Quiz!! Lesões colônicas

 

Paciente de 62 anos, com antecedente de volumosa massa hepática, realiza colonoscopia para complementar investigação etiológica. Durante a progressão do aparelho, ainda na entrada, percebe-se após insuflação, várias lacerações mucosas superficiais, longitudinais, com leve sangramento superficial autolimitado em cólon descendente.  As lesões podem ser visualizadas antes mesmo da passagem do aparelho (fotos abaixo).

 

COLON3 COLON2 COLON




CPRE em pacientes pediátricos.

 

 

Imagem da radioscopia mostrando fístula biliar pós-colecistectomia, com identificação de extravazamento de contraste na região do hepatocolédoco médio-proximal.

A colangiopacreatografia retrógrada endoscópica – CPRE é um procedimento endoscópico avançado para diagnóstico e tratamento de diversas afecções biliopancreáticas. Apesar de ser realizado com mais frequencia em adultos, ela apresenta indicações em todas as idades. A realização de CPRE na população pediátrica é menos frequente que em adultos, resultando em protocolos e estratégias adaptados. Porém, nos últimos anos, vem crescendo relatos e estudos específicos para a realização desse procedimento em crianças, ajudando a criar um melhor entendimento das indicações e técnicas para esta faixa etária.

Indicações :

Deve-se ter em mente, que mesmo em pediatria, a CPRE possui perfil relativamente alto de eventos adversos (EA). Portanto, sua indicação deve ser criteriosa, devendo-se lançar mão de procedimentos menos invasivos quando apenas for necessário o diagnóstico. As principais indicações de CPRE em crianças são :

Patologias biliares :

  • Coledocolitíase
  • Manejo de estenoses (pós transplante ou colangite esclerosante)
  • Manejo de fístula biliar (pós colecistectomia)
  • Avaliação de cisto de colédoco ou sua obstrução
  • Avaliação pré-operatória de junção pancreatobiliar anômala
  • Investigação de colestase neonatal
  • Investigação de patologias biliares onde exames menos invasivos não foram conclusivos

Patologias pancreáticas:

  • Pancreatite crônica (melhora da drenagem)
  • Pâncreas divisum
  • Investigação de pancreatite recorrente
  • Manejo de fistula pancreática (pós trauma)
  • Manejo de pseudocisto pancreático
  • Investigação de patologias pancreáticas onde exames menos invasivos não foram conclusivos

 

Alguns estudos demonstram que houve diminuição no número de exames diagnósticos nos últimos 15 anos, porém uma indicação disgnóstica que ainda permanece, e que muitas vezes evita lapatomomias exploradoras é em pacientes neonatais com suspeita de atresia biliar.

Considerações técnicas :

  • Ambiente :

Na maioria das vezes a CPRE em paciente pediátricos é realizada por endoscopistas treinados e com experiência em adultos, sendo a única modificação o paciente.  Em grandes centros de referência pediátricos há endoscopistas habituados em CPRE infantil, onde realizam o procedimento em ambiente preparado para receber este tipo de paciente com equipe treinada para tal.

  • Sedação

Não há consenso sobre a melhor técnica para sedação, já que há estudos mostrando a segurança tanto da sedação feita por endoscopista quanto a sedação feita por anestesista ou mesmo quando esses pacientes são submetidos a anestesia geral.  Alguns trabalhos demonstram uma taxa aumentada de conversão de sedação para anestesia geral, o que pode dificultar a realização da CPRE.

Uma particularidade da população pediátrica é a fragilidade da traquéia, especialmente em paciente com baixo peso (10 a 15 kg), onde a passagem de duodenoscópios standard pode causar sua compressão gerando uma depressão respiratória de difícil controle.

  • Equipamentos específicos

Provavelmente o tópico de maior dúvida.  No artigo utilizado como referência (1), os autores relatam que equipamentos pediátricos são raramente necessários, mesmo em centros de grande volume de exames.  Descrevem que em termos gerais,  duodenoscópios pediátricos (com cerca de 7,5 a 8,6 mm de diâmetro) devem ser a escolha para pacientes com menos de 10 kg, e em crianças maiores o duodenoscópio padrão deve ser utilizado, apesar de não haver consenso na faixa de peso de 10 a 15kg.  A utilização de aparelhos standards na maioria dos pacientes acima de 10 kgs, leva em conta o diâmetro do canal de trabalho dos mesmos, os quais permitem a passagem de próteses maiores que 5 Fr e materiais de triplo lúmen. Ao utilizar duodenoscópios standard em crianças, deve-se ter cuidado redobrado na passagem do aparelho, principalmente no esfíncter superior do esôfago e no piloro.

  • Eventos adversos

Devido a frequência relativamente baixa de eventos adversos em CPRE na população pediátrica, e principalmente poucos estudos de grande impacto na literatura sobre esse tema, é difícil estabelecer fatores de risco ou estratégias para diminuir os EA.

Em trabalho retrospectivo (2), com idade média de 15 anos (±5), foram analisados 429 procedimentos, onde o perfil de EA foi : Pancreatite (6,3 %, sendo a maioria leve ou moderada), dor abdominal (sem perfuração ou pancreatite – 5,6%), colangite (2,5%), febre (sem colangite ou pancreatite – 1,6%) e sangramento (1,4%). Não houve casos de perfuração.

A pancreatite segue como o EA mais comum nas CPREs também em crianças. Os fatores de risco aparentemente são os mesmos dos adultos (manipulação ou injeção no ducto pancreático, canulação difícil, dilatação, precut ….) .  Infelizmente, não se dispõem de dados mostrando diminuição da incidência de pancreatite com uso de stents pancreáticos (com alguns trabalhos demonstrando maior índice de EA) ou AINES via retal, como observado em adultos.

Sangramentos podem ocorrer, principalmente após papilotomia, sendo que o tratamento segue  as mesmas indicações e técnicas de pacientes adultos. O mesmo para perfurações,  devendo-se apenas atentar para o tipo de aparelho escolhido (como discutido acima ).

