap afunilado para a confecção da mucosotomia

 

Figura 4: Túnel submucoso

 

Figura 5: Início da piloromiotomia

 

Figura 6: Piloro inteiramente seccionado

 

Figura 7: Piloro ampliado

 

Em metanálise realizada em 2020, foram identificados mais de 7000 publicações sobre a piloromiotomia endoscópica, dimensionando a popularidade do tema(Dra. Karime Lucas -ref 8). Visando a objetiva mensuração da eficácia técnica, foram incluídos apenas os trabalhos com documentação do GCSI e da cintilografia antes e após o procedimento, totalizando 281 pacientes. O levantamento identificou 100% de sucesso técnico e 71% de sucesso clínico. Havendo uma maior taxa de sucesso nas etiologias pós cirúrgicas e idiopáticas. Uma pior resposta foi encontrada nos pacientes diabéticos e nos portadores de GCSI muito elevados (superior a 30).

Uma taxa de êxito mais modesta foi encontrada em estudo prospectivo multicêntrico envolvendo 80 pacientes publicado em 2022(9). O sucesso clínico, definido como queda ≥25% em duas subescalas do escore GCSI, foi de 56% em 12 meses. Um número inferior à média das publicações sobre o tema, ressaltando a necessidade de mais estudos para identificar o perfil de pacientes que obterão melhores resultados com a piloromiotomia endoscópica.

CONCLUSÃO

A gastroparesia afeta de maneira marcante a qualidade de vida e o estado nutricional dos pacientes. A piloromiotomia endoscópica (genericamente chamada de G-POEM) surgiu como uma alternativa promissora e segura no tratamento dos pacientes refratários. Mais estudos prospectivos são necessários para confirmar os atuais resultados e individualizar o perfil de pacientes que mais se beneficiarão da técnica.

BIBLIOGRAFIA

1. Cardinal G, Index S, Res QL, Pubmed N. Gastroparesis Cardinal Symptom Index ( GCSI ): development and validation of a patient reported assessment of severity of gastroparesis. 2013;11–2.

2. Camilleri M, Parkman HP, Shafi MA, Abell TL, Gerson L. Clinical guideline: Management of gastroparesis. Am J Gastroenterol. 2013;108(1):18–37.

3. Shada AL, Dunst CM, Pescarus R, Speer EA, Cassera M, Reavis KM, et al. Laparoscopic pyloroplasty is a safe and effective first-line surgical therapy for refractory gastroparesis. Surg Endosc. 2016;30(4):1326–32.

4. Xu J, Chen T, Elkholy S, Xu M, Zhong Y, Zhang Y, et al. Gastric Peroral Endoscopic Myotomy (G-POEM) as a Treatment for Refractory Gastroparesis: Long-Term Outcomes. Can J Gastroenterol Hepatol. 2018;2018.

5. Khashab MA, Stein E, Clarke JO, Saxena P, Kumbhari V, Chander Roland B, et al. Gastric peroral endoscopic myotomy for refractory gastroparesis: First human endoscopic pyloromyotomy (with video). Gastrointest Endosc. 2013;78(5):764–8.

6. Landreneau JP, Strong AT, El-Hayek K, Tu C, Villamere J, Ponsky JL, et al. Laparoscopic pyloroplasty versus endoscopic per-oral pyloromyotomy for the treatment of gastroparesis. Surg Endosc [Internet]. 2019;33(3):773–81. Available from: http://dx.doi.org/10.1007/s00464-018-6342-6

7. Li L, Spandorfer R, Qu C, Yang Y, Liang S, Chen H, et al. Gastric per-oral endoscopic myotomy for refractory gastroparesis: a detailed description of the procedure, our experience, and review of the literature. Surg Endosc [Internet]. 2018;32(8):3421–31. Available from: http://dx.doi.org/10.1007/s00464-018-6112-5

8. Uemura KL, Chaves D, Bernardo WM, Uemura RS, de Moura DTH, de Moura EGH. Peroral endoscopic pyloromyotomy for gastroparesis: a systematic review and meta-analysis. Endosc Int Open. 2020;08(07):E911–23.

9. Vosoughi K, Ichkhanian Y, Benias P, Miller L, Aadam AA, Triggs JR, et al. Gastric per-oral endoscopic myotomy (G-POEM) for refractory gastroparesis: Results from an international prospective trial. Gut. 2022;71(1):25–33.




Você conhece a técnica Funitel ???

Já ouviu falar da  técnica de Funitel para coleta de amostra da via biliar proximal?

Tsuyoshi Hamada e colaboradores da Universidade de Tokio, publicaram recentemente a técnica  funitel para direcionamento da biópsia de lesões intraductais biliares proximais, especificamente em área de bifurcação, que consiste :

  • Utilização de dois fios guias 0,025 posicionados na região de interesse da biópsia. Com uma pinça de biópsias fenestrada pediátrica, previamente preparada com dois pequenos laços de nylon, os quais servem de suporte para os fios guias, possibilitando o direcionamento até a área da lesão alvo (fig.1).

 

Figura 1

 

  • O efeito final pode ser visualizado na figura 2:

 

Figura 2

 

Seung Bae Yoon, em 2021, publicou uma meta-análise comparando métodos de coleta de material para diagnóstico de lesões intraductais. Foram 32 estudos, totalizando 1123 pacientes com diagnóstico de colangiocarcinoma, A sensibilidade foi de 56% para o escovado, 67% para a biópsia, 70,7% associando a biópsia ao escovado e 73,6% través da ecopunção com agulha fina.

A biópsia sob visão direta, utilizando o colangioscópio de operador único com pinça dedicada, é uma opção atrativa, porém tem como fatores limitantes o custo elevado e a pequena quantidade de material coletado pelas diminutas pinças.

A técnica de funitel é uma técnica criativa que vem como mais uma opção para coleta de amostras da via biliar proximal.

Em tempo, funitel é um tipo de teleférico suportado por dois cabos de aço!

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Tumores neuroendócrinos do pancreas

Introdução

A incidência dos tumores neuroendócrinos do pâncreas está crescendo, possivelmente devido à realização com maior frequência exames de imagem e à qualidade destes exames. No entanto, sua prevalência felizmente ainda é rara. Esse post do Endoscopia Terapêutica tem a finalidade de servir como um guia de consulta quando eventualmente nos depararmos com uma dessas situações no dia a dia.

Conceitos gerais importantes sobre tumores neuroendócrinos do trato gastrointestinal

Os TNE correspondem a um grupo heterogêneo de neoplasias que se originam de células neuroendócrinas (células enterocromafins-like), com características secretórias.

Todos os TNE gastroenteropancreáticos (GEP) são potencialmente malignos e o comportamento e prognóstico estão correlacionados com os tipos histológicos.

Os TNE podem ser esporádicos (90%) ou associados a síndromes hereditárias (10%), como a neoplasia endócrina múltipla tipo 1 (NEM-1), SD von Hippel-Lindau, neurofibromatose e esclerose tuberosa.

Os TNE são na sua maioria indolentes, mas podem determinar sintomas. Desta forma, podem ser divididos em funcionantes e não funcionantes:

  • Funcionantes: secreção de hormônios ou neurotransmissores ativos: serotonina, glucagon, insulina, somatostatina, gastrina, histamina, VIP ou catecolaminas. Podem causar uma variedade de sintomas
  • Não funcionantes: podem não secretar nenhum peptídeo/ hormônios ou secretar peptídeos ou neurotransmissores não ativos, de forma a não causar manifestações clínicas.

Tumores neuroendócrinos do pâncreas (TNE-P)

Os TNE funcionantes do pâncreas são: insulinoma, gastrinoma, glucagonoma, vipoma e somatostatinoma.

