Artigos comentados – Julho 2018

Apresentamos os artigos considerados de maior relevância na área de endoscopia que foram publicados recentemente.

 

Peroral Endoscopic Pyloromyotomy Is Efficacious and Safe for Refractory Gastroparesis: Prospective Trial With Assessment of Pyloric Function

J Jacques, L Pagnon, F Hure, R Legros, S Crepin, AL Fauchais, S Palat, P Ducrotté, B Marin, S Fontaine, NE Boubaddi, MP Clement, D Sautereau, V Loustaud-Ratti, G Gourcerol, J Monteil. Endoscopy 2018 Jun 12.

Em um estudo prospectivo e em centro único francês, foi avaliado a viabilidade, segurança e eficácia da piloromiotomia endoscópica perioral (G-POEM) para o tratamento de pacientes com gastroparesia refratária. Foram incluídos 20 pacientes (10 diabéticos e 10 não diabéticos). Os pacientes foram submetidos pré e pós procedimento a avaliação extensiva da função pilórica, tempo de esvaziamento gástrico e escores de sintomas e qualidade de vida. O sucesso técnico do G-POEM foi alcançado em 100% dos pacientes com significante melhora dos sintomas, da qualidade de vida e o tempo de esvaziamento gástrico. Entre outras intercorrências, foram relatados três casos de perfuração com manejo clínico e um caso de perfuração onde foi necessária laparoscopia diagnóstica devido a intesa dor abdominal.

Apesar das intercorrências relatadas, elas foram manejadas predominantemente de modo clínico, sem mortalidade associada. Esse estudo demonstra portanto que G-POEM é potencialmente seguro e eficaz no tratamento da gastroparesia refratária. Novos estudos, preferencialmente multicêntricos e randomizados, seriam ideais para o pleno estabelecimento da técnica.

 

Non-Superiority of Lumen-Apposing Metal Stents Over Plastic Stents for Drainage of Walled-Off Necrosis in a Randomised Trial

JY Bang, U Navaneethan, MK Hasan, B Sutton, R Hawes, S Varadarajulu. Gut 2018 Jun 01.

Outros estudos que valem a leitura:

Screening for Dysplasia With Lugol Chromoendoscopy in Longstanding Idiopathic Achalasia

FA Ponds, A Moonen, AJPM Smout, WOA Rohof, J Tack, S van Gool, R Bisschops, AJ Bredenoord, GE Boeckxstaens. Am. J. Gastroenterol 2018 May 11.

Deep Learning Localizes and Identifies Polyps in Real Time with 96% Accuracy in Screening Colonoscopy

G Urban, P Tripathi, T Alkayali, M Mittal, F Jalali, W Karnes, P Baldi. Gastroenterology 2018 Jun 18.

Colorectal Cancer Screening for Average-Risk Adults: 2018 Guideline Update From the American Cancer Society

AMD Wolf, ETH Fontham, TR Church, CR Flowers, CE Guerra, SJ LaMonte, R Etzioni, MT McKenna, KC Oeffinger, YT Shih, LC Walter, KS Andrews, OW Brawley, D Brooks, SA Fedewa, D Manassaram-Baptiste, RL Siegel, RC Wender, RA Smith. CA Cancer J Clin 2018 May 30.

No Superiority of Stents vs Balloon Dilatation for Dominant Strictures in Patients With Primary Sclerosing Cholangitis

CY Ponsioen, U Arnelo, A Bergquist, EA Rauws, V Paulsen, P Cantú, I Parzanese, EM De Vries, KN Van Munster, K Said, O Chazouillères, B Desaint, A Kemgang, M Färkkilä, S Van der Merwe, W Van Steenbergen, HU Marschall, PO Stotzer, D Thorburn, SP Pereira, L Aabakken. Gastroenterology 2018 May 24.




QUIZ! Perfuração pós mucosectomia




Artigos Comentados – Abril 2018

Apresentamos uma seleção de três artigos publicados recentemente que consideramos relevantes. Seguem abaixo:

High-Definition Colonoscopy vs Endocuff vs EndoRings vs Full-Spectrum Endoscopy for Adenoma Detection at Colonoscopy

Gastrointest. Endosc. 2018 Mar 09;[EPub Ahead of Print], DK Rex, A Repici, SA Gross, C Hassan, PL Ponugoti, JR Garcia, HM Broadley, JC Thygesen, AW Sullivan, WW Tippins, SA Main, GJ Eckert, KC Vemulapalli

BACKGROUND

Devices used to improve polyp detection during colonoscopy have seldom been compared with each other.

