Primary Needle-Knife Fistulotomy Versus Conventional Cannulation Method in a High-Risk Cohort of Post-Endoscopic Retrograde Cholangiopancreatography Pancreatitis

Publicado no American Journal of Gastroenterology (AJG) em 2020 Referência: Jang SI, Kim DU, Cho JH, et al. Primary Needle-Knife Fistulotomy Versus Conventional Cannulation Method in a High-Risk Cohort of Post-Endoscopic Retrograde Cholangiopancreatography Pancreatitis. Am J Gastroenterol. 2020 Apr;115(4):616-624. doi: 10.14309/ajg.0000000000000480. PMID: 31913191.

Introdução

A maior parte das publicações relacionadas à CPRE, envolve medidas para reduzir a incidência de pancreatite aguda (post-ERCP pancreatitis – PEP), cuja incidência chega a 14,1% em pacientes de alto risco (1). Talvez o fator de risco passível de intervenção mais relevante seja o trauma de cateterização (2), motivo pelo qual, alguns artigos passaram a estudar o acesso por fístula infundibular ou infundibulotomia sem tentativas prévias de canulação transpapilar. A hipótese é que, com uma incisão mais distante do ducto pancreático principal (DPP)/óstio papilar, haja menor edema local e incidência de PEP. Por outro lado, questiona-se a segurança e eficácia desta estratégia.

Métodos

Este trabalho é multicêntrico (7 centros na Coréia do Sul), que incluiu apenas pacientes de alto risco para PEP, randomizando pacientes para cateterização convencional transpapilar (conventional cannulation methods – CCM) ou para infundibulotomia (needle-knife fistulotomy – NKF) “upfront”, sem tentativas transpapilares prévias.

No grupo CCM, as tentativas eram limitadas a 10 minutos, 5 cateterizações do ducto pancreático principal (DPP) ou mais de uma injeção de contraste no DPP. Nestes casos, ocorria uma espécie de crossover, sendo realizada a NKF. Ainda no grupo da CCM, a técnica do duplo fio guia poderia ser empregada.

No grupo da NKF, buscou-se manter uma distância de ao menos 5 mm entre a incisão e o óstio da papila. Foi utilizada a unidade eletrocirúrgica VIO 300D, com o endocut I, efeito 2, duração e intervalo de corte 3. Após a cateterização, o acesso era ampliado com papilótomo ou dilatação balonada.

AINEs via retal e hiper-hidratação com ringer-lactato não foram utilizados. Como profilaxia de PEP, houve apenas o uso de stent pancreático, cuja passagem ocorreu de acordo com a avaliação momentânea do endoscopista. O follow-up foi realizado apenas até o terceiro dia após a CPRE. Uma vez que sangramentos tardios podem ocorrer até 1-2 semanas, a avaliação deste evento adverso apresenta um viés importante

Resultados

CCM: 97 pacientes → 87 canulações (89,7% de sucesso) x 10 casos que foram para NKF (acesso à via biliar bem sucedido nos 10). Vale ressaltar que os 10 pacientes submetidos a NKF neste grupo não foram incluídos na análise final – isso apresenta importante limitação metodológica, uma vez que são pacientes com manipulação relevante da papila, logo de alto risco para PEP, podendo subestimar a incidência de PEP neste grupo.

NKF: 98 pacientes → 96 canulações (97,9% de sucesso) x 1 caso em foi tentado CCM (sem sucesso) e 1 com acesso à via biliar apenas após procedimento combinado com radiointervenção.

O estudo considerou maior sucesso técnico no grupo da NKF (89,7% x 97,9%, p = 0,005). Os 10 casos considerados como insucesso no grupo da CCM foram resolvidos com NKF, revelando a eficácia da estratégia empregada pela maioria dos endoscopistas, na qual a NKF é um método “de resgate” – aproximadamente 90% de sucesso transpapilar e os outros 10% foram resolvidos com NKF.

Em relação aos eventos adversos, houve 8 casos de PEP com CCM e nenhum com NKF (9,2% x 0%; p = 0,001). Não houve diferença na incidência de sangramento, perfuração, hiperamilasemia assintomática (lembrar que não é considerado um evento adverso ou complicação), colangite ou colecistite entre os grupos.

