Síndrome de Polipose Serrilhada (SPS)

A lesão serrilhada séssil (LSS) é o novo termo para lesões anteriormente chamadas de adenoma serrilhado séssil (SSA) e LSS com displasia é o termo usado para as lesões anteriormente chamadas de SSA com displasia. Uma revisão detalhada das lesões serrilhadas você encontra nesse outro artigo.

Com base nisso, a Síndrome de Polipose Serrilhada (SPS) é uma condição rara caracterizada por várias lesões serrilhadas colorretais e risco aumentado de câncer colorretal.

  • A prevalência varia de 0,03% a 0,5% em pacientes submetidos à colonoscopia.
  • O diagnóstico geralmente ocorre entre 50-55 anos, embora varie de 20-70 anos
  • Prevalência semelhante em homens e mulheres.

Clique aqui para saber de outras síndromes de polipose colorretal.

Critérios Atualizados para Polipose Serrilhada:

Em comparação com a edição anterior, a OMS em 2019 atualizou os critérios diagnósticos, permanendo apenas 2 dos 3 critérios clínicos para a definição de SPS:

  1. Critério: Pelo menos 5 lesões/pólipos serrilhados proximais ao reto, todos com tamanho ≥ 5 mm, sendo que pelo menos 2 com tamanho ≥ 10 mm.
  2. Critério: Mais de 20 lesões/pólipos serrilhados de qualquer tamanho distribuídos pelo cólon, com pelo menos 5 deles proximais ao reto.

  • Pacientes que atendem pelo menos um critério são diagnosticados com polipose serrilhada.
  • Todos os subtipos de pólipos serrilhados (lesão serrilhada séssil, pólipo hiperplásico, adenoma serrilhado tradicional, adenoma serrilhado não classificado) são incluídos na contagem.
  • A contagem é cumulativa ao longo de várias colonoscopias.
  • Estudos relatam risco de câncer entre 15–30% em pacientes com SPS, variando conforme idade, fenótipo do pólipo e características histológicas de alto risco.
  • Recomenda-se vigilância endoscópica rigorosa (colonoscopia anual).
  • Estudos mais recentes mostraram que a maioria dos pacientes apresentam controle endoscópico com diminuição do número e tamanho dos pólipos após 2-3 colonoscopias anuais, sugerindo espaçamento do intervalo de vigilância para 2 anos após essa etapa inicial [1].

Resumo das Alterações:

Critérios diagnósticos para Síndrome de Polipose Serrilhada de acordo com OMS 2019

Referência

  1. MacPhail M.E., Thygesen S.B., Patel N., Broadley H.M., Rex D.K. Endoscopic control of polyp burden and expansion of surveillance intervals in serrated polyposis syndrome. Gastrointest. Endosc. 2019;90:96–100. doi: 10.1016/j.gie.2018.11.016. 

Como citar este artigo

Martins BC e Tanigawa R. Síndrome de Polipose Serrilhada (SPS). Endoscopia Terapeutica, 2024 vol. 1. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.com.br/assuntosgerais/sindrome-de-polipose-serrilhada-sps/




Lesões Serrilhadas Colorretais: Dossiê Completo!

1. Introdução

O câncer colorretal (CCR) é um grande problema de saúde pública, associado a uma alta taxa de morbidade e mortalidade no ocidente. O CCR representa o ponto final de uma ampla gama de alterações genéticas e epigenéticas que ocorrem em células colorretais normais.

Estima-se que aproximadamente 85% dos CCRs se desenvolvem a partir de pólipos colorretais. Os pólipos adenomatosos e as lesões serrilhadas sésseis (LSS ou SSL em inglês) são os precursores mais importantes do CCR. Estima-se que adenomas e LSS estejam presentes em 20% a 50% dos indivíduos com mais de 50 anos de idade [1].

2. Classificação da OMS para Lesões Serrilhadas Colorretais

Até 2010, lesões serrilhadas colorretais eram geralmente consideradas como lesões inofensivas e relatadas como pólipos hiperplásicos (PHs) por patologistas e gastroenterologistas.

Posteriormente, uma variedade de termos foi usada para descrever essas lesões, contribuindo para mal-entendidos sobre a terminologia e classificação das lesões serrilhadas.

Em 2010, a Organização Mundial da Saúde (OMS) propôs a seguinte classificação para lesões serrilhadas colorretais (4ª edição = penúltima versão até a publicação deste artigo):

Tipo Histológico Tipo Histológico
Pólipo Hiperplásico (PH) • Tipo Microvesicular
• Tipo rico em células caliciformes
• Tipo pobre em mucina
Adenoma/Pólipo Serrilhado Séssil (SSA/P) • SSA/P com displasia
• SSA/P sem displasia
Adenoma Serrilhado Tradicional (TSA)
Classificação das Lesões Serrilhadas Colorretais (OMS 2010 Antiga 4ª Edição)

Em 2019 a OMS atualizou a classificação Lesões serrilhadas colorretais (5ª. Edição) [2]. Esta nova classificação diferencia lesões serrilhadas em quatro categorias:

Tipo Histológico Subtipo Histológico
Pólipo Hiperplásico (PH) • Tipo Microvesicular
• Tipo rico em células caliciformes
Lesão Serrilhada Séssil (LSS) • LSS
• LSS com displasia (LSSD)
Adenoma Serrilhado Tradicional (TSA)
Adenoma Serrilhado, Não Classificado
Classificação das Lesões Serrilhadas Colorretais (OMS 2019 5ª Edição)

A principal mudança na terminologia é a aprovação do novo termo “lesão serrilhada séssil ” (LSS), que visa adequar as terminologias anteriores confusas “adenoma séssil serrilhado e pólipo séssil serrilhado “. De fato, o termo “adenoma” inclui o conceito de displasia, que não é observada em um número significativo de LSSs. Agora, quando o patologista observa um padrão displásico nas LSSs, deve utilizar a terminologia “LSS com displasia”. Além disso, grande parte das LSSs não apresentam aparência polipoide, tornando o termo “pólipo” inadequado.

3. Lesões Serrilhadas Colorretais: Características Histológicas e Endoscópicas

Microscopicamente, as lesões serrilhadas colorretais são caracterizadas pela presença de dobras semelhantes a dentes de serra nas criptas epiteliais [1]. As diferenças entre os principais subtipos de lesões serrilhadas estão nas características arquiteturais e na localização/extensão da zona proliferativa.

3.1 – Pólipos Hiperplásicos (PH)

  • Os PHs são as lesões serrilhadas mais comuns, representando cerca de 75% de todos os pólipos serrilhados.
  • Prevalência estimada em pacientes submetidos a colonoscopias de rastreio é de 20–30%.
  • Nos PH, as criptas são retas e alongadas, com uma arquitetura serrilhada confinada aos dois terços superiores das criptas e as células mostram mínima atipia citológica.
  • Na parte basal da cripta, a arquitetura é regular e não serrilhada, e as células não apresentam sinais de atipia.
  • PH são comumente encontrados no cólon esquerdo, principalmente no cólon retossigmoide, e normalmente têm menos de 5 mm.
  • Na endoscopia com luz branca, aparecem como lesões elevadas ou sésseis, às vezes cobertas com mucosa normal.
  • Na cromoendoscopia, são observadas padrão de criptas tipo II do tipo estrelado na superfície da lesão.
Pólipos sésseis hiperplásicos. Na magnificação de imagem com filtro de luz observa-se padrão de criptas estrelado (tipo II)

Duas variantes de Pólipos Hiperplásicos:

  • pólipos hiperplásicos de tipo microvesicular:

    • caracterizados pela presença de pequenas gotículas de muco nas células
    • são considerados precursores de LSS.

Pólipo hiperplásico microvesicular: serrilhamento presente nas porções superficiais das criptas, que são recobertas por células com citoplasma exibindo vacúolos apicais. Não há atipias.

  • pólipos hiperplásicos ricos em células caliciformes:
Pólipo hiperplásico rico em células caliciformes. Observe as criptas alargadas e tortuosas, com células caliciformes sem atipias.

