Pólipos colorretais menores que 20 mm: guia de sobrevivência para o endoscopista

Pólipos colorretais menores que 20 mm: guia de sobrevivência para o endoscopista

Recentemente foi publicado na seção Masters of Endoscopy da revista
Endoscopy o artigo intitulado Como nós ressecamos
pólipos colorretais menores que 20 mm
, dos autores
Douglas K. Rex, da Universidade de Indiana, e Evelien Dekker, da Universidade de Amsterdam. A seguir, faremos um
resumo dos principais pontos destacados.

Primeiramente, uma avaliação minuciosa das lesões é necessária para diferenciar o tipo
de lesão (adenoma x pólipo serrilhado) e avaliar o risco de câncer, que está fortemente associado com o tamanho da
lesão.
Os autores afirmam que a retirada de lesões com pinça a frio, às vezes, é apropriada se as lesões forem de 1 a 2 mm, já que podem ser totalmente
retiradas em uma “mordida”, porém eles usam alça a frio para quase
todas as lesões menores que 10 mm. Para adenomas convencionais de 10 a 19 mm, eles usam primariamente alça
diatérmica
. Mucosectomia,
preferencialmente em bloco, é apropriada para adenomas convencionais volumosos não granulares e adenomas não
granulares com depressão nessa faixa de tamanho. Para pólipos serrilhados sésseis de 10 a 19 mm, a abordagem deles
difere até certo ponto: um usa primariamente mucosectomia a frio, e o
outro usa primariamente mucosectomia convencional com alça
diatérmica.
Os pólipos
e as lesões planas menores que 20 mm constituem 95% de todas as neoplasias colorretais e, portanto, compreendem a
maioria esmagadora das ressecções realizadas pelos colonoscopistas.
Para detectores de alto nível, cerca de 80% das lesões são menores que 5 mm e 90% são
menores que 10 mm. O risco de câncer é insignificante para lesões menores que 5 mm, muito abaixo de 1% para lesões
de 6 a 9 mm e cerca de 1 a 2% para lesões entre 10 e 19 mm.
Essencialmente, todas as lesões colorretais benignas menores 20 mm, com exceção de
lesões que se estendem para o apêndice ou íleo terminal, são endoscopicamente ressecáveis, com riscos e custos
menores que o tratamento cirúrgico. Os autores afirmam que referenciar lesões benignas menores que 20 mm para
tratamento cirúrgico aumenta o custo e expõe o paciente a um risco desnecessário. Assim, o colonoscopista atualizado deve ser apto a
realizar ressecções efetivas e seguras desses tipos de lesões.

Definições

Lesões diminutas 1-5 mm
Lesões pequenas 6-9 mm
Lesões médias 10-19 mm
Lesões grandes > 20 mm
Lesões gigantes > 30 mm

Avaliação dos pólipos

  • Para uma tomada de decisão ótima na realização de uma
    polipectomia, a superfície de todas as lesões deve ser avaliada com o intuito de predizer a invasão profunda
    da submucosa antes da ressecção;
  • Além disso, a diferenciação endoscópica dos pólipos
    serrilhados com os adenomas convencionais pode mudar a abordagem na ressecção;
  • Enfim, a lesão deve ser delineada com precisão;
  • Por todos esses aspectos, para um diagnóstico ótimo,
    endoscópios de alta definição e cromoscopia (com corantes ou virtual) têm provado seu mérito.

Base das técnicas

Os autores discorrem sobre a “revolução a frio” nas técnicas de polipectomia, isso é particularmente verdade para pólipos menores que 10
mm bem como para algumas lesões maiores. A ressecção a frio, isto é, sem aplicação de eletrocautério, é tão segura quanto a ressecção quente (com
eletrocautério) e tem um risco menor de sangramento tardio e perfuração.

Lesões diminutas (menores que 5 mm)

    • A ferramenta primária para ressecção de
      pólipos diminutos é a alça a frio. Uma alça de tamanho
      pequeno (aproximadamente 10 mm de diâmetro) e que seja rígida e fina facilitará sua colocação e pega
      do tecido;
    • Incluir de 1 a vários milímetros de tecido
      normal ao redor da lesão é crucial para garantir a ressecção completa;
    • Os autores usam alça a frio como abordagem
      preferencial para todas as lesões de 1 a 5 mm, embora, segundo eles, a pinça a frio seja aceitável
      para pólipos de 1 a 2 mm, particularmente se forem planos, muito difíceis de pegar ou se a lesão não
      puder ser colocada na posição de 5 horas;
    • Como regra geral, nunca se usa pinça a frio
      para ressecção em piece meal, pois ela é menos efetiva e menos eficiente que a ressecção com
      alça;
    • Segundo os autores, a utilização de alça com
      eletrocautério não tem papel nos pólipos diminutos, pois submete o paciente a um risco desnecessário
      de sangramento e perfuração, e a hot biopsy,
      frequentemente, é ineficaz para ressecção
      completa;
    • Atualmente, a pinça de hot biopsy tem uma função nas ressecções de
      pólipos: para retirar tecido residual plano ou fibrótico pós-mucosectomia.

Ressecção de pólipos pequenos (6 a 9 mm)

  • Para esse grupo de lesões, nem pinça a frio nem
    hot biopsy têm papel
    algum;
  • A ferramenta primária novamente, segundo os autores, é
    a alça a frio. Pela necessidade de se pegar um grande pedaço
    de tecido, ocasionalmente, é necessário serrar o tecido através da submucosa com a alça a frio ou cortá-lo
    puxando contra a ponta do colonoscópio. Isso, às vezes, leva a um “cordão” de submucosa, que consiste de
    submucosa e, às vezes, de muscular da mucosa. Esse “cordão” não requer amostras de biópsias ou
    tratamento;
  • O uso do eletrocautério também é apropriado para pólipos pequenos selecionados como os
    sésseis volumosos ou pediculados, afirmam os autores. Entretanto, eles usam alça a frio para quase todo conjunto
    de pólipos de 6 a 9 mm.

Ressecção de pólipos serrilhados médios (10–19 mm)

  • A segurança da alça a frio pode ser percebida na
    ressecção de lesões serrilhadas sésseis maiores que 10 mm de tamanho. Uma endoscopia de alta definição é
    essencial para garantir a avaliação de todas as criptas serrilhadas e sua excisão com margem ampla. A
    injeção submucosa com contraste antes da ressecção (mucosectomia) melhora sobremaneira a visualização das
    criptas serrilhadas da lesão. Essa técnica, chamada “mucosectomia a frio” (cold
    EMR
    ) pode ser considerada para pólipos serrilhados de 10
    a 19 mm de tamanho;
  • Um dos autores (D.K.R) usa mucosectomia a frio para
    maioria dos pólipos serrilhados médios, enquanto o outro (E.D) prefere com eletrocautério. Essas diferenças
    na prática são consistentes com a atual evidência limitada a respeito da melhor prática;
  • Outros autores usam ressecção a frio em piece meal
    para pólipos serrilhados maiores que 10 mm sem injeção submucosa.
    Estudos adicionais são necessários para esse tipo de prática.

 Vídeo: exemplo de mucosectomia a frio

Ressecção de adenomas convencionais médios (10–19 mm)

  • As técnicas para ressecção de adenomas convencionais
    de 10 a 19 mm ainda estão evoluindo. Particularmente, as taxas de ressecção completa adequada para adenomas
    convencionais maiores que 10 mm usando ressecção em piece meal
    com alça a frio e mucosectomia a frio ainda não estão
    estabelecidas;
  • Os autores revelam que usam uma mistura de abordagem
    para adenomas dessa faixa de tamanho, dependendo do seu tamanho e morfologia;
  • Para lesões médias pediculadas, é preferível alça
    diatérmica. Essas lesões devem sempre ser ressecadas em bloco, preferencialmente, com a alça posicionada
    pelo menos abaixo da metade do pedículo, para aumentar a chance de ressecção com margens livres em caso de
    câncer inesperado. Muitas dessas lesões estão localizadas no cólon sigmoide, e o posicionamento da alça pode
    ser facilitado pela mudança de posição do paciente ou preenchendo a luz de água;
  • Para lesões pediculadas, eles preferem coagulação em
    baixa potência usando corrente controlada. A terapêutica profilática com loops, injeção de adrenalina ou
    clipes é recomendada;
  • Lesões não pediculadas devem ser avaliadas para
    achados endoscópicos de invasão profunda da submucosa, como ulceração, deformidade das criptas e do padrão
    vascular;
  • As lesões com esses achados têm indicação de
    tratamento cirúrgico. Na ausência desses achados, outros achados endoscópicos, como morfologia não granular
    (particularmente se houver depressão ou se a lesão for séssil e volumosa), estão associados com maior risco
    de invasão superficial da submucosa. Se ressecadas em bloco, os pacientes com essas lesões talvez possam ser
    capazes de evitar cirurgia;
  • Portanto, adenomas não granulares entre 10 e 19 mm,
    particularmente se eles são volumosos ou deprimidos, devem ser ressecados em bloco, usando eletrocautério
    sempre que possível. A injeção submucosa reduz o risco e, frequentemente, facilita a ressecção em
    bloco;
  • Para mucosectomia, os autores geralmente preferem
    corrente de corte predominante. Existem outras abordagens como a realização de dissecção endoscópica da
    submucosa (ESD).