METHODS

We performed a 3-center prospective randomized trial comparing high-definition (HD) forward-viewing colonoscopy alone to HD with Endocuff to HD with EndoRings to the Full Spectrum Endoscopy (FUSE) system. Patients were age ≥50 years and had routine indications and intact colons. The study colonoscopists were all proven high-level detectors. The primary endpoint was adenomas per colonoscopy (APC) RESULTS: Among 1,188 patients who completed the study, APC with Endocuff (APC Mean ± SD 1.82 ± 2.58), EndoRings (1.55 ± 2.42), and standard HD colonoscopy (1.53 ± 2.33) were all higher than FUSE (1.30 ± 1.96,) (p<0.001 for APC). Endocuff was higher than standard HD colonoscopy for APC (p=0.014) . Mean cecal insertion times with FUSE (468 ± 311 seconds) and EndoRings (403 ± 263 seconds) were both longer than with Endocuff (354 ± 216 seconds) (p=0.006 and 0.018, respectively).

CONCLUSIONS

For high-level detectors at colonoscopy, forward-viewing HD instruments dominate the FUSE system, indicating that for these examiners image resolution trumps angle of view. Further, Endocuff is a dominant strategy over EndoRings and no mucosal exposure device on a forward-viewing HD colonoscope.

Comentários:

  • No artigo, os autores apresentam os dados de um trial multicêntrico, randomizado, comparando colonoscopia de alta definição (HD), alta definição + Endocuff (HD Endocuff), alta definição + EndoRings (HD EndoRings) e endoscopia de espectro ampliado (full-spectrum endoscopy – FUSE). Foram incluídos 1188 pacientes, idade ≥50 anos, submetidos a colonoscopia de rotina.
  • Uso do Endocuff obteve a maior taxa de detecção de adenomas por colonoscopia (APC), com valores significativamente maiores que uso de EndoRings e também colonoscopia padrão de alta definição, se traduzindo potencialmente na melhor técnica de aumento de exposição mucosa dentre as apresentadas.
  • O sistema FUSE parece levar a maior tempo de intubação cecal sem evidente benefício no APC quando comparado as outras técnicas.

 

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Feasibility and Safety of Micro-Forceps Biopsy in the Diagnosis of Pancreatic Cysts

Gastrointest. Endosc. 2018 Mar 03;[EPub Ahead of Print], O Basar, O Yuksel, D Yang, J Samarasena, D Forcione, CJ DiMaio, MS Wagh, K Chang, B Casey, C Fernandez-Del Castillo, MB Pitman, WR Brugge

BACKGROUND AND AIM

The tissue acquisition and diagnostic yield of cyst fluid cytology is low-to-moderate and rarely provides a specific diagnosis. The aim of this study was to compare the tissue acquisition and diagnostic tissue yield of micro-forceps biopsy (MFB) with cyst fluid cytology.

PATIENTS AND METHODS

The data of 42 patients, whose cysts were aspirated by EUS-guided fine needle aspiration (EUS-FNA) and then biopsied with MFB device in this multicenter study, were collected. Cytological analysis of cyst fluid and histological analysis of biopsy samples were processed. Acquisition yield was defined as percentage of patients with tissue present in the aspirate or biopsy. Diagnostic tissue yield was evaluated at 3 levels: the ability of differentiation between mucinous/non-mucinous cysts; detection of high-risk for malignancy; and specific cyst type diagnosis.