Maioria dos TNE-P são malignos, exceção aos insulinomas e TNE-NF menores que 2 cm.

A cirurgia é a única modalidade curativa para TNE-P esporádicos, e a ressecção do tumor primário em pacientes com doença localizada, regional e até metastática, pode melhorar a sobrevida do paciente.

De maneira geral, TNE funcionantes do pancreas devem ser ressecados para controle dos sintomas sempre que possível. TNE-NF depende do tamanho (ver abaixo).

Tumores pancreáticos múltiplos são raros e devem despertar a suspeita de NEM1.

A SEGUIR VAMOS VER AS PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS DE CADA SUBTIPO HISTOLÓGICO

INSULINOMAS

  • É o TNE mais frequente das ilhotas pancreáticas.
  • 90% são benignos, porém são sintomáticos mesmo quando pequenos.
  • Cerca de 10% estão associadas a NEM.
  • São lesões hipervascularizadas e solitárias, frequentemente < 2 cm.
  • Tríade de Whipple:
    • hipoglicemia (< 50)
    • sintomas neuroglicopenicos (borramento visual, fraqueza, cansaço, cefaleia, sonolência)
    • desaparecimento dos sintomas com a reposição de glicose
  • insulina sérica > 6 UI/ml
  • Peptídeo C > 0,2 mmol/l
  • Pró-insulina > 5 UI/ml
  • Teste de jejum prolongado positivo (99% dos casos)

 

GASTRINOMAS

  • É mais comum no duodeno, mas 30% dos casos estão no pâncreas
  • São os TNE do pâncreas mais frequentes depois dos insulinomas.
  • Estão associados a Sd. NEM 1 em 30%, e nesses casos se apresentam como lesões pequenas e multifocais.
  • Provocam hipergastrinemia e síndrome de Zollinger-Ellison.
  • 60% são malignos.
  • Tratamento: cirúrgico nos esporádicos (DPT).
  • Na NEM 1, há controvérsia na indicação cirúrgica, visto que pode não haver o controle da hipergastrinemia mesmo com a DPT (tumores costumam ser múltiplos)

GLUCAGONOMAS

  • Raros;  maioria esporádicos.
  • Geralmente, são grandes e solitários, com tamanho entre 3-7 cm ocorrendo principalmente na cauda do pâncreas.
  • Sintomas: eritema necrolítico migratório (80%), DM, desnutrição, perda de peso, tromboflebite, glossite, queilite angular, anemia
  • Crescimento lento e sobrevida longa
  • Metástase linfonodal ou hepática ocorre em 60-75% dos casos.

VIPOMAS

  • Extremamente raros
  • Como os glucagonomas, localizados na cauda, grandes e solitários.
  • Maioria maligno e metastático
  • Em 10% dos casos pode ser extra-pancreático.
  • Quadro clínico relacionada a secreção do VIP (peptídeo vasoativo intestinal):
    • diarréia (mais de 3L litros por dia) – água de lavado de arroz
    • Distúrbios hidro-eletrolítico: hipocalemia, hipocloridria, acidose metabólica
    • Rubor
  • Excelente resposta ao tratamento com análogos da somatostatina.

 

SOMATOSTATINOMAS

  • É o menos comum de todos
  • Somatostatina leva a inibição da secreção endócrina e exócrina e afeta a motilidade intestinal.
  • Lesão solitária, grande, esporádico, maioria maligno e metastatico
  • Quadro clínico:
    • Diabetes (75%)
    • Colelitíase (60%)
    • Esteatorréia (60%)
    • Perda de peso

TNE NÃO FUNCIONANTES DO PÂNCREAS

  • 20% de todos os TNEs do pâncreas.
  • 50% são malignos.
  • O principal diagnóstico diferencial é com o adenocarcinoma

TNE-NF bem diferenciados menores que 2 cm: duas sociedades (ENETS e NCCN) sugerem observação se for bem diferenciado. Entretanto, a sociedade norte-americana NETS recomenda observação em tumores menores que 1 cm e conduta individualizada, entre 1-2 cm.

TNE PANCREÁTICO RELACIONADOS A SINDROMES HEREDITARIAS

  • 10% dos TNE-P são relacionados a NEM-1
  • Frequentemente multicêntricos,
  • Geralmente acometendo pessoas mais jovens.
  • Geralmente de comportamento benigno, porém apresentam potencial maligno
  • Gastrinoma 30-40%; Insulinoma 10%; TNE-NF 20-50%; outros 2%
  • Tto cirúrgico é controverso, pq as vezes não controla a gastrinemia (tumores múltiplos)

PS: Você se recorda das neoplasias neuroendócrinas múltiplas? 

As síndromes de neoplasia endócrina múltipla (NEM) compreendem 3 doenças familiares geneticamente distintas envolvendo hiperplasia adenomatosa e tumores malignos em várias glândulas endócrinas. São doenças autossômicas dominantes.

NEM-1
  • Doença autossômica dominante
  • Predispoe a TU (3Ps): Paratireóide; Pituitária (hipófise); Pâncreas,
  • Geralmente de comportamento benigno, porém apresentam potencial maligno
  • Gastrinoma 30-40%; Insulinoma 10%; TNE-NF 20-50%; outros 2%
  • Tto cirúrgico é controverso, pq as vezes não controla a gastrinemia (tumores múltiplos)
NEM-2A:
  • Carcinoma medular da tireoide,
  • Feocromocitoma,
  • Hiperplasia ou adenomas das glândulas paratireoides (com consequente hiperparatireoidismo).
NEM-2B:
  • Carcinoma medular de tireoide,
  • Feocromocitoma
  • Neuromas mucosos e intestinais múltiplos

Referências:

  1. Pathology, classification, and grading of neuroendocrine neoplasms arising in the digestive system – UpToDate ; 2021
  2. Guidelines for the management of neuroendocrine tumours by the Brazilian gastrointestinal tumour group. ecancer 2017,11:716 DOI: 10.3332/ecancer.2017.716

Como citar esse artigo:

Martins BC, de Moura DTH. Tumores neuroendócrinos do pancreas. Endoscopia Terapêutica. 2022; vol 1.  Disponível em: endoscopiaterapeutica.net/pt/assuntosgerais/tumores-neuroendocrinos-do-pancreas




Seis perguntas que você sempre quis fazer sobre técnicas de ressecção a frio e as respostas inusitadas baseadas em evidências que só o endoscopia terapêutica traz!

O câncer colorretal é atualmente o segundo em incidência em homens e mulheres do Brasil e o terceiro em mortalidade geral. A detecção e remoção de pólipos é uma estratégia que reduz a mortalidade e a incidência dessa neoplasia. A colonoscopia é o exame de escolha para o diagnóstico e tratamento dos pólipos, tendo um papel determinante na prevenção do câncer colorretal.

A avaliação acurada das margens verticais das lesões é de extrema importância. A maior parte das lesões de risco, com histologia avançada, são lesões grandes, maiores que 10 mm. Vale a pena lembrar, no entanto, que cerca de 5,2% dos pólipos pequenos (até 5 mm) são associados à histologia avançada. Independente do tamanho, para lesões com histologia avançada, a ressecção incompleta está associada a um pior prognóstico. Discutir indicações, técnicas de ressecção e as evidências mais recentes tem uma grande importância para todos nós.

Pensando nisso, selecionamos algumas perguntas em relação às chamadas técnicas de ressecção a frio. Vamos lá!

1. O que é melhor para pólipos pequenos (< 5 mm): polipectomia com alça ou com pinça?

A melhor técnica para ressecção de pólipos pequenos (< 5 mm) ainda é motivo de debate. Seriam essas lesões mais bem tratadas pela polipectomia com alça a frio? Será que a polipectomia com pinça é suficiente para tratá-las ?