Como esperado, houve mais passagem de stents pancreáticos (p = 0,048), cateterizações (p = 0,017) e injeções de contraste (não significativo) no DPP no grupo da CCM, já que o mesmo não está presente na topografia da fístula suprapapilar, exceto em casos de canal comum longo.

O tempo total de procedimento e de canulação foi maior no grupo da NKF. Isso pode ser explicado pela exclusão de pacientes submetidos a CCM com tempo de canulação prolongado, conforme exposto pelos autores.

Os desfechos clínicos com diferença estatística e os eventos adversos são sumarizados na tabela 1.

Desfechos clínicos
CCM NKF p
Sucesso técnico 89/97 (89,7%) 96/98 (97,9%) 0,005
Número de canulações do DPP 18 (20,7%)  8 (8,3%) 0,017
Número de injeções de contraste do DPP 4 (4,6%)  3 (3,1%) 0,606
Passagem de stent pancreático 6 (6,9%) 1 (1,0%) 0,048
Tempo de canulação  171,5 +/- 173,0 min 257,2 +/- 219,6 min 0,004
Tempo total de procedimento 766,9 +/- 375,2 min 907,6 +/- 458,8 min 0,025
Eventos adversos
PEP 8 (9,2%) 0 (0%) 0,001
Sangramento 1 (1,1%) 3 (3,1%) 0,363
Perfuração 0 (0%) 0 (0%) > 0,999
Colecistite 0 (0%) 0 (0%) > 0,999
Colangite 2 (2,3%) 3 (3,1%) 0,733
Hiperamilasemia assintomática 15 (17,2%) 13 (13,5%) 0,489

Discussão

O trabalho traz um resultado muito expressivo, com uma redução importante na incidência de PEP com a estratégia de NKF “upfront”, sem manipulação do óstio papilar. A redução da taxa de PEP foi bastante superior a estratégias preconizadas como o uso de AINEs, hiper-hidratação, emprego de corte puro (ou endocut efeito 1) na papilotomia e uso de stent pancreático (2, 3).

Os resultados vão de encontro ao mecanismo de trauma de canulação como possível principal fator modificável na profilaxia de PEP (2)

Entretanto, alguns questionamentos são levantados em relação à estratégia NKF:

Em primeiro lugar, a morfologia da papila é sabidamente relevante no sucesso desta técnica, a qual fica muito limitada, por exemplo em papilas diminutas e planas. O trabalho avaliou apenas a semelhança da morfologia da papila entre os grupos – não houve seleção de casos de acordo com a morfologia favorável, o que parece mais adequado na prática clínica (possivelmente a melhor estratégia é direcionar os casos em que haja morfologia favorável para NKF “upfront”). Além disso, excluiu 2 casos em que a papila apresentava morfologia desfavorável para NKF.

Outro ponto importante é a curva de aprendizado, não havendo consenso a esse respeito. Uma vez que trata-se de uma técnica avançada e exige expertise em CPRE, existe a recomendação (não consensual) de ser empregada apenas por endoscopistas com > 300 CPREs supervisionadas e > 80% de canulação transpapilar.

A técnica em si, com exposição de cerca de 3 mm da ponta do estilete (needle-knife), incisão gradual, aprofundando planos e reavaliando o tecido exposto (e sabendo identificar a parede e mucosa do colédoco), mantendo-se a uma distância mínima de 3 mm do óstio também é muito importante para o sucesso e menor incidência de complicações.

Deve-se ainda, considerar que, pela menor abertura da incisão final da NKF em relação à incisão desde o óstio papilar (CCM), alguns cálculos de grandes dimensões podem ser de extração mais difícil.

O trabalho também nos permite concluir que a NKF é um método seguro, uma vez que apresenta menor incidência de PEP e semelhante incidência dos demais eventos adversos quando comparado à CCM.