Por fim, é notório o maior uso de CPRE em pacientes pediátricos, assim como novas tecnologias devem se juntar a ela, como por exemplo a ultrassonografia endoscópica. Assim, estudos voltados para este grupo de pacientes são necessários para protocolos e consensos possam ser estabelecidos.

Você realiza CPRE em crianças ? Divida conosco sua experiência, acessando e participando do fórum de discussões .

Bibliografia :

 

Veja também :

CPRE em Pacientes Cirróticos 

CPRE em pacientes com gastrectomia a Billroth II prévia: 30 anos de experiência

CPRE em pacientes com gastrectomia a Billroth II

 




QUIZ ! Qual a alternativa correta ?

Paciente do sexo feminino, 25 anos, com antecedente de pancreatite aguda grave há cerca de 2 semanas. Apresentou boa evolução clínica, estando assintomática no momento, aguardando colecistectomia. Apresenta porém, abaulamento indolor palpável em epigastro e hipocôndrio esquerdo. Para melhor avaliação, foi solicitada TC de abdomen, que evidenciou coleção líquida homogenia em cabeça e corpo de pâncreas, com cerca de 10 cm de diâmetro, sem gás ou sinais de sangramento.

Coleção líquida em cabeça e corpo pancreático.

Também foi realizada endoscopia digestiva alta que observou :

Abaulamento fixo de parede posterior de corpo gástrico.

 

Com base na história e exame :

 




Complicações em Retocolite Ulcerativa

Paciente do sexo feminino , 62 anos, solteira, natural e procedente de Marília-SP, empresária.

Foi encaminhada (março de 2015) com antecedente de retocolite ulcerativa de longa data, apresentando quadros de dor e diarréia, mesmo com uso (irregular) de corticóide e salicilatos.

Inicialmente foi submetida a colonoscopia , para avaliar a gravidade da doença, com os seguintes achados:

Erosões puntiformes difusas, sem erosões (Doença moderada, Escore 2 - Classificação Clínica Mayo)

Erosões puntiformes difusas, sem erosões (Doença moderada, Escore 2 – Classificação Clínica Mayo)

Erosões puntiformes difusas, sem erosões (Doença moderada, Escore 2 - Classificação Clínica Mayo)

Erosões puntiformes difusas,com áreas de apagamento vascular submucosa

Erosões puntiformes difusas, sem erosões (Doença moderada, Escore 2 - Classificação Clínica Mayo)

Erosões puntiformes difusas, sem ulcerações. (Doença moderada, Escore 2 – Classificação Clínica Mayo)

Erosões puntiformes difusas, sem erosões (Doença moderada, Escore 2 - Classificação Clínica Mayo)

Erosões puntiformes difusas, , com enantema

Laudo da colonoscopia (abril/2015) : Pancolite ulcerativa (subescore 2 – Clínica Mayo) – Doença diverticular de cólon esquerdo não complicado  (Nota : Não foi possível avaliação de íleo terminal, por grande quantidade de resíduos).

Baseado no exame colonoscópico, corrigiu-se as dosagens de salicilatos e corticóide, sendo checada adesão ao tratamento, com retornos ambulatoriais frequentes. Houve inicialmente melhora parcial , porém, na evolução, voltou a  apresentar diarreia, agora com sangramento e perda ponderal. Foi então solicitado novo exame endoscópico, agora uma retossigmoidoscopia, para avaliar a resposta  ao tratamento, com os seguintes achados :

Retocolite Ulcerativa em atividade Moderado-Grave. Escore 3 de Mayo

Retocolite Ulcerativa em atividade Moderado-Grave. Escore 3 de Mayo

Retocolite Ulcerativa em atividade Moderado-Grave. Escore 3 de Mayo

Retocolite Ulcerativa em atividade Moderado-Grave.Erosões enantema e  edema difuso

Retocolite Ulcerativa em atividade Moderado-Grave. Escore 3 de Mayo

Retocolite Ulcerativa em atividade Moderado-Grave. Escore 3 de Mayo

Retocolite Ulcerativa em atividade Moderado-Grave. Escore 3 de Mayo

Retocolite Ulcerativa em atividade Moderado-Grave. Ulcerações isoladas

Retocolite Ulcerativa em atividade Moderado-Grave. Escore 3 de Mayo

Retocolite Ulcerativa em atividade Moderado-Grave. Ulceraões isoladas

Retocolite Ulcerativa em atividade Moderado-Grave. Escore 3 de Mayo

Retocolite Ulcerativa em atividade Moderado-Grave. Escore 3 de Mayo

Retocolite Ulcerativa em atividade Moderado-Grave. Escore 3 de Mayo

Retocolite Ulcerativa em atividade Moderado-Grave. Erosões e sangramento difuso

Retocolite Ulcerativa em atividade Moderado-Grave. Escore 3 de Mayo

Retocolite Ulcerativa em atividade Moderado-Grave. Escore 3 de Mayo

Laudo Retossigmoidoscopia (junho/2015) : Retocolite Ulcerativa em atividade moderado-grave.

Com base no quadro clínico e exame de imagem , optou-se por iniciar terapia com imunobiológicos, sendo escolhido Adalimumab (Humira ®), nas doses habituais de indução e manutenção.

Ainda assim, não apresentou melhora clínica, com persistência da diarréia, sangramento retal, perda de peso e desnutrição. Foi internada, para tratamento com corticóide e troca de imunossupressor biológico para infliximab (Remicade ®)  Novamente, foi solicitada exame endoscópico, para avaliar a falência do tratamento com imunossupressor, com os seguintes achados :

Retocolite ulcerativa em atividade moderada: Escore 2 de Mayo.

Retocolite ulcerativa em atividade moderada: Apagamento de vasculatura e enantema difuso

Retocolite ulcerativa em atividade moderada: Escore 2 de Mayo.