Sabemos que a maior parte dos pólipos encontrados durante colonoscopias têm tamanho < 10 mm, e as técnicas usadas para a remoção dessas lesões são muito heterogêneas entre os endoscopistas.

Joon Sung Kim e cols conduziram um estudo clínico randomizado muito interessante em seu serviço (Hospital St Mary em Seul, Coreia do Sul) e que foi publicado no ano de 2015. Um total de 139 pacientes foi randomizado entre os grupos polipectomia com pinça e polipectomia com alça a frio. Depois do procedimento, todos os pacientes foram submetidos à mucosectomia para avaliar os leitos de ressecção em busca de lesões residuais.

Os resultados mostram que para as lesões diminutas, ou seja, com tamanho igual ou inferior a 4 mm, os resultados não diferem em relação às duas opções (uso de alça a frio ou polipectomia com pinça). No entanto, para as lesões com tamanho superior a 5 mm, a polipectomia com alça a frio está associada a uma maior taxa de ressecção completa e, por esse motivo, deve ser a preferência para essas lesões.

 

2. Fazer injeção submucosa melhora os resultados da polipectomia a frio?

Esse é um questionamento interessante. Será que há a necessidade de proceder injeção submucosa para melhorar os resultados da polipectomia a frio? Será que a injeção submucosa permite uma ressecção de mais tecido e garante as margens?

Yuichi Shimodate e cols conduziram um estudo prospectivo e randomizado em sua instituição em Okayama, no Japão, para responder a esses questionamentos. Os autores fizeram uma comparação entre a polipectomia com alça a frio auxiliada por injeção de salina na submucosa (salina + índigo carmine + adrenalina) e a polipectomia com alça a frio convencional.

Os desfechos estudados foram a taxa de ressecção completa da muscular da mucosa (definida como taxa de ressecção da muscular da mucosa > 80%), margens lateral e vertical, fragmentação das lesões e complicações, como sangramento e perfuração. Duzentos e quatorze pacientes foram randomizados entre os dois grupos. As taxas de ressecção completa de muscular da mucosa foram 43,9% no grupo com injeção submucosa e 53,3% no grupo de polipectomia convencional, e as taxas de margens vertical e lateral livres foram menores no grupo com uso de injeção submucosa (58% x 76% p=0,03 e 42,3% x 56,7% p=0,006, respectivamente). Os autores concluem que o uso de solução salina na submucosa, de maneira diferente ao que era esperado, não promoveu melhoria no manejo das lesões e, além disso, esteve associado a piores desfechos das ressecções em relação às margens.

O estudo de Shimodate mostra que vale a pena investir em uma boa técnica convencional de polipectomia a frio, sem a necessidade de injeção submucosa. Essa informação favorece, ainda, a polipectomia underwater como método de ressecção completa de lesões.

3. É possível remover lesões grandes com a técnica de polipectomia com alça a frio?

Ressecções de lesões maiores que 10 mm são usualmente realizadas com alça diatérmica e/ou mucosectomia. Esse tem sido o padrão de tratamento. O racional para o uso de corrente elétrica no manejo dessas lesões inclui facilidade na transecção dos tecidos, cauterização de eventuais tecidos displásicos remanescentes e prevenção do sangramento imediato, pela coagulação térmica dos vasos locais.

Nos últimos anos, no entanto, os impactos e riscos da injúria térmica aos tecidos têm sido demonstrados. Podemos citar a perfuração, sangramento tardio e a síndrome pós-polipectomia como exemplos de lesões causadas pelo uso do bisturi elétrico durante ressecções endoscópicas.

A ESGE (European Society of Gastrointestinal Endoscopy) recomenda o uso de polipectomia com uso de bisturi elétrico para lesões com tamanhos entre 10 e 19 mm e mucosectomia para as lesões ≥ 20 mm.

Nesse contexto, o uso da polipectomia a frio para lesões maiores que 10 mm vem sendo investigado, com as primeiras publicações datando de 2014.

Chandrasekar V e cols conduziram uma meta-análise para responder a esses questionamentos e mostraram resultados animadores em relação à segurança e eficácia da polipectomia a frio para lesões > 10 mm.

A meta-análise incluiu 8 estudos e 522 pólipos ressecados, com uma média de tamanho de 17,5 mm (10-60 mm). A taxa de efeitos adversos foi de 1,1%, com 0,7% de sangramento durante o procedimento (IC95%, 0%-1.4%), 0,5% de sangramento pós-procedimento (IC95% 1%-1,2%) e 0,6% de dor abdominal (IC95% 0,1%-1,3%). Não foi observada perfuração na análise. A taxa de complicações foi maior para pólipos ≥ 20 mm (1,3% de sangramento durante o procedimento e 1,2% de dor abdominal, sem sangramento tardio observado). A taxa de ressecção completa foi 99,3% (IC95% 98,6%-100%), e a taxa de lesão residual variou entre 1% e 11,1%, com um período de seguimento de 154 a 258 dias.

4. As taxas de sangramento são maiores com a técnica a frio?

O sangramento pode ocorrer durante o procedimento e após a ressecção. O sangramento durante o procedimento é definido como aquele com duração superior a 60s ou que requer abordagem e ocorre em cerca de 2,8% das polipectomias e 11,3% das mucosectomias. O sangramento pós-procedimento pode ocorrer a partir de 6h até 30 dias, associado à instabilidade hemodinâmica e que requer abordagem. Ocorre em cerca de 6-7% dos casos e está associado a lesões maiores que 20 mm, uso de antitrombóticos e lesões em cólon direito.

polipectomia com alça a frio e polipectomia com pinçaNa questão anterior, mostramos os resultados da meta-análise de Chadrasekar e cols, que mostraram taxas de sangramento intra e pós-procedimento por volta de 1%, mesmo para lesões maiores que 20 mm.

5. O que é aquela “coisinha branca protrusa e revirada” que fica no leito de ressecção? Devo me preocupar com aquilo?

A polipectomia com alça a frio é usualmente usada para remoção segura e efetiva de pólipos e é uma estratégia muito interessante para a prevenção do câncer colorretal. Como mencionado previamente neste texto, a polipectomia com alça a frio é mais usada para lesões pequenas, com tamanho entre 3 e 9 mm, no entanto, a técnica é também efetiva para lesões maiores.

Um dos riscos da polipectomia com alça a frio é a formação de protrusões de tecido no leito de ressecção após a realização da polipectomia.

polipectomia com alça a frio

A prevalência dessas protrusões é de cerca de 14 a 36% e, em sua maioria, correspondem a parte da muscular da mucosa ou da submucosa. Inicialmente, a maioria dos autores não considerou que essas protrusões tivessem algum significado clínico relevante. No entanto, alguns grupos têm valorizado esses achados durante o exame do leito de ressecção. Seriam essas protrusões associadas a problemas?

Tatsuya Ishii et al conduziram um interessante estudo retrospectivo, publicado no periódico GIE de Maio de 2021, estudando os leitos de ressecção e também as peças (pólipos) ressecadas. Os autores acessaram um total de 1.026 lesões, e, dessas, 116 (11,3%) exibiam protrusões de tecido no leito de ressecção. As protrusões estavam associadas à fragmentação das peças tanto em análise univariada (OR 3,74 IC95% 2,47-5,66 p<0.001) quanto em análise multivariada (OR 3,13 IC95% 2,04-4,82 p<0.001). Apesar disso, a proporção de taxas de ressecção completa não foi diferente nos pacientes, independente do fato de existirem as protrusões. A proporção de muscular da mucosa < 50% foi mais elevada no grupo que apresentava as protrusões (48,5 x 29,1% p<0.001).