Outros trabalhos na literatura apresentam resultados similares, destacando-se:

  1. Estudo randomizado por Furuya et al., publicado em 2018 (4): PEP: NKF 1/51 = 2% x CCM 5/51 = 9,8% (p não significativo); 100% de sucesso na canulação biliar no grupo da NKF x 39/51 = 76,5% na CCM, sendo os outros 12 casos bem sucedidos com fístula de resgate.
  2. Revisão sistemática e metanálise por Mutneja et al, publicado em 2021 (5): tendência a menor incidência de PEP com NKF 3/253 (1,2%) x 16/238 (6,7%), p = 0,06; com taxas de sucesso no acesso à via biliar (p = 0,28) e de outros eventos (p = 0,59) similares entre os grupos.

Em resumo, a despeito das limitações do trabalho e considerações a respeito da NKF, já há evidência para embasar esta técnica “upfront” para endoscopistas com adequada expertise, especialmente em papilas com morfologia favorável e pacientes de alto risco para PEP.

Referências

  1. Kochar B, Akshintala VS, Afghani E, et al. Incidence, severity, and mortality of post-ERCP pancreatitis: a systematic review by using randomized, controlled trials. Gastrointest Endosc. 2015;81(1):143-149.e9. doi:10.1016/j.gie.2014.06.045, PMID: 25088919.
  2. Pereira Funari M, Ottoboni Brunaldi V, Mendonça Proença I, et al. Pure Cut or Endocut for Biliary Sphincterotomy? A Multicenter Randomized Clinical Trial. Am J Gastroenterol. 2023;118(10):1871-1879. doi:10.14309/ajg.0000000000002458. PMID: 37543748.
  3. Buxbaum JL, Freeman M, Amateau SK, et al. American Society for Gastrointestinal Endoscopy guideline on post-ERCP pancreatitis prevention strategies: summary and recommendations. Gastrointest Endosc. 2023;97(2):153-162. doi:10.1016/j.gie.2022.10.005. PMID: 36517310.
  4. Furuya CK, Sakai P, Marinho FRT, et al. Papillary fistulotomy vs conventional cannulation for endoscopic biliary access: A prospective randomized trial. World J Gastroenterol. 2018;24(16):1803-1811. doi:10.3748/wjg.v24.i16.1803. PMID: 29713133.
  5. Mutneja HR, Bhurwal A, Attar BM, Vohra I, Tejeda EP, Verma S, Kumar V, Demetria M. Efficacy and safety of primary needle-knife fistulotomy in biliary cannulation: a systematic review and meta-analysis. Eur J Gastroenterol Hepatol. 2021 Dec 1;33(1S Suppl 1):e71-e77. doi: 10.1097/MEG.0000000000002238. PMID: 34284413.

Como citar este artigo

Funari MP. Primary Needle-Knife Fistulotomy Versus Conventional Cannulation Method in a High-Risk Cohort of Post-Endoscopic Retrograde Cholangiopancreatography Pancreatitis. Endoscopia Terapeutica 2024 vol II. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/artigoscomentados/primary-needle-knife-fistulotomy-versus-conventional-cannulation-method-in-a-high-risk-cohort-of-post-endoscopic-retrograde-cholangiopancreatography-pancreatitis/




Pure Cut ou Endocut para Esfincterotomia Biliar? Um Estudo Multicêntrico Randomizado

Publicado no American Journal of Gastroenterology (AJG) em 2023

Introdução

Há grande preocupação com os eventos adversos pós-CPRE. Dentre eles, o que gera maior preocupação é a pancreatite pós-CPRE (post-ERCP pancreatitis – PEP) devido à sua incidência (1,6 – 9,7%) e potencial de gravidade (1-3). Múltiplas medidas como anti-inflamatórios (AINEs) via retal, hiper-hidratação com ringer lactato e passagem de prótese pancreática foram postulados para a prevenção deste evento adverso. Considerando, entre os mecanismos fisiopatológicos da PEP, a disseminação de energia térmica na região da papila (proximidade com o óstio pancreático), alguns trabalhos investigaram melhor esta relação (corrente elétrica e PEP). Deste modo, existe a hipótese que o corte puro cause menos dano térmico e menos pancreatite que correntes mistas como o blend ou endocut. Por outro lado, há a preocupação de um possível aumento da incidência de sangramento diante de um menor poder de coagulação (corte puro). Recentemente, foi publicado na AJG (American Journal of Gastroenterology), um estudo randomizado multicêntrico (FMUSP e FMRP) comparando o corte puro com o corte pulsado ou Endocut (configuração recomendada pela ERBE – endocut I, efeito 2) empregados na papilotomia endoscópica. Clique aqui para saber mais sobre configurações de bisturi elétrico.