3.2 – Lesões Sésseis Serrilhadas (LSS)

  • LSS são o segundo tipo mais comum de lesão serrilhada e são consideradas lesões precursoras de CRC. (Mais detalhes etiopatogênicos)
  • Prevalência de LSS na população geral é de 5–10%.
  • Geralmente, LSS são maiores que PH, com diâmetro médio entre 5-7 mm, e sua forma é plana ou séssil.
  • Ao contrário dos PH, LSS são mais frequentes no cólon direito.
  • Característica histológica que distingue LSS de PH é a presença de criptas serrilhadas distorcidas.
  • Para diagnóstico histológico de LSS, a cripta deve mostrar pelo menos uma das seguintes características:

    1. Crescimento horizontal ao longo da camada muscular da mucosa.
    2. Dilatação da base da cripta.
    3. Serrilhamento se estendendo até a base da cripta.
    4. Proliferação assimétrica.

  • Características endoscópicas:

    • presença de uma capa de muco
    • Coloração pálida/esbranquiçada.
    • Padrão de criptas tipo II-O (abertas) na cromoscopia com magnificação.

Lesão serrilhada séssil. Bases das criptas com crescimento horizontal ao longo da camada muscular da mucosa.

3.3 – Lesões Sésseis Serrilhadas com Displasia (LSS-D)

  • De acordo com seu potencial carcinogênico conhecido, LSSs podem originar focos displásicos.
  • Esta entidade histológica, chamada LSSD, representa um subgrupo dos LSSs.
  • Estima-se que cerca de 4–8% dos LSSs contêm displasia.
  • Pelo menos três tipos morfológicos diferentes de displasia foram descritos em LSSD:

    • Displasia intestinal (semelhante a adenoma): rara.
    • Displasia serrilhada: mais comum.
    • Displasia de mínima divergência: poucas alterações em comparação com LSS e perda característica de MLH1.

  • Endoscopicamente, essas lesões geralmente apresentam nódulos na superfície.
  • Sinais como morfologia (sub)pediculada, elevação dupla, depressão central e tonalidade avermelhada são sinais suspeitos de displasia. [3]
  • Na cromoendoscopia com magnificação, exibem um padrão de pit adenomatoso (Kudo tipo III, IV). [4]

3.4 – Adenoma Serrilhado Tradicional (AST ou TSA em inglês)

  • Mais frequentes no cólon esquerdo.
  • São as lesões serrilhadas mais raras do colorretal com prevalência de menos de 1%.
  • Geralmente, AST são maiores que LSS e têm aparência polipoide ou pediculada.
  • Histologicamente, apresentam arquitetura vilosa distorcida e, em muitos casos, vilosidades com pontas bulbosas.
  • Tanto a displasia tipo adenoma quanto a displasia serrilhada podem ser observadas nos AST.
  • O risco e a rapidez de progressão para carcinoma são desconhecidos.
  • Na endoscopia, parecem lesões avermelhadas, protuberantes ou pediculadas e, macroscopicamente, apresentam aspecto de “pinha” ou “coral”.

Adenoma serrilhado tradicional – projeções vilosas com serrilhamento da superfície
Adenoma serrilhado tradicional. As células que revestem os vilos são colunares com citoplasma acidófilo e núcleos ovalados e pseudoestratificados. O serrilhamento da superfície ocorre pela presença de criptas ectópicas.
Aspecto endoscópico do AST. Lesão polipoide com aspecto “em pinha”. A última imagem pertence a um segundo caso e apresentava um pedículo curto. 

Resumo das Alterações:

  • Lesão serrilhada sésseis (LSS) é o novo termo para lesões anteriormente chamadas de adenoma serrilhado séssil (SSA). As diretrizes clínicas para o gerenciamento de SSA se aplicam à LSS.
  • LSS com displasia é o termo usado para as lesões anteriormente chamadas de SSA com displasia citológica.
  • Adenoma serrilhado não classificado foi introduzido para pólipos raros difíceis de classificar como LSS ou TSA.

Resumo dos Critérios Histológicos para Lesões Sésseis e Pólipos:

  • Uma única cripta distorcida incontestável é o suficiente para diagnosticar uma lesão serrilhada sésseis (LSS). A distorção da arquitetura da cripta pode incluir crescimento horizontal ao longo da muscular da mucosa, dilatação da base da cripta e proliferação assimétrica.
  • Lesões/pólipos serrilhados planos sem cripta típica do tipo LSS são diagnosticados como pólipo hiperplásico (PH) por exclusão. Dilatação simétrica leve da cripta e células caliciformes na base das criptas não são suficientes para diagnóstico de LSS.
  • Estratificação em displasia de baixo e alto grau não é recomendada.
  • O diagnóstico de adenoma serrilhado tradicional (TSA) requer duas das seguintes características:

    • (1) serrilhamento em forma de fenda;
    • (2) células eosinofílicas altas com núcleos de lápis;
    • (3) formações de criptas ectópicas.

Referências:

  1. Mezzapesa M, Losurdo G, Celiberto F, Rizzi S, d’Amati A, Piscitelli D, Ierardi E, Di Leo A. Serrated Colorectal Lesions: An Up-to-Date Review from Histological Pattern to Molecular Pathogenesis. Int J Mol Sci. 2022 Apr 18;23(8):4461. doi: 10.3390/ijms23084461. PMID: 35457279; PMCID: PMC9032676.
  2. WHO Classification of Tumours Editorial Board . WHO Classification of Tumors: DIGESTIVE System Tumours. 5th ed. International Agency for Research on Cancer; Lyon, France: 2019
  3. Murakami T, Sakamoto N, Ritsuno H, Shibuya T, Osada T, Mitomi H, Yao T, Watanabe S. Distinct endoscopic characteristics of sessile serrated adenoma/polyp with and without dysplasia/carcinoma. Gastrointest Endosc. 2017 Mar;85(3):590-600. doi: 10.1016/j.gie.2016.09.018. Epub 2016 Sep 20. PMID: 27663716.
  4. Tate D.J., Jayanna M., Awadie H., Desomer L., Lee R., Heitman S.J., Sidhu M., Goodrick K., Burgess N.G., Mahajan H., et al. A standardized imaging protocol for the endoscopic prediction of dysplasia within sessile serrated polyps. Gastrointest. Endosc. 2018;87:222–231. doi: 10.1016/j.gie.2017.06.031.

Como citar este artigo

Martins BC e Tanigawa R. Lesões Serrilhadas Colorretais: Dossiê Completo. Endoscopia Terapeutica, 2024 vol. 1. Disponível em: https://endoscopiaterapeutica.com.br/assuntosgerais/lesoes-serrilhadas-colorretais-dossie-completo/




Pólipos de Vesícula Biliar

Os pólipos da vesícula biliar geralmente são achados incidentais diagnosticados durante exames de ultrassom abdominal ou durante colecistectomia. Geralmente não apresentam sintomas, mas ocasionalmente podem causar desconfortos similares aos causados por cálculos biliares.

Uma revisão pormenorizada desse assunto foi publicada recentemente no Gastropedia, e pode ser acessada através desse link: Pólipos de Vesícula Biliar

Em resumo, os pólipos de vesícula podem ser classificados como:

  • Pólipos benignos não neoplásicos: pólipos de colesterol, adenomiomatose, pólipos inflamatórios
  • Pólipos benignos neoplásicos: adenomas e mais raramente fibromas, lipomas e leiomiomas
  • Pólipos malignos: adenocarcinoma de vesícula e mais raramente Carcinoma escamoso, cistoadenoma mucinoso e adenoacantomas

Fizemos ainda uma revisão mais detalhada das lesões mais comuns:

Acesse os artigos pelos links acima e bons estudos!




Onde coletar as biópsias gástricas para o estadiamento OLGA?

O protocolo OLGA para estadiamento da atrofia gástrica ficou muito popular no nosso meio. Cada vez mais os endoscopistas estão recebendo pedidos dos gastroenterologistas solicitando coleta de biópsias conforme o protocolo OLGA.

Mas existe uma dúvida persistente: de que locais devemos coletar essas biópsias?