Retocolite ulcerativa em atividade moderada: Escore 2 de Mayo.

Retocolite ulcerativa em atividade moderada: Escore 2 de Mayo.

Retocolite ulcerativa em atividade moderada: Erosões difusas, com fibrina

 

Retocolite ulcerativa em atividade moderada: Escore 2 de Mayo.

Retocolite ulcerativa em atividade moderada: Escore 2 de Mayo.

Retocolite ulcerativa em atividade moderada: Escore 2 de Mayo.

Retocolite ulcerativa em atividade moderada: Apagamento de vasculatura e erosões difusas

Pólipo Reto

Pólipo Reto – séssil, 25 mm

Pólipo Reto

Pólipo Reto – séssil, 25 mm , cerca de 8 cm de B.A.

Pólipo Reto

Pólipo Reto

Laudo colonoscopia (outubro/2015): Colonoscopia incompleta com angulação fixa de sigmóide. Colite ulcerativa em atividade moderada (Escore 2 de Clínica Mayo). Pólipo de reto (10 cm de BA). Biópsias (nota :não realizada polipectomia devido a inflamação importante do órgão)

Anátomo patológico da biópsia de pólipo de reto: Adenocarcinoma.

Como não houve resposta ao tratamento clínico, associado ao exame endoscópico de neoplasia, optou-se pela protocolectomia total, que foi realizada sem intercorrências, não sendo realizada “pouch ileal” devido as condições clínicas do paciente (realizada ileostomia terminal). Durante a cirurgia, foi realizada retoscopia, para deter minar que todo o reto havia sido dissecado e seria retirado (fechamento do reto cerca de 2 cm acima da linha pectínea) :

Pólipo- Retoscopia intraoperatória.

Pólipo- Retoscopia intraoperatória.

Pólipo- Retoscopia intraoperatória.

Pólipo- Retoscopia intraoperatória.

Pólipo- Retoscopia intraoperatória.

Pólipo- Retoscopia intraoperatória.

A peça cirúrgica :

Peça - Protocolectomia

Peça – Protocolectomia

Peça - Protocolectomia - aberta

Peça – Protocolectomia – aberta

Pólipo reto

Pólipo reto

Pólipo reto

Pólipo reto

 

Pólipo reto

Pólipo reto

Anátomo patológico da peça :

  • Adenocarcinoma tubular polipóide de moderado grau nuclear, com invasão da submucosa, sem atingir a muscular própria. Invasão perineural ou angiolinfática não detectada.
  • Ausência de metástase em 4o linfonodos isolados.
  •  Adenocarcinoma microcópico incidental (invadindo superficialmente a submucosa)
  • Retocolite ulcerativa idiopática em intensa atividade comprometendo todo o cólon e apêndice cecal)
  • Linfadenite crônica inespecífica.
  • Margens livres.

 

Paciente sem encontra em pós operatório, com boa recuperação, teve breve internação no 10 po por desidratação – ileostomia), aguardando consulto com oncologista para acompanhamento clínico.

 

Nota : Escore da Clínica Mayo para achado endoscópico em doença inflamatória intestinal:

Zero = Normal ou inativa

1  = Doença leve (enantema, perda de padrão vascular, leve friabilidade)

2 = Doença moderada (enantema evidente, perda de padrão vascular, friabilidade, erosões)

3 = Doença grave (sangramento espontâneo, ulceraçõe)

 

Imagens gentilmente cedidas pelo Prof. Dr. Fábio Vieira Teixeira – Gastrosaúde – Marília – SP

 

Veja mais :

Como realizar cromoscopia no rastreamento de displasia em casos de doença inflamatória intestinal?

DIRETRIZES – SCENIC – Consenso internacional sobre o rastreamento e manejo de displasia na doença inflamatória intestinal

 




Insuflação com dióxido de carbono versus ar: uma metanálise

Muitas são as variáveis que atestam a qualidade do exame, no ponto de vista médico. Tempo de chegada no ceco , índice de intubação do íleo, índices de detecção de adenomas e outros. Porém, todos estes indicadores de qualidade, dificilmente importam para o paciente. Para este, a qualidade do exame reside num preparo com pouco desconforto, um exame com boa sedação e analgesia, e um pós exame sem dor ou distensão. Vários são os métodos disponíveis para o preparo, adequando cada paciente a um tipo de preparo. Temos avanços na sedação , com medicamentos de ação rápida, segura e de qualidade. Por fim, novas técnicas vem sendo aplicadas visando diminuir o desconforto durante e após o exame.

Dentre estas novas técnicas, ganha espaço a colonoscopia com distensão por água,  e a com insuflação com dióxido de carbono (ICO2), principalmente em contexto de exames sem sedação. As técnicas com ICO2 iniciais datam da década de 50, posteriormente se provou que ele difunde 150  vezes mais rápido, diminuindo espasmo e dor. Assim, as publicações com uso de ICO2 vem se avolumando, justificando este estudo, que visa avaliar sistematicamente a colonoscopia com insuflação com ar (IA) versus a colonoscopia com ICO2.

Para este fim, os autores optaram por realizar uma revisão sistemática, com metanálise, onde foram incluído estudos com os seguintes critérios :

  •         Estudos tipo ensaio clínico randomizado
  • Comparação entre IA e ICO2
  • Avaliação do paciente com relação a dor e desconforto
  • Tempo de chegada no ceco ou taxa de insucesso

Como objetivo primário, os autores avaliaram a intensidade de dor (baseado em escala), quantidade de pacientes com dor durante o precedimento, e após uma, 6 e 24 horas. O objetivo secundário foi o tempo de chegada no ceco e taxa de colonoscopia incompleta.

Foram escolhidos 21 estudos , englobando 3607 pacientes, sendo 1801 no grupo ICO2 e 1806 no grupo IA.