RESULTS

The mean patient age was 69 years. Sixteen (38.1%) cysts were localized in head, 17 (40.5%) body, and 9 (21.4%) in tail. The mean cyst size was 28.2 mm (12-60 mm); 25 of 42 (60%) were septated. EUS-FNA tissue (fluid) acquisition yield was 88.1% (37/42). MFB tissue acquisition yield was 90.4% (38/42). The diagnostic cytology yield to differentiate between mucinous/non-mucinous cyst was 47.6% (20/42) and MFB histological yield o differentiate between mucinous/non-mucinous cyst was 61.9% (26/42) (p=0.188). The percentage of cysts at high-risk for malignancy by cytology was 54.7% (23/42) and MFB was 71.5% (30/42) (p=0.113). However, the ability of MFB to provide a specific cyst type diagnosis was 35.7% (15/42) and cytology was 4.8% (2/42) (p=0.001). Surgical histology was concordant with MFB in 6 of 7 (85%) patients and with cytology in 1 of 7 (15%) patients.

CONCLUSION

The cyst tissue acquisition yield for the MFB was 90%. Although cytology of cyst fluid and MFB were comparable in distinguishing mucinous and non-mucinous cysts and detecting cysts at high-risk for malignancy, the MFB was far superior to cytology for providing a specific cyst diagnosis.

Comentários:

  • Nessa coorte retrospectiva, os autores descreveram a aquisição de tecido e o valor diagnóstico com uso de biópsias por micropinças em cistos pancreáticos
  • De um total de 42 pacientes com cistos pancreáticos submetidos a ecoendoscopia com punção por agulha fina e biópsias por micropinça (MFB), a capacidade de aquisição global de tecido foi de 90.4% (38/42) com MFB e 88.1% (37/42) com citologia do fluído.
  • A capacidade de diferenciar entre cistos mucinosos x não mucinosos foi de 47.6% (20/42) com citologia e 61.9% (26/42) com MFB
  • Um diagnóstico específico para os cistos foi apresentado em 35.7% dos casos (15/42) com MFB e 4.8% casos (2/42) com citologia, levando a conclusão sobre potencial a superioridade diagnóstica do uso de micropinça.

 

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Outcomes of Endoscopic Balloon Dilation vs Surgical Resection for Primary Ileocolic Strictures in Patients With Crohn’s Disease

Clin. Gastroenterol. Hepatol. 2018 Mar 02;[EPub Ahead of Print], N Lan, L Stocchi, JH Ashburn, TL Hull, SR Steele, CP Delaney, B Shen

BACKGROUND & AIMS

Few studies have compared endoscopic balloon dilation (EBD) with ileocolic resection (ICR) in the treatment of primary ileocolic strictures in patients with Crohn’s disease (CD).

METHODS

We performed a retrospective study to compare post-procedure morbidity and surgery-free survival among 258 patients with primary stricturing ileo (colic) CD (B2, L1, or L3) initially treated with primary EBD (n=117) or ICR (n=258) from 2000 through 2016. Patients with penetrating disease were excluded from the study. We performed multivariate analyses to evaluate factors associated with surgery-free survival.

RESULTS

Post-procedural complications occurred in 4.7% of patients treated with EBD and salvage surgery was required in 44.4% of patients. Factors associated with reduced surgery-free survival among patients who underwent EBD included increased stricture length (hazard ratio [HR], 2.0; 95% CI, 1.3-3.3), ileocolonic vs. ileal disease (HR, 10.9; 95% CI, 2.6-45.4), and decreased interval between EBD procedures (HR, 1.2; 95% CI, 1.1-1.4). There were no significant differences in sex, age, race, or CD duration between EBD and ICR groups. Patients treated with ICR were associated with more common post-operative adverse events (32.2%, P<.0001), but reduced need for secondary surgery (21.7%, P<.0001) and significantly longer surgery-free survival (11.1±0.6 years vs. 5.4±0.6 years, P<.001).

CONCLUSION

In this retrospective study, we found that although EBD is initially successful with minimal adverse events, there is a high frequency of salvage surgery. Initial ICR is associated with a higher morbidity but a longer surgery-free interval. The risks and benefits should be balanced in selecting treatments for individual patients.

Comentários:

 

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Artigo comentado – “Escleroligadura” x ligadura por banda na erradicação de varizes esofagogástricas

Ligadura elástica (LE) é atualmente a técnica de manejo favorita para as varizes de esôfago, possuindo eficácia similar a escleroterapia, contudo, com eventos adversos ​​associados menos graves. Ela requer menor número de sessões para alcançar a erradicação de varizes, mas está associada a maior taxa de recorrência. Esta alta taxa de recorrência ocorre porque as veias perfurantes e varizes mais profundas não são alcançadas pela LE, diferentemente da escleroterapia com seu efeito químico.