O Sistema Sidney

Primeiramente, devemos revisitar um artigo importantíssimo acerca do assunto: O update do sistema Sydney, escrito pelo Dr. Michael Dixon, pelo famoso Dr. Pelayo Correa além de outros autores (Dixon M, 1996). Destaco esse trecho:

Recommendations: For optimal assessment, five biopsy specimens are taken, two from the antrum within 2 to 3 cm from the pylorus, one from the distal lesser curvature, and the other from the distal greater curvature, two from the corpus about 8 cm from the cardia (one from the lesser and the other from the greater curvature), and one from the incisura angularis (Fig. 2). Samples from antrum, corpus, and incisura angularis should be separately identifiable.”

Sistema OLGA

Em abril de 2005, um grupo internacional de gastroenterologistas e patologistas (Operative Link for Gastritis Assessment [OLGA]) reuniu-se em Parma, Itália, com o objetivo de reavaliar criticamente as diretrizes atualizadas do Sistema de Sydney e determinar se seria possível adicionar alguma espécie de estadiamento da gastrite crônica.

Como o risco do CaG esta relacionado a extensão da atrofia gástrica, um sistema que envolvesse o status da atrofia poderia fornecer informações importantes para o prognostico e seguimento desses pacientes. Nasce então o sistema OLGA.

Nesse artigo, os autores escrevem o seguinte paragrafo:

“…the Sydney Systems took into account the topographical distribution of the elementary lesions in the different gastric compartments and recommended that multiple endoscopic biopsy samples be taken from predefined sites of the stomach [8]. Five main sites were considered necessary: (1) greater and lesser curvature of the distal antrum (mucus-secreting mucosa), (2) greater and lesser curvature of the proximal corpus (oxyntic mucosa), and (3) lesser curvature at the incisura angularis, where the earliest atrophic-metaplastic changes tend to occur.” [Rugge M. Hum Pathol. 2005]

Ou seja, eles se baseiam nas recomendações do sistema Sidney e recomendam biópsias da pequena e grande curvatura tanto de corpo quanto de antro, além da incisura.

Em 2007 surge uma nova publicação do protocolo OLGA

“According to the Sydney system, the biopsy sampling protocol required that no less than five biopsy samples were obtained: two from the antral mucosa; one from the mucosa of the angularis incisura; two from the oxyntic area. Biopsy samples were submitted to the pathology department in different vials labelled according to the site of the sample.” [Rugge M. Gut. 2007]

Notem que aqui ele já não fala nada a respeito da parede gástrica, se pequena curvatura, grande, anterior ou posterior.

Um ano depois, em 2008, sai a seguinte publicação

“The OLGA proposal (basically consistent with the Houston-updated biopsy protocol) consists in recommending (at least) five biopsy samples from: (1) the greater and lesser curvatures of the distal antrum (A1–A2 = mucussecreting mucosa); (2) the lesser curvature at the incisura angularis (A3), where the earliest atrophic–metaplastic changes mostly occur; and (3) the anterior and posterior walls of the proximal corpus (C1–C2 = oxyntic mucosa) (Fig. 2)”. Rugge M. Dig Liver Dis. 2008.

Aqui ele já muda para parede anterior e posterior de corpo, porém cita a mesma referência de Dixon M et al, do updated Sydney System de 1994, que recomendava PC e GC 🧐. Esse novo artigo do Dr. Massimo Rugge tem ilustrações bonitinhas e que foram bastante reproduzidas nas aulas de congressos, publicações, etc. Talvez um dos motivos da maioria das pessoas entenderem que o local correto é a parede anterior e posterior de corpo.

Teria sido um erro da publicação?

A princípio parece que não, pois em publicações posteriores, Massimo Rugge e colaboradores reiteram a coleta na parede anterior e posterior de corpo, mas em outras publicações voltam para pequena e grande curvatura e em algumas citam apenas corpo, antro e incisura, sem especificar a parede. Explicado então porque existe tanta confusão a esse respeito.

MAPS II

Mais recentemente, a ESGE, em conjunto com outras sociedades europeias (European Helicobacter and Microbiota Study Group (EHMSG), European Society of Pathology (ESP), and Sociedade Portuguesa de Endoscopia Digestiva (SPED) publicaram o consenso MAPS (Management of epithelial precancerous conditions and lesions in the stomach). Nesse consenso a preferência é pela pequena e grande curvatura.

“Biopsies of at least two topographic sites (from both the antrum and the corpus, at the lesser and greater curvature of each) should be taken and clearly labelled in two separate vials.”

Nesse consenso a preferência é pela pequena e grande curvatura, mas sumiu a incisura angularis! 😫

Incisura angularis: to biopsy or not biopsy?

Mais biópsias permitirão um melhor estadiamento. No entanto, na prática clínica, mais biópsias significam mais tempo e mais custos.

O racional para a biópsia da incisura vem das recomendações do sistema Sydney atualizado. O sistema Sydney original recomendava duas biópsias de antro e duas de corpo. Já o sistema Sydney atualizado recomenda incluir a incisura, visto ser o local onde mais precocemente ocorre as alterações atróficas e metaplásicas “….lesser curvature at the incisura angularis, where the earliest atrophic-metaplastic changes tend to occur”. No entanto, essa recomendação foi baseada em conceitos, e não havia evidências cientificas sugerindo um benefício clínico.

Estudos sobre o benefício da amostragem de biópsia da incisura:

  • Um grande estudo com mais de 400 mil biópsias mostrou que a aderência ao sistema original de Sydney proporcionou a mais alta eficácia diagnóstica para infecção por H. pylori e IM. A inclusão de uma biópsia da incisura resultou em ganhos diagnósticos marginais a um custo adicional. [Lash JG, 2013]
  • Dois estudos europeu mostraram que sem a biópsia da incisura, 14/1048 pacientes mudariam a categoria de alto risco (III/IV) para baixo risco (I/II) do estadiamento OLGA. [Isajevs S, 2014 e Varbanova M, 2016]
  • Isso se traduziu em um número necessário para tratar de 75 – 80, o que significa que um em cada 75 – 80 pacientes não seria corretamente incluído em um grupo de alto risco se a biópsia da incisura não fosse realizada.
  • Outro estudo europeu, incluindo população de alto risco (parentes de primeiro grau de pacientes com câncer gástrico de início precoce) avaliou o sistema OLGA sem a biópsia da incisura e demonstrou um downgrade geral de 15% e 30% em comparação com o sistema OLGA original. No entanto, para pacientes em estágios de alto risco (OLGA III/IV), o rebaixamento foi menor (apenas 5% dos pacientes). [Marcos-Pinto R, 2012]
  • Um estudo coreano (Kim YI, 2017) incluindo 247 pcts de alto risco testou vários protocolos de biópsias e mostrou que incluir a incisura angularis e obter biópsias da pequena e grande curvaturas de corpo (PC + GC) ao invés da parede anterior e posterior (AP) identificavam mais pacientes no grupo de alto risco de OLGA e OLGIM

    • Corpo (PC + GC), incisura, antro (PC + GC) = 64,4%
    • Corpo (PC + GC) + antro (PC + GC) = 59,5% (p= .031)
    • Corpo (AP), incisura, antro (PC + GC) = 55,5% (P< .001)
    • Corpo (AP) + antro (PC + GC) = 47,8% (P< .001)

Em resumo, existe um pequeno rendimento adicional de uma biópsia da incisura o qual precisa ser equilibrado em relação aos custos e tempo, tempo e trabalho. O consenso MAPS II recomenda um mínimo de duas biópsias do antro e duas biópsias do corpo, observando que pode ser considerado adicionar uma biópsia da incisura para maximizar a detecção de pacientes com condições pré-neoplásicas, especialmente quando a cromoendoscopia não está disponível.

Onde colher então?

Minha preferência é pela pequena e grande curvatura. Além dos motivos já expostos, devemos lembrar da linha F, que é a linha de progressão da atrofia no estômago. Segundo a classificação de Kimura, a linha F se estende pela pequena curvatura do corpo em direção à cárdia. Ou seja: maior chance de pegar uma amostra com sinais de atrofia se incluirmos a PC nas amostras.