Resultados :

  • Dor durante a colonoscopia : Há  maior incidência global de dor com o uso de IA (OR 0,50 CI:0,3-0,84 p<0,008), sendo que com uso de ICO2, há escores menores de dor (p<0,0002).
  • Dor após 1, 6 e 24 horas  : Há maior incidência de dor com IA nos três períodos (OR 0,24  p<0,03  /  OR 0,25 P<0,0006 / OR 0,42 p<0,0005), sendo que com uso de ICO2, há escores menores de dor para os dois primeiros perídos (uma e seis horas : p<0,0002 / p<0,01 / p<), mas não há diferença para os escores de dor após 24 horas (p=0,2)
  • Taxa de colonoscopia incompleta: Não houve diferença entre os grupos (p=0,83)
  • Tempo de chegada ao ceco (intubação). Há menor tempo de intubação com ICO2 (p=0,02).

Assim , os autores afirmam que há vantagens clínicas no uso de ICO2, como menor tempode chegada ao ceco, e principalmente menos desconforto durante e após o exame .

Pessoalmente, possuo pouca experiência com ICO2. Porém, não é incomum pacientes apresentarem dor após a colonoscopia, mesmo que por pouco tempo. Nem sempre é possível a retirada de todo o ar do órgão (sendo necessária nova intubação, o que em alguns pacientes não é possivel), e em outros, mesmo com aparente retirada do ar do cólon, ainda há dor (distensão do delgado ?). Assim, o uso de ICO2 parece ideal para colonoscopia, e o relato dos colegas que fazem uso desta tecnologia é sempre positiva. Porém, há o investimento necessário para tal, e este, nem sempre tem retorno garantido (não há pagamento diferenciado para colonoscopia com ICO2), o que inviabiliza a difusão em massa do ICO2.

 

Artigo original :

1 – Sajid MS, Caswell J, Bhatti MI, Sains P, Baig MK, Miles WF. Carbon dioxide insufflation vs conventional air insufflation for colonoscopy: a systematic review and meta-analysis of published randomized controlled trials. Colorectal Dis. 2015 Feb;17(2):111-23. doi: 10.1111/codi.12837

 

Veja também :

ARTIGO COMENTADO – Multicenter, randomized, tandem evaluation of EndoRings colonoscopy – results of the CLEVER study.

DIRETRIZES – Preparo intestinal para colonoscopia.

Artigo Comentado – Perfurações de trato gastrointestinal alto e colônicas. Medidas práticas de prevenção e avaliação.

 

 

 




CPRE em Pacientes Cirróticos

Um dos pacientes de manejo clínico mais difícil , com certeza são os pacientes com doença hepática avançada , especialmente os cirróticos. Estes possuem uma variada gama de alterações, como ascite, coagulopatias, hipertensão portal e outras, que aumentam o risco de qualquer intervenção cirúrgica que este paciente possa vir a realizar. Assim, para várias patologias, a CPRE pode ter um papel importante, porém, há pouco conhecimento publicado sobre este procedimento em pacientes cirróticos.

Para avaliar os resultados e complicações da CPRE em pacientes cirróticos, os autores realizaram um estudo retrospectivo multicêntrico, incluindo todos os pacientes que possuiam diagnóstico laboratorial ou de imagem de cirrose e que realizaram CPRE, no período de 2003 a 2014. Foram excluídos pacientes gestantes, menores de 18 anos e aqueles em que não havia diagnóstico de certeza de cirrose. Todos os pacientes realizavam exames de tempo de protrombina, INR e contagem de plaquetas. Pacientes com INR acima de 1,5 recebiam vitamina K e plasma fresco, e pacientes com plaquetas abaixo de 50000 recebiam transfusão de plaquetas. Para análise, os pacientes foram divididos conforme a classificação de Child-Pugh (CP).

Foram incluídos 538 procedimentos, em 328 pacientes (64% homens , idade média de 53,2 ±14,4 anos) com as seguintes causas de cirrose:

  • Consumo de alcool – 4,1 %
  • Hepatite viral – 13,6%
  • Colangite esclerosante primária (CEP)– 70,2%
  • Esteatohepatite não alcoólica – 1,1%
  • Cirrose criptogênica – 11%

Com relação ao estadiamento da cirrose, 229 pacientes tinham classificação de CP classe A, 229 classe B e 80 classe C. O INR basal estava abaixo de 1,7 para 492 pacientes, entre 1,7 e 2,2 em 33 pacientes e acima de 2,2 para 13, sendo que para contagem de plaquetas , a média foi de 105000 (de 29000 a 193000).

As indicações para CPRE nos pacientes incluídos foram :

  • Coledocolitíase – 6,5%
  • Estenoses biliares (terapia/biópsias) – 70% (*nota : o grupo não realiza, geralmente, papilotomia para este procedimento em paciente com CEP)
  • Pancreatite aguda recorrente – 4,1%
  • Colangite – 6,7 %
  • Outros – 12,3%

As principais condutas terapêuticas durante o procedimento de CPRE foram colocação de próteses biliares (51%), papilotomia (16,2%) e esfincterotomia pancreática (1,5%). Quarenta e dois pacientes necessitaram de dilatação com balão , ou de estenoses para colocação de próteses, ou para remoção de cálculos.

Como resultados, foram observados complicações em 49 procedimentos, assim distribuídos:

  • Pancreatite pós CPRE – 25 (4,7 % do total)
  • Sangramento – 6 (1,1%)
  • Colangite – 15 (2,8%)
  • Perfuração – 2 (0,4%)
  • Morte – 1 (0,2%)
  • Complicações cardiopulmonares – 5 (0,9%)

Observou-se que maior incidência de efeitos colaterais em pacientes com CP classe B e C quando comparados a classe A (p=0,048). Houve maior incidência de pancreatite em pacientes com realizaram papilotomia (p=0,0002), não foi encontrada relação entre ocorrência de sangramento e a classificação de CP, mas houve relação com presença de encefalopatia não controlada (5,1 % vs 0,6% p=0,02) e também para eventos cardiopulmonares (5,1% vs 0,4% p=0,01).

