Artigo comentado : Indometacina retal pré procedimento universal versus pós para pacientes selecionados em CPRE. Trial multicêntrico.
Em estudo multicêntrico, randomizado e controlado publicado na revista Lancet compilando seis centros chineses e envolvendo 2600 pacientes foi avaliado se a administração universal (em todos os pacientes) pré CPRE de indometacina é mais efetiva que a administração pós procedimento somente em pacientes de alto risco na prevenção de pancreatite pós CPRE.
Conhecimento prévio ao estudo:
A pancreatite pós procedimento é a complicação mais comum da CPRE, potencialmente grave, podendo levar a aumento do tempo de internação e dos custos hospitalares associados. Trabalhos recentes tem apontado que o uso de stents pancreáticos e de anti-inflamatórios não esteróides podem prevenir a pancreatite pós CPRE. Entre as principais drogas e vias de administração estudadas, a indometacina via retal parece ser a mais efetiva na prevenção de pancreatite em pacientes de alto e médio risco. Contudo, não está claro qual a população alvo ideal (estratificada por risco ou com uso de forma universal), ou qual o melhor momento da aplicação (antes ou após o procedimento).
Objetivo: Avaliar se a administração pré procedimento de indometacina retal em todos os pacientes é mais efetiva que seu uso pós procedimento em pacientes de alto risco, na prevenção de pancreatite pós CPRE.
Desenho do estudo: Multicêntrico, randomizado, controlado, envolvendo seis centros na China. Pacientes com papila nativa que iam ser submetidos a CPRE foram selecionados e distribuídos em dois grupos em proporção 1:1.
Entre Dezembro de 2013 e Setembro de 2015, 2600 pacientes foram selecionados.
- Grupo Indometacina pré exame universal: Dose simples de Indometacina 100 mg, retal, 30 min antes da CPRE, em todos os pacientes (n= 1297)
- Grupo Indometacina pós exame em risco estratificado: Dose simples de Indometacina 100 mg, imediatamente pós a CPRE, em pacientes estratificados como de alto risco (n= 1303)
Resultados
Ocorrência de pancreatite pós CPRE
- Em 47 (4%) dos 1297 pacientes no grupo em que a indometacina foi administrada de forma universal e em 100 (8%) dos 1303 pacientes no grupo indometacina com risco estratificado (risco relativo 0,47; 95% CI 0,34–0,66; p<0·0001).
- Em 18 (6%) dos 305 pacientes de alto risco no grupo indometacina universal e 35 (12%) dos 281 pacientes de alto risco no grupo de risco estratificado (p=0,0057).
- Menos frequente nos pacientes de risco intermediário no grupo indometacina universal (3% [29/992]), que no grupo de risco estratificado (6% [65/1022]), no qual a droga não foi administrada (p=0,0003).
Outros eventos além de pancreatite aconteceram em 41 pacientes no grupo indometacina universal (3%; dois casos graves) e em 48 pacientes do grupo de risco estratificado (4%; um grave). Não houve aumento significativo no risco de sangramento.
Foi evidenciado que o uso de indometacina pré procedimento em casos não selecionados, quando comparado com o grupo que administrou a droga pós procedimento em casos estratificados como de alto risco, reduziu a ocorrência de pancreatite pós CPRE sem aumentar o risco de sangramento. Os autores sugerem portanto, que esses dados favorecem o uso universal de indometacina pré CPRE na ausência de contra indicações a utilização da mesma.
Essa publicação trouxe grande contribuição a literatura existente, diante da boa amostra e desenho de estudo utilizados. Entre as intervenções propostas, o uso de indometacina de forma universal pré procedimento se apresenta como uma tática capaz de simplificar a abordagem farmacológica nesses pacientes, em comparação principalmente ao uso de indometacina após estratificação de risco (grupo que já havia sido muito bem descrito no importante trabalho publicado por Elmunzer e colegas no New England Journal of Medicine em 2012). Ajuda também, ao ampliar a discussão em relação relação a real capacidade de prevenção da indometacina na pancreatite pós CPRE, diante, por exemplo, dos achados de dois estudos recentes que não demonstraram benefício do uso de indometacina peri procedimento quando comparado a placebo (Levenick et al, 2016; Döbrönte et al, 2014). Novos estudos abordando o uso de indometacina são esperados. Possivelmente trabalhos que abordem amostras populacionais maiores, ajudando a fortalecer a evidência sobre o papel da droga na prevenção da pancreatite pós CPRE, qual o potencial risco de sangramento gastrointestinal e também esclarecendo quais os pacientes não se beneficiam do uso.
Artigo original :
Bibliografia :
- Elmunzer, J, Scheiman, JM, Lehman, GA et al. A randomized trial of rectal indomethacin to prevent post-ERCP pancreatitis. N Engl J Med. 2012; 366: 1414–1422
- Levenick, JM, Gordon, SR, Fadden, LL et al. Rectal indomethacin does not prevent post-ERCP pancreatitis in consecutive patients. Gastroenterol. 2016; 150: 911–917
- Döbrönte, Z, Szepes, Z, Izbéki, F et al. Is rectal indomethacin effective in preventing of post-endoscopic retrograde cholangiopancreatography pancreatitis?. World J Gastroenterol. 2014; 20: 10151–10157
Veja também :
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CPRE em pacientes com gastrectomia a BIllroth II.