Saiba mais

Classificação de Kimura-Takemoto

Explicação sobre estadiamento OLGA

OLGA, OLGIM e Kimura

Laudando gastrite atrófica

Referências

  1. Dixon MF, Genta RM, Yardley JH, Correa P. Classification and grading of gastritis. The updated Sydney System. International Workshop on the Histopathology of Gastritis, Houston 1994. Am J Surg Pathol. 1996 Oct;20(10):1161-81. doi: 10.1097/00000478-199610000-00001. PMID: 8827022.
  2. Rugge M, Genta RM. Staging and grading of chronic gastritis. Hum Pathol. 2005 Mar;36(3):228-33. doi: 10.1016/j.humpath.2004.12.008. PMID: 15791566.
  3. Rugge M, Meggio A, Pennelli G, Piscioli F, Giacomelli L, De Pretis G, Graham DY. Gastritis staging in clinical practice: the OLGA staging system. Gut. 2007 May;56(5):631-6. doi: 10.1136/gut.2006.106666. Epub 2006 Dec 1. PMID: 17142647; PMCID: PMC1942143.
  4. Rugge M, Correa P, Di Mario F, El-Omar E, Fiocca R, Geboes K, Genta RM, Graham DY, Hattori T, Malfertheiner P, Nakajima S, Sipponen P, Sung J, Weinstein W, Vieth M. OLGA staging for gastritis: a tutorial. Dig Liver Dis. 2008 Aug;40(8):650-8. doi: 10.1016/j.dld.2008.02.030. PMID: 18424244.
  5. Pimentel-Nunes P, Libânio D, Marcos-Pinto R, Areia M, Leja M, Esposito G, Garrido M, Kikuste I, Megraud F, Matysiak-Budnik T, Annibale B, Dumonceau JM, Barros R, Fléjou JF, Carneiro F, van Hooft JE, Kuipers EJ, Dinis-Ribeiro M. Management of epithelial precancerous conditions and lesions in the stomach (MAPS II): guideline update 2019. Endoscopy. 2019 Apr;51(4):365-388. doi: 10.1055/a-0859-1883. Epub 2019 Mar 6. PMID: 30841008.
  6. Misiewicz JJ. The Sydney System: a new classification of gastritis. Introduction. J Gastroenterol Hepatol 1991; 6: 207 – 208
  7. Isajevs S, Liepniece-Karele I, Janciauskas D et al. The effect of incisura angularis biopsy sampling on the assessment of gastritis stage. Eur J Gastroenterol Hepatol 2014; 26: 510 – 513
  8. Lash JG, Genta RM. Adherence to the Sydney System guidelines increases the detection of Helicobacter gastritis and intestinal metaplasia in 400738 sets of gastric biopsies. Aliment Pharmacol Ther 2013; 38: 424 – 431
  9. Varbanova M, Wex T, Jechorek D et al. Impact of the angulus biopsy for the detection of gastric preneoplastic conditions and gastric cancer risk assessment. J Clin Pathol 2016; 69: 19 – 25
  10. Marcos-Pinto R, Carneiro F, Dinis-Ribeiro M et al. First-degree relatives of patients with early-onset gastric carcinoma show even at young ages a high prevalence of advanced OLGA/OLGIM stages and dysplasia. Aliment Pharmacol Ther 2012; 35: 1451 – 1459
  11. Kim YI, Kook MC, Cho SJ, Lee JY, Kim CG, Joo J, Choi IJ. Effect of biopsy site on detection of gastric cancer high-risk groups by OLGA and OLGIM stages. Helicobacter. 2017 Dec;22(6). doi: 10.1111/hel.12442. Epub 2017 Sep 22. PMID: 28940945.

Como citar este artigo

Martins BC. Onde coletar as biópsias gástricas para o estadiamento OLGA? Endoscopia Terapeutica 2023, vol 2. Disponível em: http://endoscopiaterapeutica.net/pt/assuntosgerais/onde-coletar-as-biopsias-gastricas-para-o-estadiamento-olga




Processo de aprendizado – Parte 2: como aprender melhor e mais rápido?

Não seria bacana aprender qualquer coisa de maneira mais eficaz e mais rápida? Sem dúvida nossa vida seria muito mais fácil! Existem vários livros e técnicas sobre esse assunto.

Na primeira parte dessa série, explicamos sobre o processo de aprendizado e a curva de esquecimento. Se você não leu a primeira parte, clique aqui nesse post.

Nesse segundo artigo, estou compartilhando algumas técnicas bacanas sobre como melhorar a memória e o aprendizado.  

O acrônimo para decorar a fim de aprender mais rápido é F.A.S.T.

F= FORGET

Para aprender melhor você precisa esquecer 2 coisas:

  1. Esqueça qualquer coisa não urgente que possa desviar sua atenção. Apesar de tentarmos fazer várias coisas ao mesmo tempo, nosso cérebro não foi desenhado para cumprir múltiplas tarefas simultâneas. Desligue o celular e concentre-se no que está estudando.
  2. Esqueça suas limitações. Se começar o aprendizado repetindo ideias como: “isso é muito difícil”, “nunca vou aprender isso”, “sou ruim com números/pessoas/pólipos/drogas/etc” muito dificilmente você aprenderá alguma coisa sobre o assunto em questão. Essa é uma dica muito poderosa.

A sigla mnemônica em inglês para esse conceito é ANT (authomatic negative thoghts). Portanto, para um melhor aprendizado você precisa acabar com esses pensamento negativos, ou seja: KILL THE ANTs! Significa eliminar os pensamentos negativos que tiram sua concentração e travam seu aprendizado. Isso vale não apenas para memória de conceitos mas também para o aprendizado técnico de endoscopia, colonoscopia, ultrassom endoscópico, etc.

Kill the ANTs!!!

A= ACTIVE

Seja ativo! Tome atitude! O aprendizado eficaz não pode ser uma atividade passiva. Isso não funciona e sabemos disso há décadas!

Lembre-se do esquema de aula na escola: os alunos entediados na sua carteira enquanto o professor falava de algum assunto que não desperta interesse. Resultado: aprendizado zero!

Assim ninguém aprende

O cérebro também aprende através da criação. Fazer perguntas, imaginar situações, se envolver no assunto, tomar notas, fazer desenhos, etc. Quanto mais ativo –> maior o aprendizado.

Por último: pratique atividade física! Existem diversos estudo científicos relacionando atividade física com melhora da capacidade de aprendizado. O que é bom para o coração, também é bom para o seu cérebro.

“Um grande estudo da Universidade de Munique, por exemplo, acompanhou 4.000 idosos durante dois anos. Aqueles que raramente faziam atividades físicas tiveram mais do que o dobro de chance de sofrer algum comprometimento cognitivo se comparados aos que faziam jardinagem, natação ou ciclismo algumas vezes por semana.” – (extrato de artigo da revista galileu – Link – original da revista new scientist por Christie Aschwanden)

Fonte: revista galileu. Renato Faccini. https://revistagalileu.globo.com/Revista/noticia/2014/02/quer-ser-mais-inteligente-corra.html

S= STATE

Seu estado emocional pode ajudar ou atrapalhar o seu aprendizado. São as emoções que você está sentindo naquele momento.

Muito mais propício para o aprendizado se você estiver empolgado, curioso ou fascinado pelo assunto. Se cansado, estressado ou se estiver pensando na praia, é melhor você não perder seu tempo e passar seu protetor solar.

INFORMAÇÃO + EMOÇÕES = MEMÓRIA DE LONGO PRAZO

T= TEACH

Todos já ouviram a máxima: “see one, do one, teach one” Durante seu estudo, aprenda como se fosse ensinar alguém. Você irá prestar mais atenção. Irá tomar notas. Querer entender o porquê. Vai repetir o conteúdo até ter certeza que a informação que você irá passar é a mais correta possível. Resultado –> melhor aprendizado pessoal!  

Duas outras dicas que eu gosto bastante!!!

1. DURMA BEM

Com uma mente tubulenta não conseguimos nos concentrar, nem tomar decisões acertadas e nem aprender nada. Uma boa noite de sono ajudará você a se concentrar, pensar com mais clareza e tomar melhores decisões. Também é essencial para a sua memória, porque durante o sono é quando você consolida a memória de curto a longo prazo.

Técnicas de meditação também funcionam para o mesmo propósito.

 

2. FAÇA PARTE DE UM GRUPO POSITIVO DE PESSOAS

As pessoas com quem você convive é quem você acabe se tornando. Em um grupo positivo de pessoas, uma pessoa acaba estimulando a outra com novidades, curiosidades, dúvidas, etc. Portanto, verifique se as pessoas com quem você está convivendo são boas para sua mente e sua vida. De alguma forma, isso é exatamente o que fazemos aqui no Endoscopia Terapêutica!