Métodos

Pacientes com papila virgem submetidos à CPRE com canulação transpapilar primária (sem técnicas de pré-corte, esfincterotomia transpancreática ou infundibulotomia/fístula) foram randomizados para corte puro ou pulsado (Endocut). A randomização foi realizada após a confirmação do acesso à via biliar e definição de que a papilotomia seria realizada.
Não foram incluídos pacientes com CPRE/papilotomia prévia, variações anatômicas (pós-operatório) e com coagulopatia.
As unidades eletrocirúrgicas foram:

  • Corte pulsado (Endocut)

    • ERBE VIO 300 ou VIO 3 (ERBE), Endocut I, efeito 2, duração de corte 3 e ciclo de corte 3 conforme recomendado pelo fabricante e amplamente utilizado em grandes centros em todo o mundo

  • Corte puro

    • SS-200E (WEM) corte puro 30-50W ou ICC 200 (ERBE) AUTO CUT 30-50W (efeito 3).

Como profilaxia de PEP, os pacientes de risco receberam hiper-hidratação com ringer lactato e, em raros casos, prótese pancreática (clique aqui para saber mais sobre profilaxias). AINEs via retal não foram utilizados devido sua indisponibilidade nos centros incluídos. O desfecho primário foi a incidência de PEP e os principais secundários foram sangramento e perfuração/papilotomia em zíper. Pancreatite e sangramento foram definidos e graduados segundo os critérios de Cotton (tabela 1). Consideramos apenas perfuração relacionada à papilotomia (Stapfer tipo II).

Tabela 1 – Critérios de Cotton para pancreatite e sangramento relacionados à CPRE (4)

Sangramento (tardio)
Leve queda de Hb < 3 g/dL, evidência clínica do sangramento; sem necessidade de transfusão
Moderada transfusão < 4 concentrados de hemácias (CH), sem necessidade de procedimento
Grave transfusão >= 5 CH e/ou necessidade de arteriografia ou cirurgia
Pancreatite pós-CPRE
Leve Quadro clínico compatível + amilase > 3x o valor de referência após 24h do procedimento + readmissão ou prolongamento da internação até 2-3 dias (diagnóstico exige readmissão ou prolongamento da internação)
Moderada Hospitalização por 4-10 dias
Grave Hospitalização > 10 dias ou complicação local (infecção/ pseudocisto/ pancreatite hemorrágica) ou necessidade de intervenção (drenagem percutânea/ cirurgia)

Resultados

Entre 2019 e 2021, 550 pacientes foram incluídos (272 no grupo do corte puro e 278 no endocut). As características de base foram semelhantes entre os grupos (incluindo fatores de risco para PEP e sangramento).

Pancreatite (PEP)

A incidência total de PEP foi de 4,0%, sendo maior no braço do endocut (5,8% vs 2,2%, P = 0,034).
A análise univariada revelou o número de tentativas > 5 (p = 0,004) e o Endocut (p = 0,034) como fatores de risco.
Na análise multivariada, houve uma tendência para o Endocut (p = 0,052), sendo o número de tentativas > 5 (p = 0,005) o principal fator de risco para PEP.

Sangramento imediato (durante o procedimento)

Em 18% dos casos houve sangramento imediato acima do esperado, sendo que 9% (metade) exigiram intervenção endoscópica (os outros 9% foram autolimitados). As análises uni e multivariadas revelaram idade (OR 1,013; IC 95% 1,000 – 1,025; p = 0.046), dilatação balonada da papila (OR 2,120; IC 95% 1,275 – 3,524; p = 0.004), injeção de contraste no ducto pancreático (OR 2,287; IC 95% 1,010 – 5,177; p = 0.047) e corte puro (OR 2,554; IC 95% 1,594 – 4.093; p < 0.001) como fatores de risco.

Nenhum destes casos apresentou repercussão hemodinâmica e todos foram controlados durante o mesmo procedimento, por meio de corrente de coagulação, injeção de solução de adrenalina e colocação de hemoclipes. Nenhum caso precisou de stent metálico ou procedimentos adicionais com radiologia intervencionista ou cirurgia.