As protrusões foram associadas com um maior tamanho dos pólipos e dos espécimes ressecados, tanto em análise univariada quanto em análise multivariada. Os autores argumentam que a presença dessas protrusões pode ser um alerta para um diagnóstico patológico fragilizado, pela associação com menor proporção de muscular da mucosa representada na peça e maior associação com fragmentação, que prejudica a análise das margens. Em pólipos malignizados isso torna-se um problema grave.

6. E a polipectomia/mucosectomia underwater? Tem alguma vantagem em relação à técnica convencional?

Nas chamadas técnicas underwater, o espaço luminal é preenchido por água, o que mantém a camada muscular própria sob tensão, fazendo com que as camadas submucosa e mucosa “flutuem”. Dessa maneira, os riscos de lesão térmica e de perfuração estão minimizados, e as técnicas underwater surgem como alternativas às técnicas ditas convencionais.

A injeção na submucosa é considerada um passo importante nos procedimentos de mucosectomia convencional e tem a função de elevar as lesões, tornando-as polipoides e, dessa maneira, facilitando a apreensão com alça de polipectomia. Além disso, afasta as lesões da camada muscular própria, minimizando os riscos de sangramento e perfuração, e, em teoria, aumentaria as taxas de ressecção completa e margens negativas.

O estudo prospectivo e randomizado de Shimodate e cols (mencionado previamente neste post) mostrou resultados que contrariam as premissas das técnicas de mucosectomia convencional e destacam as qualidades dos procedimentos underwater.

Recentemente, uma meta-análise de Choi e cols comparou a mucosectomia underwater (614 pacientes) e a mucosectomia convencional (623 pacientes), mostrando resultados inusitados. Os autores observaram que os procedimentos underwater estavam mais associados a ressecções “em bloc” e menores índices de recorrência em relação às técnicas convencionais, principalmente para lesões maiores que 20 mm. O quadro abaixo mostra os principais achados do estudo:

Sabemos que a recorrência das lesões está fortemente associada a ressecções incompletas ou ressecções piecemeal. As técnicas underwater têm se mostrado seguras, factíveis em diferentes contextos e associadas a maiores taxas de ressecção completa em estudos diversos, estudos head to head, publicados recentemente.

Como citar este artigo

Cardoso DMM. 6 perguntas que você sempre quis fazer sobre técnicas de ressecção a frio e as respostas inusitadas baseadas em evidências que só o endoscopia terapêutica traz. Endoscopia Terapêutica; 2021. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/assuntosgerais/6-perguntas-que-voce-sempre-quis-fazer-sobre-tecnicas-de-resseccao-a-frio

Referências

  1. Kim JS, Lee Bo-In, Choi H et al. Cold snare polypectomy versus cold forceps polypectomy for diminutive and small colorectal polyps: a randomized controlled trial. (Gastrointest Endosc 2015;81:741-7.
  2. Shimodate Y, Itakura J, Takayama H et al. Impact of submucosal saline solution injection for cold snare polypectomy of small colorectal polyps: a randomized controlled study. Gastrointest Endosc 2020;92:715-22.
  3. Ferlitsch M, Moss A, Hassan C, et al. Colorectal polypectomy and endoscopic mucosal resection (EMR): European Society of Gastrointestinal Endoscopy (ESGE) Clinical Guideline. Endoscopy 2017;49:270-97.
  4. Chandrasekar VT, Spadaccini M, Aziz M et al. Cold snare endoscopic resection of nonpedunculated colorectal polyps larger than 10 mm: a systematic review and pooled-analysis. Gastrointest Endosc 2019;89:929-36.
  5. Ishii T, Harada T, Tanuma T et al. Histopathologic features and fragmentation of polyps with cold snare defect protrusions. Gastrointest Endosc 2021;93:952-9.

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Divertículos gástricos

Os divertículos gástricos (DG) são saculações que protruem pela parede gástrica, geralmente ocorrendo no fundo, pela parede posterior. Alguns fatos:

  • São os divertículos menos comuns do trato gastrointestinal;
  • Anormalidade anatômica rara;
  • Em geral é um achado incidental;
  • Incidência é difícil de ser avaliada, estimada em cerca de 0,04% dos exames radiológicos de estômago e de 0,01 a 0,11% em endoscopias.

Quanto a sua origem, podem ser congênitos (ou verdadeiros), compostos por todas as camadas do estômago, ou serem adquiridos (ou falsos) ,compostos apenas pela mucosa, estes últimos ainda podem ser subdivididos pela origem, como tração ou inflamação, em que uma força externa traciona a mucosa – causando os divertículos (pós-operatórios, pancreatites, úlceras) –, ou de pressão, em que a força interna causa a protrusão (tosse, obesidade).

Os DGs do tipo congênitos são mais comuns (70% dos casos), com localização mais habitual no fundo pela grande curvatura, cerca de 3 cm abaixo do cárdia, e podem conter mucosa ectópica (FIGURA 1 E 2). A origem deve-se a alterações de divisão das fibras longitudinais perto do cárdia, gerando uma área de fraqueza DG, quando localizados na área prepilórica tendem a estar associados ao pâncreas ectópico.

FIGURA 1

FIGURA 2

Apesar de a maioria dos portadores serem assintomáticos, sintomas podem ocorrer, como dor epigástrica, náuseas, dispepsia, saciedade precoce, halitose e até disfagia. Complicações, como perfuração, sangramento ou neoplasia, são mais raras. O sintoma mais comum é a dor epigástrica, presente em cerca de 18 a 30% dos casos. Arrotos e halitose por crescimento bacteriano e estase alimentar podem ocorrer, sendo socialmente desagradáveis. Assim, o diagnóstico clínico dessa alteração é muito difícil.

O diagnóstico do DG é incomum, mas importante, pois, apesar das complicações serem raras, podem ocorrer, entre elas, alterações na mucosa do divertículo com risco aumentado de transformação para câncer. Assim, o melhor método diagnóstico é a endoscopia digestiva cuidadosa, podendo avaliar a localização, tamanho e alterações mucosas. Exames contrastados gástricos e CT também podem ser utilizados, mas são menos específicos.

O tratamento depende do tamanho e sintomas. Em geral, pacientes assintomáticos devem ser apenas observados. Divertículos grandes com complicações ou muito sintomáticos devem ser ressecados. Uma abordagem não cirúrgica também pode ser inicialmente indicada, com PPI por algumas semanas. DGs maiores que 4 cm em geral estão associados a pior resposta clínica. Nas complicações, principalmente sangramentos, a terapêutica endoscópica já está bem estabelecida.

Por fim, o tratamento cirúrgico de ressecção fica reservado aos pacientes com divertículos maiores que 4 cm, sintomáticos após tratamento clínico, complicações não tratadas endoscopicamente (perfuração e sangramentos), sendo a via de acesso (aberta ou laparoscópica) de escolha do cirurgião.

Como citar este artigo

Sauniti G. Divertículos gástricos. Endoscopia Terapêutica; 2021. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/uncategorized/diverticulos-gastricos/

Referências

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  2. Rashid F, Aber A, Iftikhar SY. A review on gastric diverticulum. World J Emerg Surg. 2012 Jan 18;7(1):1. doi: 10.1186/1749-7922-7-1. PMID: 22257431; PMCID: PMC3287132.

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Podemos considerar a ecoendoscopia um exame seguro?

A ecoendoscopia é um método emergente e minimamente invasivo que dia a dia vem se aprimorando e adquirindo novas tecnologias e, com isso, ampliando suas finalidades diagnósticas e terapêuticas. No Brasil, deixou de ser exame restrito aos grandes hospitais das capitais, estando atualmente difundido por quase todo o país. No entanto, com o aumento da sua demanda, observam-se também maiores índices de eventos adversos. Mas, afinal, podemos considerá-la um método seguro?