Quer saber mais?




Processo de aprendizado – Parte 1: curva de esquecimento

Nosso cérebro está constantemente registrando informações temporárias: trechos de conversas ouvidas na calçada, o que a pessoa na sua frente está falando, vestindo, fazendo, etc.

Como a maioria das informações não são necessárias e não ficam se repetindo, nosso cérebro vai se desfazendo delas. A notícia ruim, é que as informações que você realmente deseja guardar (na palestra que acabou de ouvir ou no texto que acabou de ler) também vão sendo apagadas junto com as informações banais do dia a dia.

Ebbinghaus Forgetting Curve

A curva de esquecimento de Ebbinghaus representa a diminuição da capacidade do cérebro de reter uma informação ao longo do tempo. Esse conceito foi elaborado por Hermann Ebbinghaus em 1885.

  • A capacidade de memória é máxima ao final da lição.
  • No segundo dia, se você não recapitular nada do que foi aprendido, você terá perdido 50-80% do que aprendeu (triste né?).
  • No dia 7, lembramos ainda menos, e no dia 30, retemos cerca de 5% do aprendizado original

Taxa de Esquecimento

Existem vários fatores que podem afetar a taxa de esquecimento. Alguns dos quais são

  • Significado da informação: a importância que a nova informação tem para você
  • A maneira como é apresentada: técnicas de ensino, etc.
  • Fatores fisiológicos e estado emocional (curiosidade, motivação, estresse, sono, etc.)

A taxa de esquecimento (inclinação da curva) não é a mesma entre todos.

Existem desempenhos diferentes na memória dos indivíduos que podem ser explicados pelas habilidades individuais de representação mnemônica. Em outras palavras: algumas pessoas têm naturalmente uma capacidade mnemônica extraordinária, outras são bem treinadas para melhorar sua memória, e outras não estão nem aí para esse assunto (e não há problema algum com isso).

Nem todos temos capacidade de armazenamento ilimitada….
…e não há problema algum com isso

De acordo com Ebbinghaus, os indivíduos podem ser treinados para aumentar sua capacidade mnemônica. Duas técnicas que ele destaca são:

  1. Melhor representatividade mnemônica (técnicas mnemônicas como associação, visual, etc)
  2. Repetição através da recordação ativa (repetição espaçada periódica)

Desta forma, você pode alterar a forma da curva de Ebbinghaus, estudando com mais eficiência e revisando periodicamente o material estudado.

Ao reprocessar a informação, você envia um sinal poderoso ao seu cérebro para manter esses dados. Quando a mesma coisa é repetida, seu cérebro diz: “Oh – aí está de novo, é melhor eu manter isso”. E quando você é exposto às mesmas informações repetidamente, leva cada vez menos tempo para “ativar” as informações em sua memória de longo prazo e fica mais fácil recuperar as informações quando necessário.

Após revisitar o material algumas vezes a retenção do conteúdo é muito maior, e a queda da curva é mais lenta

Um exemplo prático de como revisar o material estudado pode ser benéfico:

  • dentro de 24 horas após o estudo – gaste 10 minutos revisando e você aumentará a curva para quase 100% novamente.
  • Uma semana depois, são necessários apenas 5 minutos para “reativar” o mesmo material
  • No dia 30, seu cérebro precisará apenas de 2 a 4 minutos para fornecer o feedback “sim, eu sei disso …”

Quer saber mais sobre processo de aprendizagem e dicas de como aprender melhor e mais rápido?

Não perca a segunda parte dessa série no post que sai amanhã, aqui no site Endoscopia Terapêutica!




Injeção Endoscópica de Toxina Botulínica

 Introdução 

Esta revisão visa ilustrar a técnica de injeção endoscópica de toxina botulínica, assim como mostrar seus benefícios e limitações. Iniciaremos com o conceito de acalásia, para depois ilustrar a forma correta de aplicação da técnica citada. Serão também mostrados efeitos da intervenção e preditores de sucesso em longo prazo, além de eventuais complicações.

O principal artigo para elaboração dessa revisão foi: Chan Sup Shim, Endoscopic botulinum toxin injection: Benefit and limitation, Gastrointestinal Intervention, Volume 3, Issue 1,2014, Pages 19-23. https://doi.org/10.1016/j.gii.2014.03.001. 

Acalásia 

Conceito 

É uma desordem motora esofágica que tem como principal sintoma a disfagia, ocorrendo de forma insidiosa. Caracteriza-se pela destruição ou ausência dos plexos nervosos intramurais do esôfago. Essa condição determina ausência de peristaltismo (aperistalse) no corpo do órgão, bem como o relaxamento incompleto do esfíncter inferior do esôfago (EIE) em resposta à deglutição. Consequentemente, há estase esofágica e incoordenação motora. De modo progressivo, ocorre dilatação do órgão e diminuição de sua capacidade de contração. 

Histologia 

  • Histologicamente observa-se destruição do plexo nervoso mioentérico (Auerbach). 
  • A degeneração inflamatória envolve preferencialmente os neurônios inibitórios, que liberam óxido nítrico e peptídeo vasoativo intestinal, afetando o relaxamento da musculatura lisa. 
  • Os neurônios excitatórios estão relativamente poupados. Eles liberam acetilcolina e causam contração da musculatura lisa, contribuindo para o tônus do EIE. 
  • A perda da inervação inibitória do esfíncter inferior do esôfago faz a pressão basal do EIE aumentar, de modo a impedir o relaxamento do mesmo. 
  • No corpo esofágico, a destruição do plexo nervoso resulta em aperistalse.       
Localização dos plexos nervosos na parede do trato gastrointestinal.

O tratamento usual consiste na dilatação com balão ou na miotomia do EIE. A injeção intraesfincteriana de toxina botulínica (botox) emergiu como uma alternativa à dilatação com balão, agindo através do bloqueio da liberação de acetilcolina nos terminais nervosos. 

A toxina botulínica bloqueia a liberação de acetilcolina na junção neuromuscular, diminuindo a contração muscular.

Injeção Endoscópica de Toxina Botulínica 

Técnica endoscópica de injeção de botox: 

  • Consiste na injeção de 100 UI nos quatro quadrantes do EIE (25 UI em cada quadrante), utilizando agulha de escleroterapia.
  • A injeção deve ser feita 1 cm proximal à junção escamocolunar, de forma perpendicular à parede esofágica, na camada muscular.
  • Uma nova injeção de 100 UI após 1 mês pode aumentar a eficácia2

Para aplicação de botox, é necessário diluir o mesmo com SF 0,9% e misturar suavemente, sem agitar a solução.  

Efeitos da intervenção 

Estudos demonstraram que a injeção de toxina botulínica (ITB) nos pacientes com acalásia proporciona uma melhora sintomática significativa comparativamente ao placebo.  

A aplicação de 100 UI, seguida da repetição da dose em um mês demonstrou ser mais eficiente do que aplicações únicas de 50 ou 200 UI2. Contudo, uma redução na eficácia da toxina botulínica tem sido observada no seguimento destes pacientes, provavelmente relacionada à produção de anticorpos contra a sua molécula. 

Estudos mostram que as taxas de resposta 1 mês após a administração são em média de 82% (69–90%). Aos 6 meses, a taxa de resposta clínica cai para 57% (33–77%) e, em 12 meses, para 48% (15–76%). 

Preditores de sucesso em longo prazo 

A ITB, apesar de menos invasiva que a dilatação pneumática e miotomia, ainda apresenta piores resultados a longo prazo em relação a estes métodos. Fatores preditores de melhor resposta à toxina botulínica incluem: 

  • Acalásia vigorosa (tipo III); 
  • Pacientes com pressão do esfíncter esofágico inferior não excedendo mais de 50% do limite superior da normalidade, em pacientes sem acalasia vigorosa 
  • Idade maior que 50/55 anos, sendo a taxa de resposta nesse grupo etário próximo ao dobro da observada na população mais jovem e ainda mais evidente na acalásia clássica; 
  • Forma do tratamento, com reaplicação em 4 semanas. 