Conclusão

  • A tendência, em geral, na ressecção de lesões
    colorretais menores que 20 mm é usar sempre que possível alça ao invés de pinça, e isto se aplica mesmo para
    lesões de 1 a 5 mm;
  • Para lesões menores que 10 mm, a ressecção a frio, sem
    eletrocautério, é tão ou muito próxima em termos de efetividade ao uso do eletrocautério e evitam-se os
    riscos;
  • Estudos iniciais com técnicas a frio indicam que seu
    resultado é efetivo na erradicação de pólipos serrilhados maiores que 10
    mm;
  • A abordagem dos autores nesse tipo de lesão varia, o
    que reflete a limitada evidência disponível. Estudos controlados de mucosectomia x mucosectomia a frio x
    ressecção em piece meal a frio sem injeção são necessários;
  • As técnicas a frio não são estabelecidas como efetivas
    para adenomas convencionais maiores que 10 mm. Na maioria dos adenomas convencionais de 10 a 19 mm, a
    ressecção com alça usando o eletrocautério permanece o padrão ouro;
  • Para lesões de crescimento lateral (LST) não
    granulares de 10 a 19 mm, a ressecção em bloco deve ser a meta, particularmente para lesões com achados
    associados a alto risco de invasão profunda;
  • Lesões pediculadas do cólon são em sua maioria
    adenomas. Quando maiores que 10 mm, elas devem ser removidas em bloco e utilizando alça com
    eletrocautério.

E vocês, na prática clínica diária, utilizam alça mesmo para lesões menores que 5
mm? Sentem segurança em realizar “mucosectomia a frio” sem uso de corrente?

Como citar este artigo:

Arraes L. Pólipos colorretais menores que 20 mm. Guia de Sobrevivência para o
endoscopista. Endoscopia Terapêutica; 2021. Disponível em:

Pólipos colorretais menores que 20 mm: guia de sobrevivência para o endoscopista

Referência:

Rex DouglasK et al. How we resect colorectal polyps < 20 mm in size. Endoscopy.
2018
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Esôfago de Barrett após gastrectomia vertical (Sleeve)

Artigo publicado na Gastrointestinal Endoscopy em fevereiro de 2021. Trata-se de uma revisão sistemática e metanálise sobre esôfago de Barrett após gastrectomia vertical (Sleeve).

A Doença do Refluxo Gastroesofágico (DRGE) é uma das grandes preocupações em pacientes submetidos ao Sleeve. E a DRGE é o maior fator de risco para o esôfago de Barrett, que é sabidamente um precursor do adenocarcinoma de esôfago.

A prevalência de DRGE e hérnia de hiato é maior que o normal nos pacientes obesos, sendo, então, esperado um aumento do esôfago de Barrett nessa população. Apesar disso, uma metanálise de mais de 13.000 pacientes submetidos à endoscopia pré-cirurgia bariátrica relatou um baixo índice de esôfago de Barrett, menor que 1%. No entanto, se os pacientes pioram da DRGE pós-Sleeve, cria-se a hipótese que aumentaria o risco de desenvolver esôfago de Barrett.

De acordo com os guidelines, pacientes cuja prevalência esperada de Barrett é maior que 10% são considerados de alto risco para desenvolver essa condição e devem, portanto, ser rastreados. Avaliar o risco de esôfago de Barrett pós-Sleeve tem importantes implicações clínicas para endoscopistas que realizam endoscopia pré e pós-operatórias desses pacientes, cirurgiões bariátricos que realizam o procedimento, pacientes e clínicos que os acompanham.

Nessa metanálise, o resultado primário avaliado foi a proporção de pacientes que desenvolveram esôfago de Barrett pós-Sleeve, confirmado histologicamente. Eles também avaliaram a prevalência de DRGE e esofagite no seguimento.

Resultados

A pesquisa inicial identificou 4.389 estudos e, após avaliações e exclusões, foram incluídos 10 estudos, totalizando 680 pacientes.

Prevalência do esôfago de Barrett

No geral, 54 dos 680 pacientes apresentaram esôfago de Barrett. Todos os casos foram sem displasia e de novo (sem Barrett na endoscopia pré-cirurgia). Além disso, todos os casos foram observados em estudos com seguimento longo (acima de 3 anos). A prevalência de esôfago de Barrett foi de 11,4 % (IC 95%, 7,7% -16,6%), p< 0,001.

Esôfago de Barrett e sintomas de DRGE

No total, 7 pacientes tinham esôfago de Barrett sem sintomas de DRGE no pós-operatório. A taxa agrupada na metanálise foi de 10,3% (IC 95%, 5%-20%, p< 0,001). A taxa agrupada de Barrett em pacientes com sintomas de DRGE foi 18,2% (IC 95%, 12,4%-26%). Não houve diferença significativa na probabilidade de ter Barrett baseado nos sintomas de DRGE (odds ratio 1,74; IC 95%, 0,52-5, 89; p=0,37).

Apenas 1 estudo relatou a taxa de projeção linear de epitélio colunar no esôfago (como vista endoscopicamente). Nesse estudo, a taxa de epitélio colunar foi alta (50%, n=10). Mas apenas 3 desses pacientes confirmaram por biópsias esôfago de Barrett.

Esofagite pós-Sleeve

Sete estudos relataram esofagite antes e após o Sleeve com vários intervalos de seguimento. Em cinco estudos de seguimento longo (maior que 3 anos), o aumento relativo da taxa de esofagite foi 86% (64%-109%), P < .001, I 2 = 47%, Q = 7.6 (P =0,107). Isso significa que há 86% de aumento no risco de esofagite pós-Sleeve em seguimento de longo prazo.

DRGE pós-Sleeve

Oito estudos relataram a taxa de DRGE pós-Sleeve. A definição de DRGE teve grande variação em cada estudo (consenso de Montreal, aplicação de questionários, presença de pirose, cintilografia, entre outros). Como resultado, foi observada uma heterogeneidade significativa na magnitude da DRGE pós-operatória. No entanto, todos os estudos mostraram estar na mesma direção: um significativo aumento da prevalência do DRGE no pós-operatório com odds rates variando de 1,6 a 49. Quatro estudos relataram DRGE de novo pós-Sleeve. Entre aqueles que não apresentavam sintomas de DRGE antes da cirurgia, a taxa de DRGE no pós-operatório foi de 45% (IC 95%, 35%-55%), p=0,106. Dois estudos relataram aumento do uso de inibidores de bomba de prótons no pós-operatório: de 22% para 76% e de 24% para 76%.

Discussão

Segundo os autores, essa metanálise incluiu todos os estudos existentes. Foi verificado que a prevalência do Barrett pós-Sleeve gástrico é de 11,6%. Além disso, foi visto que o aparecimento do Barrett não foi limitado aos pacientes com sintomas de DRGE somente. Barrett apareceu por volta de 3 anos após o procedimento e continuou a ser detectado 10 anos após a cirurgia.

Implicações clínicas

Há muitas implicações clinicas nesses achados. Primeiro, devido ao aumento de peso da população e da demanda pelo Sleeve, cirurgiões bariátricos, gastroenterologistas e demais médicos que acompanham os pacientes precisam estar cientes desses possíveis resultados. Esses dados justificam uma discussão com os pacientes em relação aos riscos e benefícios do rastreamento para esôfago de Barrett pós-Sleeve. De acordo com o guideline da ASGE, rastreamento para esôfago de Barrett deve ser indicado para os pacientes de uma população em que a prevalência de Barrett é maior que 10%. Observe que 11,6% dos casos foram Barrett de novo, nenhum dos pacientes submetidos ao Sleeve tinham Barrett na endoscopia pré-operatória. Os dados sugerem que o rastreio pode ser mais útil se iniciado cerca de 3 anos após o Sleeve. Mais dados sobre essa questão são necessários antes de tais recomendações serem adotadas em diretrizes clínicas.