A “escleroligadura” reduz a recorrência precoce de varizes esofágicas por supostamente aumentar o feito esclerosante nas veias perfurantes e colaterais paraesofágicas, em combinação a própria obliteração varicosa pela LE.

Varizes gástricas se desenvolvem em 5- 33% dos pacientes com hipertensão portal e quando surgem de forma concomitante no esôfago, estabelecem o diagnóstico de variz esofagogástrica (GOV).

Varizes esofagogástricas se dividem em dois tipos:

  • GOV1, que se extende pela pequena curvatura do estômago
  • GOV2, que se extende pelo fundo gástrico

A “escleroligadura” (combinação de escleroterapia com ligadura elástica) tem sido usada com sucesso no manejo de varizes esofagianas mas não foram avaliadas previamente no manejo de varizes esofagogástricas.

Em artigo publicado em agosto de 2017 na revista Gastrointestinal Endoscopy, Mansour e colaboradores, em trabalho conduzido em Tanta, Egito, avaliaram uma nova técnica de escleroligadura no manejo de sangramento por varizes esofagogástricas em relação a sua eficácia, eventos adversos, recorrência de varizes e sobrevida.

 

Métodos

O estudo foi conduzido em 120 pacientes cirróticos com sangramento por varizes esofagogástricas. Os pacientes foram, de modo randomizado, separados em 2 grupos de 60 pacientes cada – grupo de ligadura elástica isolada x “escleroligadura”.

Todos os casos incluídos no estudo tinham 01 ou mais varizes esofagogástricas, com sangramento localizado acima da junção esofagogástrica. Casos com sangramento em vasos abaixo da junção esofagogástrica foram tratados com Histoacryl e excluídos do estudo. Entre os pacientes incluídos, ressalta-se ainda que nenhum deles fazia uso de betabloqueador.

  • LE – Uma banda foi aplicada a cada variz em um padrão “de escada” até um nível de 5 cm acima da junção esofagogástrica. O procedimento foi realizado a cada 2 a 3 semanas.
  • “Escleroligadura”- cada variz foi ligada com 01 banda, 3- 5 cm acima da junção esofagogástrica, seguido por injeção de 2 ml de oleato de etanolamina 5%, intravaricoso, abaixo de cada banda aplicada, 2 -3 cm acima da junção esofagogástrica.

 

Resultados

  • O número médio de sessões para atingir a erradicação foi menor no grupo “escleroligadura” que no grupo de LE (2.22 ± 0.92 e 3.43 ± 0.67, respectivamente) (P < .001), assim como a duração do tratamento (8.64 semanas versus 15.16 para LE) (P < .001) e o número total de bandas utilizadas.
  • Os pacientes do grupo de “esleroligadura receberam um número médio significativamente menor de unidades de transfusão de sangue por paciente (1,53 unidades) do que aqueles no grupo LE (2,30 unidades) (P = 0,03).
  • O custo e a sobrevida foram comparáveis entre os dois grupos.
  • Não houve diferença significante entre os dois procedimentos em relação a presença de eventos adversos, taxas de recorrência, ou taxas de ressangramento após a obliteração.
  • A recorrência foi significativamente maior em pacientes com varizes maiores, ulcerações e febre pós procedimento.
  • Ressangramento foi significativamente maior entre os pacientes que apresentaram febre pós procedimento e que desenvolveram ou tiveram piora nas ectasias vasculares antrais gástricas.

 

Conclusão

A “escleroligadura” aparenta alcançar uma taxa mais rápida de erradicação, com menor número de sessões para tratamento e menor número de bandas utilizadas para atingir a obliteração das varizes do que a ligadura elástica. Os métodos são comparáveis em custo, eventos adversos e taxas de recorrência.