Sangramento tardio (após o procedimento)

A incidência de sangramento tardio foi de 1,4%. O endocut se mostrou como fator de risco para este evento adverso (p = 0,047).

Perfuração/ papilotomia em zíper

Não houve casos de perfuração relacionada à papilotomia (p = 1,0).
Ocorreu apenas um caso de papilotomia em zíper, no grupo do Endocut.

Discussão

A fisiopatologia e os trabalhos publicados sobre o assunto, apontam para maior lesão térmica e maior incidência de PEP com o emprego de maior proporção de coagulação. Vale a pena ressaltar, que um trabalho comparando blend e corte puro foi interrompido precocemente devido maior incidência de PEP com o blend, reforçando este mecanismo fisiopatológico (5). A comparação fica evidente na tabela abaixo (tabela 2), que traz os resultados de todos os estudos randomizados publicados sobre o assunto.

Tabela 2 – Sumário dos ECRs comparando a incidência de PEP com os modos de corte puro e pulsado

Corte puro Corte pulsado (Endocut)
Ellahi et al. 2001 (6) 0/31 (0%) 5/55 (9,1%)
Kida et al. 2004 (7) 1/43 (2,3%) 4/41 (9,8%)
Norton et al. 2005 (8) 1/134 (0,75%) 3/133 (2,3%)
Funari et al. 2022 (9) 6/272 (2,2%) 16/278 (5,8%)
Total 8/486 (1,6%) 28/501 (5,6%)

O corte puro se associa a maior incidência de sangramento intra-procedimento. Porém esses sangramentos são controlados de modo relativamente simples e não se mostraram relacionados a sangramento tardio (com repercussão clínica). Além disso, houve mais sangramentos tardios com o Endocut. Hipóteses para estes achados são: (1) a identificação e tratamento de vasos durante o procedimento que não sangrariam durante a CPRE inicial (com o endocut) e, portanto, não seriam tratados, podendo apresentar sangramento tardio e (2) maior progressão de lesão térmica com o endocut, atingindo vasos mais calibrosos nos dias pós procedimento, porém ser capaz de promover sua coagulação.

Além disso, os trabalhos não mostraram associação do tipo de corrente elétrica com a perfuração e papilotomia descontrolada (em zíper). De qualquer forma, ressalta-se a importância de cuidado e treinamento para a papilotomia com corte puro, uma vez que não há interrupção automática da onda de corte como com o corte pulsado.

Resumindo, segundo os trabalhos analisados, o emprego de maior proporção de coagulação com o modo Endocut está associada a maior incidência de PEP e, talvez, de sangramentos tardios. O corte puro está associado a maior incidência de sangramento imediato (sem repercussão clínica). Logo, parece razoável preferir empregar o corte puro de modo rotineiro na papilotomia.

Vale uma ressalva importante para os endoscopistas familiarizados com o Endocut. O trabalho seguiu a recomendação atual do fabricante (ERBE), com o efeito 2. Lembramos que o efeito 1 não libera corrente de coagulação entre as ondas de corte (ausência do gráfico azul), funcionando como um corte puro pulsado (imagem 1).

Portanto, podemos utilizar o corte puro ou o endocut efeito 1 (corte puro pulsado), minimizando o efeito negativo da corrente elétrica com maior poder de coagulação na papilotomia.

Imagem 1 – Corte pulsado (Endocut): ilustração gráfica dos diferentes efeitos

Material adicional sugerido para aprofundar no assunto:

Guideline ASGE – Electrosurgical generators

Guideline ESGE – The use of electrosurgical units

Revisão sistemática e metanálise sobre o assunto

  • Funari MP, Ribeiro IB, de Moura DTH, et al. Adverse events after biliary sphincterotomy: Does the electric current mode make a difference? A systematic review and meta-analysis of randomized controlled trials. Clin Res Hepatol Gastroenterol. 2020 Oct;44(5):739-752. doi: 10.1016/j.clinre.2019.12.009. Epub 2020 Feb 20. PMID: 32088149.