Segundo, embora o Barrett possa levar anos para se desenvolver, o risco de esofagite parece aumentar 13% por ano baseado em regressão logística. Muitos pacientes com esôfago de Barrett e esofagite são assintomáticos. Embora esses resultados secundários requeiram investigações adicionais, o resultado da metanálise indica que supressão ácida precoce pós-Sleeve pode ser considerada para atenuar risco de DRGE e, portanto, o risco de esôfago de Barrett e adenocarcinoma de esôfago.

Terceiro, o aumento do risco de esôfago de Barrett devido ao Sleeve deve ser discutido com os pacientes candidatos à cirurgia. Pacientes com aumento do risco para Barrett devem receber a opção de ter um procedimento alternativo. Esses pacientes incluem aqueles com DRGE, esofagite documentada, história familiar de Barrett ou adenocarcinoma de esôfago, homens e fumantes.

Nenhum dos estudos relatou a taxa de progressão para displasia no esôfago de Barrett. Entretanto, não há razão para se presumir que o Barrett pós-Sleeve teria um comportamento diferente que o Barrett em outros pacientes.

Além disso, poderia haver implicações clínicas para gastroplastia endoscópica (endoscopic sleeve gastroplasty – ESG). Embora o ESG mimetize o Sleeve por cirurgia na sua técnica, o efeito do ESG na DRGE, esofagite erosiva e esôfago de Barrett, não está bem estudado. Um estudo retrospectivo com 83 pacientes submetidos à ESG e 54 ao Sleeve cirúrgico mostrou que o risco de refluxo foi menor no grupo ESG, porém o verdadeiro efeito do ESG na DRGE e esofagite erosiva não está bem estabelecido ainda.

Limitações

Uma das limitações do estudo é o relativo tamanho pequeno da amostra. Além disso, o resultado primário foi esôfago de Barrett. Portanto, muitos dos resultados secundários devem ser usados com cautela.

Conclusão

Pacientes submetidos à gastrectomia vertical têm risco aumentado de desenvolver esôfago de Barrett. Mais estudos são necessários para entender a fisiopatologia desse fenômeno. Gastroenterologistas, cirurgiões bariátricos e demais médicos devem estar atentos a esses dados. Uma clara discussão com os pacientes a respeito dos riscos após o procedimento e a avaliação do risco-benefício do rastreamento do esôfago de Barrett após o Sleeve devem ser consideradas.

Como citar este artigo

Arraes L. Esôfago de Barrett após gastrectomia vertical (Sleeve). Endoscopia Terapêutica; 2021. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/artigoscomentados/esofago-de-barrett-apos-gastrectomia-vertical-sleeve/

Referência

Barrett esophagus after sleeve gastrectomy: a systematic review and meta-analysis. Bashar J. Qumseya et al. Gastointestinal Endoscopy. Volume 93, issue 2, P343-353.E2. February 01, 2021. DOI: https://doi.org/10.1016/j.gie.2020.08.008




Quiz! O que você faz com essa LST no seu dia a dia?

Você realiza uma colonoscopia em sua paciente de 66 anos, sem comorbidades, submetida à primeira colonoscopia para rastreamento.

E verifica a seguinte lesão no reto proximal:

LST

LST

 

 

Aproveite e revise este quiz sobre classificação das LSTs.

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Como citar esse artigo:

Arraes L. Quiz! O que você faz com essa LST no seu dia a dia? Endoscopia Terapêutica 2020; 6(11). Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.net/pt/quiz/quiz-o-que-voce-faz-com-essa-lst-no-seu-dia-dia/

 




Quiz! Você já viu essa lesão antes?

Paciente de 21 anos, com quadro de DRGE, submetida a EDA, sendo vista em esôfago cervical a imagem abaixo.

 

Referências

  1. L. Lenz, G. Luz, A. Felipe-Silva, F. Nakao, E. Libera, D. Chaves, B. Sugai , R. Rohr. Tiny fibrovascular polyps of the esophagus as incidental findings – look carefully or you might miss them. Endoscopy 2011; 43: E392. DOI: 10.1055/s-0030-1256950
  2. Sultan PK, et al. Fibrovascular polyps of the esophagus. J Thorac Cardiovasc Surg 2005;130:1709-10. DOI: https://doi.org/10.1016/j.jtcvs.2005.05.043



Estudo controlado e randomizado em pacientes com cálculos biliares grandes

Endoscopia Terapêutica

Recentemente, foi publicado na Endoscopy por Korugue e colaboradores o resultado de um estudo japonês multicêntrico, controlado e randomizado, em que pacientes com cálculos biliares grandes foram alocados em dois grupos: dilatação balonada da papila com balão dilatador grande (DBP) sem esfincterotomia ou somente esfincterotomia isolada.

O estudo foi realizado em 19 centros japoneses. Todos os pacientes com idade de 60 anos ou mais que foram encaminhados para CPRE por cálculos grandes do ducto biliar comum (maior ou igual a 10 mm) foram colocados no estudo. Para permitir o uso da dilatação balonada da papila, o tamanho do colédoco distal precisava ser maior ou igual a 12 mm e não apresentar sem estenose distal.

PROCEDIMENTOS:

* Dilatação sem papilotomia: após a canulação biliar, dilatação com balão grande tipo CRE (Boston) foi realizada. O tamanho máximo da dilatação foi determinado de acordo com o tamanho dos cálculos, mas não excedia o diâmetro do colédoco distal. O balão era desinsuflado imediatamente após a perda da cintura. Pacientes sem dilatação ou com estenose do colédoco distal eram relocados para o grupo da papilotomia.

* Papilotomia sem dilatação: após a canulação, a papilotomia foi feita, podendo ser completa (até a prega duodenal) ou média (cerca de 2/3 da completa).

papilotomia

CÁLCULOS DOS RESULTADOS:

A análise do estudo foi planejada inicialmente em duas etapas. Na primeira etapa, foram avaliados os resultados a curto prazo, como a eficácia da remoção do cálculo. Na segunda etapa, resultados a longo prazo, como eventos biliares tardios (os pacientes serão seguidos por 5 anos). Nesse estudo, eles relatam a análise de curto prazo, da primeira etapa.

O resultado primário foi a taxa de remoção completa do cálculo em uma única sessão. Os resultados secundários foram a taxa geral de remoção completa do cálculo, uso de litotripsia, tempo de procedimento, eventos adversos iniciais e custos do procedimento.

RESULTADOS:

Pacientes

Um total de 181 pacientes foram inscritos entre fevereiro de 2013 a janeiro 2015, sendo 91 randomizados para o grupo dilatação balonada da papila (DBP) e 90 para o grupo da papilotomia isolada (PI). Após exclusão de 10 pacientes, 171 foram colocados na análise (86 no grupo dilatação e 85 no grupo papilotomia).

Eficácia em remover o cálculo

A taxa de remoção completa do cálculo em uma única sessão foi significativamente maior no grupo da dilatação: 90,7% (78/86) vs. 78,8% (67/85) da papilotomia.

Embora o grupo da dilatação tenha tido taxa alta de cálculos maiores que 15 mm, o uso da litotripsia não foi frequente 30,2% (26/86) vs. 48,2% (41/85) da papilotomia.

A taxa de remoção completa usando somente um único acessório não foi alta em grupo algum: < 5% com basket e cerca de 30% com balão extrator.

O tempo e o custo do procedimento foram semelhantes nos dois grupos.

A análise do subgrupo de 67 pacientes que tinham cálculos maiores que 15 mm mostrou que: remoção completa do cálculo em sessão única foi maior no grupo da DBP (85,4%) comparado ao grupo da papilotomia isolada (53,8%). Uma diferença absoluta na taxa de remoção completa do cálculo entre DBP e papilotomia foi mais proeminente naqueles com cálculos maiores que 15 mm: 31,6% comparado com 11,9%.

A necessidade de litotripsia nesse grupo com cálculos maiores de 15 mm também foi maior: 43,9% no grupo DBP e 69,2% no grupo papilotomia.

papilotomia

papilotomia

Segurança

Os efeitos adversos precoces foram semelhantes: 9,3% DBP vs. 9,4% papilotomia. Pancreatite ocorreu em 4,7% no grupo DBP e 5,9% no grupo papilotomia, todas classificadas com leve. Não houve mortes dentro de 30 dias.