Concluem que o procedimento de CPRE em cirróticos é seguro, com baixa taxa de complicações (maiores em pacientes CP classe A e B ), sendo as taxas de pancreatite nos pacientes incluídos são comparáveis as taxas em pacientes sem cirrose (4,6 vs 3,6%), assim como sangramento (1,1 vs 1,3%). Porém, em sua discussão , apresentam alguns estudos anteriores, com menor número de participantes, onde o índice de complicações foi bem maior, em especial, sangramento durante ou após o procedimento. Para o estudo apresentado, todos os pacientes que possuíam coagulopatia ou baixa contagem de plaquetas foram corrigidos, e apenas 82 deles realizaram papilotomia, sendo esta não realizada (ou evitada) em pacientes com INR maior que 1,7 ou na presença de varizes duodenais. Também demonstra menor taxa de complicações no subgrupo com CEP.

Em nossa prática clínica diária, a indicação de CPRE é rara, porém existe. Nestes pacientes, o maior receio é o risco de sangramento. Mesmo na ausência de varizes duodenais, o sistema esplâncnico esta sob regime de hipertensão portal, que associado a coagulopatias (que nem sempre podem ser totalmente corrigíveis), aumentam muito o risco. No estudo apresentado, apenas uma parte pequena dos pacientes foi submetido a papilotomia, talvez o maior fator de risco isolado para sangramento, porém um dado interessante, e que mesmo quando foi necessária colocação de próteses, não foi realizada papilotomia em pacientes com CEP. Isto mostra que uma abordagem interessante nestes pacientes seria a resolução da urgência (drenagem com próteses ou dilatações com balão), e após melhora clínica, realizar o procedimento definitivo (papilotomia com remoção de cálculo por exemplo).

Você possui experiência em CPRE em paciente cirróticos ? Divida seu conhecimento conosco participando das discussões, deixando seu comentário abaixo.

Artigo original:

Adler DG, Haseeb A, Francis G, et al. Efficacy and safety oftherapeutic ERCP in patients with cirrhosis: a large multicenter study. Gastrointest Endosc. 2015 Aug 19. pii: S0016-5107(15)02756-X.

Veja mais artigos relacionados:

HDA: guia resumido de condutas desde admissão à alta hospitalar. 

Baveno VI – O que há de novo?




NBI versus cromoscopia com lugol para diagnóstico de neoplasia precoce de esôfago.

Narrow-band imaging magnifying endoscopy versus lugol chromoendoscopy with Pink-color assesment in the diagnosis of superficial esophageal squamous neoplasms : A randomized noninferiority trial.

 

O câncer de esôfago responde pela oitava patologia oncológica mais comum , sendo a sexta causa de mortes por câncer. A maior incidência é em países em desenvolvimento, com o tipo histológico espino-celular (epidermóide – CEC). O prognóstico ruim se deve ao fato de a maior parte das lesões serem diagnosticadas tardiamente, quando o paciente já possui sintomas.

Assim, a detecção precoce é a chave para melhor prognóstico. Sendo os fatores de risco para o câncer do tipo epidermóide conhecidos (tabagismo, etilismo, outras neoplasias de cabeça e pescoço), o rastreamento do CEC precoce torna-se possível. Para tal, classicamente utiliza-se solução de lugol aplicada ao esôfago, corando o esôfago de maneira uniforme, porém, na presença de lesão precoce, esta não se cora (área iodo negativa), guiando a biópsia e posterior possível tratamento. Porém, o uso de solução de iodo não é isenta de riscos, sendo observados casos de dor retroesternal, aspiração e até reações alérgicas, necessitando de materiais especiais para a sua aplicação. Neste contexto, o exame com aplicação da tecnologia de cromoscopia digital NBI, mostra-se como uma alternativa a cromoscopia habitual com lugol, com estudos já demonstrando sua utilidade em avaliação de lesões de cabeça e pescoço.

Como as duas técnicas (cromoscopia com lugol e NBI) tem altas taxas de sensibilidade para detecção de CEC, baseado em estudos anteriores, desenvolveu-se um estudo randomizado  comparativo entre as duas técnicas, conduzido entre janeiro de 2009 a junho de 2011.

  • Critérios de inclusão : Presença ou antecedente de neoplasia de cabeça e pescoço (CEC), idade maior que 20 anos, sem sintomas de disfagia (se fosse encontrada lesão avançada, esta não era avaliada para este estudo).
  • Critérios de exclusão : Cirurgia esofágica anterior, quimio/radioterapia para CEC de esôfago em qualquer momento ou recente para qualquer outro tipo de tumor, alergia a lugol, varizes de esôfago e gravidez.

Os paciente eram randomizados 1:1 em cada braço (NBI vs cromoscopia com lugol-PS : Em tempo, é adicionado um marcador avermelhado, que cora em vermelho as áreas iodo negativas, aumento a visibilização das lesões). Foram incluídos para a análise final  147 pacientes no grupo NBI e 147 no grupo lugol-OS.

A avaliação endoscópica era iniciada a partir de 20 cm da arcada dentária superior, até a TEG, e depois, de forma retrógrada até a retirada do aparelho pelo esôfago cervical. As áreas iodo negativas (ou lugol-PS positivas) são classificadas quanto a sua forma, número e diâmetro das áreas, sendo então biopsiadas. Eram consideradas suspeitas áreas de coloração amarronzada no esôfago, que então eram avaliada para seis padrões de achados de microvasculatura, onde a presença de quatro destes padrões indicavam a área a ser biopsiada (table1) . Assim, o objetivo deste estudo foi comparar a sensibilidade dos dois métodos na detecção do CEC precoce.