Referências

  1. Williams EJ, Taylor S, Fairclough P, Hamlyn A, Logan RF, Martin D, Riley SA, Veitch P, Wilkinson ML, Williamson PR, Lombard M. Risk factors for complication following ERCP; results of a large-scale, prospective multicenter study. Endoscopy. 2007 Sep;39(9):793-801. doi: 10.1055/s-2007-966723. PMID: 17703388.
  2. Freeman ML, Nelson DB, Sherman S, Haber GB, Herman ME, Dorsher PJ, Moore JP, Fennerty MB, Ryan ME, Shaw MJ, Lande JD, Pheley AM. Complications of endoscopic biliary sphincterotomy. N Engl J Med. 1996 Sep 26;335(13):909-18. doi: 10.1056/NEJM199609263351301. PMID: 8782497.
  3. Kochar B, Akshintala VS, Afghani E, Elmunzer BJ, Kim KJ, Lennon AM, Khashab MA, Kalloo AN, Singh VK. Incidence, severity, and mortality of post-ERCP pancreatitis: a systematic review by using randomized, controlled trials. Gastrointest Endosc. 2015 Jan;81(1):143-149.e9. doi: 10.1016/j.gie.2014.06.045. Epub 2014 Aug 1. PMID: 25088919.
  4. Cotton PB, Lehman G, Vennes J, Geenen JE, Russell RC, Meyers WC, Liguory C, Nickl N. Endoscopic sphincterotomy complications and their management: an attempt at consensus. Gastrointest Endosc. 1991 May-Jun;37(3):383-93. doi: 10.1016/s0016-5107(91)70740-2. PMID: 2070995.
  5. Elta GH, Barnett JL, Wille RT, Brown KA, Chey WD, Scheiman JM. Pure cut electrocautery current for sphincterotomy causes less post-procedure pancreatitis than blended current. Gastrointest Endosc. 1998 Feb;47(2):149-53. doi: 10.1016/s0016-5107(98)70348-7. PMID: 9512280.
  6. Ellahi W, Franklin E, Kasmin, Seth A, Cohen, Jerome H, et al. Israel Medical Ctr, North Div, New York NY. ‘‘Endocut’’ technique versus pure cutting current for endoscopic sphincterotomy: a comparison of complication rates. Gastrointest Endosc [Internet] 2001;53:AB95, http://dx.doi.org/10.1016/S0016-5107(01)80137-1.
  7. Kida M, Kikuchi H, Araki M, Takezawa M, Watanabe M, Kida Y, et al. Randomized Control Trial of EST with Either Endocut Mode or Conventional Pure Cut Mode. Gastrointest Endosc [Internet] 2004;59:P201, http://dx.doi.org/10.1016/ S0016-5107(04)00930-7.
  8. Norton ID, Petersen BT, Bosco J, Nelson DB, Meier PB, Baron TH, Lange SM, Gostout CJ, Loeb DS, Levy MJ, Wiersema MJ, Pochron N. A randomized trial of endoscopic biliary sphincterotomy using pure-cut versus combined cut and coagulation waveforms. Clin Gastroenterol Hepatol. 2005 Oct;3(10):1029-33. doi: 10.1016/s1542-3565(05)00528-8. PMID: 16234050.
  9. Pereira Funari M, Ottoboni Brunaldi V, Mendonça Proença I, Aniz Gomes PV, Almeida Queiroz LT, Zamban Vieira Y, Eiji Matuguma S, Ide E, Prince Franzini TA, Lera Dos Santos ME, Cheng S, Kazuyoshi Minata M, Dos Santos JS, Turiani Hourneaux de Moura D, Kemp R, Guimarães Hourneaux de Moura E. Pure Cut or Endocut for Biliary Sphincterotomy? A Multicenter Randomized Clinical Trial. Am J Gastroenterol. 2023 Oct 1;118(10):1871-1879. doi: 10.14309/ajg.0000000000002458. Epub 2023 Jul 7. PMID: 37543748.

Como citar este artigo

Funari MP. Pure Cut ou Endocut para Esfincterotomia Biliar? Um Estudo Multicêntrico Randomizado. Endoscopia Terapeutica 2024 Vol 1. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/https://endoscopiaterapeutica.net/pt/artigoscomentados/pure-cut-ou-endocut-para-esfincterotomia-biliar-um-estudo-multicentrico-randomizado/