DISCUSSÃO

Muitos estudos comparativos prospectivos têm sido feitos para avaliação da DBP, com ou sem papilotomia. Não há diferença significativa na remoção completa do cálculo nos estudos, porém dois deles demonstraram uma maior taxa de remoção completa do cálculo em uma só sessão na DBP com papilotomia quando comparada à papilotomia isolada. Houve dois estudos comparando a DBP sem papilotomia com a papilotomia, mas esse estudo foi o primeiro a mostrar a superioridade da DBP sem papilotomia sobre a papilotomia isolada, com taxa de remoção completa em uma sessão única de 90,7 % (contra 78,8% no grupo da papilotomia, com p=0,04).

A DBP pode ser realizada com ou sem papilotomia prévia. Enquanto a papilotomia completa (até a prega transversal) foi relatada como sendo fator de risco para hemorragia após dilatação em um estudo multicêntrico, a segurança da DBP sem papilotomia gera preocupação, incluindo sobre o risco de pancreatite. Nos estudos controlados e randomizados prévios, a papilotomia prévia não teve efeito sobre a remoção completa do cálculo nem sobre os efeitos adversos. As vantagens da DBP sem papilotomia são a natureza simples do procedimento e seu custo. Em pacientes com divertículo periampular, com anatomia alterada cirurgicamente ou naqueles em uso de agentes antitrombóticos, a DBP sem papilotomia é o tratamento de primeira escolha para cálculos grandes.

Sobre as limitações do estudo: os endoscopistas não eram blindados para o tipo de procedimento, mas o limite de tempo para cada procedimento foi de 1 hora; foi definido como cálculo grande quando maior ou igual a 10 mm, mas a vantagem do DBP sem papilotomia foi maior em cálculos > 15 mm. Além disso, foram selecionados somente pacientes > 60 anos por causa da ausência de dados nos resultados a longo prazo pós-DBP sem papilotomia, o que também limita a generalização do estudo. Uma análise dos resultados a longo prazo será conduzida sobre as alterações biliares após 5 anos. DBP sem papilotomia pode potencialmente preservar a função do esfíncter quando comparada com a esfincterotomia. A função do esfíncter preservada após comparada com a papilotomia.

Em resumo, dilatação balonada da papila com balão grande sem papilotomia alcançou uma taxa significativamente maior de remoção completa do cálculo em uma única sessão, sem aumentar os eventos adversos. Os resultados a longo prazo, como cálculos recorrentes do ducto biliar comum, devem ser avaliados no futuro.

Considerações:

  • No Brasil, o grupo do Serviço de Endoscopia Gastrointestinal do Hospital das Clínicas (FMUSP) realizou uma metanálise envolvendo 9 estudos controlados randomizados e 1.230 pacientes com coledocolitíase (611 pacientes submetidos a papilotomia isolada e 619 submetidos papilotomia e dilatação com balão) em que não se observou diferença na taxa de remoção de cálculos como desfecho primário, no entanto a dilatação balonada da papila com papilotomia obteve menor necessidade de litotripsia mecânica. Não foram observadas, ainda, diferenças estatísticas nas taxas de eventos adversos (pancreatite, sangramento e perfuração).

  • A Endoscopy publicou na última edição um editorial sobre esse trabalho, escrito pelo Prof. James Lau, denominado “Endoscopic papillary large ballon dilation: more questions than answers” em que ele interroga o que aprendemos com esse trabalho, citando:

    • Os pacientes devem ser selecionados cuidadosamente;
    • Os cálculos devem ser grandes (> 10 mm) para justificar a dilação com balão grande e a porção distal do ducto também deve ser suficientemente dilatada para acomodar o balão;
    • O balão não deve ser inflado além do diâmetro máximo do colédoco distal;
    • Quando a papilotomia sabidamente será difícil como nos pacientes com gastrectomia a Billroth II ou com coagulopatia, a dilatação com balão grande é uma solução legítima a aceitável.

Referências:

  1. Kogure Hirofume et al. Multicenter randomized trial of endoscopic papillary large balloon dilation without sphincterotomy versus endoscopic sphincterotomy for removal of bile duct stones: MARVELOUS trial. Endoscopy 2020; 52 (09): 736-744. DOI: 10.1055/a-1145-3377
  2. Lau, J. Endoscopic papillary large balloon dilation: more questions than answers Endoscopy 2020; 52(09): 745 – 746 DOI: 10.1055/a-1189-3035
  3. Moura, EGH; Sakai, P.; Bernardo, V.M. Série Manual do Médico-Residente do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo – Volume Endoscopia Baseada em Evidências 2017.



Guideline da ASGE sobre o papel da endoscopia na avaliação e tratamento da coledocolitíase

Guideline da ASGE sobre o papel da endoscopia na avaliação e tratamento da coledocolitíase

A cada ano, a coledocolitíase causa obstrução biliar, colangite e pancreatite em um número significante de pacientes. O tratamento primário, CPRE, é minimamente invasivo, mas associado a eventos adversos de 6% a 15% dos casos. Este guideline fornece recomendações baseadas em evidências para avaliação e tratamento endoscópico da coledocolitíase. O framework GRADE (Grading of Recommendations Assessment, Development and Evaluation) foi usado para revisar e sintetizar de forma rigorosa a literatura atual sobre os seguintes tópicos:

  • Ecoendoscopia x CPRM para diagnóstico;
  • Papel da CPRE precoce na pancreatite biliar;
  • Dilatação endoscópica da papila após esfincterotomia x esfincterotomia isolada para cálculos grandes;
  • Impacto da terapia intraductal guiada por CPRE para cálculos grandes e difíceis.

 

Revisões sistemáticas também foram usadas para avaliar:

  • Colecistectomia na mesma internação para pancreatite biliar;
  • Preditores clínicos de coledocolitíase;
  • Momento ideal da CPRE em relação a colecistectomia;
  • Tratamento da síndrome de Mirizzi e hepatolitíase;
  • Prótese biliar para coledocolitíase.

 

Todas essas questões clínicas foram avaliadas através de uma extensa revisão da literatura e as recomendações foram baseadas em opiniões de consenso. As recomendações são rotuladas como “fortes” ou “condicionais”, de acordo com a abordagem GRADE. As palavras “o painel de diretrizes recomenda” são usadas para recomendações fortes e “sugere” para recomendações condicionais.

QUESTÃO 1: Qual a utilidade diagnóstica da ecoendoscopia versus CPRM para confirmar a coledocolitíase em paciente com risco intermediário?

RESPOSTA: Em paciente com risco intermediário (10-50%) para coledocolitíase, sugerimos ecoendoscopia ou CPRM para conformar o diagnóstico. A escolha do teste deve levar em consideração fatores como preferencia do paciente, experiência local e disponibilidade de recursos (recomendação condicional, baixo grau de evidência).

DISCUSSÃO:

A ecoendoscopia tem uma acurácia comparável a CPRE diagnóstica para avaliação da coledocolitíase e está associada a uma taxa de eventos adversos significativamente mais baixa. Entre os pacientes com risco indeterminado, a ecoendoscopia antes da CPRE pode evitar a necessidade desta última. A CPRM é superior ao US abdominal. Uma metanálise mostrou que as especificidades da ecoendoscopia e da CPRM foram muito altas (0,97 x 0,92). Na revisão Cochrance, a sensibilidade da CPRM e ecoendoscopia foi comparável também. Entretanto, outra metanalise mostrou que a sensibilidade da ecoendoscopia foi superior a CPRM. Nos dois estudos individuais com a maior discrepância entre a ecoendoscopia e CPRM, as CPRMs falso-negativas foram para cálculos menores que 6 mm.  Kondo et al propuseram que a ecoendoscopia fosse considerada nos pacientes com CPRM negativa. Entretanto, deve-se levar em consideração o custo relativo de uma ecoendoscopia com acompanhamento anestésico. Além disso, a taxa de eventos adversos da ecoendoscopia, embora baixo, não é zero e este não é um exame disponível em todos os centros. Outras considerações incluem fatores específicos do paciente que podem limitar a viabilidade de um dos métodos, como claustrofobia e marcapassos para CPRM ou história de Bypass gástrico em Y de Roux para ecoendoscopia.

QUESTÃO 2: Em pacientes com pancreatite biliar, qual o papel da CPRE precoce?

RESPOSTA: Em pacientes com pancreatite biliar sem colangite ou obstrução biliar/coledocolitíase, nossa recomendação é contra a CPRE de urgência (em 48 horas) (recomendação forte, baixa qualidade de evidências).