 

tabela2

Resultados :

  • Grupo NBI : 20 % dos pacientes apresentavam áreas suspeitas, com 54  delas positivas para CEC, 19 áreas falso negativas e 15 áreas falso positivas.
  • Gupo Lugol-PS: 22% dos pacientes apresentavam 62 delas positivas para CEC, 12 áreas falso negativas e 16 áreas falso positivas.

Os resultados obtidos de sensibilidade, especificidade, valor preditivo positivo e negativo podem ser avaliados na tabela abaixo (table4).

 

tabela

 

 

 

Com estes resultados, os autores puderam demonstrar que os dois métodos de detecção para CEC precoce se equivalem. Fazem uma resalva. Em paciente onde a imagem obtida e de várias áreas alteradas ao NBI (esôfago tipo D), de tamanhos variados, há uma tendência a ser indicado o uso de lugol, já que neste estudo, houve maior número de falsos positivos na presença de lesões suspeitas difusas no esôfago.

Outra limitação destacada foi o fato dos exames serem realizados por endoscopistas treinados em NBI e lugol, demonstrando a necessidade de repetição do estudo com endoscopistas pouco treinados.

Em nosso país, temos uma alta prevalência de tabagismo e alcoolismo, e por consequência, uma alta taxa de tumores de cabeça e pescoço, população indicada para a detecção de CEC  precoce. Porém, nem sempre este rastreio é realizado, seja por falta de conhecimento do endoscopista, falta de lugol ou de material para melhor aplicação do mesmo ou até falta de tempo para o procedimento (agendas com muito exames, não pagamentos de honorários para realizar o procedimento). Assim, uma nova tecnologia e sempre bem vinda, já que é mais rápida, isenta de riscos, porém, exige treinamento e investimento em novos aparelhos, o que por vezes pode ser impeditivo.

Artigo original (free)

Goda K, Dobashi A, Yoshimura N, Kato M, Aihara H, Sumiyama K, Toyoizumi H,Kato T, Ikegami M, Tajiri H. Narrow-Band Imaging Magnifying Endoscopy versus Lugol Chromoendoscopy with Pink-Color Sign Assessment in the Diagnosis of Superficial Esophageal Squamous Neoplasms: A Randomised Noninferiority Trial.Gastroenterol Res Pract. 2015;2015:639462. doi: 10.1155/2015/639462.

Veja também :

Novas tecnologias : Cromoscopia digital e óptica.

CASO CLÍNICO – Passo a passo: “Importância da endoscopia do diagnóstico no tratamento da neoplasia precoce do esôfago”

 

 

 




Novas tecnologias – Cromoscopia digital e óptica.

Contamos com o auxílio da cromoendoscopia para melhor visualização de estruturas, definir limite de lesões, auxiliar a visualizar lesões precoces entre outras. O uso de substancias para este fim já são clássicas e bem difundidas em nosso meio. Porém, para serem realizadas, necessitam de materiais específicos para sua aplicação, não são disponíveis em todos os centros, e podem levar a danos no aparelho utilizado.

Visando manter os benefícios da cromoendoscopia, porém, sem os aspectos negativos, as grandes empresas fabricantes de aparelhos de endoscopia, desenvolveram sistemas de cromoscopia, baseados em alterações computadorizadas das imagens geradas pelo endoscópio, ou através de filtros adicionados as fontes de luz dos mesmos, tentando assim reproduzir os benefícios da cromoendoscopia habitual.

Três são os métodos chamados de cromoscopia virtual computadorizada (ou óptica): o NBI, FICE e o i-SCAN

  • NBI (Narrow Band Imaging – Olympus)

A luz branca natural visível, produzida pelo endoscópio tem um comprimento de onda entre 300 a 700nm, estando contido neste espectro, todas as cores, que juntas, compõe a luz branca. Quanto maior a onda, mais ela penetra nas estruturas da mucosa, formando assim a imagem do aparelho.

O NBI baseia-se no uso de um filtro, junto a fonte de luz branca xenom do aparelho, que permite apenas a passagem de espectro da ondas, com 415 e 540 nm . Estes dois espectros da luz, coincidem com a absorção de luz da hemoglobina, mais superficial no feixe de 415nm , e mais profunda no feixe de 540nm . Na prática, a imagem formada, realça em um tom acinzentado os vasos mais superficiais, e em um tom mais azul-esverdeado, os vasos mais profundos, em contraste com as áreas circunvizinhas, avasculares, mais escurecidas.

 

image1

 

 

Para utilizar o recurso de NBI, basta apertar um botão na manopla do aparelho, que aciona e desliga o sistema de filtros da fonte.

Como serve para caracterizar os vasos da mucosa e submucosa, o NBI tem seu uso em lesões que alteram a vasculatura habitual, sendo seu uso acoplado a magnificação , importante em determinar áreas de displasia em regiões de Barret, caracterizar casos de refluxo com poucas alterações mucosas, avaliar o potencial malignos de pólipos e lesões de crescimento lateral entre outras.

nbi

 

 

  • FICE ( Flexibe Spectral Imaging Color Enhancement – Fujinon)

A Fujinon, trabalha com uma metodologia digital de tratamento da imagem. Após a imagem com luz branca ser obtida pelo aparelho, a processadora de imagem realizada cálculos matemáticos na mesma, conseguindo então separar os comprimentos de onda adquiridos, reforçando aquele de interesse (alterando sua cor).

Como a imagem é tratada, e não por meio de filtros de luz, pode-se obter vários tipos de recomposição da mesma, gerando contraste maior entre as estruturas visualizadas, facilitando assim a sua interpretação, ou alterando a imagem de forma a melhor visualização de vasos mucosos. Também é acionado por um simples comando na manopla do aparelho, dispondo de vários “presets”, cada um com uma melhor aplicabilidade (melhor visualização de criptas em pólipos, alterações vasculares ou lesões displásicas em áreas de Barret).