Outros fatores como sexo, duração da doença, características radiográficas basais e gravidade dos sintomas iniciais não demonstraram ser preditores de resposta ao tratamento. 

Complicações 

As complicações da administração da toxina botulínica incluem principalmente a dor torácica transitória e azia, sendo reportados casos isolados de bloqueio cardíaco, retenção urinária e pneumotórax. 

Benefícios e limitações 

A ITB, apesar de apresentar menor eficácia terapêutica que os demais métodos, é comumente utilizada como terapia inicial pela sua facilidade técnica e baixa taxa de complicações, sendo preferencialmente reservada para pacientes com comorbidades importantes, em espera para tratamento cirúrgico ou que se recusam outros métodos de tratamento. Destaca-se, porém, o aumento da taxa de perfuração esofágica quando o paciente é submetido, posteriormente, à dilatação pneumática. 

Após a aplicação da toxina botulínica, os pacientes com acalásia devem ser monitorados regularmente, pesquisando possíveis complicações, como dilatação esofágica maciça e carcinoma esofágico.  

Referências

  1. Chan Sup Shim, Endoscopic botulinum toxin injection: Benefit and limitation, Gastrointestinal Intervention, Volume 3, Issue 1,2014, Pages 19-23. https://doi.org/10.1016/j.gii.2014.03.001
  2. V. Annese, G. Bassotti, G. Coccia, M. Dinelli, V. D’Onofrio, G. Gatto, et al. A multicentre randomised study of intrasphincteric botulinum toxin in patients with oesophageal achalasia. GISMAD Achalasia Study Group, Gut, 46 (2000), pp. 597-600.

Como citar este artigo

Passos HL, Bernardes FV, Martins BC. Injeção Endoscópica de Toxina Botulínica. Endoscopia Terapeutica 2023, vol 1. Disponivel em: http://endoscopiaterapeutica.net/pt/injecao-endoscopica-de-toxina-botulinica/




Laudos em endoscopia digestiva alta-parte III Como descrever as alterações encontradas.

Em nossos primeiros artigos sobre o tema (Laudos Endoscópicos e Fotodocumentação) abordamos como o laudo endoscópico deve ser estruturado, destacando a importância de uma boa foto documentação e da coerência entre o que está descrito e o que está documentado nas imagens.

A intenção deste documento é orientar como descrever as características mais importantes das principais alterações endoscópicas.

Obviamente existem preferências individuais na maneira de redigir o texto, sendo que alguns preferem texto corrido enquanto outros preferem separar em parágrafos, alguns preferem uso da voz passiva e outros voz ativa, e assim por diante. A escolha do estilo usado na descrição das alterações compete a cada profissional. No entanto, é importante estar atento a alguns princípios.

Fornecer as informações necessárias para enquadrar as lesões dentro de uma classificação validada pela literatura.

Exemplo: classificação de Los Angeles. O endoscopista deve descrever a extensão das erosões (maior ou menor do que 5 mm), se são confluentes ou não, e, em caso de erosões confluentes, descrever se acometem mais ou menos do que 75% da circunferência esofágica.

Escrever de forma objetiva

Evitar informações desnecessárias e um texto prolixo. Isso torna a leitura do seu relatório mais precisa e mais agradável. Vale a pela usar frases curtas sempre que possível.

Usar termos descritores padronizados e validados, de acordo com a Minimal Standard Terminology for Digestive Endoscopy (M.S.T. 3.0)

Segue abaixo uma lista com as alterações endoscópicas mais comuns e as sugestões para descrição que são um verdadeiro guia prático para você:

Esofagite erosiva

O que é importante?

  • descrever a extensão das erosões (maiores ou menores do que 5 mm)
  • presença de confluência ou não
  • em caso de erosões confluentes, descrever se acometem mais ou menos do que 75% da circunferência esofágica.

Exemplos:

Mucosa encontra-se opacificada e espessada na região distal, com erosões (menores/maiores) do que 5 mm, não confluentes (ou confluentes em menos do que 75% da circunferência) ao nível da transição esofagogástrica.

Mucosa do segmento distal do esôfago, ao nível da transição esofagogástrica exibe coloração opaca e perda do padrão vascular. Notam-se erosões lineares menores/maiores do que 5 mm, sem confluência (ou exibindo confluência em menos/mais do que 75% da circunferência).

Esôfago de Barrett

O que é importante?

  • descrever a extensão máxima do acometimento circunferencial (C) e a extensão máxima da projeção de epitélio colunar (M) segundo a classificação de Praga.
  • descrever os achados da avaliação do epitélio colunar, com uso de cromoscopia ou magnificação quando disponível
  • relatar a realização de biópsias e se foram realizadas de forma dirigida ou de acordo com protocolo de Seattle.

Exemplos de descrição:

Nota-se epitelização colunar em esôfago distal sendo circunferencial por 1,0 cm e com extensão máxima de 3,0 cm (Praga C1M3). Realizada cromoscopia virtual com (NBI/LCI), seguido de cromoscopia com solução de ácido acético, não se observando áreas suspeitas para displasia. Realizadas biópsias nos quatro quadrantes conforme protocolo de Seattle.

Nota-se em esôfago distal, junto à transição esofagogástrica (localizada a 38 cm dos incisivos), mucosa apresentando coloração rosa-salmão, com acometimento circunferencial de cerca de 1,0 cm (37-38 cm dos incisivos), e com duas projeções de até 3,0 cm pelas paredes anterior e posterior (35-38 cm). Realizada cromoscopia virtual com (NBI/LCI), seguido de cromoscopia com solução de ácido acético, não se observando áreas suspeitas para displasia. Realizadas biópsias nos quatro quadrantes conforme protocolo de Seattle.

Exemplos de Conclusão

  • Epitelização colunar em esôfago distal.
  • Esôfago de Barrett curto/longo (quando já existe a confirmação diagnóstica),
  • Alterações endoscópicas sugestivas de epitelização colunar em esôfago distal

Esofagite eosinofílica

O que é importante?

  • descrever os segmentos do esôfago acometidos.
  • presença de estrias longitudinais ou não
  • presença de exsudato na superfície mucosa ou não
  • presença de padrão em “traqueização” ou não
  • áreas de estenose
  • a realização de biópsias nos segmentos proximal, médio e distal.

Exemplos de descrição no corpo do laudo:

Mucosa dos segmentos proximal, médio e distal apresenta edema e perda do padrão vascular habitual. Além disso notam-se estrias longitudinais, padrão em “traqueização” e exsudato puntiforme aderido. Não visualizamos segmento estenótico. Realizadas biópsias dos segmentos de esôfago.

Mucosa do esôfago médio e distal apresenta aspecto espessado e esbranquiçado, associado a estrias e fissuras longitudinais, anéis concêntricos e exsudato pontilhado esbranquiçado. Realizadas biópsias de esôfago proximal, médio e distal.

Exemplos de Conclusão

  • Alterações endoscópicas compatíveis com esofagite eosinofílica.
  • Esofagite eosinofílica?

Hérnia hiatal

O que é importante?

  • descrever a relação entre a transição esofagogástrica e o pinçamento diafragmático
  • o endoscopista pode também descrever a distância entre as estruturas anatômicas e os incisivos (ou arcada dentária superior – ADS)

Exemplos de descrição no corpo do laudo:

Transição esofagogástrica situada 2,0 cm acima do pinçamento diafragmático.

Transição esofagogástrica situada a 38 cm da ADS, 2,0 cm acima do pinçamento diafragmático.

Exemplos de Conclusão

  • Hérnia hiatal.
  • Hérnia hiatal por deslizamento.
  • Hérnia hiatal mista (tipo III)

Fundoplicatura

O que é importante?

  • Descrever se a TEG está sob a zona de pressão constituída pela fundoplicatura + hiatoplastia ou se está deslizada (considera-se deslizamento da FPL quando a TEG está situada 2,0 cm acima da zona de pressão)
  • descrever se a fundoplicatura está intra-abdominal ou migrada
  • descrever se a fundoplicatura envolve toda a circunferência da cárdia, se envolve parcialmente a cárdia ou se está desgarrada.
  • descrever se há hérnia paraesofágica ou não

Exemplos de descrição no corpo do laudo:

À retrovisão observa-se fundoplicatura intra-abdominal (ou migrada) envolvendo circunferencialmente (ou parcialmente) a cárdia.