DISCUSSÃO:

O conceito de CPRE precoce para pancreatite biliar origina-se de relatórios cirúrgicos observacionais: aqueles que foram submetidos à exploração cirúrgica após 48 horas exibiram lesões histológicas mais graves. Nesta teoria multitemporal da pancreatite biliar, postula-se que a passagem de diminutos cálculos pela ampola inicia a pancreatite aguda e um cálculo maior obstruindo persistentemente a papila resulta em doença grave. No entanto, um trial controlado e randomizado de cirurgia precoce para pancreatite biliar demonstrou que a intervenção precoce resultou em aumento da morbimortalidade. Isso favoreceu uma hipótese alternativa de que a pancreatite biliar resulta da passagem de um cálculo biliar inicial pela ampola e que a manipulação cirúrgica ou endoscópica adicional da região tem mais probabilidade de exacerbar do que aliviar a inflamação. Evidências adicionais de suporte para essa abordagem são encontradas em séries endoscópicas nas quais a maioria dos pacientes com pancreatite biliar apresenta colangiografia negativa, mesmo entre aqueles com alteração das enzimas hepáticas. Em sua meta-análise, Tse e Yuan demonstraram que a CPRE precoce não diminui a mortalidade ou os eventos adversos da pancreatite biliar. A recomendação do painel contra o CPRE foi, portanto, motivada pela necessidade de minimizar riscos e danos indevidos. A CPRE pode levar a feitos adversos, além do custo, sem benefício claro.
Nossa recomendação contra a CPRE precoce não se aplica a pacientes com pancreatite e colangite, dado o benefício demonstrado pela CPRE no cenário de colangite.
Um desafio ao informar a recomendação para CPRE precoce para pancreatite de biliar é a falta de um método para diagnosticar pancreatite pós-CPRE.

QUESTÃO 3: Em pacientes com cálculos grandes da via biliar, a dilatação papilar após a esfincterotomia é preferida à esfincterotomia isolada?
RESPOSTA: Em pacientes com cálculos grandes, sugerimos a realização de esfincterotomia endoscópica seguida de dilatação por balão de grande calibre em vez de esfincterotomia endoscópica isoladamente (recomendação condicional, evidência moderada).
DISCUSSÃO:
A dilatação balonada da papila pós-esfincterotomia foi desenvolvida para facilitar a remoção de cálculos grandes e para evitar o aumento da taxa de pancreatite observada quando a dilatação com balão foi realizada sem esfincterotomia.
Nove estudos randomizados e controlados além de 22 estudos observacionais indicaram que a dilatação balonada da papila pós-esfincterotomia apresenta maior chance de clareamento completo da via biliar, diminui a chance de litotripsia mecânica e não há diferença nos efeitos adversos totais e específicos como pancreatite, colangite, sangramento e perfuração.
Estudos adicionais usando definições bem caracterizadas de eventos adversos, tamanhos de balão e extensão da esfincterotomia podem impactar esta recomendação.

QUESTÃO 4: Qual é o papel da terapia intraductal versus convencional em pacientes com coledocolitíase grande e difícil?
RESPOSTA: Para pacientes com cálculos grandes e difíceis, sugerimos terapia intraductal ou terapia convencional com dilatação papilar. A escolha da terapia pode ser impactada pela experiência local, custo e preferências de pacientes e médicos (recomendação condicional, qualidade de evidência muito baixa).
DISCUSSÃO:
Cálculos grandes (> 10 mm) e aquelas muito duros ou com formas excêntricas podem ser difíceis de remover. Além disso, a presença da porção distal anormal do colédoco (oblíquo, estreitado), impactação ou grande quantidade de cálculos podem tornar o quadro refratário ao tratamento.
A recente evolução dos colangioscópios, incluindo aqueles descartáveis ​​e fornecem imagens de alta resolução, intensificou o interesse no tratamento intraductal da coledocolitíase difícil usando litotripsia a laser ou o sistema eletro-hidraulico.
Uma revisão sistemática mostrou proporções semelhantes de clareamento bem-sucedido da via biliar (0,92 para ambos) com o uso de abordagens tradicionais e intraductais. Isso contrasta com um estudo randomizado que compara o tratamento intraductal versus o convencional, que demonstrou clareamento maior com a terapia introductal (0,93 vs 0,67, P= 0,009). Existem várias explicações para essa diferença. Quando estratificada pelo uso de dilatação balonada, a metanálise constatou que a terapia intraductal era superior ao tratamento convencional quando a esfincterotomia + dilatação balonada da papila não foi realizada como parte da terapia convencional. No estudo randomizado, a esfincterotomia + dilataçao foi subutilizada, pois dilatações com balões maiores (> 12 mm) foram usadas em menos de 20% dos pacientes no braço convencional.
Outros pesquisadores estudaram a terapia intraductal apenas em pacientes que falharam na terapia convencional (litotripsia mecânica ou dilatação papilar). No trial controlado e randomizado de Buxbaum et al, a randomização foi estratificada sobre se o procedimento foi a primeira CPRE ou se foi submetido a CPRE nos 3 meses anteriores. Maior sucesso para intraductal versus terapia convencional foi observada naqueles que foram submetidos a CPRE prévia (0,90 versus 0,54), sem diferença entre aqueles que não foram submetidos a um procedimento prévio.
O painel concordou com a recomendação condicional de que o cálculo grande ou difícil pode ser tratado por terapia intraductal ou por terapia convencional, incluindo esfincterotomia seguida de dilatação balonada da papila. Houve uma extensa discussão sobre o alto custo, tempo do procedimento e inconveniência (como necessidade de encaminhamento para centros terciários) relacionados à colangioscopia.

Questões clínicas para as quais uma revisão abrangente foi usada.
As seguintes questões clínicas foram abordadas pelo painel de diretrizes com base em uma revisão abrangente da literatura, mas não aderindo à metodologia GRADE.

É necessário realizar colecistectomia na mesma admissão em pacientes com pancreatite biliar leve?

Recomendação: A colecistectomia na mesma admissão é recomendada para pacientes com pancreatite biliar leve.
Revisão:
Uma metanalise avaliou a segurança da colecistectomia durante a mesma admissão em pancreatite biliar leve e os riscos de efeitos adversos entre a alta e a colecistectomia naqueles que não foram submetidos na internação inicial. A pesquisa dos autores na literatura de 1992 a 2010 revelou dados de 948 pacientes: 483 pacientes que foram submetidos a colecistectomia na mesma admissão e 515 que foram submetidos a colecistectomia após uma média de 40 dias após a alta. Nesse último grupo, 95 pacientes (18%) foram readmitidos antes da colecistectomia; 43 (8%) por pancreatite recorrente, 35 (7%) por cólica biliar e 17 (3%) por colecistite aguda. Não houve diferenças nos eventos adversos ou na conversão para procedimento aberto entre aqueles submetidos na mesma hospitalização ou colecistectomia após o intervalo. Em um estudo randomizado e controlado “Pancreatite de origem biliar, momento ideal para colecistectomia (PONCHO)”, 266 pacientes de 23 centros holandeses com pancreatite biliar leve foram randomizados para colecistectomia na mesma admissão versus colecistectomia com intervalo. O desfecho primário foram eventos adversos relacionados a cálculos biliares que requeressem readmissão, incluindo colangite, obstrução biliar, pancreatite recorrente, cólica biliar ou mortalidade. Eventos adversos da via biliar ocorreram em 17% dos pacientes no intervalo versus 5% nos pacientes da colecistectomia na mesma admissão. Não houve diferença nos eventos adversos ou na conversão para procedimento aberto.
O painel recomendou que a colecistectomia fosse realizada na mesma admissão para pacientes com pancreatite biliar. Esta recomendação está de acordo com a recente declaração da American Gastroenterological Association.
Sobre a questão se a esfincterotomia protege contra eventos adversos biliares naqueles em que a vesícula biliar permanece in situ, o painel concordou que a CPRE com esfincterotomia profilática para prevenir pancreatite recorrente ou outros eventos adversos biliares não deve ser usada como uma alternativa à colecistectomia para pacientes com pancreatite biliar, a menos que a cirurgia seja absolutamente contraindicada (por exemplo, pancreatite recorrente em paciente com doença hepática crônica terminal).