 

Comentários:

O estudo apresentado se mostrou inovador ao estudar a abordagem endoscópica no sangramento de varizes esofagogástricas de modo combinado (“escleroligadura”) em comparação a técnica mais corrente com uso de ligadura elástica. Os autores fizeram uma seleção criteriosa de pacientes, com obtenção de dados clínicos, endoscópicos, ultrassonográficos variados. Utilizou como substrato lógico os trabalhos que fizeram comparação semelhante em varizes esofágicas somente e obteve resultados parecidos, com menor número de sessões de tratamento para atingir a erradicação de varizes no grupo “escleroligadura”. Pesa contra o trabalho ter sido realizado em centro único, com limitado número de pacientes e randomização que levou o grupo “escleroligadura” a ter mais pacientes com varizes de médio e grosso calibre.

Link para o artigo original: http://www.giejournal.org/article/S0016-5107(17)30003-2/fulltext

E vocês, o que acharam do artigo? A maior dificuldade técnica da realização de ligadura e esclerose no mesmo procedimento poderia agregar mais risco de complicações em mãos menos experientes? Compensaria a redução potencial do número de sessões de tratamento, entre outros benefícios? Alguém tem por rotina a realização de “escleroligadura”? Participe dando sua opinião no campo de comentários, ou em nosso mural!

 




Em relação ao papel da endoscopia na colangite esclerosante primária (CEP), pode-se afirmar:




Manejo endoscópico da Síndrome de Mallory Weiss

A síndrome de Mallory-Weiss (SMW) é caracterizada por hemorragia digestiva alta (HDA) associada a presença de laceração mucosa na região da junção esofagogástrica (laceração de Mallory-Weiss). Usualmente associada a vômitos repetidos, SMW é uma causa comum de sangramento digestivo, podendo representar até 15% do total de casos de HDA.

Figura 1. Laceração de Mallory-Weiss em transição esofagogástrica com prolongamento em pequena curvatura

A patogênese da síndrome de Mallory-Weiss não é completamente entendida, tendo sido proposto que o aumento súbito de pressão intra-abdominal possa levar a formação de lacerações na transição esofagogástrica e lesão do plexo venoso e/ou arterial local.

Entre algumas das situações comumente associadas a SMW, cita-se: abuso de álcool, vômitos de repetição, tosse intensa, convulsões, trauma abdominal fechado, prática esportiva de levantamento de peso, passagem de sonda nasogástrica e realização de procedimentos de endoscopia digestiva alta.

Casos de laceração de Mallory Weiss iatrogênicos durante endoscopia digestiva alta tem sido relatados com incidência estimada entre 0.007 % a 0.49 % do total de procedimentos.

A manifestação clínica mais comum é hematêmese,  que pode ser acompanhada por dor epigástrica. Na maioria dos casos, há relato de náuseas com esforço de vômito, episódios eméticos sem sangue associado ou tosse intensa antecedendo o quadro.

O manejo inicial se dá com a estabilização clínica do paciente, suporte, reposição volêmica quando necessária, e introdução de inibidor de bomba de próton venoso, duas vezes ao dia.

O estabelecimento diagnóstico da SMW se dá com a realização de endoscopia digestiva alta com evidência de laceração localizada na junção esofagogástrica. As lacerações de Mallory-Weiss são usualmente únicas e longitudinais, contudo, lacerações múltiplas são descritas em até 27% dos casos.

Figura 2. Apresentação de laceração de Mallory-Weiss em seu local mais comum (parede lateral direita).

Na endoscopia, a laceração aparece como uma lesão longitudinal avermelhada na mucosa, algumas vezes estendendo-se até a muscular da mucosa. Presença de coágulos, ou mesmo sangramento ativo, podem ser evidenciados.

Tratamento endoscópico Síndrome de Mallory Weiss:

A terapia endoscópica é indicada no tratamento de sangramento ativo das lacerações de Mallory-Weiss. Entre os recursos potencialmente utilizados cita-se: injeção endoscópica, coagulação térmica, hemoclipes e ligadura com banda elástica. A utilização de pós hemostáticos  (Hemospray) é descrita com sucesso na SMW em séries de caso.

  • Injeção endoscópica

A terapêutica por injeção é simples, facilmente aplicável e relativamente barata como primeira linha. A adrenalina é a solução mais comumente usada e melhora os resultados em termos de taxa de ressangramento, tempo de hospitalização e necessidade de transfusão, quando comparada a realização de medidas de suporte isoladas. Possui efeito hemostático por induzir vasoconstricção, por compressão vascular associado ao volume de injeção, e por induzir agregação plaquetária.