A perfuração é um dos eventos adversos mais temidos, pois na maioria das vezes requer tratamento cirúrgico. Os locais mais comumente acometidos são as áreas de maior angulação, como a hipofaringe, o duodeno (durante a passagem do aparelho do bulbo para a segunda porção) e a transição do retossigmoide. O maior risco de perfuração em relação à endoscopia digestiva alta é devido principalmente às características do aparelho: o ecoendoscópio, além de calibroso, possui uma ponta pouco flexível devido a um segmento rígido nos 4 cm distais, aumentando o desafio na introdução do aparelho, principalmente se o paciente possuir alterações pós-cirúrgicas, divertículos e estenoses associadas. Essa dificuldade se torna ainda mais acentuada pelo campo de visão restrito quando há necessidade de utilização do aparelho linear, dedicado à realização das punções ecoguiadas.

Para minimizar o risco de perfuração, é importante que o ecoendoscopista esteja familiarizado com o equipamento e conheça bem a anatomia. Pacientes submetidos a punções ecoguiadas estão até dez vezes mais propensos a eventos adversos, comparativamente àqueles não puncionados, mesmo assim com incidência em torno de 1-3%. Dor, infecções, pancreatite aguda e hemorragia são os eventos mais observados. Peritonite biliar e implante tumoral são extremamente raros, com poucos casos reportados na literatura, e a mortalidade relatada, estimada em 0,02%.

O risco de infecção pós-punção pode ocorrer especialmente nas lesões de natureza cística. Para tanto, recomendam-se alguns cuidados no intuito de diminuir esse evento, como realizar punção única, esvaziar, sempre que possível, completamente o conteúdo do cisto e administrar antibiótico profilático.

A possibilidade de pancreatite iatrogênica sempre deve ser considerada nas punções pancreáticas e ocorre em cerca de 2% dos casos, sendo a forma leve a mais frequentemente observada, estando os pacientes com história de pancreatite aguda recorrente e aqueles com doenças pancreáticas benignas sob maior risco. Para aumentar a segurança do procedimento, deve-se evitar transfixar o ducto pancreático, além de grandes segmentos de parênquima pancreático saudável com a agulha da punção.

Hemorragias leves e autolimitadas intraluminais são reportadas em até 4% dos casos e usualmente não requerem intervenção endoscópica, cirúrgica ou transfusões. Estão sob maior risco os pacientes com lesões císticas, bem vascularizadas (como tumores neuroendócrinos, lesões subepiteliais mesenquimais e algumas metástases) ou aquelas próximas aos grandes vasos, e portadores de hipertensão portal. O uso do doppler para calcular o melhor trajeto da agulha e o questionamento sob uso de anticoagulantes e antiplaquetários são primordiais para diminuir o risco de hemorragia.

Devido ao relativo baixo risco de eventos adversos, principalmente considerando casos fatais, podemos considerar a ecoendoscopia, com ou sem punção, procedimento seguro, estando o sucesso da técnica diretamente relacionado ao treinamento adequado e experiência do médico executante, além da pronta identificação/tratamento do evento adverso e apropriada seleção do paciente.

Podemos considerar a ecoendoscopia um exame seguro? - Punção ecoguiada de cisto pancreático

Punção ecoguiada de cisto pancreático

 

Podemos considerar a ecoendoscopia um exame seguro? - Material de punção ecoguiada

Material de punção ecoguiada

 

Como citar este artigo

Ribeiro MSI. Podemos considerar a ecoendoscopia um exame seguro?. Endoscopia Terapêutica; 2021. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/assuntosgerais/podemos-considerar-a-ecoendoscopia-um-exame-seguro/

Referências

  1. Jenssen C et al. World J Gastroenterol. 2012 Sep 14; 18(34): 4659–4676.

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PMAE x colecistite aguda: mitos e verdades

A neoplasia pancreática da vesícula biliar e do ducto biliar é a causa mais comum de obstrução biliar maligna extra-hepática. Em caso de câncer avançado irressecável, o prognóstico é bastante reservado, com uma taxa de sobrevida em 5 anos inferior a 2%. Nesses casos, o tratamento da icterícia obstrutiva é paliativo e realizado de forma não cirúrgica por meio da colocação de prótese endoscópica ou percutânea, esta última geralmente considerada após tentativa endoscópica malsucedida.

Vários tipos de próteses estão comercialmente disponíveis, incluindo as de plástico (PP) e as metálicas autoexpansíveis (PMAE). As últimas são superiores às primeiras em termos de patência e consideradas mais custo-efetivas para pacientes com obstrução biliar maligna irressecável. Existem dois tipos de PMAE: a descoberta (PMAED), que é um tubo construído a partir de fios de liga metálica; e a recoberta (PMAER), que possui um material sintético fornecendo cobertura à liga metálica, seja parcial (excluindo as extremidades) ou total (incluindo toda a prótese). O ímpeto por trás do desenvolvimento da PMAER foi diminuir o risco de crescimento interno de tecido através da malha metálica da PMAED, melhorando, assim, a duração da patência.

Como resultado dos avanços na CPRE terapêutica e do desenvolvimento de uma variedade de PMAE, complicações após procedimentos com colocação de próteses, embora não sejam frequentes, estão sendo cada vez mais identificadas. As principais complicações incluem migração, colangite, pancreatite, colecistite e obstrução, que podem ser fatais quanto acometem pacientes com uma expectativa de vida curta.

A migração e a obstrução da prótese são complicações mais frequentes e com causas bem estabelecidas. Já no que se refere à colecistite, a incidência varia bastante na literatura, oscilando entre 1,9% e 12% dos casos, e sua causa permanece um assunto bastante controverso na literatura, com trabalhos apresentando resultados conflitantes. Existem várias teorias que tentam justificar a razão pela qual as próteses biliares podem estar associadas à colecistite: colonização bacteriana da bile após esfincterotomia endoscópica; preenchimento da vesícula biliar por meio de contraste não estéril e interrupção do fluxo de bile. Outras duas variáveis que também poderiam ser consideradas associadas ao surgimento da colecistite são o comprometimento do orifício do ducto cístico por tumor e a presença de cálculos no interior da vesícula biliar.

Além da compressão causada pelo material de cobertura das próteses, que se sobrepõe ao orifício do ducto cístico, os mecanismos pelos quais a interrupção do fluxo biliar pode ocorrer são por meio de 2 vias distintas (mas não mutuamente excludentes): obstrução pelo crescimento de tecido através ou sobre a PMAE e agregação de detritos dentro do lúmen da prótese. Embora úteis na prevenção do crescimento interno de tecido, os materiais de cobertura das PMAERs, que incluem silicone, policaprolactona e poliuretano, podem aumentar o desenvolvimento de biofilme aderente, que eventualmente promove o rápido acúmulo de detritos e consequente entupimento. Isso poderia explicar, inclusive, as taxas de oclusão semelhantes observadas em vários trabalhos entre os grupos de PMAER e PMAED.

A relação do orifício do ducto cístico com a localização do tumor pode interferir no surgimento da colecistite. Diferentemente dos tumores localizados acima ou abaixo, o que compromete diretamente o orifício do ducto cístico pode ocasionar uma redução significativa da drenagem da vesícula biliar, culminando com a inflamação/infecção da vesícula.

Em alguns trabalhos, além da confirmação de que a obstrução do ducto cístico pode ser responsável pelo desenvolvimento de colecistite, a presença de colelitíase findou por ser constatada como outro fator de risco. A hipomotilidade da vesícula biliar ou infecção da bile, como fatores de risco para a formação de cálculos biliares, podem resultar no desenvolvimento de colecistite após a colocação de prótese.