As combinações de testes de função hepática, características clínicas e US abdominal são capazes de predizer a coledocolitíase?
Recomendação: sugerimos os seguintes critérios de alto risco para coledocolitíase, que devem indicar a CPRE:
1. Cálculo do hepatocolédoco no US abdome
2. Bilirrubina total> 4 mg / dL e ducto biliar comum dilatado
3. Colangite ascendente
Sugerimos que pacientes com outros critérios, como alteração de enzimas e função hepáticas, idade> 55 anos e ducto biliar comum dilatado na US (risco intermediário de coledocolitíase) sejam submetidos a ecoendoscopia, CPRM ou colangiografia intraoperatória ou US intraoperatório na laparoscopia para avaliação adicional.
Revisão:
Depois de revisar as evidências atuais, o painel recomendou os seguintes critérios de alto risco: colangite, cálculo em exame de imagem e a combinação de bilirrubina total > 4 mg / dL e dilatação do hepatocolédoco. Este último foi definido como > 6 mm nos adultos com vesícula biliar e > 8 mm nos que foram submetidos à colecistectomia.
Critério intermediário foi definido como bioquímica hepática anormal, idade> 55 anos ou dilatação do hepatocolédoco. Ele propôs que pacientes com qualquer um dos critérios de alto risco fosse submetidos a CPRE e aqueles com critério de risco intermediário fossem submetidos a ecoendoscopia, CPRM, colangiografia intraoperatória ou US intraoperatório. Aqueles sem fatores clínicos de risco devem ser submetidos a colecistectomia com ou sem colangiografia intraoperatória ou US intraoperatório. Essa abordagem de estratificação e gerenciamento exigirá validação em futuros estudos prospectivos.
Diretrizes específicas para CPRE em pacientes pediátricos com coledocolitíase provavelmente exigirão mais pesquisas, e as diretrizes atuais para adultos podem não ser diretamente aplicáveis.

Qual é o momento ideal da CPRE para a coledocolitíase em pacientes submetidos à colecistectomia?
Recomendação: Sugerimos que CPRE pré ou pós-operatória ou tratamento laparoscópico sejam realizados para pacientes com alto risco de coledocolitíase ou com colangiografia intraoperatória positiva, dependendo expertise da equipe cirúrgica e endoscópica local.
Revisão:
Existem várias abordagens para o manejo da coledocolitíase quando a colecistectomia é planejada. Pode ser uma abordagem somente cirúrgica e a cirurgia associado a um procedimento minimamente invasivo para clareamento da via biliar. Frequentemente a CPRE é realizada antes da colecistectomia em pacientes com alto risco de coledocolitíase. Uma alternativa também é fazer a colangiografia intraoperatória durante a colecistectomia e realizar a CPRE se tiver cálculo.

Qual o papel do CPRE no tratamento da síndrome de Mirizzi e hepatolitíase?
Recomendação: Para pacientes com síndrome de Mirizzi, a terapia colangioscópica peroral pode ser uma alternativa ao tratamento cirúrgico, dependendo da experiência local; no entanto, a ressecção da vesícula biliar é necessária, independentemente da estratégia. Para hepatolitíase, sugerimos uma abordagem multidisciplinar, incluindo endoscopia, radiologia intervencionista e cirurgia.
Revisão:
Aproximadamente 0,3% a 1,4% dos pacientes desenvolverão a síndrome de Mirizzi, na qual a obstrução biliar se desenvolve pela presença do cálculo no ducto cístico ou no infundíbulo da vesícula biliar. A CPRE está bem estabelecida como um método para diagnosticar a síndrome de Mirizzi e desobstruir a via biliar com colocação de prótese antes do tratamento cirúrgico definitivo. Colangioscopia com laser intraductal ou sistema eletrohidraulico parecem expandir o papel do tratamento endoscópico. Séries maiores revelaram uma taxa de sucesso de 75% a 91% para abordagens intraductais guiadas por colangioscopia para tratar a síndrome de Mirizzi. No entanto, se a vesícula biliar não for removida após terapia endoscópica, a maioria dos pacientes desenvolve complicações biliares e, mesmo após a colecistectomia, 10% podem desenvolver problemas biliares subsequentes. Experts advogam que o tratamento por colangioscopia deveria ser limitado a Mirizzi tipo II visto que a tipo I é de difícil abordagem por essa técnica e que a abordagem cirúrgica requer apenas colecistectomia sem exploração da via biliar.
Embora os estudos sejam limitados, aproximadamente dois terços dos pacientes com doença biliar intra-hepática apresentam respostas favoráveis às abordagens endoscópicas convencionais. Os avanços na colangioscopia peroral, incluindo o desenvolvimento de endoscópios flexíveis de alta resolução, permitiram uma terapia endoscópica bem-sucedida no tratamento a laser ou com sistema eletrohidráulico em mais de 85% dos pacientes. Há ainda papel para terapia percutânea. Em uma grande série de casos de pacientes com colangite supurativa recorrente, 85,3% alcançou clareamento com essa abordagem. No entanto, em certos casos, estenoses e alguns formatos de cálculo podem impedir o clareamento por abordagens endoscópicas ou percutâneas, e a ressecção parcial do fígado naquelas com boa função hepática permite sucesso em mais 80% dos pacientes com litíase intrahepática grave.
Qual o papel dos stents do ducto biliar no tratamento da coledocolitíase?
Recomendação: Os stents plásticos e metálicos recobertos podem facilitar a remoção de coledocolitíase difícil, mas requerem remoção ou troca planejada.
Revisão:
Os stents biliares são comumente usados para manter a drenagem biliar em pacientes com coledocolitíase difícil submetidos a CPRE ou que apresentem sinais de infecção. No entanto, também foi proposto como estratégia de tratamento para coledocolitíase difícil. A colocação temporária de stents biliares parece ser uma terapia eficaz para a coledocolitíase. Estudos de coorte demonstram que a colocação de stents para coledocolitíase resulta em uma diminuição significativa no volume e no número de cálculos. No momento da remoção do stent, programada para 2 a 6 meses após a colocação inicial, o clareamento completo foi alcançada em 65% a 93% dos casos. Dois pesquisadores também demonstraram que a colocação de stents metálicos recobertos, por uma média de 6 e 8 semanas, permitiu um clareamento completo de mais de 80% dos pacientes durante a segunda CPRE. Em outras séries maiores, os cálculos difíceis puderam ser removidos por simples varredura com balão em 66%.
A hipótese dos autores é de que o stent favorece a remoção da coledocolitíase difícil por fragmentação através atrito mecânico direto e por indução de dilatação papilar.

O resumo das questões clínicas está na tabela abaixo:

Acesse: https://www.giejournal.org/article/S0016-5107(18)33162-6/fulltext

 




O que podemos fazer para evitar pancreatite pós-CPRE ? Essas duas publicações recentes tratam desse assunto.

Atualização sobre pancreatite pós-CPRE: artigos recentes

 

 

A pancreatite aguda pós-CPRE é a mais frequente complicação desse procedimento e, embora em grande parte dos casos apresente-se de forma leve a moderada, por vezes a evolução pode ser grave. Os endoscopistas buscam, portanto, todas as técnicas e condutas para evitá-la. Abaixo, seguem dois estudos de 2019 sobre essa temida complicação.

 

  1. Pharmacological prophylaxis versus pancreatic duct stenting plus pharmacological prophylaxis for prevention of post-ERCP pancreatitis in high risk patients: a randomized trial (ENDOSCOPY DOI: 10.1055/a-0977-3119)

 

Objetivo: o objetivo desse estudo de não-inferioridade foi avaliar a eficácia da colocação de prótese pancreática associada a profilaxia farmacológica versus somente profilaxia farmacológica na prevenção de pancreatite pós-CPRE (PEP), em pacientes de alto risco.

 

Métodos: estudo de não-inferioridade, randomizado, controlado, duplo cego, em um único hospital terciário de Tehran, Irã. Os pacientes foram randomizados em dois grupos. As drogas utilizadas como profilaxia foram indomedacina por via retal, dinitrato de isosorbida via sublingual, ambas administradas imediatamente antes do procedimento, além de hiper-hidratação com ringer lactato (6 ml/kg/h durante a CPRE, seguida de bolus de 20ml/kg após e 3 ml/kg nas 8 horas seguintes).

A prótese pancreática utilizada foi 5 fr x 4 cm, single pigtail.

Foram avaliados o índice e gravidade da PEP, níveis séricos de amilase, e tempo de internação hospitalar.

 

Resultados:

  • 414 pacientes (207 em cada grupo) foram avaliados em 21 meses.
  • Média de idade 55,5 anos, 60,2% eram mulheres.
  • PEP ocorreu em 59 pacientes (14,3%, IC 95%, 11.1 % – 17.9 % ): 26  pacientes (12.6 %,  IC 95 %  8.6%–17.6% ) no grupo farmacológico + prótese e 33 pacientes (15.9%, IC 95%, 11.4%– 21.4 % ) no grupo somente farmacológico.
  • Não houve diferença significativa entre os dois grupos com relação à gravidade da pancreatite (p=0,59), níveis séricos de amilase após 2 horas (p=0,31) ou em 24 horas (p=0,08) e no tempo de internação hospitalar (p=0,07).