O efeito hemostático da adrenalina como terapia de injeção isolada na SMW é controverso. Alguns estudos têm demonstrado que a injeção de adrenalina, em casos de sangramento ativo, pode levar a um aumento das taxas de ressangramento quando comparada a hemostasia mecânica ou terapia combinada.

  • Eletrocoagulação

A eletrocoagulação promove controle hemostático pela aplicação de calor e pressão por contato ao sítio de sangramento de forma simultânea. Contudo, em vigência de sangramento ativo, a dissipação rápida do calor no sangue pode levar a maior dificuldade técnica. A eletrocoagulação multipolar parece melhorar a hemostasia de modo significativo, reduzindo risco de cirurgia em pacientes com SMW.  O uso de coagulação agrega risco, no entanto, associado a possibilidade lesão térmica transmural e perfuração do órgão.

O plasma de argônio também tem seu uso descrito em SMW, com a vantagem de ter bom poder hemostático associado com menor dano térmico e consequentemente menor risco de perfuração.

  • Hemoclipe

A aplicação de hemoclipes é um procedimento simples para tratar lesões em tecido não fibrótico como na SMW e nas lesões de Dieulafoy. Contudo, a aplicação de hemoclipes na transição esofagogástrica agrega dificuldade técnica.  Em um estudo japonês com uso de hemoclipes metálicos para SMW iatrogênica, e de outras naturezas, foi demonstrada hemostasia inicial de 100% e baixas taxas de ressangramento (Shimoda et al, 2009).

Figura 3. Aplicação de hemoclipe em laceração de Mallory-Weiss.

  • Ligadura elástica

A principal vantagem da ligadura elástica por banda é a facilidade técnica comparada com outros procedimentos endoscópicos hemostáticos. O uso do cap de ligadura propicia uma boa visualização tangencial da lesão e, ao tocar e realizar leve compressão da laceração, leva a imobilização, permitindo uma adequada terapêutica.

Figura 4. Realização de ligadura elástica em laceração de Mallory-Weiss.

Poucos estudos realizam comprações diretas entre as técnicas hemostáticas. Um dos trabalhos de maior representatividade, realizada de forma retrospectiva em 168 pacientes com laceração de Mallory-Weiss, a terapia baseada em hemoclipes e a ligadura elástica apresentaram maior taxa de sucesso na prevenção do ressangramento comparado com a terapia por injeção isolada (96, 89 e 71%, respectivamente)(Lee et al, 2016).

Considerações finais:

SMW é uma importante causa de sangramento digestivo alto, com boa parte do casos cessando de forma espontânea. Nos pacientes com sangramento ativo, as técnicas endoscópicas mais frequentes são: injeção de adrenalina, coagulação com plasma de argônio, hemoclipes e banda elástica.  A seleção da melhor estratégia hemostática depende da habilidade do executor do procedimento e do contexto clínico apresentado. A realização de terapia injetora isolada deve ser evitada.

A maioria dos pacientes com sangramento ativo durante a endoscopia podem ser controlados endoscopicamente com taxa de ressangramento de até 7%. Diante do ressangramento, nova endoscopia com hemostasia pode ser tentada. Caso haja falha endoscópica, o uso da arteriografia com embolização ou mesmo a abordagem cirúrgica podem ser opcões técnicas.

Referências:

