Gastrite atrófica – guia prático sobre OLGA e OLGIM
A gastrite atrófica é um achado frequente de exames endoscópicos, sendo um dos fatores de risco para o desenvolvimento de câncer gástrico. Para identificar e estratificar grupos de risco foi criada uma classificação denominada OLGA (Operative Link of Gastritis Assesment), baseada na localização das biópsias e achados histológicos avaliando de forma objetiva o grau de atrofia. A classificação é reprodutível, de fácil execução, permitindo selecionar o grupo de pacientes de maior risco que devem ter seguimento mais rígido, mantendo a custo-efetividade do rastreamento.
Resumidamente, as biópsias devem ser realizadas nos seguintes locais e identificadas em três frascos separados, com ao menos dois fragmentos de cada local:
- Parede anterior e parede posterior de corpo (C1 e C2)
- Incisura angular (A3)
- Pequena e grande curvatura de antro (A1 e A2)
Obs: se quiser uma discussão mais aprofundada a respeito dos locais de biópsia, confira esse outro artigo: onde coletar as biópsias para estadiamento OLGA?
O escore OLGA é classificado de acordo com o resultado destas biópsias, conforme tabela abaixo:
Essa classificação não leva em consideração a avaliação de outro fator de risco relevante caracterizado pela metaplasia intestinal. Para suprir esta deficiência, a classificação de OLGIM foi criada e basicamente reproduz a mesma ideia de avaliar a localização de biópsias com aspectos histológicos, porém voltadas para a metaplasia intestinal.
Os estágios são muito parecidos conforme disposto na tabela abaixo:
É realmente necessário fazer essas biópsias? A avaliação endoscópica não é suficiente??
Diversas publicações mostraram ao longo do tempo que os scores OLGA III/IV possuem maior risco para desenvolvimento de câncer gástrico, sendo relevante realizar seguimento cuidadoso neste subgrupo. Dentre elas destaca-se a publicação da GUT de 2007 envolvendo 448 pacientes estratificados utilizando o sistema OLGA com identificação de aumento gradativo da faixa etária e prevalência de infeção com H. Pylori (HP) nos escores maiores. Além disso, lesões neoplásicas foram identificadas apenas nos estágios OLGA III e IV.
Publicações mais recentes corroboram estes achados como a extensa metanálise envolvendo cerca de 2700 pacientes (8 estudos , dos quais 6 caso-controle) realizada por Yue H et al em 2018. Nessa publicação, foi descrito maior risco de desenvolvimento de câncer gástrico em escores OLGA III e IV (OR 2,64; 95% IC p<0,00001) e OLGIM III e IV (OR 3.99; 95% IC , p< 0,00001), confirmando a importância dos escores descritos nesse post e ressaltando a importância de fazer sim as biópsias.
O que dizem então os guidelines?
ASGE (2021 )
- As biópsias devem ser realizadas em antro, incisura e corpo;
- A presença de metaplasia intestinal implica em diagnóstico de gastrite atrófica;
- Achados endoscópicos típicos: mucosa gástrica pálida, aumento da visualização de vascularização submucosa e perda de pregas gástricas;
- Pacientes com gastrite atrófica e com HP + devem realizar tratamento e confirmar erradicação;
- Rastreamento a cada 3 anos em pacientes com atrofia gástrica avançada (baseado na histologia e extensão de acometimento);
- Na presença de gastrite autoimune, pesquisar vitamina B12, Ferro e anticorpos anticorpos anti-célula parietal e anti-fator intrínseco, doenças tireoideanas. Suspeitar de gastrite autoimune em pacientes com deficiência de B12 e/ou de Ferro;
- Anemia perniciosa é uma manifestação tardia de gastrite autoimune – no diagnóstico realizar biópsias para confirmar predominância de atrofia em corpo e excluir neoplasia e tumores neuroendócrinos;
- Pacientes com gastrite autoimune devem ser rastreados para tumor neuroendócrino tipo 1 e os menores que 1cm devem ser ressecados. Controle endoscópico a cada 1-2 anos.
ESGE (2019 – MAPSII)
- Pacientes com gastrite atrófica ou metaplasia intestinal possuem risco aumentado de adenocarcinoma;
- Endoscopia com equipamentos de alta definição e cromoscopia (CE) são superiores a endoscópios de alta definição com luz convencional
- Cromoscopia pode direcionar as biópsias para áreas mais representativas, com maior risco de malignidade;
- Realizar biópsias em ao menos dois locais (corpo e antro – grande e pequena curvaturas) e enviar em frascos separados;
- Pacientes com atrofia leve a moderada restrita ao antro não possuem evidência para recomendação de rastreamento;
- Pacientes com metaplasia intestinal em uma única região porém com histórico familiar de câncer gástrico, metaplasia incompleta ou gastrite crônica com HP persistente – considerar rastreamento e biópsias guiadas por CE em 3 anos;
- Casos de gastrite atrófica severa devem ser rastreados a cada 3 anos;
- Displasia, sem lesão endoscópica definida devem ser submetidos a endoscopia com CE;
- Lesão endoscópica com displasia de baixo ou alto grau / carcinoma devem ser estadiados e tratados;
- Erradicação de H. pylori traz cicatrização do tecido não atrófico reduzindo o risco de câncer.
Referências:
- Yue, H., Shan, L., & Bin, L. (2018). The significance of OLGA and OLGIM staging systems in the risk assessment of gastric cancer: a systematic review and meta-analysis. In Gastric Cancer (Vol. 21, Issue 4, pp. 579–587).
- Rugge, M., Meggio, A., Pennelli, G., Piscioli, F., Giacomelli, L., de Pretis, G., & Graham, D. Y. (2007). Gastritis staging in clinical practice: The OLGA staging system. Gut, 56(5), 631–636.
- Coelho, M. C. F., et al. (2021). Helicobacter pylori chronic gastritis on patients with premalignant conditions: Olga and olgim evaluation and serum biomarkers performance. Arquivos de Gastroenterologia, 58(1), 39–47.
- Pimentel-Nunes, P., Libânio, D., Marcos-Pinto, R., et al. (2019). Management of epithelial precancerous conditions and lesions in the stomach (MAPS II): European Society of Gastrointestinal Endoscopy (ESGE), European Helicobacter and Microbiota Study Group (EHMSG), European Society of Pathology (ESP), and Sociedade Portuguesa de Endoscopia Digestiva (SPED) guideline update 2019. Endoscopy, 51(4)