A despeito do racional fisiopatológico elencado acima, a ocorrência da colecistite após inserção de PMAE persiste como ponto bastante polêmico. Diversas metanálises não evidenciaram risco aumentado de colecistite após passagem de próteses recobertas quando comparado com as próteses descobertas, o que, em teoria, é contrário ao esperado com base nas explicações mais óbvias. Ademais, tanto a colelitíase quanto o envolvimento do ducto cístico por tumor aqui mencionados, apesar de citados em poucos trabalhos, não figuraram de forma definitiva nas revisões sistemáticas.

Assim sendo, à luz da medicina baseada em evidências, não é possível estabelecer de maneira incontestável a relação entre as PMAE e o surgimento da colecistite, de forma que não há de se falar em contraindicação ao procedimento ou tipo do material utilizado por essa razão.

Por fim, a escolha do modelo de prótese a ser utilizado deve seguir uma formatação multidisciplinar e parcimoniosa, muito mais individualizada do que genérica, levando-se em consideração todas as variáveis que permeiam o caso clínico. A opção pela PMAED pode ser preferida em pacientes com doença avançada, de baixa expectativa de sobrevida e com menor probabilidade de apresentar ingrowth. Por outro lado, nos pacientes sabidamente com neoplasia pancreática ou colangiocarcinoma, em que sobrevida estimada tende a ser maior, a escolha pode recair sobre a PMAER, pois, além de prevenir o ingrowth, permite futuras trocas em caso de disfunção.

PMAE x Colecistite aguda – Mitos e Verdades

Mitos e Verdades PMAE x Colecistite aguda

Como citar este artigo

Brasil G. PMAE x Colecistite aguda – Mitos e Verdades. Endoscopia Terapêutica; 2021. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/assuntosgerais/pmae-x-colecistite-aguda-mitos-e-verdades

Referências bibliográficas

  1. Suk et al. Risk factors for cholecystitis after metal stent placement in malignant biliary obstruction. Gastrointest Endosc 2006;64:522-9.
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  3. Conio et al. Covered versus uncovered self-conformable metal stent for palliation of primary malignant extrahepatic biliary strictures: a randomized multicenter study. Gastrointest Endosc 2018 Aug;88(2):283-291.e3.
  4. Seo et al. Covered and uncovered biliary metal stents provide similar relief of biliary obstruction during neoadjuvant therapy inpancreatic cancer: a randomized trial. Gastrointestinal Endoscopy Volume 90, No. 4 : 2019
  5. Jang et al. Association of covered metallic stents with cholecystitis and stent migration in malignant biliary stricture. Gastrointestinal Endoscopy Volume 87, No. 4 : 2018.

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Tumor de Krukenberg

O tumor de Krukenberg (TK) caracteriza-se por uma lesão metastática ovariana proveniente do adenocarcinoma de células em anel de sinete rico em mucina. É uma patologia incomum responsável por 1% a 2% das neoplasias ovarianas.

Foi descrito pela primeira vez em 1896 pelo ginecologista e patologista alemão Friedrich Ernst Krukenberg (1871-1946), que suspeitava ser essa lesão um novo tipo de neoplasia primária do ovário. A descoberta dessa como lesão metastática ovariana, de um tumor primário epitelial, só foi realizada em 1902.

Os sítios primários podem ser provenientes de diversos locais:

  • Estômago: sítio mais frequente, correspondendo a cerca de 70% dos casos, principalmente no piloro, representado pelo adenocarcinoma de células em anel de sinete ou difuso;
  • Cólon e reto (adenocarcinoma);
  • Mama (carcinoma lobular invasivo);
  • Outros (ex: vesícula biliar, apêndice e intestino delgado).

Somando-se as incidências de metástases oriundas do estômago e da topografia colorretal, elas totalizam aproximadamente 90% dos sítios primários do TK. Portanto, em regiões que apresentem alto índice de câncer gástrico, como em países asiáticos, a incidência do TK também é elevada, podendo representar até 20% das neoplasias do ovário.

O perfil epidemiológico é representado por mulheres jovens, na fase pré-menopausa, com idade média de 40 a 45 anos, fato que difere o TK dos tumores primários de ovário, que apresentam maior incidência na sexta década de vida.

Sintomas

Os principais sintomas acarretados pelo TK surgem pelo efeito de massa ou devido ao desequilíbrio da produção hormonal.

  • Grandes massas ovarianas: dor ou distensão abdominal, ascite, perda ponderal, dor pélvica e dispareunia;
  • Produção hormonal exacerbada: hirsutismo, irregularidade no ciclo menstrual ou sangramento naquelas pós-menopausa.

Entretanto, o TK pode permanecer assintomático até em estágios avançados ou gerar sintomas inespecíficos.

Diagnóstico

Em 1973, Serov e Scully definiram critérios para auxiliar no diagnóstico do TK que posteriormente foram adotados pela OMS. São estes:

  • Presença de neoplasia ovariana infiltrativa com células em anel de sinete preenchidas por mucina;
  • Presença do envolvimento estromal ou apenas a proliferação sarcomatoide do estroma ovariano.

A imuno-histoquímica tem um papel fundamental no diagnóstico, sendo o CK7 e CK20 os antígenos mais utilizados. Se CK7 e CK20 positivos ou apenas o CK20 positivo, a lesão é sugestiva de uma metástase de TK, mas, se imunorreatividade positivo para CK7 e negativo para CK20, a lesão favorece um carcinoma de ovário primário.

Outro parâmetro útil é o antígeno carcinoembrionário (CEA). Se positivo juntamente à imunorreatividade negativa para CA 125, a lesão favorece origem metastática.

Tabela 1. Relação dos marcadores imuno-histoquímicos dos tumores ovarianos.

TIPOS DE TUMORES CK7 CK20 CEA CA-125
TK gástrico e colorretal + +
Neoplasia ovariana 1ª + +

Com o diagnóstico de TK, é importante a investigação pormenorizada em busca dos focos primários, seja por meio de métodos endoscópicos ou radiológicos.

Como o local da neoplasia primária frequentemente é o TGI, é de extrema importância a realização de endoscopia digestiva alta e colonoscopia. Devemos nos atentar aos pontos cegos do estômago, como a região da cárdia, entre as pregas da grande curvatura do corpo, e até mesmo valorizar os sinais discretos, como o espessamento das pregas ou diminuição da expansibilidade gástrica.

Nos métodos de imagem radiológicos (como a ultrassonografia, tomografia computadorizada ou ressonância magnética), o TK apresenta-se como massas ovarianas assimétricas, complexas, sólidas (em menor frequência císticas), com proporções variáveis e bilaterais.

O fato da bilateralidade em 80% dos casos, ocasionado por sua natureza metastática, é de grande valia na realização do diagnóstico diferencial de outros tumores, como os carcinomas mucinosos ovarianos primários, tumores carcinoides mucinosos e tumores de células de Sertoli e Sertoli-Leydig.

Vias de disseminação

A via de disseminação mais aceita, se o sítio primário for no estômago, é a via linfática retrógrada:

  • As células neoplásicas metastizam-se para os linfonodos perigástricos, formando êmbolos que bloqueiam o sistema linfático, e, pelo refluxo, alcançam a linfa paraórtica e pélvica;
  • Sendo os ovários tão bem vascularizados, eles têm preferência pelo depósito de tais células.

Outras vias de disseminação são a direta (transperitoneal) e a hematogênica.

Acompanhamento

O marcador CA-125 pode ser um parâmetro útil tanto para o rastreio de metástases ovarianas (em pacientes com adenocarcinoma primário do TGI) como para monitorização de doença ativa, marcador para análise da ressecabilidade cirúrgica e avaliação do prognóstico.