  1. Knauer CM. Mallory-Weiss syndrome. Characterization of 75 Mallory-weiss lacerations in 528 patients with upper gastrointestinal hemorrhage. Gastroenterology 1976; 71:5.
  2. Fishman ML, Thirlwell MP, Daly DS. Mallory-Weiss tear. A complication of cancer chemotherapy. Cancer 1983; 52:2031.
  3. Sugawa C, Benishek D, Walt AJ. Mallory-Weiss syndrome. A study of 224 patients. Am J Surg 1983; 145:30.
  4. Laine L. Multipolar electrocoagulation in the treatment of active upper gastrointestinal tract hemorrhage. A prospective controlled trial. N Engl J Med. 1987;316:1613–1617.
  5. De Vries AJ, van der Maaten JM, Laurens RR. Mallory-Weiss tear following cardiac surgery: transoesophageal echoprobe or nasogastric tube? Br J Anaesth 2000; 84:646.
  6. Peng YC, Tung CF, Chow WK, et al. Efficacy of endoscopic isotonic saline-epinephrine injection for the management of active Mallory-Weiss tears. J Clin Gastroenterol. 2001;32:119–122.
  7. Shimoda R, Iwakiri R, Sakata H, et al. Endoscopic hemostasis with metallic hemoclips for iatrogenic Mallory-Weiss tear caused by endoscopic examination. Dig Endosc 2009; 21:20.
  8. Lecleire S, Antonietti M, Iwanicki-Caron I, et al. Endoscopic band ligation could decrease recurrent bleeding in Mallory-Weiss syndrome as compared to haemostasis by hemoclips plus epinephrine. Aliment Pharmacol Ther. 2009;30:399–405.
  9. Akhtar A J, Padda M S. Natural history of Mallory-Weiss tear in African American and Hispanic patients. J Natl Med Assoc. 2011;103:412–415. 
  10. Ljubicic N, Budimir I, Pavic T. et al. Mortality in high-risk patients with bleeding Mallory-Weiss syndrome is similar to that of peptic ulcer bleeding. Results of a prospective database study. . Scand J Gastroenterol. 2014;49:458–464. 
  11. Giles H, Lal D, Gerred S, Casey P, Patrick A, Luo D, Ogra R. Efficacy and safety of TC-325 (HemosprayTM) for non-variceal upper gastrointestinal bleeding at Middlemore Hospital: the early New Zealand experience.N Z Med J. 2016 Dec 2;129(1446):38-43.
  12. Lee S, Ahn JY, Jung HY, et al. Effective endoscopic treatment of Mallory-Weiss syndrome using Glasgow-Blatchford score and Forrest classification. J Dig Dis 2016; 17:676.



Quiz! Profilaxia de sangramento digestivo varicoso

Conforme consenso de Baveno VI, em relação a profilaxia primária e secundária do sangramento varicoso esofagogástrico nos pacientes com hipertensão portal, é incorreto afirmar?

 

VE1 VE2 VE3 VE4




QUIZ! Assinale a alternativa incorreta?

Paciente de 48 anos, com relato de anemia ferropriva há cerca de dois anos, necessitando múltiplas tranfusões sanguínea e reposição venosa de ferro sem controle adequado. Nega perda de peso. À admissão apresentava Hb= 6,0 mg/dL. Antecedente médico de hipertensão arterial sistêmica em uso de Losartana e Hidroclorotiazida. Ao exame físico foram observadas lesões sugestivas de ectasias vasculares em lábios, além de lesões de aspecto similar em região genital. Submetida então a endoscopia digestiva alta que evidenciou:

OWR ectasia 3 OWR ectasia 5 OWR ectasia 2

OWR ectasia

 

Em relação ao quadro clínico apresentado, assinale a alternativa incorreta:




Como você classificaria essa lesão usando a classificação de Kudo (‘pit patterns”)?

Tipo IV: reflete presença de criptas tortuosas, exuberantes e ramificadas.

Confira também: Principais lesões que acometem os endoscopistas




ARTIGO COMENTADO – Utilidade da fistulotomia com needle-knife como método inicial na canulação biliar para prevenção de pancreatite pós CPRE

A CPRE é um procedimento amplamente utilizado no diagnóstico e tratamento de doenças do trato biliar e pancreáticas. Pancreatite pós CPRE (PEP) é o evento adverso mais comum após o procedimento, variando de 2-10% em casos não selecionados e podendo elevar substancialmente a morbidade, mortalidade e custos médicos associados. Entre os fatores de risco associados a PEP cita-se: pacientes jovens (<60 anos), sexo feminino, com ducto biliar comum (CBD) de calibre normal (<9 mm), disfunção de esfíncter de Oddi (SOD), ou uma história prévia de pancreatite. Diante da associação de fatores de risco as taxas de PEP podem alcançar até 67%.