À retrovisão observa-se fundoplicatura migrada e parcialmente desgarrada, associada a hérnia paraesofágica.

Exemplos de Conclusão

  • Fundoplicatura íntegra
  • Fundoplicatura em bom aspecto
  • Fundoplicatura (total ou parcial) com bom aspecto 
  • Fundoplicatura migrada, porém não desgarrada
  • Fundoplicatura desgarrada e migrada

Gastrite enantemática (ou enantematosa)

O que é importante?

  • descrever a distribuição do enantema: restrito ao antro, restrito ao corpo, difuso.
  • descrever a intensidade do enantema: leve, moderado ou acentuado

Exemplos de descrição:

Mucosa de (corpo/antro) apresenta enantema difuso de (leve/moderada) intensidade.

Exemplos de Conclusão

  • Gastrite enantemática leve de antro
  • Pangastrite enantematosa moderada

Gastrite erosiva

O que é importante?

  • descrever a distribuição das erosões: restritas ao antro, ao corpo, difusas.
  • descrever o aspecto das erosões: se planas ou elevadas
  • descrever a intensidade do acometimento: leve, moderado ou acentuado

Exemplos de descrição:

Mucosa de (corpo/antro) apresenta erosões (planas/elevadas) em (pequena/grande) quantidade

Exemplos de Conclusão

  • Gastrite erosiva plana leve de antro.
  • Pangastrite erosiva intensa.

Gastrite atrófica

O que é importante?

  • descrever as características da mucosa atrófica como presença de palidez, aspecto adelgaçado da mucosa, realce da vascularização subeptielial, se há redução numérica e/ou volumétrica das pregas do corpo (em caso de gastrite atrófica de corpo)
  • descrever a extensão do acometimento: restrito ao antro, envolvendo antro e corpo, restrito ao corpo, envolvendo antro e pequena curvatura do corpo, etc.
  • documentar caso haja a realização de biópsias e os respectivos locais

Nota: o endoscopista pode utilizar classificações como a classificação de Kimura-Takenoto ou estadiamento OLGA. Estadiamento OLGA depende da coleta de biópsias nos locais adequados e da solicitação do endoscopista no pedido de anatomopatológico.

Exemplos de descrição:

Mucosa de antro apresenta sinais de atrofia que se estendem para incisura angularis e pequena curvatura de corpo distal. Realizadas biópsias de acordo com protocolo OLGA.

Mucosa de antro e pequena curvatura de corpo exibem palidez, realce da vascularização subepitelial e aspecto adelgaçado, compatível com atrofia. Realizadas biópsias de corpo, antro e incisura de acordo com protocolo OLGA.

Mucosa de corpo e fundo apresenta-se adelgaçada e com maior visualização dos vasos submucosos. Além disso há redução numérica e volumétrica das pregas gástricas. Realizadas biópsias de corpo e antro em frascos separados.

Exemplos de conclusão:

  • Gastrite atrófica de antro.
  • Gastrite atrófica de corpo.
  • Alterações endoscópicas sugestivas de gastrite atrófica de antro / corpo
  • Alterações endoscópicas compatíveis com gastrite atrófica (tipo C-2 de Kimura-Takemoto)

Metaplasia intestinal gástrica

O que é importante?

  • descrever a extensão do acometimento: restrito ao antro, envolvendo antro e corpo, restrito ao corpo, envolvendo antro e pequena curvatura do corpo, etc.
  • descrever se houve a realização de biópsias e os locais.

    • Nota: o endoscopista pode decidir pela realização de biópsias de corpo, antro e incisura e solicitar ao patologista a classificação conforme protocolo OLGIM.

Nota: importante salientar que existem variações no fenótipo da metaplasia intestinal, a qual pode apresentar-se como placas esbranquiçadas levemente elevadas, ou placas superficialmente elevadas com centro deprimido (o centro geralmente é mais avermelhado), ou apenas como múltiplas áreas deprimidas. À magnificação é possível observar alteração do padrão de microarquitetura de superfície, presença de substância branca opaca e sinal da crista azul (light blue crest).

Exemplos de descrição:

Observam-se placas esbranquiçadas discretamente elevadas, sugestivas de metaplasia intestinal, distribuídas por toda extensão do antro. Realizada cromoscopia e biópsias de acordo com protocolo OLGIM.

Notam-se inúmeras áreas superficialmente elevadas, cm coloração vermelha, exibindo padrão de microarquitetura de superfície sugestivo de metaplasia intestinal. As lesões distribuem-se pelo corpo e antro, se destacam após cromoscopia. Realizadas biópsias.

Exemplos de conclusão:

  • Alterações endoscópicas sugestivas de metaplasia intestinal em antro.
  • Focos de metaplasia intestinal em corpo gástrico

Lesão subepitelial

O que é importante?

  • descrever a localização da lesão, seu tamanho estimado, consistência e mobilidade
  • descrever o aspecto da mucosa que recobre a lesão (íntegra ou não)

Exemplos de descrição:

Observa-se lesão elevada recoberta por mucosa íntegra, medindo aproximadamente 10mm, móvel à palpação com a pinça, localizada em parede anterior de antro, compatível com lesão subepitelial.

Nota-se lesão elevada, recoberta por mucosa lisa, de aspecto subepitelial, medindo 2,5 cm, localizada em parede posterior de segmento médio de corpo, endurecida ao toque da pinça.

Exemplos de conclusão:

  • Lesão subepitelial em corpo gástrico.
  • Lesão subepitelial em antro gástrico

Úlcera gástrica

O que é importante?

Importante uma descrição detalhada da úlcera com informações importantes para guiar o tratamento, bem como para levantar suspeita quanto natureza benigna ou maligna. A descrição deve incluir:

  1. localização da úlcera
  2. tamanho
  3. formato (ovalada, alongada)
  4. profundidade (rasa, profunda)
  5. aspecto das bordas (regulares ou não / definidas ou não),
  6. retração ou deformidade das pregas,
  7. aspecto do fundo da úlcera (fibrina, restos necróticos, restos hematínicos, etc)

Finalmente, conclui-se a fase do ciclo da úlcera conforme a classificação de Sakita

No caso de úlcera hemorrágica, descrever a presença de estigmas de sangramento recente (vaso visível, coágulo aderido) conforme classificação de Forrest, e se foi realizada terapia endoscópica.

Exemplos de descrição:

Na parede anterior do antro distal observa-se uma ulceração profunda, com formato redondo, medindo cerca de 20 mm. A ulceração apresenta bordos regulares, edemaciados e com halo de enantema. O fundo da ulceração é recoberto por fibrina espessa com restos necróticos.

Na pequena curvatura do antro distal, nota-se úlcera superficial em cicatrização, com convergência de pregas, bordas regulares, hiperemiadas e com pequena área linear de fibrina medindo aproximadamente 5 mm.

Na pequena curvatura do antro, presença de retração cicatricial, compatível com cicatriz de úlcera gástrica.

Exemplos de conclusão:

  • Úlcera em atividade no antro gástrico (Sakita A1)
  • Retração cicatricial no antro gástrico (Sakita S2)
  • Cicatriz de úlcera bulbar (Sakita S2)

Anatomia alterada cirurgicamente

O que é importante?

Descrever a alteração anatômica encontrada, o tamanho do remanescente gástrico (se houver) e sempre que possível identificar o tipo de reconstrução de trânsito que foi empregada. Importante descrever o tipo, tamanho e aspecto da anastomose.

A seguir, exemplificaremos as principais cirurgias que lidamos no nosso dia a dia.

Bypass gastrico

O que é importante?

Descrever o tamanho do remanescente gástrico, presença de constrição anelar se houver e estimar o diâmetro da anastomose. Importante avaliar presença de erosões ou ulceras perianastomoticas e se há torção de eixo na alça alimentar.

Exemplos de descrição:

Estômago operado, com evidências de gastroplastia redutora e reconstrução a Y de Roux.

Coto gástrico medindo 4 cm, com mucosa de aspecto preservado.

Anastomose gastrojejunal em bom aspecto, medindo aproximadamente 1,5 cm de diâmetro e sem lesões.

Alça alimentar sem alterações de eixo ou lesões de mucosa.