 

Discussão: o design de não-inferioridade foi escolhido para esse estudo porque se for demonstrado ser a profilaxia farmacológica igualmente efetiva, ela oferece muitas vantagens sobre a prótese pancreática. Essas vantagens incluem uma única e fácil administração da droga, baixo risco de complicação, além de custo-efetividade favorável.  Assim como a indometacina via retal, vários estudos já demonstraram os benefícios da prótese pancreática como profilaxia da PEP. Porém, esta técnica apresenta algumas poucas desvantagens: prolonga o tempo do procedimento, tecnicamente desafiador, a falha na colocação aumenta o risco de PEP e torna mais caro um procedimento que já tem alto custo; além da necessidade de retirada da prótese, nos casos em que não há saída espontânea. Se essa a saída espontânea for precoce, perde-se o benefício da prótese. Se houver migração para o ducto pancreático, embora rara, trata-se de um evento adverso grave, que pode requerer várias abordagens endoscópicas e até tratamento cirúrgico. Muitos estudos de profilaxia com prótese pancreática foram conduzidos antes do uso difundido da indometacina via retal como profilaxia. A demonstração de não-inferioridade da terapia farmacológica poderia, portanto, ser suficiente para recomendar essa estratégia como método primário de profilaxia de PEP. Entretanto o estudo falhou em demonstrar a não-inferioridade ou inferioridade da profilaxia farmacológica isolada. Embora os resultados não tenham sido conclusivos, o benefício de adicionar a prótese pancreática à profilaxia farmacológica (se houver) deve ser pequeno. Novos estudos são necessários.

 

Conclusão: o estudo falhou em demonstrar a não-inferioridade ou a inferioridade da profilaxia farmacológica isolada ou associada à colocação de prótese pancreática na prevenção de PEP.

 

Link para acessar o artigo original 

 

  1. Comparative Efficacy of 9 Major Drugs for Postendoscopic Retrograde Cholangiopancreatography Pancreatitis: A Network Meta-Analysis (Surgical Laparoscopy Endoscopy & Percutaneous Techniques doi: 10.1097/SLE.0000000000000707)

 

A droga ótima para reduzir o risco de PEP ainda é incerta.

 

Objetivo: O objetivo desse estudo foi comparar a eficácia das 9 maiores drogas usadas no mundo todo para profilaxia da PEP.

 

Método: foi feita uma pesquisa sistemática na literatura até outubro 2018 no Pubmed, Embase, Web of Science, the Cochrane Central Library e ClinicalTrials.gov. Foram incluídos estudos controlados e randomizados comparando alopurinol, diclofenaco, gabexate (GAB), nitroglicerina (GTN), indometacina, nafamostat, octreotide, somatostatina e ulinastatin.

 

Resultados:

  • 86 estudos controlados e randomizados envolvendo 25.246 pacientes foram incluídos.
  • Os resultados indicam que diclofenaco, GAB, GTN, indometacina, somatostatina e ulinastatin foram mais efetivos que placebo com odds ratios variando entre 0,48 (IC 95% 0,26 – 0,86) para GAB e 0,61 (0,39-0,94) para somatostatina.
  • Alopurinol, nafamostat e octreotide mostraram eficácia similar ao placebo em reduzir o risco de PEP.
  • Não foram encontradas diferenças significativas entre diclofenaco, GAB, GTN, indometacina, somatostatina e ulinastatin.
  • Em termos de prognóstico, GAB pode ser o tratamento mais efetivo e octreotide, o menos efetivo.

 

Discussão:  esse estudo foi a primeira metanálise com drogas mais usadas na prevenção da PEP e incluiu um grande número de estudos. Entretanto as seguintes limitações devem ser consideradas: primeiro, diferentes drogas com diferentes doses e vias de administração foram usadas nos estudos, o que pode ter um certo impacto nos resultados. Os estudos têm mostrado que diferentes vias de administração afetam o papel dos AINES e da somatostatina em prevenir PEP. Segundo, as definições de PEP usadas são as mesmas a despeito do grande período de tempo de condução dos estudos incluídos. Terceiro, há poucos estudos head-to-head nos estudos incluídos.

 

Conclusão: embora a análise sugira que GAB pode ser o mais efetivo em prevenir PEP, as limitações do estudo justificam mais estudos head-to-head futuros, usando doses e vias de administração similares, para aprimorar e validar a comparação entre as drogas na prevenção de PEP.

 

Link para acessar o artigo original

 

 

 

 

Para saber mais sobre este tema, acesse o site Gastropedia clicando aqui!




Impacto do índice de massa corporal na incidência e gravidade da pancreatite pós-colangiopancreatografia retrógrada endoscópica

RESUMO

O que já sabíamos:

– Pancreatite aguda é a maior complicação pós-CPRE

– Os fatores de risco relacionados a pancreatite pós-CPRE incluem: dificuldade ou falha na canulação biliar, dilatação balonada do esfíncter, esfincterotomia pancreática e injeção no ducto pancreático

– Os fatores de risco relacionados ao paciente incluem: pacientes jovens, mulheres, suspeita de disfunção do esfíncter de Oddi, história de pancreatite recorrente, história de pancreatite prévia e ausência de pancreatite crônica

Novos achados:

– A obesidade não aumenta a incidência ou a gravidade da pancreatite pós-CPRE

– IMC baixo não impacta na incidência ou na gravidade da pancreatite pós-CPRE

– Concluindo: o estudo mostrou que não há correlação entre obesidade e incidência ou gravidade de pancreatite.  Da mesma forma, os pacientes abaixo do peso não tiveram maior incidência ou gravidade de pancreatite. Estudos futuros sobre o assunto deveriam ser realizados de forma prospectiva, idealmente, para minimizar os vieses e deveriam ser usados outras mensurações da composição corporal para melhor avaliação da obesidade.

Mohamed M. Abdelfataha,b, Nicholas J. Koutlasa , Eric Gochanoura , Ahmed Hameda , Mariam Ibrahima , Mohamed Barakatc , Prashant R. Mudireddya

East Carolina University, Greenville, NC; Emory University, Atlanta, GA, USA

Ann Gastroenterol. 2019 May-Jun;32(3):298-302.

INTRODUÇÃO

Embora considerada segura, a colangiopancreatografia retrógrada endoscópica (CPRE) está entre os procedimentos endoscópicos associados a maior risco de complicações. A pancreatite pós-CPRE (PEP, do inglês pos-ERCP pancreatitis) é a complicação mais comum. A incidência de PEP varia de 1 a 9% em pacientes com risco médio e de 11 a 40% em pacientes de alto risco, com 0,1% de mortalidade.

Os fatores de risco para PEP têm sido exaustivamente estudados e são classificados em:  fatores de risco relacionados ao paciente (pacientes jovens, mulheres, com suspeita de disfunção do esfíncter de Oddi, história de pancreatite recorrente, história de PEP prévia e ausência de pancreatite crônica) e fatores relacionados ao procedimento (dificuldade ou falha na canulação biliar, dilatação balonada do esfíncter, esfincterotomia pancreática e injeção de contraste no ducto pancreático).

Alguns estudos têm mostrado que a obesidade pode contribuir na incidência, gravidade e mortalidade da pancreatite aguda. Isso deve-se provavelmente ao estado inflamatório crônico observado nos pacientes obesos.

A correlação entre obesidade e incidência e gravidade da PEP ainda não está bem elucidada. Um grande estudo retrospectivo, de Deenandayalu e colaboradores, com 964 pacientes, mostrou que a taxa de PEP não foi diferente entre pacientes com índice de massa corpórea (IMC) > 30 kg/m2 e aqueles com IMC < 30 kg/m2 (12,5% vs. 16,4%, respectivamente, p =0,14).

Em contraste, Cotton e colaboradores mostraram que a obesidade está associada com complicações pós-CPRE, incluindo pancreatite.

Um estudo retrospectivo recente com 583 pacientes, de Fujisawa e colaboradores, demostrou que pacientes obesos (IMC > 30) têm uma taxa significativamente maior de PEP comparados com pacientes com sobrepeso (IMC 25-30), com peso normal (IMC 18,5 – 25) e com pacientes abaixo do peso (< 18,5). Entretanto, uma das limitações desse estudo é que apenas 20 pacientes eram obesos. Além disso, Kumar e colaboladores realizaram uma análise na base de dados americana que foi sugestivo que há uma correlação positiva entre obesidade e PEP (odds ratio 1.55, 95% de intervalo de confiança 1.25-1.92).