 Prognóstico

Mesmo com os avanços da medicina, o prognóstico do TK ainda permanece desfavorável, devido a seu caráter metastático e a sua evolução silenciosa (acaba sendo diagnosticado em estágios avançados).

  • A taxa de sobrevida média após o diagnóstico é menor que 2 anos;
  • Atualmente, nenhum tratamento curativo está disponível;
  • Tratamento cirúrgico é indicado para pacientes jovens e hígidas com doença limitada;
  • Para pacientes sintomáticas, o tratamento paliativo cirúrgico pode ser considerado após discussão multidisciplinar.

Como citar este artigo

Gregório JM. Tumor de Krukenberg. Endoscopia Terapêutica; 2021. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/uncategorized/tumor-de-krukenberg/

Referências

  1. Aziz M, Kasi A. Krukenberg Tumor. 2021 Jul 25. In: StatPearls [Internet]. Treasure Island (FL): StatPearls Publishing; 2021 Jan–. PMID: 29489206.
  2. Kubeček O, Laco J, Špaček J, Petera J, Kopecký J, Kubečková A, Filip S. The pathogenesis, diagnosis, and management of metastatic tumors to the ovary: a comprehensive review. Clin Exp Metastasis. 2017 Jun;34(5):295-307. doi: 10.1007/s10585-017-9856-8. Epub 2017 Jul 20. PMID: 28730323; PMCID: PMC5561159.
  3. Al-Agha OM, Nicastri AD. An in-depth look at Krukenberg tumor: an overview. Arch Pathol Lab Med. 2006 Nov;130(11):1725-30. doi: 10.5858/2006-130-1725-AILAKT. PMID: 17076540.
  4. Lyngdoh BS, Dey B, Mishra J, Marbaniang E. Krukenberg tumor. Autops Case Rep. 2020 Apr 2;10(2):e2020163. doi: 10.4322/acr.2020.163. PMID: 33344281; PMCID: PMC7703453.
  5. Agnes A, Biondi A, Ricci R, Gallotta V, D’Ugo D, Persiani R. Krukenberg tumors: Seed, route and soil. Surg Oncol. 2017 Dec;26(4):438-445. doi: 10.1016/j.suronc.2017.09.001. Epub 2017 Sep 12. PMID: 29113663.
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Fundoplicatura gástrica: como avaliar?

Frequentemente, recebemos pacientes submetidos à fundoplicatura (FPL) para avaliação pós-operatória.

Apesar de parecer um exame relativamente simples, muitas vezes temos dificuldade em avaliar corretamente todas as características das fundoplicaturas, especialmente quando encontramos anormalidades ou complicações cirúrgicas.

Primeiramente, é preciso entender alguns princípios básicos da cirurgia:

  • A válvula é confeccionada com o fundo gástrico que passa posteriormente ao estômago;
  • A FPL deve envolver cerca de 2 a 3 cm do esôfago distal;
  • O ponto que segura a válvula deve “beliscar” a parede anterior do esôfago, para evitar que ela deslize para baixo;
  • Aproximação dos pilares diafragmáticos (hiatoplastia).

Aspecto endoscópico da fundoplicatura Nissen (360°)

Visão Frontal

  • TEG deve estar sob zona de pressão, ou seja, envolta pela fundoplicatura (admite-se como normal até 1 cm acima);
  • Transposição do endoscópio pela FPL ocorre com leve resistência, sem desvio do eixo e sem “degrau”.

À retrovisão (fundoplicatura Nissen – 360°)

  • Prega gástrica transversal envolvendo circunferencialmente a cárdia, justa ao aparelho e sem torções;
  • Sem torções significa: estar paralela às linhas brancas demarcatórias do endoscópio;
  • Fundoplicatura intra-abdominal;
  • Ausência de hérnia paraesofágica (hiatoplastia íntegra).

À retrovisão (fundoplicatura Toupet-Lind – 270°)

  • Prega gástrica transversal envolvendo parcialmente a cárdia;
  • Prega posterior menos robusta que a Nissen;
  • Com os movimentos respiratórios, podem ocorrer breves períodos de abertura da válvula, expondo a linha Z.
À retrovisão (fundoplicatura Toupet-Lind – 270°)
Na visão frontal, a TEG deve estar sob zona de pressão, ou seja, envolta pela fundoplicatura.
Na retrovisão, a FPL deve envolver a cárdia
Na retrovisão, a FPL deve envolver a cárdia, abraçando o aparelho em quase 360°. Avaliar se a válvula está paralela à demarcação do aparelho ou se não está torcida.
Fundoplicatura
FPL parcial envolve o aparelho em menos de 360 graus, porém em mais de 180 graus (ou estaria desgarrada). O formato da FPL é da letra grega ômega. Com base nesses conhecimentos, fica mais fácil entender as anormalidades da cirurgia.

Com base nesses conhecimentos, fica mais fácil entender as anormalidades da cirurgia

Fundoplicatura desgarrada

A prega gástrica transversal não envolve o aparelho. A prega faz uma linha reta e um ângulo de 180º na cárdia. É comum a recidiva dos sintomas do refluxo nessa situação.

Fundoplicatura Desgarrada
Fundoplicatura desgarrada. Não envolve o aparelho.

Fundoplicatura torcida

Prega gástrica (FPL) não está paralela às linhas de demarcação do endoscópio. Geralmente, isso se deve a um erro técnico no qual não houve liberação adequada do fundo gástrico. Podem ocorrer sintomas, como disfagia ou refluxo.

Fundoplicatura torcida
FPL torcida. A prega gástrica deveria estar paralela às linhas brancas de demarcação do endoscópio. Nesse caso, está correndo em um sentido crânio-caudal, ou seja, torcida.

Fundoplicatura migrada

A FPL encontra-se íntegra, porém a hiatoplastia se abriu, permitindo a migração cranial da fundoplicatura e da TEG em direção ao tórax. Muitas vezes, apesar dessa complicação, os pacientes permanecem assintomáticos.

Fundoplicatura migrada
FPL migrada. Na visão endoscópica, observa-se também uma hérnia para-hiatal.

Fundoplicatura deslizada (FPL gastrogástrica ou estômago bicompartimentado)

Essa situação é relativamente comum, mas as pessoas têm dificuldade em diagnosticar – talvez por desconhecerem o termo.

A FPL deve envolver o esôfago distal e a linha Z. Mas ela pode deslizar (descer) e ficar abraçando o próprio estômago. Na visão endoscópica frontal, observa-se a TEG 2 cm ou mais acima da zona de constrição (como uma hérnia hiatal). Na retrovisão, observa-se a fundoplicatura intra-abdominal, ou seja, ela não está migrada nem desgarrada.

Fundoplicatura deslizada
Fundoplicatura deslizada. A TEG está acima da zona de constrição.
Fundoplicatura deslizada
Fundoplicatura deslizada. A TEG está acima da zona de constrição. Nota-se câmara gástrica herniada, e à retrovisão o aspecto da fundoplicatura é normal.

Presença, ou não, de hérnia paraesofágica

A FPL pode estar íntegra, em posição intra-abdominal, não desgarrada, mas a hiatoplastia pode ter se alargado, permitindo a herniação de parte do fundo gástrico para o tórax. Notam-se pregas gástricas correndo em direção à hiatoplastia e “caindo” na cavidade torácica.

Fundoplicatura com presença de hérnia paraesofágica
Fundoplicatura intra-abdominal e não desgarrada, porém com hérnia paraesofágica.