 

 

fice

  • i-SCAN (Pentax)

Como metodologia de tratamento de imagem por software, o i-scan é muito semelhante ao sistema FICE, também gerando imagens trabalhadas, onde é possível melhor avaliação de superfícies mucosas, limites e alterações capilares, através de imagens aprimoradas.

Possui três tipos (i-scan 1,2 e 3), sendo o subtipo1 mais utilizado para aumentar o  constraste entre as estruturas da  mucosa (melhor definição de margens por exemplo), o subtipo 2, além do melhor contraste, também gera maior individulização de vasos mucosos e o subtipo3, gera melhor avaliação de estruturas um pouco mais distantes (não e necessária muita aproximação do local a ser estudado, maior campo pode ser explorado).

 

iscan

 

Muitos estudos tem sido publicados sobre tais tecnologias, principalmente, com o uso do NBI, porém deve ser ressaltado, que o uso de tais metodologias ainda não substituem o uso da cromoendoscopia tradicional, e principalmente o treinamento exaustivo do endoscopista e um exame bem realizado.

Em especial, em nosso país, os aparelhos com esta tecnologia, tem um custo elevado, o seu uso, assim como o uso de corantes tradicionais, não são pagos por alguns convênios, o que dificulta seu uso indiscriminado.

Pessoalmente, uso aparelho equipado com FICE, que uso de rotina em avaliação de pacientes com Barret e em acompanhamento de doenças inflamatórias de longa data (screening para tumores). Ressalto, que além da tecnologia já descrita acima, estes aparelhos por serem mais modernos, em geral possuem melhor imagem (em High Definition), fator já associado a um exame de maior qualidade (detecção de lesões).

 

Bibliografia (também para visualizar ótimas imagens) :

1 : Subramanian V, Ragunath K. Advanced endoscopic imaging: a review of commercially available technologies. Clin Gastroenterol Hepatol. 2014 Mar;12(3):368-76.e1. doi: 10.1016/j.cgh.2013.06.015

2 : ASGE Technology Committee, Manfredi MA, Abu Dayyeh BK, Bhat YM, Chauhan SS, Gottlieb KT, Hwang JH, Komanduri S, Konda V, Lo SK, Maple JT, Murad FM, Siddiqui UD, Wallace MB, Banerjee S. Electronic chromoendoscopy. Gastrointest Endosc. 2015 Feb;81(2):249-61. doi: 10.1016/j.gie.2014.06.020

 

Veja também :

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CASO CLÍNICO – Passo a passo : Importância da endoscopia do diagnóstico ao tratamento da neoplasia precoce de esôfago.

Artigo Comentado – Cromoendoscopia com ácido acético na vigilância do esôfago de Barrett é superior ao protocolo padronizado de biópsias aleatórias : resultados obtidos através de um grande estudo de coorte




Perfurações de trato gastrointestinal alto e colônicas. Medidas práticas de prevenção e avaliação.

As perfurações do trato gastrointestinal são raras, porém, potencialmente graves. A gravidade não reside apenas nas possíveis complicações de morbimortalidade envolvidas (sepse, necessidade de internação prolongada, procedimentos cirúrgicos), mas principalmente porque podem afetar a relação médico paciente e até a confiança do endoscopista. Nesse artigo o autor destaca que para o endoscopista a perfuração iatrogênica em algum momento de sua carreira é tão certa quanto os impostos e a morte e a única maneira garantida de evitá-la é não realizar o procedimento endoscópico.

A incidência de perfuração aumenta quanto mais invasivo for o procedimento, mas em geral, é em torno de 0,1 % para endoscopia alta, 0,01 a 0,3% em colonoscopias, 0,4% em EUS e de 0,5 a 1,5% em CPRE.

A prevenção começa com a indicação do exame, se deve ser ou não realizado. Deve-se conhecer a história do paciente, presença de comorbidades, uso de medicações e cirurgias prévias. O procedimento deve ser agendado com tempo adequado (no nosso dia a dia é comum uma agenda com muitos exames nos levando a realizar procedimentos com curto espaço de tempo). Também é importante o conhecimento do material utilizado (clipes, bisturi elétrico, o endoscópio em uso),  ter uma equipe de apoio com treinamento para manejo de emergências (material pronto e organizado) e principalmente, o endoscopista precisa conhecer seus limites pessoais. Este é o ponto mais importante. O profissional deve  investir em treinamento (cursos e congressos) e saber o momento de referenciar a um centro ou endoscopista de maior prática.

Outro ponto fundamental é reconhecer a perfuração. Isso nem sempre é simples. Não são todos os casos de perfuração que  ocorre a clara visualização de gordura visceral. Um sinal bastante sugestivo que sempre nos deve fazer pensar em perfuração é a impossibilidade  de se manter a insuflação do órgão por vezes associada à grande distensão abdominal. Nos casos em que a perfuração não foi identificada durante o ato endoscópico, deve-se lançar mão de exames radiológicos quando houver uma mínima suspeita (dor, taquicardia, distensão abdominal, sinais de pneumoperitôneo, enfisema subcutâneo). Muitas vezes a radiografia de abdome já confirma a presença de pneumoperitônio mas a tomografia computadorizada é o método mais sensível para perfurações menores.

Pneumoperitônio

Radiografia de abdome mostrando volumoso pneumoperitônio (clique para ampliar)

1- Perfurações do Esôfago :

São incomuns, mais frequentes com duodenoscópios ou aparelhos de EUS ou em pacientes com comorbidades como divertículos, estenoses ou durante procedimentos como colocação de próteses e dilatações. A perfuração pode ser identificada durante exame quando se visualiza uma laceração na mucosa. Na dúvida pode-se realizar exame com contraste iodado e fluoroscopia (se não houver, TC é o melhor exame).

Como prevenir ?