PACIENTES E MÉTODOS

Estudo retrospectivo com todos os pacientes submetidos a CPRE diagnóstica ou terapêutica de janeiro de 2009 a outubro de 2016. Os procedimentos foram realizados por 04 endoscopistas experientes. Foram coletados os dados dos pacientes e os detalhes do procedimento. Os pacientes que tiveram pancreatite aguda 72 horas antes do procedimento foram excluídos.

DEFINIÇÕES

O IMC foi definido de acordo com a Organização Mundial da Saúde (IMC abaixo do peso < 18,5 kg/m2/ IMC normal ente 18,5 e 25 kg/m2/ Obesidade entre 30-40 kg/m2/ Obesidade mórbida IMC> 40 kg/m2).

PEP foi definida como início ou piora de dor abdominal causando admissão hospitalar não planejada em pacientes submetidos a CPRE de forma ambulatorial ou prolongamento de internação em pacientes internados submetidos a CPRE. O diagnóstico foi associado a aumento da amilase ou lipase sérica pelo menos 3 vezes o limite superior da normalidade aproximadamente 24 h após o procedimento.

A gravidade da pancreatite foi graduada de acordo com a classificação de Atlanta revisada: leve (sem evidência de falência orgânica sistêmica ou  local ou complicações sistêmicas); moderada (falência orgânica transitória ou falência orgânica sistêmica ou local não persistente); ou grave (falência orgânica persistente ou necrose pancreática). CPRE de alto risco foi definida baseada nos fatores de risco dos pacientes e relatados no procedimento.

OBJETIVOS

O objetivo primário foi a incidência de PEP em CPREs. O objetivo secundário foi a gravidade da CPRE.

RESULTADOS

Um total de 2236 pacientes cujo IMC foi verificado e que tiveram o seguimento adequado foram incluídos na análise final. A idade média dos pacientes foi 60±18 anos; 1247 (56%) pacientes eram mulheres e 991 (44%) eram homens. A média do IMC foi 29±8(kg/m2). Os fatores de risco não foram diferentes nos dois grupos.

 No total, 17% dos pacientes submetidos a CPRE foram de alto risco para PEP. O diagnóstico de PEP foi feito em 107  (4,8%) pacientes. No total, 921 pacientes tinham IMC ≥30 kg/m2 enquanto 1315 pacientes tinham IMC <30 kg/m2. Não houve diferença estatisticamente significativa entre os fatores de risco dos pacientes e relacionados ao procedimento nos grupos de IMC baixo (<30 kg/m2) e alto (≥30 kg/m2). Dos 921 pacientes com IMC BMI≥30, 49 foram diagnosticados com PEP (5,3%). Em comparação, 58 pacientes (4,4%) foram diagnosticados com  PEP dos 1317 com IMC <30 kg/m2 (odds ratio [OR] 1.2, 95%CI 0.82-1.8; P=0.32). Não houve diferença significativa na incidência de PEP nos subgrupos.

Na análise univariada, os seguintes fatores foram associados a PEP: mulheres < 40 anos, esfincterotomia biliar, esfincterotomia pancreática, canulação do ducto pancreático principal, injeção de contraste no ducto pancreático principal, dificuldade de canulação, falha na colocação de prótese no ducto pancreático principal e história de pancreatite recorrente.

Na análise multivariada, sexo feminino e idade < 40 anos, esfincterotomia biliar, esfincterotomia pancreática, injeção de contraste no ducto pancreático principal, dificuldade de canulação e falha na colocação da prótese pancreática foram associados com PEP. Entretanto, IMC > 30 não teve impacto na incidência de PEP (OR 1.1, 95%CI 0.75-1.8; P=0.48). Da mesma forma, não houve diferença de incidência de PEP na análise de subgrupos de diferentes categorias de IMC.

Gravidade da PEP

Sete pacientes foram diagnosticados com pancreatite moderada de acordo com a classificação de Atlanta revisada: 1 do grupo com IMC baixo (<18), 2 com IMC normal, 3 do grupo com sobrepeso e 1 do grupo de obesidade mórbida.

Nove pacientes foram diagnosticados com pancreatite grave: 1 do grupo abaixo do peso, 2 do grupo com IMC normal, 1 do grupo do sobrepeso, 3 do grupo obeso e 2 do grupo obeso mórbida. Três desses 9 pacientes morreram em 30 dias: 1 do grupo obeso mórbido, 1 do grupo obeso e 1 do grupo com IMC normal.

DISCUSSÃO

Embora com limitações, esse foi o maior estudo retrospectivo que investiga a relação entre PEP e IMC. Os resultados indicam que IMC aumentado (≥30 kg/m2) não aumenta o risco de PEP. Além disso, diferentes categorias de IMC, incluindo baixo peso, sobrepeso, obesidade e obesidade mórbida, não estão associadas com uma incidência diferente de PEP comparada com pacientes de peso normal.

Leia o artigo na íntegra em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC6479648/pdf/AnnGastroenterol-32-298.pdf

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QUIZ – ENDOSCOPIA PEDIÁTRICA

Em se tratando da população pediátrica, é sabido que a realização de biópsias em áreas macroscopicamente normais à endoscopia aumenta sobremaneira o diagnóstico de muitas doenças.




METÁSTASE GÁSTRICA DE MELANOMA

Metástases gástricas de melanoma

Metástase de melanoma pigmentado constituída de células epitelióides pleomórficas; coloração de hematoxilina e eosina, 40x.

O melanoma maligno é uma das doenças malignas mais comuns que metastatizam para o tubo digestivo. A metástase pode ocorrer no momento do diagnóstico primário ou décadas após, como primeiro sinal de recorrência. Os sítios mais comuns de metástases de melanoma maligno são o intestino delgado (50%), cólon (31,3%), estômago (20%) e ânus e reto (25%)(1).

Já melanoma maligno primário do gastrointestinal pode surgir em várias áreas do trato digestivo: 33% estão localizados na nasofaringe, 5,9% no esôfago, 2,7% no estômago, 2,3% no intestino delgado, 1,4% na vesícula biliar, 9% no cólon, 22% no reto e 31% na região anal (2, 3).

Os pacientes com metástases de melanoma para o TGI podem apresentar sintomas como dor abdominal, disfagia, obstrução do intestino delgado, diarreia, hematêmese e melena (1), mas frequentemente são inespecíficos, e a indicação de realizar a endoscopia normalmente é investigação de anemia crônica por deficiência de ferro (2).

Endoscopicamente, as metástases gástricas do melanoma podem apresentar-se como úlceras pigmentadas enegrecidas, pigmentos enegrecidos difusos na mucosa, múltiplos diminutos nódulos na mucosa ou submucosa, lesões polipoides ou massas extrínsecas. Essas lesões são frequentemente pigmentadas, porém podem apresentar-se de forma não-pigmentadas, mimetizando outras neoplasias epiteliais e linfoma MALT. Portanto, as biópsias são mandatórias em pacientes com história de melanoma submetidos à endoscopia, mesmo em lesões não-pigmentadas. A cápsula endoscópica ou enteroscopia são úteis quando há suspeita de lesão no delgado. O PET-CT tem alta sensibilidade para detectar metástases de melanoma, entretanto não é capaz de detectar metástases gástricas (2).

A intervenção cirúrgica pode ser realizada especialmente em pacientes sintomáticos, para alívio da dor e melhora da qualidade de vida. Médicos oncologistas escolhem imunoterapia sistêmica com o anticorpo monoclonal anti-CTLA4 ipilimumab, que tem sido provada como tratamento efetivo para melanoma metastático (2).

O prognóstico é ruim, com sobrevida média de 4 a 6 meses.

Referência

1. Pommer B et al. Gastric metastases from malignat melanoma. Endoscopy 2008; 40: E30-E31

2. Genova, Pietro; Sorce, Maria; Gabibi, Daniela; Genova, Gaspare; Gebbbia, Vittorio; Galanti, Daniela; Ancona, Chiara; Valerio, Maria Rosaria. Gastric and Retal Metastases From Malignant Melanoma Presenting With Anemia

Hipocrômica e Tratada com Imunoterapia. Case Report In Oncological Medicine. 2017

3. Rai MP et al. BMJ Case Rep 2018. Doi: 10.116/bcr-2018-224914