Resumo da avaliação endoscópica

TEG x fundoplicatura

  • TEG está sob zona de pressão, ou seja, envolta pela fundoplicatura;
  • TEG está fora da zona de pressão, ou seja, acima da fundoplicatura. Se > 2 cm acima, concluímos como FPL deslizada.

Posição da fundoplicatura

  • Fundoplicatura intra-abdominal;
  • Fundoplicatura parcialmente migrada;
  • Fundoplicatura totalmente migrada.

Descrição da fundoplicatura

  • Fundoplicatura envolve completamente a cárdia;
  • Fundoplicatura envolve parcialmente a cárdia;
  • Fundoplicatura completamente desgarrada;
  • Fundoplicatura torcida.

Presença de hérnia paraesofágica

  • Presente;
  • Ausente.

Veja também

Quiz! Você conhece essas anormalidades das fundoplicaturas?

Como citar este artigo

Martins B. Fundoplicatura gástrica: como avaliar? Endoscopia Terapêutica; 2021. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/assuntosgerais/fundoplicatura-gastrica-como-avaliar/

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Você sabe o que é fiducial?

O câncer de pâncreas é a quarta principal neoplasia causadora de mortes nos Estados Unidos. Dos pacientes diagnosticados com essa condição, apenas 10% são candidatos à cirurgia, sendo que 30 a 40% são limítrofes entre ressecável e localmente avançado, e os outros 50 a 60% já apresentam doença metastática.

Dentre as opções terapêuticas para os pacientes não candidatos cirúrgicos, a radioterapia tem um papel importante, sendo a modalidade estereotáxica a preferida pois consegue entregar uma alta dose de radiação em uma área bem-definida, aumentando sua efetividade e diminuindo os efeitos colaterais.

Um dos maiores desafios da radioterapia nos tumores de pâncreas é que, durante o ciclo respiratório, estima-se uma movimentação do alvo entre 2 e 3 cm, dessa forma a implantação de um marcador radiológico, fiducial, forneceria um ponto de referência fixo.

A implantação do fiducial pode ser realizada por meio da ecoendoscopia, cirurgia ou mesmo percutânea. Entretanto, o acesso pancreático percutâneo pode ser desafiador pelo risco de injúria vascular e/ou a órgãos adjacentes, além da maior possibilidade de implantação neoplásica peritoneal, sendo o acesso cirúrgico mais invasivo. Assim, a implantação por meio da ecoendoscopia tem surgido como primeira opção nesses casos.

Tipos

Os fiducials mais comuns são os sólidos feitos de ouro ou platina, sendo que ainda há modelos menos comuns de polímeros de carbono e ensaios clínicos iniciais utilizando líquidos. A utilização de líquidos (hydrogel) teria o benefício de não produzir artefatos, baixo risco de migração e seu desaparecimento local após o período de tratamento. Com relação ao formato, eles podem ser retos (cilíndricos) ou em forma de bobina (coil), que, em teoria, apresentaram um risco menor de migração, apesar de um recente estudo feito por Kashab não ter demonstrado diferença.

Em uma pesquisa feita entre médicos, os modelos mais utilizados são os cilíndricos ou coil, feitos de ouro (maior disponibilidade de modelos), com diâmetros entre 0,35 e 0,43 mm e comprimento de 5 a 10 mm, apresentando uma melhor relação entre contraste e artefatos. Entretanto, os estudos comparando os diversos modelos são conflitantes, não havendo definição sobre o melhor material ou formato.

Fiducials tipo coil e reto de platina

Figura 1: Fiducials tipo coil e reto de platina (LumiCoil®)

Técnica

Sua implantação é realizada por meio de agulhas de FNA, sendo que os fiducials com diâmetro ≥ 0.75 mm necessitam de uma agulha de 19G. Entretanto, devido à facilidade técnica, sempre que possível o ideal é a utilização de agulhas 22G.

Existem duas diferentes técnicas de carregamento do fiducial: pela ponta e pelo luer da agulha. Pelo luer, a agulha FNA é locada à lesão, na sequência o estilete é removido, seguido da introdução do fiducial no lúmen da agulha, o qual é empurrado com o estilete. Essa técnica pode ser desafiadora nos casos em que a agulha está angulada, além da possibilidade de entrarem bolhas de ar na agulha após a retirada do estilete, prejudicando a visualização adequada do procedimento. Na técnica pela ponta, a agulha é carregada com o estilete previamente à sua introdução. Inicialmente, o estilete é retraído 10 mm, seguido da colocação do fiducial em sua ponta. Existem ainda agulhas já pré-carregadas com fiducials, que não demonstraram superioridade em estudos clínicos.

No Brasil, atualmente, está disponível o modelo da LumiCoil® da Boston Scientific, feito de platina, nos tamanhos 5 mm no formato reto e 10 mm no formato coil, ambos compatíveis com agulha FNA 22G, sendo possível o carregamento pela ponta e pelo luer na reta e apenas pela ponta na coil.

Resultados

Com relação ao sucesso técnico do procedimento, as revisões demonstraram resultados entre 96 e 98%. A dificuldade técnica ocorre principalmente nos casos de lesões em cabeça pancreática ou processo uncinado, utilizando agulhas de 19G e carregamento pelo luer.

O risco de migração fica em entre 3 e 4% e pode ocorrer de forma imediata devido a dificuldades técnicas ou mesmo tardio por regressão do tumor após terapia neoadjuvante. Inflamação e sangramento consequentes ao trauma na introdução do fiducial também podem levar à migração.

Os eventos adversos costumam ser leves, em torno de 4%, sendo os mais comuns pequenos sangramentos, pancreatites e infecções leves. Com o intuito de evitar infecções mais importantes, a profilaxia antibiótica deve ser sempre realizada.

Conclusão

A técnica de introdução de fiducials por meio da ecoendoscopia tem papel importante na radioterapia estereotáxica, auxiliando na utilização da técnica, porém ainda são necessários estudos prospectivos e randomizados para definição de melhor técnica e material. Dessa forma, a discussão prévia entre ecoendoscopistas, oncologistas, cirurgiões e radioterapeutas deve ser sempre realizada.

Veja abaixo o vídeo sobre esse fiducial:

Resumo

  • Fiducial: marcador radiopaco para radioterapia estereotáxica;
  • Material: sólidos (ouro, platina e carbono) e líquidos (em testes clínicos);
  • Formato: reto e coil;
  • Agulhas FNA para implantação: 22G e 19G.

Como citar este artigo

Oliveira JF. Você sabe o que é fiducial?. Endoscopia Terapêutica; 2021. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/assuntosgerais/voce-sabe-o-que-e-fiducial/

Quer saber mais sobre fiducials?

Acesse os links abaixo:

  1. https://www.bostonscientific.com/en-US/products/fiducial-markers/lumicoil-platinum-fiducial-markers.html
  2. Kerdsirichairat T, Shin EJ. Role of endoscopic ultrasonography guided fiducial marker placement in gastrointestinal cancer. Curr Opin Gastroenterol. 2020 Sep;36(5):402-408. doi: 10.1097/MOG.0000000000000662. PMID: 32740001.
  3. Yoo J, Kistler CA, Yan L, Dargan A, Siddiqui AA. Endoscopic ultrasound in pancreatic cancer: innovative applications beyond the basics. J Gastrointest Oncol. 2016 Dec;7(6):1019-1029. doi: 10.21037/jgo.2016.08.07. PMID: 28078128; PMCID: PMC5177581.
  4. Kim SH, Shin EJ. Endoscopic Ultrasound-Guided Fiducial Placement for Stereotactic Body Radiation Therapy in Pancreatic Malignancy. Clin Endosc. 2021 May;54(3):314-323. doi: 10.5946/ce.2021.102. Epub 2021 May 28. PMID: 34082487; PMCID: PMC8182253.

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