Exemplos de conclusão:

Gastroplastia redutora com reconstrução a Y de Roux (Bypass gástrico)

Status pós-operatório de gastroplastia redutora com reconstrução em Y de Roux

Gastrectomia Vertical

O que é importante?

Descrever a forma do remanescente gástrico, atentando-se para a transição corpo antro, próximo da incisura angularis, onde pode haver estenose ou torção de eixo.

Exemplos de descrição:

Presença de sutura longitudinal na grande curvatura do corpo, conferindo forma tubular ao órgão.

Transição corpo-antro (ou…. região da incisura angularis) permitindo a passagem do aparelho sem dificuldades.

Mucosa….

Exemplos de conclusão:

Gastrectomia vertical.

Status pós-operatório de gastrectomia vertical.

Como citar este artigo

Cardoso DMM. e Martins BC. Laudos em endoscopia digestiva alta-parte III Como descrever as alterações encontradas. Endoscopia Terapeutica 2023, vol 1. Disponível em: http://endoscopiaterapeutica.net/pt/laudos-em-endoscopia-digestiva-alta-parte-iii-como-descrever-as-alteracoes-encontradas/




Ressecção de parede total gástrica com Padlock

Paciente masculino 68 anos com antecedente pessoal de leucemia tratada, obesidade, diabetes e dislipidemia.

Durante exame de rotina, apresentou em endoscopia digestiva alta lesão elevada medindo 15 mm em grande curvatura de corpo gástrico com vasos aberrantes, apresentando características sugestivas de tumor neuroendócrino (TNE) que foram confirmados em anatomopatológico. A mucosa gástrica de corpo e antro não apresentavam sinais de atrofia, o que levantou a hipótese de um TNE esporádico do tipo III (não relacionado com gastrite atrófica autoimune).

Paciente submetido a complementação diagnóstica com ecoendoscopia, a qual mostrou lesão limitada a segunda e terceira camadas, portanto passível de ressecção endoscópica.

Realizada ressecção endoscópica com a técnica de ligadura elástica sem intercorrências.

O estudo histológico evidenciou acometimento de submucosa com margens profundas e laterais comprometidas. Imuno-histoquimica revelou ki-67 inferior a 2%.

Por tratar-se de provável TNE do tipo 3, ou seja, com risco maior de disseminação linfonodal, optado por tentativa de nova ressecção endoscópica com intuito de evitar um procedimento cirúrgico.

Submetido a novo tratamento com auxílio de over-the-scope-clip (Padlock) para ressecção endoscópica de espessura gástrica total (full thickness endoscopic ressection). Aplicação de dois endoloops de segurança abaixo do OTSC. A remoção da lesão foi obtida com sucesso apresentando pela patologia amostra livre de neoplasia.

Discussão

Resseções endoscópicas de espessura total permitem diagnósticos definitivo e apresentam potencial curativo no tratamento de lesões envolvendo qualquer camada da parede do trato gastrointestinal (1). O uso de OTSC para ressecção de parede total no trato gastrointestinal alto é uma técnica emergente para ressecções de lesões epiteliais e subepiteliais selecionadas com evidência de eficácia e segurança em uma série de casos(2-4). O uso da técnica se mostra mais favorável com lesões subepiteliais medindo até 1,5 cm, visto que lesões maiores podem apresentar dificuldade para serem aspiradas dentro do cap antes da liberação do clipe(5). Cumpre salientar que o clipe Padlock não é recomendado para ressecção de espessura total do TGI. Sua aprovação na ANVISA está ligada a tratamento de fístulas e sangramento digestivos

Comentários Finais

A técnica de ressecção endoscópica de espessura total permite o tratamento definitivo de lesões envolvendo camadas mais profundas dos órgãos do trato gastrointestinal , principalmente para lesões medindo até 1,5cm de diâmetro. A ressecção endoscópica de parede total pode ser uma possibilidade terapêutica para casos selecionados de lesões profundas do trato gastrointestinais.

Para saber mais sobre este tema, acesse o site Gastropedia clicando aqui!

Referências

1.Feng Y, Yu L, Yang S, et al. Endolumenal endoscopic full-thickness resection of muscularis propria-originating gastric submucosal tumors. J Laparoendosc Adv Surg
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5. Over-the-scope clip-assisted endoscopic full-thickness resection of epithelial and subepithelial GI lesions

Como citar este artigo

Barros RS, Martins BC. Tumor neuroendócrino. Endoscopia Terapêutica 2023, vol. 1. Disponível em: endoscopiaterapeutica.net/pt/casosclinicos/resseccao-de-parede-total-gastrica-com-padlock




Neoplasia periampular sem lesão visível

Paciente do sexo feminino, 53 anos, sem comorbidades prévias, iniciou quadro de icterícia, febre e aumento de enzimas caniculares.

  • Realizou ressonância magnética (RNM) abdominal que identificou sinais de colangite com dilatação da VB intra e extra-hepáticas.
  • Submetida a CPRE em serviço externo com evidência de “papilite” e microcálculos no coledoco. Realizado fistulotomia, dilatação de papila, varredura com balão extrator e passagem de prótese plástica. Biopsiado a papila que resultou em amostra inconclusiva.

Após um mês, apresentou novamente quadro de colangite e a nova RNM de abdome apresentava as mesmas alterações, agora com a presença de prótese biliar.

  • Realizada ecoendoscopia que mostrou dilatação do colédoco (16 mm) e ducto principal pancreático (4,5 mm), com interrupção dos mesmos na topografia da papila duodenal, sem nítida lesão perceptível na ecoendoscopia. Efetuada punção ecoguiada com agulha fina. 
  • Em nova CPRE, realizada dilatação, biópsias de papila e passagem de nova prótese plástica.

Resultado de anatomopatológico da punção ecoguiada e das biópsias por CPRE: adenocarcinoma moderadamente diferenciado de papila duodenal, superficialmente invasivo e ulcerado.

Paciente foi submetida a gastroduodenopancreatectomia com linfadenectomia regional. Estadiamento revelou comprometimento linfático, vascular e neural pT3b pN2. O tratamento adjuvante com quimioterapia foi indicado.

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Comentários:

Esse caso ilustra bem a importância de insistir na elucidação diagnóstica dos tumores periampulares. Apesar da imagem endoscópica e da RNM não demonstrarem lesão nítida na papila duonenal maior, a suspeita se manteve devido a grande dilatação do colédoco (16mm) associado a icterícia, sem uma causa muito convincente (apenas microcálculos na CPRE anterior). Isso motivou a realização da Ecoendoscopia concomitante para melhor investigar a região, a qual demonstrou dilatação do duto pancreático principal que não havia sido evidenciado na RNM, o que aumentou ainda mais a suspeita de uma lesão periampular. Nesses casos, a punção guiada por ecoendoscopia justamente no local onde ocorre a interrupção dos dutos aumenta a sensibilidade diagnóstica.

O adenocarcinoma de papila duodenal faz parte do grupo de tumores periampulares que surgem nas proximidades da ampola de Vater. A incidência é maior na população com síndromes de Polipose Hereditária. O quadro clínico mais comum é de síndrome colestática obstrutiva associado a dor abdominal, emagrecimento e anemia. Laboratorialmente evidencia-se aumento de bilirrubinas diretas e enzimas caniculares. A avaliação diagnóstica das vias biliares se inicia com USG de abdome, com pouca sensibilidade para visualizar o tumor. A CPRE é indicada para o diagnóstico, permitindo a identificação do tumor, biópsia e descompressão biliar. A ecoendoscopia apresenta importância para detecção e punção de tumores pequenos como também no estadiamento. O tratamento padrão envolve a gastroduodenopancreatectomia e frequentemente associada à quimioterapia adjuvante e radioterapia.

Por ser um diagnóstico raro e de maior complexidade, é fundamental ressaltá-lo precocemente diante de um quadro de colestase obstrutiva, com melhora do prognóstico quando detectado inicialmente.

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Como citar esse artigo?

Cardoso ACFL, Martins BC. Neoplasia periampular sem lesão visível. Endoscopia Terapêutica 2023, vol 1. Disponível em: http://endoscopiaterapeutica.net/pt/casosclinicos/neoplasia-periampular-sem-lesao-visivel/