A fistulotomia suprapapilar com needle-knife (NKF) tem sido usada como uma técnica alternativa a falha de canulação convencional via óstio papilar em casos difíceis, e pode ser recomendada como um artifício em casos de canulação pancreática repetida não intencional. O uso dessa técnica está associada a uma redução potencial do risco de PEP, enquanto a canulação biliar difícil aumenta o risco.

Objetivo:

Em artigo publicado na edição de novembro de 2016 da Gastrointestinal Endoscopy, Young-Joo Jin e colaboradores apresentaram um estudo prospectivo preliminar que objetivou avaliar a viabilidade do NKF como procedimento inicial no acesso biliar em pacientes com cálculos biliares e que possuíam risco aumentado de PEP. Foram avaliadas: taxa de incidência de pancreatite pós CPRE após NKF e taxas de sucesso da canulação biliar e remoção de cálculos após NKF.

Metodologia:

Prospectivamente, entre Julho de 2013 e Maio de 2015, foram selecionados 55 pacientes que se submeteram a CPRE com NKF por cálculos biliares em um centro de referência na Coréia do Sul. Todos os casos possuíam um ou mais do seguintes fatores de risco para PEP: pacientes jovens (<60 anos), sexo feminino ou CBD de calibre normal (<9 mm).

Resultados:
  • Risco para PEP:
    • 1 fator: 17 pacientes
    • 2 fatores: 27 pacientes
    • 3 fatores: 11 pacientes
  • Tempo médio de procedimento para NKF: 2.1 minutos (0.2–8.7 min)
  • Tempo médio de remoção de calculo biliar: 6.5 minutos (1.1–28.3 min)
  • Taxas de sucesso na canulação biliar usando NKF: 96.3% (53/55)
  • Taxas de sucesso na remoção de cálculo biliar: 92.7% (51/55)
  • Complicações:
    • Não houve caso de PEP
    • Dor: 4 pacientes (7,3%)
    • Febre: 9 pacientes (16,4%)
    • Sangramento: 2 pacientes (3,6%)
    • Perfuração duodenal retroperitoneal: 1 paciente (1.8%) que foi manejado conservadoramente

Conclui-se portanto, que NKF pode ser uma técnica viável como procedimento inicial no acesso biliar em pacientes com cálculos biliares que possuem risco elevado de pancreatite pós CPRE se o procedimento é realizado por um endoscopista biliar experiente.

Comentários:

A pancreatite é um evento comum e muito temido após CPRE. Muito tem sido discutido sobre estratégias de prevenção de PEP nos últimos anos e algumas condutas tem sido implementadas de forma regular em centros de referência como uso de AINE e de próteses pancreáticas¹.

A fistulotomia suprapapilar é uma estratégia previamente conhecida e discutida como alternativa técnica ao acesso biliar, potencialmente reduzindo o risco de pancreatite quando implementada de forma precoce².

O estudo apresentado traz novos dados a literatura atualmente existente por abordar de forma prospectiva e chamar a atenção para a potencial prevenção de pancreatite pós CPRE com uso de fistulotomia suprapapilar em pacientes de risco. Contudo, o estudo possui limitações a serem consideradas como: ter sido realizado de forma não randomizada, em centro único, com somente um endoscopista realizando os procedimentos. Novos estudos com desenho multicêntrico, prospectivos e randomizados seriam recomendáveis.

Referência e link para o artigo:

Jin YJ, Jeong S, Lee DH. Utility of needle-knife fistulotomy as an initial method of biliary cannulation to prevent post-ERCP pancreatitis in a highly selected at-risk group: a single-arm prospective feasibility study. Gastrointest Endosc. 2016 Nov;84(5):808-813.

Outras referências:
  1. Dumonceau, J.M., Andriulli, A., Elmunzer, B.J. et al. Prophylaxis of post-ERCP pancreatitis: European Society of Gastrointestinal Endoscopy (ESGE) Guideline – updated June 2014. Endoscopy. 2014; 46: 799–815
  2. Mariani A, Di Leo M, Giardullo N, et al. Early precut sphincterotomy for difficult biliary access to reduce post-ERCP pancreatitis: a randomized trial. Endoscopy. 2016;48:530–535.