  • Passagem cuidadosa de aparelhos de CPRE e EUS, por profissional com experiência na na área (considerar realizar endoscopia antes de EUS)
  • Dilatações com controle endoscópico
  • Não utilizar próteses por longo tempo em doenças benignas

O tratamento endoscópico deve ser individualizado, a depender do tamanho e localização. Podem ser aplicados clipes ou em casos selecionados, próteses recobertas. Sempre deve haver a avaliação conjunta da equipe de cirurgia.

2- Perfurações gástricas :

São muito raras e normalmente consequentes à procedimentos (dilatação de anastomoses, ESD, polipectomias). A avaliação para perfuração segue os princípios já descritos sendo a visualização de perfuração óbvia ou gordura as alterações mais fáceis de serem identificadas. Sempre lembrar que a dificuldade de insuflação é um dado sugestivo.

Como prevenir ?

  • Evitar alça “excessiva” em duodenoscopias ou enteroscopias – pressão em quadrante superior esquerdo pode ajudar, assim como overtube em enteroscopias
  • Injeção submucosa em ressecções (ter treinamento para ESD/EMR).
  • Usar CO2 em procedimentos de risco.
  • Antes de ressecar lesões subepiteliais, avaliá-las com EUS.
  • Considerar uso de fluoroscopia em dilatações.

O tratamento depende do tamanho e natureza da lesão, mas em geral, envolve a colocação de clipes, com fechamento total da lesão.

3- Perfurações duodenais:

Podem ser não ampulares (polipectomias, ESD e dilatações) ou ampulares (CPRE). A identificação já foi discutida e segue os pricípios anteriores. Neste artigo o autor não aprofunda o tema em relação às perfurações durante CPRE por haver outros artigos específicos sobre o assunto.

Como prevenir ?

  • Passagem cuidado do aparelho para segunda porção duodenal
  • Conhecer os antecedentes cirúrgicos do paciente
  • Injeção submucosa para tratamento de lesões mucosas
  • Usar técnicas não térmicas associadas para terapia em úlceras profundas.
  • CPRE – treinamento

4- Perfurações colônicas :

Ocorrem mais comumente em reto e sigmóide (53%) e ceco (23%). As perfurações são mais comuns em polipectomias de pólipos maiores que 10mm e em ESD de lesões extensas (risco pode chegar a 10%) ou em colocação de stents (7%). No contexto da colonoscopia diagnóstica normalmente se segue por trauma do aparelho, divertículo, presença de angulação, “alça excessiva” ou durante retrovisão.

São fatores de risco :

  • Diverticulose intensa
  • Colite em atividade
  • Pacientes idosos
  • Aderências (cirurgias previas)
  • Radioterapia / uso de corticóides
  • Pólipos volumosos
  • Preparo de cólon irregular

Cerca de 30% dos casos são identificadas durante o exame com achado de lesão mucosa, visualização da serosa, gordura ou cavidade peritoneal. O uso de azul de metileno na solução injetada durante polipectomia/ESD pode revelar lesão esbranquiçada central (perfuração) com halo avermelhado (muscular) no local.

Quando não identificada a perfuração colônica costuma se manifestar em 24 horas , como qualquer outra perfuração do TGI, com taquicardia, dor e distensão abdominal, impondo-se o exame radiológico (em especial TC, onde pode avaliar coleções). As perfurações de reto extraperitoneais podem cursar com enfisema subcutâneo abdominal, nos membros e até na região cervical.

Como prevenir ?

  • Exame sob visão. Evitar manobras “as cegas” (slide by);
  • Evitar exame quando o preparo está irregular/ruim (remarcar). Lembrar que perfuração com cólon “sujo” pode piorar o prognóstico;
  • Utilizar água durante o exame : Atua como lubrificante e seu peso “abre” áreas de angulação;
  • Utilizar gastroscópios/ colonoscópios infantis em casos de estenose, tumores ou diverticulose intensa;
  • Evitar “alça excessiva”, com manobras de compressão abdominal externa por auxiliar treinado;
  • Saber o momento de para o exame e referenciar o paciente para endoscopista de referência ou realização de colonoscopia por TC;
  • Evitar uso de pinça “hot biopsy” para pólipos pequenos;
  • Durante polipectomia com alça, testar a movimentação do tecido alçado , notando a formação de “tenda”, a movimentação “em bloco” da parede colônica indica laçada total da parede;
  • Injeção submucosa em pólipos largos (também evita a lesão térmica da camada muscular);
  • Treinamento pessoal em ESD/EMR, referenciando procedimentos que não possua prática (evitar biópsias do centro da lesão ou tatuar muito perto da lesão, pois pode dificultar a abordagem da lesão pelo endoscopista referenciado);
  • Uso de radioscopia durante dilatações e colocação de próteses.

Sempre na presença de perfurações a avaliação e acompanhamento do grupo de cirurgia é mandatório. O paciente nunca deve ser dispensado do hospital/clínica na suspeita de perfuração sem uma avaliação rigorosa do quadro. Sempre fornecer ao paciente meios para entrar em contato (contatos telefônicos/hospitalares) em casos de sintomas após os exames (dor, febre, distensão abdominal)  e sempre informar o paciente e familiares sobre a realização de procedimentos endoscópicos durante seu exame, como polipectomias.

Você já teve um caso de perfuração ? Como conduziu ? Compartilhe suas experiências nos comentários abaixo!

Artigo original :

Rogart JN. Foregut and colonic perforations: practical measures to prevent and assess them. Gastrointest Endosc Clin N Am. 2015 Jan;25(1):9-27. doi:10.1016/j.giec.2014.09.004.

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Como você classificaria esta lesão esofágica?

Paciente com 24 anos, refere ingestão acidental de solução de soda cáustica há cerca de 12 horas. Refere dor retroesternal e salivação. Foi internado, e submetido a endoscopia digestiva após cerca de 20 horas do acidente.

Esofagite cáustica por álcali - Zargar 2a - Esôfago médio.

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